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Instrumentos inovadores de aprendizagem: uma experiência com o WhatsApp
Inovative tools for learning: an experience with WhatsApp
Instruments d’apprentissage innovants: une expérience avec Whatsapp
Instrumentos innovadores de aprendizaje: una experiencia con el WhatsApp
Instrumentos inovadores de aprendizagem: uma experiência com o WhatsApp
Revista Lusófona de Educação, núm. 43, pp. 78-89, 2019
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias
Resumo: Parte-se do reconhecimento de que as dinâmicas atuais da comunicação do conhecimento sofrem o impacto de diferentes inovações tecnológicas; estas usam variados suportes que transformam os modos de expressão: novos tipos de linguagem, recursos disponibilizados num único aparelho ou programa. Isso impeliu a Universidade a promover mudanças no modo de ensinar, aprender e conviver, para se aproximar das demandas do tempo presente. Esta pesquisa foi realizada na UFF (RJ-Brasil) com alunos de Pedagogia e outras licenciaturas. Desenvolve-se como pesquisa-ação, com foco na avaliação do uso do aplicativo WhathApp, como ferramenta de ensino-aprendizagem. Questões:em que medida o WhathApp torna o ensino mais motivador? Que fatores aumentam essa motivação? Este procedimento fomenta hábitos de estudo profundo, ou induz apenas hábitos de estudo estratégico ou superficial? Foram criados grupos no WhatsApp, por escolha dos próprios alunos. Todo o material didático é colocado à disposição dos grupos no aplicativo; o contacto extra-aula entre aluno e professor, pelo WhatsApp, é livre. O professor e o aluno monitor participam ativamente no grupo de aprendizagem; os questionários aplicados foram construídos para coletar dados que permitam responder às questões da pesquisa; as sessões de grupo focal visaram aprofundar os fenómenos observados. O tratamento dos dados é quantitativo e qualitativo; as respostas já analisadas respondem positivamente às questões que nortearam a pesquisa.
Palavras-chave: WhatsApp, aprendizagem, novas tecnologías, universitários.
Abstract: The study begins with the recognition that the current dynamics of knowledge communication are impacted by different technological innovations; several media are used that transform the modes of expression: new types of language, resources made available in a single device or program. This has prompted the University to promote changes in the way of teaching, learning and living together to meet present time demands. The research was conducted at UFF (RJ- Brazil) with Pedagogy and other undergraduate students. It was developed as action research, focused on the evaluation of the use of WhatsApp, as a learning tool, by students and teachers. Questions: To what extent does WhatsApp make teaching more motivating? What factors increase motivation? Does this procedure encourage deep study habits or strategic and superficial only? Research procedures: at first, groups were created in WhatsApp, by choice of the students themselves. All the didactic material was made available to groups in the application; the extra-class contact between student and teacher, through WhatsApp was free. Teacher and student monitor participate actively in the learning group; the questionnaires were designed to collect data to answer the research questions; the focus group sessions aim to deepen and better understand the observed phenomena. The treatment of the data is quantitative and qualitative; the answers already analyzed respond positively to the questions that guided the research.
Keywords: WhatsApp, learning, new technologies, university students.
Résumé: On sait que les dynamiques actuelles de la communication des connaissances sont affectées par plusieurs innovations; différents supports sont utilisés, qui transforment les modes d’expression: on recourt à de nouveaux types de langage et plusieurs ressources sont disponibles dans un seul programme.Cela a incité l’Université à promouvoir des changements dans la façon d’enseigner et d’apprendre pour s’ adapter au présent. La recherche a été conduite à UFF (RJ-Brésil) avec des étudiants en pédagogie et d’autres cours. Elle a été dévelopée comme recherche-action, sur l’utilisation de WhatsApp par les étudiants et les enseignants. Questions: Dans quelle mesure WhatsApp rend l’enseignement plus motivant? Quels facteurs en sont responsables? Est-ce que cette procédure encourage des habitudes d’étude profond ou simplement stratégique ou superficielle ? Des groupes ont été créés dans WhatsApp, par le choix des étudiants eux-mêmes. Le matériel a été mis à la disposition des groupes dans l’application; le contact entre l’étudiant et l’enseignant, via WhatsApp, est gratuit. L’enseignant participe activement au groupe d’apprentissage; des questionnaires ont été conçus pour recueillir des données, afin de répondre aux questions de recherche; les séances des groupes de discussion ont cherché à approfondir les phénomènes observés. Le traitement des données est quantitatif et qualitatif; les réponses obtenues répondent positivement aux questions qui ont guidé la recherche.
Mots clés: WhatsApp, apprentisage, ouvelles technologies, étudiants universitaires.
Resumen: Se reconoce que las dinámicas actuales de la comunicación del conocimiento sufren el impacto de muchas innovaciones tecnológicas; utilisan diferentes medios de comunicación; nuevos modos de expressión y de hablar, en uno solo aparejo o programa. Esto impulsó a la Universidad a hacer cambios en el modo de enseñar, >aprender y convivir, para acercarse a las demandas del presente. La investigación fue conducida en la UFF (RJ- Brasil) con alumnos de Pedagogía y otras licenciaturas. Se desarrolla como investigación-acción, con foco en el uso de la aplicación WhatsApp, como herramienta de enseñanza-aprendizaje. Cuestiones: ¿En qué medida el WhatsApp hace la enseñanza más motivadora? ¿Qué factores aumentan esa motivación? ¿Este procedimiento fomenta hábitos de estudio profundo, o simplemente estratégico o superficial? Se crearon grupos en WhatsApp, por elección de los propios alumnos. El material didáctico estuvo a disposición de los grupos en la aplicación; el contacto entre el alumno y el profesor, por el Whats App, es libre. Lo profesor y el alumno monitor participan activamente en el grupo de aprendizaje; los cuestionarios aplicados fueron construidos para recoger datos que permitan responder a las cuestiones de la investigación; las sesiones de grupo focal buscan profundizar y comprender mejor los fenómenos observados. El tratamiento de los datos es cuantitativo y cualitativo; las respuestas ya analizadas responden positivamente a las cuestiones que guiaron la investigación.
Palabras clave: WhatsApp, aprendizaje, nuevas tecnologías, alunos de universidade.
Introdução
O avanço das sociedades atuais em direção ao conhecimento passa em grande escala pelo uso extensivo de tecnologias de informação e comunicação, orientadas pelo conhecimento científico, nas decisões que tomam sobre a sua própria organização. Essas sociedades têm como suporte fundamental do seu funcionamento a informação transformada em conhecimento tecno-científico interdisciplinar, que se vai tornando um dos núcleos centrais da sua cultura e modo de ver a realidade (Masson e Mainardes, 2011).
Mas a aplicação do conhecimento para intervenção sobre o real não é imediata: assenta no conhecimento operacional dos meios que a possibilitam, os quais integram o que se designa de tecnologia, uma forma concreta, embora não necessariamente única, de aplicar o conhecimento.
As tecnologias incluem os instrumentos de intervenção e é por isso que são expressões limitadas do conhecimento que aplicam. Por sua vez, o aperfeiçoamento das tecnologias conduz à amplificação e precisão do conhecimento que elas corporizam (Ferreira e Axt, 1999).
O relatório organizado pela UNESCO -2013 “Alfabetização midiática e informacional Currículo para formação de Professores afirma ser necessário: “desenvolver e expandir os meios de comunicação entre os seus povos, empregando esses meios para os propósitos do entendimento mútuo ...” (Wilson et al, 2013, p.1).
Reconhecendo que a revolução tecnológica constitui elemento essencial para a compreensão da modernidade, na medida em que cria novas formas de socialização e novas definições de identidade individual e coletiva, é altamente recomendável que os sistemas educativos forneçam às crianças e adultos as bases culturais que permitem operar escolhas inteligentes na massa de informações que recebem dos media.
Competências transversais: flexibilidade e adaptação à mudança
Para usar a tecnologia de forma adequada, uma condição é imprescindível: a aquisição da competência pelos utilizadores. O desenvolvimento destas competências é a base da utilização adequada para o uso eficaz das tecnologias e do conhecimento. O professor está atualmente desafiado a dominar diversos instrumentos tecnológicos, não só ao nível dos aparelhos e processos mecânicos como, mais amplamente, do que Lévy (1999) apelidou cibercultura.
Perante esta evolução, a tarefa do professor deixou de ser apenas transmitir aos alunos os conhecimentos que a sociedade lhes propõe; tem igualmente tarefas de dinamização e de elevação da complexidade de raciocínio dos alunos, para o que tem de desenvolver e pôr em ação duas áreas de competência pedagógica, enquadráveis no domínio conceptual da liderança:
• levar os alunos a sentirem-se equipa, a criarem uma identidade própria - a sintalidade, na designação proposta por Cattel (1948), a perceberem que têm com eles a força e o saber do grupo, ao agirem sobre o contexto (Kouzes, 2003).
• envolver-se na turma e adaptar-se ao estilo de trabalho dos alunos, de modo a criar um clima grupal positivo e desenvolver um bom relacionamento individual e grupal com os mesmos.
Esta dimensão psicossocial da competência do professor já foi anteriormente objeto de um estudo que colocou em evidência a importância da flexibilidade na relação com os alunos (tabela 1):
A flexibilidade do professor concretiza-se no ajustamento aos hábitos dos alunos e, no caso desta pesquisa, na utilização dos instrumentos mais usados por eles em redes virtuais.
Uma pesquisa feita sob o auspício da UNICEF (2013) revelou que entre os adolescentes brasileiros que afirmam ter acessado à internet nos últimos 3 meses a maioria declarou que o fez em busca de diversão (75%); para comunicar com amigos (66%); para fazer trabalhos escolares (61%); para busca de informações (40%). Stern e Willis (2009) apontam igualmente a procura de comunicação, a busca de informação; mas salientam um outro ponto, que merece atenção: a criação de conteúdos. Os próprios entrevistados no estudo da UNICEF focam o aspecto de a internet ser um ambiente livre, em que se pode fazer qualquer coisa que se queira (38%).
A dimensão comunicação com amigos tem como expressão a criação de novas formas de contato e a possibilidade de atingir novos espaços; neles se podem transportar ideias e sentimentos, expectativas de vida, dificuldades e conflitos e vivenciá-los de uma forma que ultrapassa a presença física, a proximidade, o concreto (Lehmann e Parreira, 2015). A vida acontece dentro da página do Facebook das redes virtuais, e quem está do lado de fora, está isolado e desconectado dessa realidade virtual. Este acontecer da vida na comunicação em espaços virtuais é um meio de construir subjetividades, isto é, de o sujeito se afirmar como aquilo que é e quer ser. Não pode ser ignorado nos adolescentes e jovens.
O presente estudo dá precisamente continuidade a pesquisas anteriores (Lehmann & Souza,2014) em que o facebook ficou identificado como o principal recurso tecnológico de uso dos jovens para comunicação. Esta pesquisa> procura justamente avaliar o impacto do uso de um aplicativo como o WhatsApp sobre dois parâmetros ligados ao processo de aprendizagem:
• a aceitação do uso do whats app por parte dos professores; de um curso de mestrado em educação;
• o impacto motivacional do uso do Whats App em relação ao estilo de estudo adotado pelos alunos;
• a percepção que os alunos têm quanto à utilidade do uso do instrumento para o desenvolvimento de suas competências.
O WhatsApp como ferramenta
WhatsApp é um software para smartphones utilizado para trocar mensagens faladas e de texto instantaneamente, além de vídeos, fotos e áudios, através da sua conexão à internet. O WhatsApp foi lançado oficialmente em 2009 pelos veteranos do Yahoo! - uma das maiores empresas americanas de serviços para a internet e funciona com sede em Santa Clara na Califórnia, Estados Unidos. Considerado um aplicativo para celulares multiplataforma, o WhatsApp é atualmente compatível com todas as principais marcas e sistemas operacionais de smartphones do mundo, como o iPhone (iOS), Android, Windows Phone, BlackBerry e Nokia.
O grande diferencial do WhatsApp, segundo os seus criadores, foi a inovação do sistema de utilização dos contatos telefônicos no software. Quando um usuário baixa o aplicativo para seu telefone, não é necessário criar uma conta ou “adicionar amigos” para poder utilizar a plataforma. O WhatsApp “vasculha” os números de celulares salvos no aparelho e automaticamente identifica qual está cadastrado no WhatsApp, adicionando-o à lista de contatos do novo utilizador.
O WhatsApp é prático e econômico, pois não há um custo adicional para enviar as mensagens, além do plano de dados utilizado para se conectar à internet. Atualmente o WhatsApp pertence ao Facebook – e existe a possibilidade de utilizar o software na rede, através do navegador do Google Chrome. Dessa forma, tem a possibilidade de ser acessado no computador, se o celular estiver ligado no WhatsApp, dando a possibilidade de ver em tamanho maior todo o conteúdo postado.
Entre outras funcionalidades do WhatsApp está a criação de grupos de contato, envio de fotos, vídeos, mensagens de voz, emoticons, assim como a alteração das mensagens de status.
Mas naturalmente não se podem ignorar as limitações do aplicativo, nomeadamente para o objetivo aprendizagem; uma dessas limitações, encontrada no presente estudo, é a restrição do acesso dos novos entrantes a conteúdos anteriores já guardados no aplicativo. Esse dado exige que alguém já possuidor do material o envie para cada novo ingressante.
WhatsApp: que impacto na atitude de aprendizagem
De acordo com Newble e Entwistle (1986), os estudantes manifestam preferências por um estilo de aprendizagem entre vários possíveis, consoante a sua trajetória pessoal e familiar. O>s autores propuseram uma classificação em três estilos: superficial, estratégico ou profundo.
O estilo superficial foi caracterizado da seguinte maneira:
• o objectivo é passar nas avaliações de conhecimento;
• a discussão dos temas e problemas é desvalorizada;
• a base de estudo são os apontamentos das aulas;
• o estudo tende a centrar-se apenas em partes da matéria consideradas essenciais;
• a retenção da informação obtida é relativamente efémera, tende a ser esquecida após a sua avaliação;
• a atitude do aluno é reativa, não proativa: está motivado pela preocupação de acabar o curso ou pelo medo de falhar; fica-se pelo essencial dos conteúdos, procurando >reproduzi-los o mais exactamente possível; usa uma aprendizagem mecânica, e o resultado obtido é um nível de compreensão superficial (Marton & Säljö, 1976; Newble & Clarke, 1986).
Quando o estudante adota um estilo de aprendizagem estratégica, procura essencialmente:
• agir de forma a agradar ao professor;
• aplicar o esforço às matérias que o professor mais valoriza;
• organizar o tempo e o esforço para conseguir o melhor resultado (Saldanha, 1999);
• sua motivação é sobretudo >alcançar boas notas, competir com outros, e ter sucesso “a qualquer preço” (Newble & Clarke: 1986).
Estes dois estilos, ainda que manifestem atitudes diferentes, têm um ponto em comum: não é o conhecimento oferecido que o aluno visa ou valoriza em primeiro lugar; o aluno visa um objetivo exterior a esse conhecimento, a aprendizagem é antes de mais o meio para atingir esse objetivo. O estilo superficial de estudo responde a um objetivo de resposta suficiente, apenas de obtenção da aprovação (como se vê nos padrões comportamentais acima delineados); o estilo estratégico responde ao objetivo social de ser aceite pelos avaliadores (o importante é agradar-lhes, ser aceite e valorizado, vender-lhes uma imagem de capacidade).
A aprendizagem profunda, pelo contrário, caracteriza-se por comportamentos bem diferentes:
• o estudante não se limita a decorar, para saber o mínimo necessário à aprovação, procura o significado inerente ao assunto;
• interpreta as informações, de modo a torná-las coerentes com a sua própria experiência;
• tenta compreender o que estuda, integrando-o em conhecimentos já adquiridos;
• critica o que estuda, levanta hipóteses e articula >eventuais pontos contraditórios que encontre nos diversos temas.>
• a informação é processada a níveis cognitivos superiores, de modo a identificar ideias chave, sintetizar, examinar e avaliar a lógica do >raciocínio (Riding e Rayner, 1998).
O estilo de aprendizagem profundo distingue-se, assim, dos outros dois: o motivo principal do comportamento de estudo é a apropriação do conhecimento e das competências que ele proporciona, e não objetivos extrínsecos ao desenvolvimento das competências do próprio aluno.
Nesta pesquisa procura-se justamente avaliar em que medida o uso do WhatsApp motivou os alunos a praticarem o estilo de aprendizagem profundo ou, pelo menos a aproximarem-se dele, vencendo a desmotivação dos alunos em relação aos métodos tradicionais de ensino. Complementarmente, procurou-se descortinar em que medida o uso desse instrumento flexibilizou a atitude do professor, focando-o mais na busca do desenvolvimento das competências e libertando-o do peso da autoridade. Segundo estudos anteriormente feitos pela equipa, o aumento da importância dada à informação em relação ao uso do poder aumenta a motivação de todos – alunos e professores – para uma aprendizagem profunda (Parreira e Pestana, 2010). Nestas preocupações se enraizou a tríplice questão para as quais o trabalho de pesquisa projetado pretendeu encontrar resposta: s>erá que o WhatsApp ajuda a tornar o ensino mais interessante, mais prático e de resultados mais rápidos? O protagonismo que dá ao aluno contribui para a sua maturidade? Em que medida favorece uma interação mais frequente, mais flexível e pronta, mais aberta e mais inclusiva?
Pesquisa de campo
Procedeu-se a uma pesquisa de campo com alun980-os dos cursos de Pedagogia e diversas licenciaturas (Matemática, Letras, Biologia, História, Geografia, Ciencias Sociais, Cinema, Quimica), a qual obedeceu aos procedimentos explicitados a seguir.
A partir de uma sondagem feita com os alunos, a respeito de que instrumento indicariam para usar como meio de comunicação, foi decidido utilizar o aplicativo Whats app, tendo sido criados dois grupos nessa plataforma: um com alunos de Pedagogia e outro com alunos de várias disciplinas de ciencias., alunos da licenciatura. Os grupos foram criados por iniciativa da monitora e da professora.
Foi elaborado um questionário inicial, disponibilizado online, através do google forms, relativo aos modos de utilização do WhatsApp pelos alunos. A pesquisa teve a participação de cerca de 80 alunos dos cursos de graduação.
De acordo com o planejado na experiência, o WhatsApp foi utilizado para comunicação entre os alunos, monitor e professor, como instrumento complementar no processo de aprendizagem das matérias da disciplina e desenvolvimento das competências por ela visadas. Foram registadas as interações entre os membros dos grupos, incluindo alunos, monitor e professor. As interações incluiram os conteúdos e outros aspectos da disciplina (proposta do professor, para integrar a pesquisa).
Os objetivos visados na pesquisa foram os seguintes:
1. Avaliar até que ponto o uso do WhatsApp desenvolve nos alunos a motivação para um estilo de aprendizagem profundo.
2. Saber em que medida o uso do WhatsApp desenvolve competências transversais nos alunos, nomeadamente: atitude aberta à procura de informação diversificada; attitude crítica e ampliadora de perspectivas; escuta ativa dos outros, mesmo quando manifestam posições divergentes; honestidade intellectual, isto é, valor dado à verdade mais objetiva, pelos critérios cientificos.
3. Descobrir em que medida o uso do WhatsApp contribui para maior flexibilidade, compromisso com os alunos e maior capacidade de liderança do professor.
Na sequência dos objetivos acima definidos, foram especificadas as seguintes hipóteses orientadoras:
H1 - O uso do WhatsApp favorece um tipo de trabalho baseado em relações de troca de informação e igualdade, contra relações assentes na autoridade do professor
H2 – O uso do WhatsApp favorece a proatividade do aluno e as motivações orientadas para a busca de informação.
H3 O uso do WhatsApp favorece o aumento da competência interpessoal e a inclusão de alunos e professores na construção de um grupo centrado na aprendizagem.
Apresentação de resultados
Alunos e professores face ao WhatsApp
O registo da attitude dos professores em relação à utilização do WhatsApp como instrumento auxiliar da aprendizagem foi feito com base em entrevistas a professores e alunos e num processo de observação participante (Valladares, 2007>).
Os alunos questionados sobre o que sabiam da utilização do WhatsApp pelo professor e monitor indicaram que a sua experiência pessoal era de que os seus professores não utilizavam o WhatsApp para fins pedagógicos e tinham mesmo manifestado uma apreciação negativa dessa ferramenta enquanto meio auxiliar da aprendizagem. A infomação dos alunos se dá a partir de suas experiências em outras disciplinas que cursam na universidade. Isso nos leva à hipótese de um indicio de resistência dos professores ao uso do aplicativo, sugerindo também que esta attitude se insere em atitudes mais gerais de desconfiança em relação à utilização pedagógica das TIC, associadas a maior informalidade na relação com os alunos. De facto, as tabelas 2 e 3 mostram que o WhatsApp induziu um estilo de interação marcadamente informal do professor com os alunos e dos alunos entre si.
A observação das duas tabelas caracteriza o estilo de interação marcadamente informal que ficou associado ao uso do whatsApp:
• A categoria informalidade tem 23 (15+8) manifestações claras, nas interações entre colegas e com o aluno monitor monitora e o professor;
• A motivação C (curiosidade pelos temas) tem 6 (5+1) manifestações por parte dos alunos;
• A motivação P (pertença ao grupo, identificação com o grupo) tem 10 (6+4) manifestações;
• A proatividade tem 10 (3+7) manifestações.
Estes indicadores podem ser interpretados com base em modelos motivacionais e de liderança complexos (Parreira e Lorga da Silva, 2014), colocando em evidência o impacto do uso destes artefatos tecnológicos sobre o processo de aprendizagem.
Em primeiro lugar, a informalidade. Enquanto o formalismo é um procedimento de marcação de distância e de poder, a informalidade nas relações professor-aluno assinala a redução da distância entre os dois e a substituição do uso da autoridade pela troca de informação. Esta mudança tem um efeito claro sobre a procura e utilização, pelo aluno, da informação circulante, dinamiza o processo de aprendizagem. Os resultados mostram que a informalidade é o tom geral das interações não só entre alunos, mas também com a monitora e a professora; complementarmente, não aparecem manifestações de recurso à autoridade para obtenção de comportamentos de estudo.
>Em segundo lugar, a confirmação desta informalidade nas interações relativas à aprendizagem aponta para a probabilidade de os alunos se encaminharem para um estilo de aprendizagem profundo: a exploração da informação sobre as matérias e o empenho na aquisição das competências propostas é notório: 6 indicadores da moti>vação C; 10 indicadores de proatividade; 10m indicadores de envolvimento na produção grupal (acima tabelas 2 e 3).
É uma conclusão derivada da relação poder-informação expressa no gráfico 1, onde se mostra que a troca de informação entre os atores cresce fortemente à medida que diminui o uso do poder numa relação.
A ideia de que o uso do WhatsApp gera nos alunos a tendência à adoção de um estilo de aprendizagem profundo (e não apenas superficial, com foco na nota de aprovação, ou estratégico, para obter status aos olhos do professor) é reforçada pelos indicadores de pratividade e motivação C (curiosidade, busca de informação): nas duas tabelas, o seu número é significativo: 10 para a proatividade e 6 para a motivação C.
Estes resultados são confirmados pelos obtidos com os dois instrumentos utilizados na coleta de dados: um questionário com 12 perguntas sobre o modo de utilização do WhatsApp; e o grupo focal com grupos dos dois tipos de alunos envolvidos no projeto.
A tabela 3 salienta os aspetos positivos já realçados acima; e inclui dois pontos críticos que merecem atenção: para não se ficar prisioneiro da dependência de uma tecnologia tem sempre de se ter em conta as falhas potenciais dos suportes dessa tecnologia e encontrar medidas alternativas capazes de as superar. Por outro lado, não se pode descurar a frase de McLuhan, “O meio é a mensagem” (1964)>: cada instrumento técnico utilizado afeta mais ou menos profundamente a mensagem que se transmite. No caso do whats app, a própria informalidade pode baixar o nível de análise dos conteúdos, reforçando uma tendência visível no mundo virtual: a sobrevalorização do efémero e do acessório, em detrimento do essencial e mais permanente. Mas conhecer as limitações de um instrumento é um passo primeiro e imprescindível para as colmatar.
O outro instrumento de coleta de dados sobre a experiência com o whatsApp foi o grupo focal, de que se realizaram dois: um com os alunos de pedagogia e outro com os alunos de outras especialidades. Os dados obtidos confirmam, por um lado, os conseguidos com o questionário e com a análise das interações da turma; e, por outro lado, esclarecem alguns pontos relacionados com a questão do tipo de estudo praticado (quadro 1).
Os dados do grupo focal reforçam a ideia de que o WhatsApp foi um instrumento útil ao processo de ensino/aprendizagem no mestrado Educação Inclusiva: os grupos realçaram principalmente os pontos positivos da utilização do WhatsApp, sem deixarem de mostrar a sua atenção e análise crítica dos pontos menos positivos.
Interpretação dos resultados
Os resultados sobre a informalidade como tom geral das interações dos alunos entre si e com a monitora e a professor, acompanhada de uma quase ausência de recurso à autoridade para obtenção de comportamentos de estudo, confirmam a validade de H1. Apontam, consequentemente, para a confirmação de H2, com base na interpretação dos modelos mais atuais de motivação (>Parreira e Lorga da Silva, 2014), que afirma a proatividade e a busca de informação como o principal motor do estilo profundo de aprendizagem). A terceira hipótese (H3) também parece validada pelos resultados relativos não só à informalidade (que indubitavelmente favorece a inclusão grupal), mas também pelos indicadores da presença de afetos positivos e da motiva>ção P (pertença) nas interações: em conjunto, as manifestações de pertença e afeto positivo somam 13 manifestações.
Estes dados permitem com certeza a inferência de que o uso do WhatsApp como meio complementar de interação professor-aluno favoreceu a caminhada para um estilo de aprendizagem profundo, por um lado, e de uma attitude inclusive geral, por outro. A questão que na sequência desta inferência se pode colocar é se este efeito positivo se estende a toda a aprendizagem ou se o WhatsApp mostrou limitações que deveriam ser ultrapassadas para que o estilo de aprendizagem profundo conduzisse realmente à aquisição de competências efetivas e transferíveis para a prática.
Acredita-se que os dados obtidos nos grupos focais permitem responder a esta questão. Eles revelam que o uso do WhatsApp incentivou os alunos a adotarem o estilo de aprendizagem profundo, já que demonstram a motivação direta dos participantes para a aquisição de conhecimentos e desenvolvimento de suas competências profissionais:
• os alunos apreciaram o seu efeito na vinculação a materiais e conteúdos;
• valorizaram ter proporcionado questionamentos e esclarecimento de dúvidas;
• gostaram da rapidez de acesso ao conhecimento e da segurança contra perdas de informação;
• elogiaram ter-se mantido o foco no uso como ferramenta de estudo, sem desvios ou dispersão;.
• revelaram interesse em corrigir algumas limitações apontadas ao instrumento, o que revela uma percepção razoavelmente objetiva do WhatsApp.
Estas considerações são uma base razoável para considerer a experiência positiva e incentivadora de experiências com o mesmo ou outros instrumentos similares, natu>ralmente com a precisão acrescida que esta pesquisa mostrou ser possível.
Referências
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