Resumo: O presente estudo discute as percepções que o público de visitação estimulada, oriundo de comunidades de baixo poder aquisitivo e/ou baixo capital cultural, desenvolve a partir da visita ao Museu de Astronomia e Ciências Afins. Descreve também o seu perfil sociodemográfico, cultural e econômico. Toma como referência os conceitos de inclusão social, experiência e empoderamento, bem como uma tipologia de público de museus, que envolve o aspecto de autonomia sociocultural do indivíduo em relação ao evento ao qual ele se expõe. O instrumento de pesquisa foi um questionário autoadministrado a 1.258 visitantes, contendo questões sobre o perfil e parâmetros atitudinais de interesse e de motivação, relacionados ao conceito de empoderamento. Conclui-se que o empoderamento se dá pela associação entre as percepções de ganhos cognitivos e de aplicabilidade destes ao mundo social do visitante no nível de suas relações pessoais e de suas relações com as esferas sociais mais externas. As ações de inclusão social em museus devem se materializar como uma política institucional.
Palavras-chave:Visita EstimuladaVisita Estimulada, Museu de Astronomia e Ciências Afins Museu de Astronomia e Ciências Afins, Empoderamento Empoderamento.
Abstract: This study discusses the perceptions that the public of stimulated visits, from communities with low purchasing power and/or low cultural capital, develop from visiting a science and technology museum. Also described is their socio-demographic, cultural, and economic profile. The concepts of social inclusion, experience, and empowerment are taken as a reference, as well as a typology of museum publics involving the aspect of the sociocultural autonomy of the individual in relation to the event they are exposed to. The instrument was a self-administered questionnaire completed by 1258 visitors, containing questions about profile and attitudinal parameters of interest and motivation, related to the concept of empowerment. It is concluded that empowerment occurs through the association between perceptions of cognitive gains and their applicability to visitors’ social world at the level of their personal relations and their relations with more external social spheres. The actions of social inclusion in museums need to be materialized as an institutional policy.
Keywords: Stimulated Visits, Science and Technology Museum, Empowerment.
Resumen: El presente estudio discute las percepciones que el público de visita estimulada, perteneciente a comunidades de bajo poder adquisitivo y/o bajo capital cultural, desarrolla a partir de la visita a un museo de ciencia y tecnología. También describe su perfil sociodemográfico, cultural y económico. Se toman como referencia los conceptos de inclusión social, experiencia y empoderamiento, así como una tipología de público de museos, que involucra el aspecto de autonomía sociocultural del individuo en relación al evento al que se expone. El instrumento de investigación fue un cuestionario auto-administrado a 1.258 visitantes, conteniendo cuestiones sobre el perfil y parámetros actitudinales de interés y de motivación, relacionados al concepto de empoderamiento. Se concluye que el empoderamiento se da por la asociación entre las percepciones de ganancias cognoscitivas y de aplicación de éstas al mundo social del visitante, en el plano de sus relaciones personales y de sus relaciones con las esferas sociales más externas. Las acciones de inclusión social en museos deben materializarse como una política institucional.
Palabras clave: Visita estimulada, Museo de Ciencia y Tecnología, Empoderamiento.
Dossiê Temático
Visita estimulada e empoderamento: por um museu menos excludente
Stimulated visits and empowerment: for a less exclusive museum
Visita estimulada y empoderamiento: por un museo menos excluyente
Recepção: 06 Setembro 2017
Aprovação: 15 Janeiro 2018
Ciência, tecnologia e inovação têm sido fatores essenciais no competitivo processo de desenvolvimento de diversas nações. Nos últimos anos, conceitos como integração, globalização e internalização permeiam uma série de mudanças sociais nas quais a interface cultura, ciência, política e educação estão profundamente implicadas. Os indivíduos estão convivendo com crises e conflitos de diferentes naturezas, enfatizando mais e mais a necessidade de um envolvimento na resolução de questões sociocientíficas. Essa situação configura-se alicerçada na preocupação com a formação de indivíduos preparados para enfrentarem os desafios emergentes no século XXI. Não há dúvidas de que a enorme quantidade de conhecimento científico produzido trouxe, e ainda traz, benefícios para o bem-estar e para a melhoria da vida das pessoas. Entretanto, um certo desconforto se faz presente na sociedade em geral, especialmente sobre algumas das consequências na aplicação desse conhecimento em áreas nas quais não há consenso entre os cientistas, como é o caso da clonagem, do clima global, dos alimentos transgênicos, entre outros assuntos controversos. Esse aspecto relaciona-se com o aumento da consciência de que, apesar da ciência ter produzido, nos últimos três séculos, boa parte das certezas, também revelou a incapacidade de oferecer diagnóstico seguro para uma série de assuntos. Como forma de caracterizar esse cenário, nada melhor do que a imagem do loop da montanha-russa apontada por Sevcenko (2001): desequilíbrio social, degradação do meio ambiente, insegurança e domínio da tecnologia.
Beck (1997) argumenta que estamos em uma "sociedade de risco" e como bem acrescenta Giddens (1997, p. 220), riscos esses associados à "fabricação de incerteza", ou seja, "muitas das incertezas com que nos defrontamos hoje foram criadas pelo próprio desenvolvimento do conhecimento humano". A aparente contradição – avanço científico e tecnológico e fabricação de incerteza – modifica o modo de produção de conhecimento científico até então vigente e coloca em cheque a confiança depositada no que Giddens (1991, p. 35) denominou "sistemas especialistas", definidos como "sistemas de excelência técnica ou competência profissional que organizam grandes áreas dos ambientes material e social em que vivemos hoje".
Em áreas como a medicina e a agricultura, por exemplo, as decisões e ações dos sistemas especialistas, bem como os resultados de pesquisas, são objetos de grande debate popular. A futura relação entre especialistas, ciência e não especialistas não pode mais estar baseada na forma tradicional de dependência nesses sistemas, mas sim pelo reconhecimento mútuo das contribuições que cada lado pode oferecer para que juntos tomem decisões que dizem respeito à sociedade em geral. Nessa nova relação entre ciência e sociedade, a expressão "agir na urgência, decidir na incerteza" de Perrenoud (1996), torna-se uma imagem adequada para sintetizar processos decisórios em que cidadãos, políticos, gestores públicos ou empresários tomam decisões acerca de temas de grande impacto social.
Além disso, vive-se em um mundo de transformações, em função de uma ordem global que ninguém compreende plenamente, mas cujos efeitos se fazem sentir em várias dimensões da vida cotidiana dos indivíduos. Nas palavras de Giddens (2000, p. 21), "a globalização é política, tecnológica e cultural, tanto quanto econômica". Nessa perspectiva, é errôneo pensar que a globalização afeta somente a ordem financeira mundial e diz respeito ao que está afastado e muito distante dos indivíduos. Ao contrário, ela é um fenômeno que influencia aspectos mais íntimos e pessoais, portanto, próximos dos indivíduos.
O somatório de todos esses pontos, aliado à ampliação da demanda por padrões mais elevados de cultura, tem levado muitos autores a insistir em que a promoção desta seja desenvolvida por uma rede de instâncias culturais. Os museus enquanto ambientes que possibilitam intensa interação social e experiências afetivas, culturais e cognitivas vêm ocupando lugar de destaque nessa rede (BOURDIEU; DARBEL, 1969; MERRIMAN, 1989; HEIN, 1998; FALK; DIERKING, 2000; HERIKSEN; FROYLAND, 2000).
Na atualidade, estão em jogo a valorização da ciência, os poderes instituídos, a denúncia de seus riscos e a aproximação com o público leigo. Conhecê-lo implica a instalação do debate democrático, introduzido por um sentido crítico. Desse modo, o debate sobre a educação e sobre a cultura científica se apresenta indispensável. Na mesma perspectiva, o museu se dá a conhecer. E é proposta dos museus e centros de ciência, em particular, o esforço de aproximação de seus visitantes com as questões da ciência e tecnologia, sejam elas controversas ou não.
O surgimento da Associação Brasileira de Centros e Museus de Ciência (ABCMC) ilustra a importância que essas instituições adquiriram nos últimos anos, nos cenários educativo e científico brasileiros. A partir da segunda metade do século XX, houve uma crescente criação de novos espaços científico-culturais incentivada tanto pelo governo como pelas associações e sociedades científicas e educacionais. De acordo com levantamento feito em 2005, que originou o guia "Centros e museus de ciência do Brasil", existiam no País cerca de 110 espaços científico-culturais (MASSARANI et al., 2005). Em 10 anos, esse número aumentou 243%. No guia de 2009, são apresentados, aproximadamente, 190 espaços (MASSARANI et al., 2009) e, na versão mais recente, foram identificadas, no Brasil, 268 instituições (MASSARANI et al., 2015).
No entanto, são muitos os desafios da divulgação da ciência. Um dos maiores é o de integrá-la a processos dialógicos voltados à inclusão social e promover o empoderamento das populações que não possuem como prática cultural o “consumo” da ciência (por exemplo, frequentar museus e centros de ciência, ler revistas e livros de divulgação da ciência, assistir a programas de televisão e usar a Internet para se informar sobre temas sociocientíficos). Essa perspectiva demanda, por parte dessas instituições museológicas, novas estratégias de concepção de exposições, elaboração de atividades educativas, bem como de mediação dos conteúdos da ciência e tecnologia.
O caráter qualitativo da comunicação da ciência nos espaços não formais de educação tem o potencial de promover a motivação para um futuro aprofundamento ou, em outros casos, a mudança de atitude para com o aprendizado formal. O desafio está em conseguir explorar os temas de maneira que o público os transponha para a sua vida entre seus familiares, amigos e nas esferas sociais mais externas, como na escola e no ambiente de trabalho. Do contrário, a percepção da experiência com a ciência pode até ser reconhecida como importante e ter impacto cognitivo, mas será vista como um evento à parte do mundo em que se vive.
Este artigo analisa aspectos do empoderamento de grupos de visitação estimulado no Museu de Astronomia e Ciências Afins, situado na cidade do Rio de Janeiro. Procura problematizar os desafios que devem ser enfrentados em relação à investigação e à comunicação com seus diferentes tipos de público e sugere caminhos para que os museus se tornem espaços culturais menos socialmente excludentes. Foram também examinados os perfis sociodemográficos, culturais e econômicos dessa audiência. O estudo desenvolvido veio ao encontro de um dos atuais desafios dos museus: estabelecer estratégias para promover o acesso físico e engajamento intelectual de camadas mais amplas da sociedade. Assim, um levantamento de informações sobre o público que não costuma frequentar museus nos ajuda a compreendê-lo. Na medida em que aprendemos com os outros somos também convidados a ver no outro suas diferenças, experiências e suas formas alternativas de sociabilidade, reavaliando conceitos e repensando práticas.
Ao longo dos anos, tanto a pesquisa como as práticas educacionais e comunicacionais relacionadas às exposições e/ou atividades em museus têm se intensificado, tornando-se cada vez mais uma área de produção de conhecimento. Nessa via, estudos e estratégias têm sido utilizados na tentativa de disponibilizar o conhecimento científico de forma acessível e com qualidade para seus visitantes. O público de museus, de modo geral, é visto como um grupo em construção, podendo ser composto por segmentos sociais diferentes. A visita ao museu é percebida como uma experiência resultante de contextos pessoal, social e físico, ancorada em regras e referências mais ou menos compartilhadas entre visitantes, curadores, cientistas e diferentes segmentos da sociedade, passíveis de negociação durante a situação observada. O significado dessa prática não resulta apenas de atributos do sujeito, mas se constrói na relação complexa entre diversos fatores.
Os estudos de público vêm emergindo como um campo de grande interesse para diretores e profissionais de museus. Inúmeras pesquisas passaram a recolher dados relativos às experiências do visitante em diferentes atividades, em lugar de medir unicamente o êxito da exposição. Os resultados dessas investigações geraram conhecimento capaz de subsidiar tanto as decisões cotidianas de gestão institucional como a compreensão dos processos de apropriação social da cultura e a elaboração de políticas públicas para o setor.
Os Museus de Ciência e Tecnologia vêm se empenhando em compreender as especificidades de um ambiente de educação não formal em ciências em suas várias ações dirigidas a seu público (GOUVÊA et al., 2003; DAMICO et al., 2009; MANO et al., 2015).
Nesse sentido, uma abordagem que se mostra útil para delimitar, compreender e orientar ações de divulgação e popularização da ciência é a autonomia que as pessoas possuem sobre a decisão da visita. Desse modo, o nível de independência sociocultural dos indivíduos nas escolhas que constituem o processo de ir a museu caracteriza três tipos de público de visitação: o de visitação espontânea, como sendo aquele que possui o maior grau de autonomia, afinal ele está exposto ao evento por livre e espontânea vontade; o de visitação programada, que possui grau intermediário de autonomia, uma vez que assumiu certo compromisso com uma programação para o evento; e o de visitação estimulada, que possui o menor grau de autonomia e que participa do evento devido a vários condicionantes externos compondo o esforço de inclusão social (COIMBRA et al., 2012).
Essa tipologia visa buscar instrumentos e métodos para avaliar a eficácia das atividades desenvolvidas nas instituições museológicas, levando em consideração as especificidades de cada tipo de público. No âmbito de uma sociologia aplicada, as pesquisas envolvem a obtenção de informação sobre o público em suas várias dimensões, sociais, culturais, demográficas e individuais a fim de produzir subsídios para a tomada de decisões na organização das ações museológicas em seus aspectos teóricos e práticos.
Nos estudos de público de museus é necessário reconhecer o papel importante que essas instituições desempenham no desenvolvimento da cultura na sociedade. Esse papel ganha mais relevância quando elas são identificadas como promotoras de motivação para o aprendizado, por exemplo. Na visitação a museu deve-se procurar a realização de uma experiência lúdica e prazerosa, dirigida para o despertar de emoções positivas, como interesse, curiosidade, surpresa, entre outras. A avaliação de indicadores tão subjetivos já é por si só um desafio.
Considerando a tipologia de público acima mencionada, pode-se identificar particularidades associadas ao desenvolvimento de pesquisas direcionadas ao conhecimento dos diferentes públicos.
Este é o público que todo museu considera como natural. É o mais frequentemente estudado. Possui o maior nível de autonomia sociocultural visto que decide por ele mesmo participar ou não do evento e se apresenta majoritariamente por grupos que possuem laços sociais, de família, de amizade, etc.
O público de visitação espontânea é o que recebe a maior atenção e para ele é dirigida a maioria das iniciativas culturais e estratégias mercadológicas (KOTLER et al., 2008), bem como todas as pesquisas do tipo Perfil-Opinião. Procura-se conhecer seu perfil demográfico (sob todos os recortes de gênero, classe, etnia, idade, etc.), social, cultural e econômico, seus hábitos, antecedentes e opiniões.
Mesmo sendo a audiência mais estudada, o grande desafio é a continuidade e a comparabilidade dos estudos. Iniciativas pontuais e voluntaristas de certos museus podem ser importantes em determinadas situações, mas uma política de pesquisa estatística regular com a utilização de instrumentos bem formulados e que possam ser comparados no espaço e no tempo é uma necessidade.
Este público é composto por grupos de turmas escolares ou ainda de grupos de turistas, de terceira idade e outros, que chegam ao museu com hora marcada para uma visitação agendada. Participam do evento grupos com perfil previamente conhecido, permitindo muitas vezes uma interação planejada por parte do museu. Seu grau de autonomia sociocultural é intermediário e o lócus de decisão sobre o evento é compartilhado; parte pelo próprio público, ou por mediadores externos, e parte pela instituição envolvida.
Como os grupos programados têm um perfil bastante homogêneo no que diz respeito às variáveis demográficas, socioculturais e econômicas, as pesquisas são direcionadas para a avaliação das atividades e programas voltados para esse segmento, bem como para conhecer a sua experiência na interação com o museu. Nesse contexto, os métodos da educação não formal podem ser usados como contraponto à educação formal das escolas, dando ênfase ao lúdico e ao prazer obtido na própria atividade.
A pesquisa sobre o público de visitação programada de museus e centros de ciência apresenta diversos desafios: se, por um lado, a caracterização sociodemográfica desse tipo de público já é conhecida, por outro lado, a avaliação dos efeitos da visitação não é uma questão trivial. Variáveis definidas pela psicologia educacional e pela psicologia cognitiva devem ser consideradas nas pesquisas.
Este público é o que possui o menor grau de autonomia sociocultural visto que possui condições econômicas desfavoráveis e/ou baixo capital cultural, ou seja, tem um perfil de visitante diferente daquele que já vai ao museu, na condição de visitação espontânea ou programada. O lócus de decisão sobre o evento está inteiramente fora dele e se encontra com uma instituição organizadora ou com alguma representação comunitária local. Ele participa do evento de visita a partir do protagonismo do museu em facilitar e estimular o acesso do grupo, como, por exemplo, organizando a excursão e financiando os custos de transporte dos visitantes.
Outra abordagem são os projetos de ciência móvel que levam as atrações dos museus às cidades desprovidas de equipamentos culturais de natureza científica, ou ainda, a regiões da própria cidade. Nessa situação, embora todos os tipos de público citados possam participar dessa ação de popularização da ciência, a dimensão da inclusão social é o propósito que orienta a itinerância.
O público de visitação estimulada é pouco considerado nas pesquisas e esse é o maior desafio. Entender porque grande parte da população simplesmente não vê a visitação a museus como parte de seu repertório de atividades sociais é essencial. Dada a importância desse tipo de público para os museus, faz-se necessário o desenvolvimento de estudos que subsidiem adaptações e reformulações que possibilitem o diálogo com múltiplas audiências.
As ações no âmbito da inclusão social estão, em geral, associadas a movimentos culturais na música, dança, esportes, artes e tradições populares. Raras são as vezes nas quais a ciência é tida como uma forma de cultura, sendo usada para a promoção de inclusão social. De acordo com Langevien-Joliot (2014, p. 193), "inscrever a cultura científica na cultura geral é um meio de emancipação e desenvolvimento de todos. É uma necessidade reduzir o fosso de incompreensão que existe entre a ciência e a sociedade". Embora exista a tendência cada vez maior da promoção da interdisciplinaridade entre as diferentes áreas de conhecimento no enfrentamento das grandes questões da ciência, há ainda muito por se fazer.
A busca por promover a aproximação com indivíduos de camadas da sociedade, identificadas pelo baixo capital econômico e/ou cultural, tem sido uma tônica dos museus que desejam ultrapassar os limites da recepção das audiências já consagradas. Guiyot-Corteville e Gachet (2011) observam que mais do que incluir e integrar esse público com a instituição museu, trata-se, antes de tudo, de mudar o olhar e a postura para ampliar o "fazer com", mais que o "fazer para". A mudança de atitude pressupõe o estabelecimento de novas relações entre profissionais de museu e dos outros atores do campo social cultural. É necessário construir uma nova relação que vá além de os dispositivos e estratégias clássicas dos projetos de mediação cultural que não incorporam os indivíduos que em virtude de suas diferenças não vão ao museu.
A ideia se reforça nas palavras de Sandell (2003, p. 45) quando afirma que inclusão social em museus não é sinônimo apenas de ampliação do acesso e diversificação da audiência, mas deve incluir mudanças de modelo no que se refere à função do museu: "o engajamento com conceitos de inclusão e exclusão social irá exigir que o museu repense radicalmente seus propósitos e objetivos e renegocie seu relacionamento com o seu papel na sociedade." Esse autor acrescenta como alguns dos fatores inibidores à adoção de práticas de inclusão social nos museus: a resistência de seus profissionais; a natureza e composição de sua força de trabalho que fortalece a manutenção do status quo; o fato de as instituições mais tradicionalmente associadas com iniciativas de inclusão social não considerarem os museus como parceiros; e a falta de informação e direcionamento por meio de políticas públicas voltadas para o setor museológico.
Portanto, inclusão social é um desafio a ser conquistado pelas instâncias da sociedade política e da sociedade civil brasileira. Moreira (2006, p. 11) a define como sendo "a ação de proporcionar para populações que são social e economicamente excluídas oportunidades e condições de serem incorporadas à parcela da sociedade que pode usufruir esses bens". Entende-se por social e economicamente excluída, possuir acesso muito reduzido aos bens materiais, educacionais, culturais e possuir recursos econômicos muito abaixo da média dos outros cidadãos.
Ao se pensar em promover ações de inclusão social não se pode desprezar o conceito de empoderamento. Segundo Zamora (2001, p. 1), "o empoderamento se refere ao aumento do poder e da autonomia de indivíduos e grupos sociais nas relações interpessoais e institucionais, em especial os setores submetidos a condições de discriminação e dominação social".
Acredita-se que ao visitar um museu de ciência e tecnologia, algo fora de seu padrão de consumo cultural, um indivíduo social e economicamente excluído, inaugure em sua vida uma nova categoria de experiências que faça com que se reconheça importante, competente, integrante de um contexto em relação ao qual, até então, não havia laços de pertencimento e identidade. Nesse sentido, pode-se também contar com Bondia (2002) que se debruça sobre a maneira como as informações que os indivíduos recebem são processadas e incorporadas em sua experiência de vida. Esse autor defende que aquilo que importa é a maneira pela qual os indivíduos processam as informações. Em suas palavras: "se a experiência é o que nos acontece e se o saber da experiência tem a ver com a elaboração do sentido ou do sem sentido do que nos acontece, trata-se de um saber finito. O saber da experiência é um saber particular, subjetivo, relativo, contingente, pessoal" (BONDIA, 2002, p. 7).
Dessa forma, a experiência de visitar um museu de ciência e tecnologia pode ser considerada como uma abertura para o desconhecido, para aquilo que não se pode antecipar e nem prever.
A pesquisa “Visitação de Grupos de Audiência Estimulada”, Visest, desenvolvida por integrantes do Grupo de Pesquisa em Educação em Ciências em Espaços Não Formais, Gecenf, do Museu de Astronomia e Ciências Afins – Mast, foi realizada em três rodadas, nos anos de 2006-2007; 2007-2008 e 2013-2014, respectivamente. Ela refletiu a necessidade de se investigar de forma mais aprofundada o público de visitação estimulada. Seus principais objetivos foram conhecer o significado que visitantes oriundos de comunidades de baixo poder aquisitivo e de baixo capital cultural desenvolvem a partir da visita a um museu de ciência e tecnologia e contribuir para a implementação de ações com intuito de promover a inclusão social.
O estudo tomou como referência os conceitos de experiência, inclusão social e empoderamento. A potencialidade deste último está no fato de implicar uma posição que reconhece que é a própria população quem pode identificar suas necessidades e propor caminhos para solucioná-las. Acredita-se que as atividades de educação em ciências podem ser promotoras de um padrão de consumo cultural que tem a ciência como elemento protagonista, gerando competências, laços de pertencimento, identidade e uma relação afetiva e estética com o conhecimento científico.
Pessoas convidadas para visitar o Mast, procedentes de áreas carentes da cidade do Rio de Janeiro e de municípios vizinhos que participaram das atividades aqui desenvolvidas no contexto da programação de atividades educacionais de final de semana e em eventos especiais de popularização da ciência como a III e a IV Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (2006 e 2007, respectivamente) e as Semanas de Astronomia do Mast (2006, 2007 e 2008).
Os grupos de visitantes foram contatados por meio de lideranças comunitárias (vinculadas a organizações não governamentais, associações de moradores e igrejas), assim como de professores de escolas públicas e do Programa Academia Carioca da Secretaria de Saúde da Prefeitura do Rio de Janeiro. No caso de lideranças comunitárias, fazia-se uma solicitação para que fossem formados grupos de famílias para a visita ao Mast. Por sua vez, os estudantes de escolas públicas e idosos do Programa Academia Carioca eram orientados a visitarem o museu acompanhados de seus familiares. A visita estimulada considera a presença da família fundamental para que não só o jovem usufrua e compreenda o museu como espaço de conhecimento, mas que essa apropriação se dê também no contexto familiar.
Os participantes eram provenientes do município do Rio de Janeiro, de bairros e comunidades localizadas na Zona Norte (Brás de Pina, Coelho Neto, Cordovil, Engenho Novo, Manguinhos, Marechal Hermes, Maré, Penha, Rocha e Vigário Geral), Zona Oeste (Bangu, Cidade de Deus, Jacarepaguá, Jardim Sulacap, Padre Miguel, Realengo e Senador Camará), Zona Sul (Laranjeiras) e também de outros municípios da região metropolitana do estado do Rio de Janeiro (São Gonçalo, Nova Iguaçu, Duque de Caxias, Belford Roxo, Mesquita, Nilópolis e São João de Meriti).
Nas primeiras duas rodadas da pesquisa, o Mast promoveu a visita a seus espaços dos grupos de audiência estimulada participantes da investigação, financiando o seu transporte. Na terceira rodada, contou-se com parceria do Instituto TIM que forneceu recursos financeiros para transporte, lanche, pagamento de mediadores e produção de material gráfico de divulgação da ciência.
Foram elaborados roteiros de visitação especialmente criados para esse público, de duração de três horas e meia, com intervalo de 30 minutos para lanche, que consistiam em visitação livre e mediada: sessão de planetário inflável; palestra interativa; observação do Sol através de telescópio; visita orientada aos espaços expositivos ("Olhar o céu, medir a Terra"; "Estações do ano, a Terra em movimento"; "A química na história do Universo, da Terra e do corpo" e "Fotografia, ciência e arte") e ao conjunto arquitetônico (Pavilhão da Luneta Equatorial de 21 cm; Pavilhão da Luneta Meridiana Zenital) e palestra interativa.
Após a visita ao Museu, os participantes acima de 12 anos eram encaminhados a um auditório para responder o questionário da pesquisa, de forma voluntária.
Esta pesquisa é de natureza quantitativa. O instrumento foi um questionário autoadministrado, respondido por pessoas de 12 anos ou mais. Na primeira rodada (2006-2007), uma versão inicial do questionário foi aplicada a 378 participantes. Na segunda (2007-2008) e na terceira (2013-2014) rodadas uma versão revisada e ampliada foi aplicada a 259 e 621 participantes, respectivamente, totalizando nas três rodadas 1.258 casos válidos. O questionário continha questões relativas ao perfil sociodemográfico, cultural e econômico e a parâmetros atitudinais ou comportamentais de interesse, de persistência e de motivação, relacionados ao conceito de empoderamento.
A medição desse conceito foi feita por meio da questão “Marque a alternativa que melhor expressa sua opinião sobre a visita ao museu” que era constituída por assertivas relacionadas a dois aspectos, cognitivo e social, do conceito em questão. Os respondentes tinham a escolha de cinco categorias de resposta: discordo totalmente (1), discordo (2), não sei (3), concordo (4) e concordo totalmente (5).
As questões relativas ao perfil foram idênticas nas três rodadas. Por outro lado, a questão voltada para a medição do empoderamento foi ampliada de 10 assertivas na primeira rodada para 28 na segunda e terceira rodadas, com objetivo de aumentar as qualidades estatísticas da análise.
As respostas aos questionários foram codificadas e transpostas para uma planilha. As estatísticas descritivas do perfil sociodemográfico, cultural e econômico dos respondentes foram obtidas com o programa (Statistical Package for Social Science (SPSS). Posteriormente, as respostas ao bloco de itens sobre o empoderamento foram analisadas pela técnica da teoria de resposta ao item não paramétrica (Trin), uma metodologia de análise que permite o estudo de escalas de medição estatística. Para isso foi empregado o programa Mokken Scale for Polythomous Items – MSP (MOLENAAR; SIJTSMA, 2000).
A seguir apresentam-se os resultados referentes ao perfil sociodemográfico, cultural e econômico do público de visitação estimulada do Mast nas três rodadas da pesquisa Visitação de Grupos de Audiência Estimulada (Visest). Na sequência são discutidos os significados atribuídos à visita ao Mast, tendo como referência o conceito de empoderamento.
A Tabela 1 apresenta a distribuição percentual dos 378 participantes da primeira rodada da pesquisa Visest (2006-2007) em relação ao sexo, faixa etária, cor/raça, nível de escolaridade e renda domiciliar mensal.
Observam-se que as mulheres foram a maioria (70%) do público presente no primeiro ano da pesquisa e que os negros e pardos somam 63% do público total. Além disso, 43% dessa audiência estimulada têm o rendimento mensal de até 1.000 reais, o que reforça o caráter de inclusão social do projeto. É válido lembrar que, quanto à renda domiciliar mensal, 34% não souberam informar porque são bem jovens (30% têm de 12 a 14 anos). Com relação ao perfil etário, 30% estão na faixa de 12 a 14 anos e 36% são jovens de 15 a 24 anos. Quanto ao nível de escolaridade, 45% dos participantes desta rodada da Visest não possuem o ensino fundamental completo. Apenas 10% possuem o ensino superior completo.
Os resultados confirmam a tendência já expressa na primeira rodada da pesquisa. A maioria do público participante é de mulheres (63%). Fato que não é coincidência, sugerindo que as mulheres assumem a responsabilidade de acompanhar a saída dos filhos menores. No que diz respeito à cor/raça, os negros e pardos somam 69%, percentual um pouco maior que na rodada anterior (63%). Em relação à renda domiciliar mensal, quase 59% estão na faixa de até 1.000 reais e 23% não souberam informar os ganhos familiares. Isso significa que se o público que não soube informar a renda for desconsiderado, tem-se 77% do total que informou o rendimento mensal, com ganhos de até 1.000 reais.
Quanto ao nível de escolaridade, o percentual de visitantes com ensino superior completo caiu de 10% para 6% e o de pessoas com ensino fundamental incompleto subiu de 45% para 61%. O percentual de jovens com faixa etária de 12 a 14 anos caiu para menos da metade (de 30% para 12%). Por outro lado, o percentual de jovens entre 15 e 24 anos cresceu de 36% para 54%, o que é um aumento significativo. No geral, o total de jovens (12 a 24 anos) não se alterou muito, fazendo com que o percentual de adultos também não variasse tanto (25 a 59 anos).
Os resultados, em relação a algumas variáveis, não confirmam a tendência expressa nas duas rodadas anteriores da Visest. A maioria do público de visitação estimulada continua sendo de mulheres (69%). O percentual de jovens com faixa etária de 12 a 14 anos não se alterou muito em relação à segunda rodada (de 12% para 15%). Por outro lado, o percentual de jovens entre 15 e 24 anos diminuiu de 54% para 23%, o que é uma diminuição significativa. Agregando as duas faixas etárias de jovens (12 a 24 anos), constata-se que a participação deste segmento teve uma grande mudança, caindo de 66% (primeira e segunda rodadas) para 38%, fazendo com que o percentual de adultos (25 a 59 anos) também variasse (de 32% e 33% na primeira e segunda rodadas para 44%). Todas essas alterações no perfil etário estão associadas à presença marcante de idosos (pessoas acima de 60 anos) nesta terceira rodada da pesquisa (18%). Nas duas rodadas anteriores, o percentual foi muito baixo (2% e 3%, respectivamente). Isso se deveu à visitação expressiva de grupos provenientes do Programa Academia Carioca da Secretaria de Saúde da Prefeitura do Rio de Janeiro.
Em relação à cor/raça, os negros e pardos somam 65%, percentual próximo ao encontrado na primeira (63%) e segunda (69%) rodadas. Quanto ao nível de escolaridade, o percentual de visitantes com ensino superior completo (11%) foi semelhante ao da segunda rodada (10%) e o de pessoas com ensino fundamental incompleto teve uma queda significativa de 61% para 24%. Esse resultado tem relação com a diminuição, nesta rodada da pesquisa, do percentual de jovens entre 15 e 24 anos (23%) e com o aumento do percentual de respondentes com ensino médio completo (22%). Nas duas rodadas anteriores, o percentual relativo a este nível de escolaridade foi baixo (7% e 10%, respectivamente). No que diz respeito à renda domiciliar mensal, houve uma diminuição no percentual dos que estão na faixa de até 1.000/1.200 reais, ou seja, caiu de 59% na segunda rodada para 38%, e o percentual dos que não souberam informar os ganhos familiares se manteve o mesmo (23%).
Constata-se que a audiência estimulada do Mast é adulta, do sexo feminino, que se declara negra ou parda, relativamente jovem, sobretudo nas duas primeiras rodadas da pesquisa. Nos anos de 2013-14, destacou-se a presença de idosos – Programa Academia Carioca. Tem nível de escolaridade baixo (estudou apenas até o ensino fundamental) e baixa renda domiciliar (aproximadamente de 1 a 3 salários mínimos).
A análise sobre a medição estatística do empoderamento foi feita usando a teoria da resposta ao item não paramétrica. Os resultados abaixo dizem respeito à terceira rodada da pesquisa (621 respondentes) e são inteiramente consistentes com os resultados da segunda rodada publicados em Falcão et al., 2010. Vale lembrar que as respostas ao bloco de 28 itens sobre o empoderamento presentes no questionário (12 de aspecto cognitivo e 16 de aspecto social) foram analisadas no programa Mokken Scale for Polythomous Items (MSP).
É importante dizer que todos os sete itens negativos tiveram seus escores revertidos. Isso se justifica para manter a mesma direção do empoderamento crescente. Por exemplo, o item “Não valeu a pena”, que antes de ser revertido tinha nível de concordância baixo (média de 1,52 – entre discordo totalmente e discordo), depois de revertido apresentou uma média alta (4,48 – entre concordo totalmente e concordo). Ou seja, o item revertido passa a funcionar como “Valeu a pena”. Quando os 28 itens foram analisados, o programa MSP, em seu modo exploratório, separou esse conjunto em duas escalas com boas propriedades estatísticas: a primeira composta de 19 itens e a segunda composta de oito itens. Um, do total dos 28 propostos, foi excluído por essa análise inicial, uma vez que apresentou baixa discriminação em relação aos demais.
Uma análise de conteúdo dos itens da primeira escala mostrou que a maioria deles se referia a aspectos sociais da visitação com alguns itens de aspecto cognitivo entre eles. Por outro lado, a segunda escala ficou constituída quase exclusivamente por itens descrevendo aspectos cognitivos da visitação. Esse resultado sugere que os itens podem ser reagrupados nas duas dimensões principais do empoderamento como já havia sido reconhecido na análise da segunda rodada.
Desse modo, foram constituídas duas escalas: uma com itens de conteúdo cognitivo e outra com itens de conteúdo preponderantemente social. Ambas as escalas foram analisadas no MSP em seu modo confirmatório e mostraram ter boas propriedades estatísticas. Os resultados estão apresentados nas Tabelas 4 e 5 abaixo. A escala que corresponde à dimensão cognitiva do empoderamento ficou constituída de 13 itens e a escala correspondente à dimensão social ficou com 15.
Os itens que expressam aspectos cognitivos são aqueles com os quais os respondentes mais demonstram concordância: o despertar da curiosidade sobre a ciência; o sentimento de surpresa; uma mudança favorável de atitude para com a imagem do museu; um convite para a reflexão sobre ciência associada a um sentimento positivo; a percepção de que a experiência da visita ao museu pode ser útil no mundo da escola ou do trabalho; a perspectiva do aumento da cultura geral e a reflexão sobre história. Esses aspectos, no seu conjunto, apontam uma dimensão eminentemente cognitiva associada a ganho de conhecimento. Eles permeiam a experiência da maioria daqueles que participaram da visita estimulada ao Mast e, nesse sentido, constituem a base comum do empoderamento promovido pela visita ao Museu. Tais expressões de empoderamento estão diretamente relacionadas às atividades educativas das quais os visitantes participaram. Nessas atividades, conteúdos de diversas áreas eram apresentados segundo uma pedagogia voltada para a divulgação e popularização da ciência e tecnologia, pautada na mediação humana.
Por outro lado, observam-se que os itens de natureza social (Tabela 5, abaixo) formam um bloco com valores médios em maioria menores que quatro (as respostas oscilam entre concordo e não sei), sugerindo que o público respondente não estabelece uma conexão forte entre as experiências vividas na visita e sua realidade cotidiana. Tal assertiva encontra eco na média alcançada pelo item 16 "Tem tudo a ver com minha realidade" (3,26 – menor média).
Os outros itens associados à natureza social do empoderamento são: a valorização da relação com a comunidade; a mudança do modo de ver as coisas a partir da visita; a visita como promotora de conversas no seio da família, de inserção na sociedade, de um futuro melhor, de aumento de capacidade para a vida, de aumento de cidadania, de aumento de autoestima; e a visita como facilitadora de troca de ideias no próprio grupo e de conversa com amigos.
A diferença entre as dimensões social e cognitiva do empoderamento também se reflete na média geral de cada escala. A dimensão cognitiva tem uma média geral (média entre todos os itens e todos os respondentes) igual a 4,29, mostrando que os respondentes tendem a ficar entre concordo totalmente e concordo no que diz respeito às afirmações da escala. E a dimensão social tem uma média igual a 3,83, mostrando que os respondentes tendem a ficar entre concordo e não sei nas afirmações da escala. Conclui-se então que o empoderamento pleno desses visitantes se dá pela associação entre as percepções de ganhos cognitivos e de aplicabilidade destes ao mundo social do visitante no nível de suas relações pessoais (família e amigos), e de suas relações com esferas sociais mais externas (escola, trabalho e sociedade).
Assumindo tal associação com o empoderamento pleno do visitante, pode-se afirmar que a visita foi mais eficiente em promover a percepção de ganhos cognitivos e menos eficiente em estabelecer conexões com o mundo do visitante. Nesse sentido, poderíamos especular se há formas de aumentar os níveis de aplicabilidade social da visita criando atividades específicas para essa parcela da população, atividades essas que abordassem temas de interesse imediato, negociados previamente com os próprios grupos de visitantes. Ou ainda, uma segunda possibilidade poderia ser o uso de processos dialógicos baseados na mediação humana (mediadores) que em diferentes momentos da visita promovessem discussões explícitas de questões relacionadas ao uso de museus como locais importantes de interação social e a sua relevância para o exercício pleno da cidadania.
As atividades realizadas nos museus tal como é hoje, pensadas para o público de visitação espontânea e programada, ainda estão distantes de promover o empoderamento pleno de audiências oriundas de comunidades de baixo poder aquisitivo e/ou baixo capital cultural. Portanto, o público de visitação estimulada é o grande desconhecido das instituições museológicas. As pesquisas direcionadas para esse tipo de público são ainda mais raras e devem ter por objetivo avaliar a abrangência e a eficácia da inclusão social; o grau de apropriação que o participante faz da atividade e o perfil de empoderamento provocado pelo evento. Por isso são fundamentais para as políticas públicas de inclusão social.
A audiência estimulada valoriza a visita ao museu e a associa ao aspecto cognitivo do empoderamento. Essa associação é mais fraca quanto ao seu aspecto social, que diz respeito ao cotidiano ou à melhoria das condições de vida das pessoas. O empoderamento se restringe ao momento da visitação e ao espaço do museu, ou seja, essa experiência não é incorporada à prática social e cultural dos sujeitos após a visita. Características do perfil dessa audiência podem estar vinculadas a um baixo capital cultural, que explicariam essa apropriação limitada da experiência (BOURDIEU, 1969).
Do ponto de vista da comunicação, os resultados obtidos em vários estudos sugerem uma estratégia que se dirija diretamente aos grupos de visitantes, principalmente às famílias. Nos grupos de visitação espontânea essa comunicação é natural, o museu contribui para a discussão cultural que se dá por meio dos laços do grupo e reforça sua mensagem. De modo análogo, nos grupos de visitação estimulada, que agora se começa a conhecer, a comunicação deve se utilizar dos canais e dos laços já estabelecidos dentro dos grupos, reforçando a ideia de que a comunicação é vista como um processo de troca, de participação e de associação. Um processo eminentemente cultural.
As ações de inclusão social em museus devem abarcar diálogo mais abrangente com o público de visitação estimulada, envolvendo uma maior democratização das práticas museológicas. É preciso renegociar a base do relacionamento com essa audiência e estabelecer mecanismos de participação mais efetiva na organização das ações a ela dirigidas. Estimular a visitação de múltiplas audiências e ampliar as representações sociais e culturais nos museus, ou seja, compreender o seu aspecto excludente é um desafio.