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Indígenas na cidade de Manaus: promoção da diversidade cultural em espaços com a presença do turismo
Indígenas en la ciudad de Manaus: promoción de la diversidad cultural en espacios con la presencia del turismo
Indigenous people in the city of Manaus: promotion of cultural diversity in spaces with the presence of tourism
Caderno Virtual de Turismo, vol. 19, núm. 2, 2019
Universidade Federal do Rio de Janeiro



Recepção: 28 Outubro 2017

Aprovação: 29 Abril 2019

DOI: https://doi.org/10.18472/cvt.19n2.2019.1511

Resumo: O objetivo principal desta pesquisa é analisar a presença da diversidade cultural indígena nos espaços apropriados pelo turismo na cidade de Manaus. De natureza qualitativa, o estudo se configura como socioantropológico com o desenho metodológico pensado a partir de uma triangulação de procedimentos e abordagens, envolvendo a pesquisa bibliográfica, documental e de campo. Foram realizadas entrevistas com lideranças indígenas e representantes das instituições públicas de turismo em Manaus, além de observação direta em 11 atrativos turísticos localizados em área urbana. Os resultados da pesquisa evidenciam a presença indígena em Manaus, sob a organização em comunidades, centros culturais e associações indígenas. Essas mobilizações têm sido fundamentais na luta pela visibilidade no contexto urbano, mas também para organizar e inserir as atividades culturais desses povos no cenário econômico, comumente propiciado pelas vias do turismo.

Palavras-chave: Comunidades Indígenas, Cidade, Cultura, Turismo.

Abstract: The main objective of this research is to analyze the presence of indigenous cultural diversity in the spaces appropriate for tourism in the city of Manaus. Of qualitative nature, the study is configured as socioanthropology with the methodological design thought from a triangulation of procedures and approaches, involving bibliographical, documentary and field research. Interviews were conducted with indigenous leaders and representatives of public tourism institutions in Manaus, as well as direct observation in 11 tourist attractions located in an urban area. The results of the research show the indigenous presence in Manaus, under the organization in communities, cultural centers, indigenous associations. These mobilizations have been fundamental in the struggle for visibility in the urban context, but also to organize and insert the cultural activities of these peoples in the economic scenario, commonly favored by tourism routes.

Keywords: Indigenous Communities, City, Culture, Tourism.

Resumen: El objetivo principal de esta investigación es analizar la presencia de la diversidad cultural indígena en los espacios apropiados por el turismo en la ciudad de Manaus. De carácter cualitativo, el estudio se configura como socioantropológico con el diseño metodológico pensado a partir de una triangulación de procedimientos y enfoques, involucrando la investigación bibliográfica, documental y de campo. Se realizaron entrevistas con líderes indígenas y representantes de las instituciones públicas de turismo en Manaus, además de observación directa en 11 atractivos turísticos localizados en área urbana. Los resultados de la investigación evidencian la presencia indígena en Manaus, bajo la organización en comunidades, centros culturales, asociaciones indígenas. Estas movilizaciones han sido fundamentales en la lucha por la visibilidad en el contexto urbano, pero también para organizar e insertar las actividades culturales de esos pueblos en el escenario económico, comúnmente propiciado por las vías del turismo.

Palabras clave: Comunidades Indígenas, Ciudad, Cultura, Turismo.

1 INTRODUÇÃO

As narrativas produzidas por historiadores, cronistas e viajantes levam-nos a uma reflexão sobre como os povos indígenas foram estigmatizados por colonizadores, propiciando a reprodução de visões preconceituosas acerca desses povos ao longo dos séculos. Em razão disso, há, na contemporaneidade, uma dinâmica política, social e econômica incongruente e desleal aos povos indígenas, que continuam sendo marginalizados e desassistidos em termos de políticas públicas que garantam seus direitos.

O censo de 2010, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelou a existência de 3.837 indígenas residentes na cidade de Manaus – número questionado pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB, 2012), que afirma haver entre 15 e 20 mil indígenas em Manaus, oriundos de outros municípios e, mesmo, de outros estados. As discrepâncias entre os dados das duas fontes evidenciam a complexidade envolvendo a presença indígena na cidade, não apenas em termos quantitativos, mas, sobretudo, pelas questões que envolvem a etnicidade na contemporaneidade.

Estudos recentes sobre os povos indígenas na cidade de Manaus (ALMEIDA; SANTOS, 2009; MELO, 2006; SOUZA, 2013), a exemplo do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (PNCSA), trazem informações de suma importância sobre as territorialidades indígenas: evidenciando quem são, como vivem, como estão organizados; mas também os estigmas e os conflitos, e, sobretudo, as lutas empreendidas e os desafios das comunidades e associações indígenas no contexto da cidade. Por meio de estudos utilizando a ferramenta da cartografia social, o Projeto PNCSA dá visibilidade à presença e à mobilização indígena na cidade em torno dos direitos constitucionais, essenciais nos processos identitário e de reelaboração cultural.

Nessa conjuntura, diante do expressivo número de indígenas em contexto urbano apontado pelos estudos supracitados, contraditoriamente vê-se pouca representatividade da cultura indígena nos eventos culturais e nos atrativos turísticos da cidade de Manaus, ainda que a promoção do turismo paute sua publicidade majoritariamente na cultura desses povos. Diante disso, há um despertar de questionamentos, a saber: Onde estão e como se organizam os povos indígenas na cidade de Manaus? Quais os projetos a Fundação Municipal de Cultura, Turismo e Eventos (ManausCult) realiza para promover a diversidade cultural dos povos indígenas na cidade de Manaus? De que forma os indígenas da cidade se organizam para inserção de suas atividades no Turismo? Quais espaços culturais na cidade promovem a cultura dos povos indígenas?

Dessa forma, instituiu-se como objetivo geral da pesquisa analisar a presença da diversidade cultural indígena nos espaços apropriados pelo turismo na cidade de Manaus. Para tanto, os objetivos específicos consistiram em mapear a presença indígena na cidade de Manaus; identificar os espaços com a presença do turismo na cidade de Manaus; elencar os projetos e/ou ações desenvolvidos pela ManausCult referentes à promoção da diversidade cultural indígena em Manaus; elencar as iniciativas nas quais se pode observar as atividades culturais dos povos indígenas de Manaus em espaços com a presença do turismo.

A pesquisa se configura como socioantropológica, baseada em uma triangulação metodológica (FLICK, 2009), cuja estrutura envolveu pesquisa bibliográfica, documental e de campo, em uma abordagem essencialmente qualitativa. A pesquisa se utilizou de entrevistas semiestruturadas com uma liderança indígena e com os representantes das instâncias municipal e estadual de Turismo da cidade de Manaus, ManausCult e Amazonastur. Os dados também foram levantados por meio de observação direta, a partir de um roteiro de observação, roteiro fotográfico, conversas informais e notas de campo em alguns institutos, centros culturais e museus, como: o Bosque da Ciência / Ilha da Tanimbuca, localizada no Instituto de Pesquisas da Amazônia; o Centro Cultural dos Povos da Amazônia; o Musa do Largo; o Teatro Amazonas e outros.

Faz-se necessário salientar que o presente estudo é fruto de uma pesquisa socioantropológica, com um esforço para mapear a presença indígena na cidade e ampliar sua visibilidade pela sociedade e pelo poder público. Seu formato e estrutura, portanto, fogem do padrão sistêmico e positivista comumente empregado em estudos do turismo. Assim, teoria e resultados estão imbricados do início ao fim, uma vez que os resultados aqui expostos são frutos de uma práxis em que não é possível desenvolver um campo sem teoria e a teoria somente se confirma com a reflexão proporcionada pelo campo.

A justificativa da pesquisa ancora-se não somente em dar visibilidade aos povos indígenas em contexto urbano, mas, também, por sua contribuição para o reconhecimento de uma identidade cultural representativa do povo manauara. Também colabora para a inserção das atividades culturais dos indígenas no circuito do turismo, tendo como referência o Plano Nacional de Cultura (PNC) elaborado pelo Ministério da Cultura (Minc), que dispõe sobre a promoção das culturas e povos indígenas brasileiros, visando contribuir para a “valorização da diversidade cultural brasileira e o fortalecimento da luta pelo exercício de direitos constitucionais” (MINC, 2006, p. 6).

Os resultados da pesquisa estão organizados em cinco seções, das quais esta introdução faz parte. Em seguida, são apresentados os caminhos metodológicos percorridos no estudo. Na terceira parte, apresenta-se uma contextualização sobre a vinda dos indígenas para a cidade, evidenciando as suas dinâmicas culturais, e uma subseção onde se destacam as formas de organização e mobilização, particularmente no que concerne às suas estratégias para obtenção de renda, para a promoção da cultura e para a garantia de sustento às famílias. Mais à frente, na quarta seção, apresentam-se os espaços turísticos nos quais verificam-se a presença e a promoção da cultura indígena na cidade de Manaus. Por fim, expõe-se as considerações deste estudo, apontando suas limitações e lacunas e, a partir delas, sugerindo novos recortes de pesquisa.

2 PERCURSOS METODOLÓGICOS

A pesquisa se configura como um estudo socioantropológico, baseado em uma triangulação metodológica que possibilita o emprego e combinação de procedimentos, abordagens e métodos variados. Conforme assevera Flick (2009), a triangulação pressupõe uma combinação de métodos que “supera as limitações de um método único por combinar diversos e dar-lhes igual relevância”, o que faz com que a pesquisa se torne “[...] ainda mais produtiva, se diversas abordagens teóricas forem utilizadas, ou ao menos consideradas, para a combinação de métodos” (FLICK, 2009, p. 32).

Quanto à natureza, este estudo é qualitativo, permitindo uma reflexividade que nos propicia levar em consideração a particularidade do objeto de estudo, (re)desenhando um molde de pesquisa conforme as necessidades da investigação, não se atendo a generalizações e quantificações, mas ao contexto e momento específicos, carregados de subjetividades, no qual a pesquisa é desenvolvida a partir da bagagem cultural e intelectual de cada autor (FLICK, 2009; GOLDENBERG, 2004).

Utilizando-se da pesquisa bibliográfica e documental, buscou-se mapear a presença das comunidades e associações indígenas na área urbana da cidade de Manaus, baseando-se na Lei 1.839, de 16 de janeiro de 2014, que dispõe sobre o perímetro urbano de Manaus. Em um primeiro momento, tendo como base as categorias de análise (indígenas na cidade, cultura e turismo), fez-se uma pesquisa bibliográfica nas bases científicas Scielo e Web of Science, além de busca nos portais de teses e dissertações da Universidade Federal do Amazonas, o Tede Ufam[1], e da Capes. Por a busca apresentar poucos resultados, não foi considerado um recorte temporal para seleção de estudos.

A análise documental representou etapa de suma importância, pois por meio do acesso a documentos internos – cedidos pela Secretaria de Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (Copime) e pela Secretaria dos Povos Indígenas (Seind) – foi possível a realização de uma análise de conteúdo categorial, por meio do cruzamento com os dados secundários levantados no Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (PNCSA) e dados primários levantados pelas autoras deste estudo. A análise de conteúdo, norteada pela teoria de Bardin (1977), constituída por pré-análise, exploração do material, inferência e interpretação dos dados levantados em material bibliográfico e documental, foi do tipo categorial temática.

Durante a coleta de dados, realizou-se entrevistas semiestruturadas com o coordenador da Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (Copime), com a ex-diretora de marketing da Fundação Municipal de Cultura e Turismo de Manaus (ManausCult) e com a gerente do Departamento de Eventos do Órgão Oficial de Turismo do Amazonas (Amazonastur). Os dados também foram levantados por meio da visita e da observação direta, a partir de um roteiro de observação, roteiro fotográfico, conversas informais e notas de campo, em alguns institutos, centros culturais e museus, como o Bosque da Ciência /Ilha da Tanimbuca, localizada no Instituto de Pesquisas da Amazônia; o Centro Cultural dos Povos da Amazônia; o Musa do Largo e outros.

Tendo como recorte espacial a área urbana da cidade de Manaus, a escolha do lócus de estudo é justificada por duas questões. A primeira é fruto de um recorte espacial baseado pelos atrativos top 10 Manaus, da Manauscult[2]; e a segunda é o acompanhamento de jornais locais e redes sociais – de associações, comunidades, instituições governamentais e não governamentais, lideranças indígenas, coletivos culturais – que divulgam os eventos de cultura e turismo da cidade de Manaus.

O período de realização da pesquisa foi do segundo semestre de 2014 ao primeiro semestre de 2016, sendo os anos de 2014 e 2015 dedicados às pesquisas bibliográfica e documental, e o ano de 2016 às visitas aos espaços culturais e entrevistas com os retromencionados atores sociais. No Quadro 1 é possível visualizar os locais que foram visitados.


Quadro 1 – Espaços turísticos visitados na cidade de Manaus de acordo com a fonte pela qual foram identificados

Fonte: Elaboração própria, 2019.* * Dos 10 atrativos selecionados pela Manauscult, constam apenas 8 no quadro, pois o Encontro das Águas e a praia do Tupé estão localizados em área rural e, por esse motivo, foram excluídos do recorte da pesquisa.

Ao total, foram visitados 11 espaços turísticos, dos quais apenas três contemplam a presença cultural indígena. Os espaços turísticos, ou ainda, os espaços apropriados pelo turismo, são entendidos, aqui, como espaços que recebem um grande quantitativo de turistas, que possuem características da cultura local, recebem estímulos promocionais das instituições públicas voltadas para gestão do turismo e são entendidos por alguns organismos locais enquanto atrativos turísticos (CASTROGIOVANNI, 2004). “O Espaço Turístico parece ser, antes de tudo, uma imagem” (CASTROGIOVANNI, 2004, p. 13), e diversos são os agentes sociais que influenciam na construção desse espaço – turistas, agentes do mercado, Estado, trabalhadores e população local (FRATUCCI, 2009). Aqui, nos ateremos aos aspectos promocionais dos organismos representativos do Estado e ao envolvimento direto ou indireto dos indígenas que se beneficiam com o trabalho do turismo.

3 DIVERSIDADE CULTURAL INDÍGENA NA CIDADE DE MANAUS: AS DINÂMICAS CULTURAIS NO PASSADO E NO PRESENTE

Estudos como os de Almeida e Santos (2009) e Baines (2001) evidenciam que a análise sobre a presença de povos indígenas na cidade necessita de contextualização sobre os processos históricos, sociais e culturais, identificando, inicialmente, os aspectos que os motivaram a sair de suas aldeias, para então, posteriormente, debruçar-se sobre a análise da vida dos indígenas na cidade – suas lutas, desafios, superação e resistência.

De acordo com Gomes (2006), a década de 1960, período em que os povos indígenas passaram a migrar para a capital amazonense com mais intensidade, tem como principais fatores problemas oriundos de invasões nos seus territórios promovidas por garimpeiros, madeireiros, empresários da pesca e outros, gerando conflitos, além dos danos ambientais, sociais e culturais. Também aparece como um fator preponderante nesse processo de vinda para a cidade a busca por “melhoria de vida”, sendo a Zona Franca de Manaus o meio para alcançá-la.

Na esteira do pensamento de Gomes (2006), Melo (2006) destaca que “a análise das narrativas indígenas de diferentes gerações inseridas em Manaus mostra que a inserção na cidade não é apenas produto da interação social ou do desejo, mas também de um conjunto de recursos mobilizados em trocas culturais” (MELO, 2006, p. 79). Dessa forma, o estar na cidade denota símbolos para além das necessidades econômicas e sociais, pois entre não indígenas e indígenas, o desejo de conhecer outros lugares é, por si só, uma motivação para migrar, para conhecer outros lugares.

Ao chegarem à cidade, os grupos indígenas se deparam com um ambiente marcado pela discriminação e segregação, fato que os conduz a uma trajetória de luta, resistência e mobilização em torno de direitos. Essas características imprimem as marcas do Movimento Indígena em todo o País e são responsáveis por uma imagem do indígena “não apenas como o ser primitivo/exótico, mas como um indivíduo politizado, organizado, que busca manter as suas tradições, a língua, a história, utilizando-se da política, da ideologia, da organização, do conhecimento” (GOMES, 2006, p. 12).

Contudo, pensar as relações dos indígenas na cidade requer uma análise sobre as relações estabelecidas, as quais têm como pano de fundo a realidade marginalizada para a qual os indígenas na cidade são deslocados: um cenário político discriminatório, exigente e subalterno, caracterizado por jogos de poder e relações sociais desiguais, cuja fuga condiciona o indígena a revestir-se da cultura globalizadora como estratégia, primeiramente, de sobrevivência. A cidade tem sido palco de diversas batalhas – socioeconômicas e culturais – para os povos indígenas, inclusive palco de lutas políticas, tanto na cobrança de direitos básicos (saúde, educação e segurança) quanto na luta contra o preconceito e, sobretudo, pelo reconhecimento e valorização de suas culturas – realidade observada não apenas na cidade de Manaus.

Hoje, como no passado, mapear a presença indígena na cidade é um trabalho que envolve inúmeras questões, não somente numéricas, mas em termos da própria natureza dos instrumentos utilizados para mensurar numericamente. Somente em 1991 o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) incluiu a categoria indígena como alternativa para o quesito cor/raça/pele. O censo populacional de 2010 constatou a existência de 817.963 pessoas que se autodeclaram[3] indígenas no Brasil. Uma parcela significativa desse número concentra-se no estado do Amazonas. São 168.680 mil indivíduos autodeclarados indígenas no estado, conforme o IBGE.

No último censo do IBGE (2010), há um quadro contendo a ordem dos municípios com o maior quantitativo de populações indígenas em suas localidades. Destes, o município de São Gabriel da Cachoeira, no estado do Amazonas, aparece com os maiores números, liderando três rankings: população indígena total, população indígena vivendo em área urbana e população indígena rural. A cidade de Manaus aparece em segundo lugar entre os municípios com maior quantitativo de indígenas vivendo em área urbana. Vale ressaltar que o número de indígenas presentes na cidade de Manaus, apontado pelo IBGE, diverge daquele considerado pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), cuja estimativa é de 15 a 20 mil indígenas, oriundos de vários municípios do estado do Amazonas e, mesmo, de outros estados.

De acordo com os dados organizados pela Copime, os representantes das 36 comunidades e/ou associações indígenas presentes em Manaus, são, em sua maioria, da etnia Ticuna. Essa etnia possui representantes em 14 associações e/ou comunidades. Na sequência estão, respectivamente, as etnias Sateré Mawé, presente em 10 das instituições e, Mura em nove, seguidas dos Munduruku, Kokama, Tukano e Apurinã.

As zonas da cidade[4] com maior concentração de comunidades e associações indígenas são as Zonas Norte, Leste e Sul, notando-se um destaque para a Zona Leste com 35% do total. De acordo com Almeida e Santos (2009), Melo (2006) e Souza (2013), a concentração nessas zonas se dá, principalmente, por serem regiões com maior possibilidade para adquirir uma casa, por serem áreas de invasão e/ou por lhes permitirem comprar uma casa ou lote com preços baixos.

Em Manaus, os indígenas organizados via associações[5] ou comunidades têm dinâmicas diversificadas: há casos de comunidades constituídas por representantes de um mesmo povo; há também comunidades mistas agrupando indígenas de diferentes povos, a exemplo de comunidades nas quais convivem indígenas Tariana, Baniwa, Baré, Ticuna, Sateré Mawé, entre outros, que deixaram suas aldeias/comunidades de origem para se estabelecer na cidade de Manaus (COPIME, 2014).

O trabalho realizado pelo Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (PNCSA) tem sido de grande relevância no processo de visibilidade dos povos indígenas na cidade. Os mapas construídos pelos indígenas, a partir dos seus conhecimentos sobre a disposição, utilização e expectativas de interação com o lugar/cidade, conformam as espacialidades territoriais e as reelaborações culturais na contemporaneidade.

Os dados levantados pelo PNCSA, bem como o trabalho da Copime, foram fundamentais durante a pesquisa de campo, pois possibilitaram entender e sistematizar informações sobre as 36 comunidades indígenas, especificamente para investigar o envolvimento dessas comunidades e associações com as alternativas de renda criadas para se manterem na cidade. No Quadro 2 estão relacionadas as comunidades e suas respectivas localizações nos diferentes lugares da cidade de Manaus.


Quadro 2 – Comunidades e Associações Indígenas presentes na cidade de Manaus

Fonte: Santos, Cruz e Silva (2015).

Os resultados da pesquisa mostraram que uma parcela significativa dessas comunidades e associações desenvolve atividades visando à obtenção de renda por meio da própria cultura, a exemplo do artesanato, dos grupos de dança e música indígena, de pinturas, do turismo – em que a comunidade se constitui como o “atrativo turístico”, entre outras atividades. Na pesquisa de campo identificaram-se algumas comunidades que recebem turistas, porém, de maneira incipiente e pontual, mas que desejam investir nessa atividade porque a veem como um importante canal para obtenção de renda, atrelada à divulgação e à promoção de suas culturas.

Embora haja uma diversificação de atividades, a maioria delas está relacionada à produção de artesanatos, verificando-se um expressivo número de associações de artesãos constituídas formalmente, ou mesmo pequenos grupos organizados de modo informal, que fabricam as peças e buscam locais na cidade para comercializá-los. Mesmo encontrando dificuldade na obtenção das matérias-primas e do tempo gasto na fabricação, os artesãos se sentem satisfeitos com essa opção, pois há uma boa aceitação dos produtos no mercado local, que os vê como souvenirs.

3.1 AS ATUAIS ESTRATÉGIAS INDÍGENAS PARA VIVER E REELABORAR SUAS CULTURAS NA CIDADE

Verifica-se que uma das estratégias dos povos indígenas que migram para a cidade é manter algumas das características da vida nas aldeias. Assim, na medida do possível, se organizam em comunidades, centros culturais, entre outros. Nesse sentido, a criação das associações indígenas formais e/ou informais configura-se como importante mecanismo para manutenção da identidade étnica, além de contribuir como alternativa de renda no contexto da cidade, pois incentiva a produção de atividades culturais, algumas vezes recorrendo a instituições para promoção de cursos de qualificação e/ou editais para financiamento e, ainda, buscando meios para escoamento/disseminação dos produtos/atividades (BERNAL, 2009).

Entende-se que as reflexões sobre as alternativas de renda, obtidas por meio da utilização dos patrimônios culturais indígenas, devem preceder de uma análise sobre a visão que esses povos têm sobre si próprios e sobre essas alternativas econômicas. Tais reflexões são imprescindíveis, pois fornecem uma compreensão sobre os processos de reelaboração cultural e sobre a necessária distinção entre a visão capitalista e a visão indígena sobre economia.

Ao se refletir sobre a noção de economia indígena, deve-se considerar que ela não segue as mesmas dinâmicas do sistema capitalista, centrada no acúmulo de bens e riquezas. Conforme assevera Luciano (2006), a economia indígena não se restringe aos aspectos econômicos – em termos gerais, os povos indígenas não costumam produzir excedente, uma vez que visam a autossustentação da comunidade na qual estão inseridos, priorizando sempre a interdependência entre o mundo da natureza e o mundo dos homens. Entretanto, as relações estabelecidas na contemporaneidade podem demandar algumas reelaborações desse modelo econômico.

No que tange ao uso do patrimônio cultural no contexto da criação das alternativas de renda visando à obtenção de meios para se manterem na cidade, verifica-se uma imbricação entre os valores simbólicos, afetivos, econômicos e a subsistência. Ao analisar as alternativas de renda das comunidades e associações indígenas na cidade de Manaus, Cruz et al. (2014, p. 15) destacam que a

ressignificação das práticas culturais indígenas por meio do associativismo, com a formação de associações de artesãos e grupos de dança e música, entre outros – por meio dos quais tentam viabilizar suas subsistências, bem como divulgar e reafirmar sua etnicidade, é uma ferramenta da qual lançam mão no mundo contemporâneo, particularmente no contexto da cidade.

Nesse sentido, as iniciativas indígenas visando à obtenção de renda, como estratégia para se manterem na cidade, passam à condição de empreendimentos culturais sem deixarem de ser estratégias políticas, culturais e de sobrevivência. No Quadro 3, apresentam-se as comunidades/associações e as atividades que desenvolvem com a finalidade em questão.


Quadro 3 – Síntese das experiências dos povos indígenas da região metropolitana com atividades econômicas e criativas.

Fonte: Seind, adaptado pela equipe do projeto “O Estado da Arte da Economia Criativa no Estado do Amazonas: empreendedorismo Cultural e Criativo dos Povos Indígenas” (2014).

No Quadro 3 estão relacionadas 22 iniciativas criadas por comunidades e associações indígenas na cidade de Manaus, com o propósito de obterem renda. Vale observar que nelas há um papel central desempenhado pelas mulheres, pois muitas dessas iniciativas são conduzidas exclusivamente por elas e mesmo nas associações mistas, são as mulheres que fabricam e comercializam os produtos.

Algumas das associações, a exemplo da Amarn, foram criadas há cerca de duas décadas e, ao longo desses anos, se firmaram como importantes meios de mobilização social em torno da defesa dos direitos indígenas e também na construção de alternativas de renda – cuja característica central é a relação intrínseca dessas atividades com a cultura de cada um dos povos indígenas pertencentes a essas comunidades e associações.

3.2 LUGARES DE VISIBILIDADE DA DIVERSIDADE CULTURAL INDÍGENA E SUAS CONEXÕES COM O TURISMO NA CIDADE DE MANAUS

Quando se pensa em turismo realizado pelas comunidades indígenas, é comum imaginar práticas associadas ao Turismo de Base Comunitária, ao Ecoturismo ou, ainda, ao Etnoturismo. Por se sustentar, ainda na atualidade, uma visão anacrônica (FREIRE, 2002) sobre os povos tradicionais e sobretudo os indígenas, recorrentemente a visitação a essas localidades tende a ser idealizada como a viagem a um lugar distante, cercado por natureza, habitado por povos vistos sob o efeito túnel do tempo (OLIVEIRA, 2013), de certa forma isolado e livre de influências da globalização.

Entretanto, diferentemente daquelas comunidades localizadas em ambientes rurais, o turismo realizado pelas comunidades indígenas localizadas em contexto urbano não cumpre com as expectativas mantidas pelo imaginário social (MAFFESOLI, 2001) dos turistas, fortemente influenciadas pelas propagandas, tanto do setor público quanto privado, que buscam evidenciar, propositalmente, uma natureza intocada, com “povos primitivos e exóticos”. Para Pereiro e Léon (2007), o imaginário do lugar turístico é construído, sobretudo, com a finalidade de envolver, impactar e vender os destinos/produtos turísticos, dos quais diversos agentes participam dessa construção – empresários, órgãos oficiais de turismo, comunidade local e turistas (PEREIRO; LÉON, 2007).

A alteridade cultural se configura como chamariz turístico, mas, para os turistas, não importa somente observar os lugares “exóticos” sob a ótica de um espectador, eles buscam vivenciar experiências de consumo “se comunicando com os visitados por meio de algumas palavras e saudações cerimoniosas, por coitos psiquicamente encarados pelo olhar ou efetivamente realizados e pela compra de alguns objetos simbólicos, tidos como suvenires, por meio dos quais o turista se apropria magicamente do destino” (GRABURN, 1989 apud CORBARI; BAHL; SOUZA, 2018, p. 12, grifo nosso).

De acordo com Souza (2013), o uso da cultura como atrativo turístico por indígenas da periferia e zona rural de Manaus tem propiciado beneficiamento econômico. As comunidades rurais que desenvolvem o turismo apresentam distintas formas de ressignificação cultural em prol do turismo: suas danças, suas músicas e seus artefatos são atualizados e apresentados enquanto oferta turística a partir de uma lógica econômica globalizada. Assim, as associações e comunidades buscam lugares com a presença de turistas para promoção de culturas como estratégia para obtenção de renda, sendo a principal das atividades o artesanato.

Na capital amazonense, os espaços públicos destinados à cultura indígena ainda são pouco representativos, considerando a grande diversidade cultural presente na região. Tanto no passado como no presente, essa diversidade é invisibilizada em virtude da visão etnocêntrica e estigmatizadora herdada dos processos de colonização, mas também pelas novas formas existentes na contemporaneidade. Apesar dessa realidade, a pesquisa que subsidia os dados e discussões neste artigo mostra que, embora inserida nesse contexto, a presença indígena na cidade é forte e pujante, principalmente pela sua organização e mobilização social – constituída nas diferentes formas, a exemplo das comunidades, centros culturais, e especialmente das associações indígenas.

Destaca-se aqui alguns desses espaços com o intuito de evidenciar a diversidade cultural indígena presente na cidade de Manaus, bem como de criar outros que possam visibilizar a diversidade cultural e o patrimônio cultural oriundos dessa diversidade. Um desses lugares é o Centro Cultural Povos da Amazônia (CCPA), que se apresenta como difusor de informações da cultura dos povos indígenas da Amazônia Continental e Território Ultramarino. De acordo com a Secretaria do Estado de Cultura (SEC) e a coordenação do CCPA, “é uma homenagem aos Povos Tradicionais da Amazônia e uma evocação à sua diversidade étnico-cultural”. Dentro do CCPA é possível vivenciar um ambiente amazônico por meio dos elementos que o compõem, a exemplo da Maloca Aruak; Casa do Caboclo; Xapono Yanomami; Barracão do Guaraná; Casa da Farinha; Tapiri de Defumação da Borracha e outros. A título de ilustração, destaca-se a Figura 1 referente à Maloca Aruak.



Figura 1 – Maloca Aruak
Fonte: Portal do CCPA (2016).

O Centro Cultural possui também em suas dependências o Museu do Homem do Norte, coordenado pela SEC. Nele há um acervo de quase 4 mil peças que retratam a cultura indígena, ribeirinha e cabocla. Existe um ambiente onde são retratados alguns rituais, como o ritual reahu – vida-morte-vida – dos Yanomami. Contam, também, com a exposição de artefatos indígenas e recursos multimídias.

Outro espaço que merece destaque por, de alguma forma, visibilizar os povos indígenas, é o Bosque da Ciência, localizado no Instituto de Pesquisa da Amazônia (Inpa). Dentro do Bosque existe um ambiente chamado de “Ilha da Tanimbuca”, onde há uma maloca destinada aos artesãos de diversas etnias indígenas, para exporem, em sistema de rodízio, os seus produtos/artesanatos. Considera-se esse local de grande relevância para as associações de artesãs indígenas, pois é um dos pouquíssimos lugares onde podem expor e comercializar seus trabalhos, garantindo uma parcela importante da renda familiar. A Figura 2 apresenta a referida maloca da Ilha Tanimbuca.



Figura 2 – Maloca na Ilha Tanimbuca, Bosque da Ciência/Inpa
Fonte: Santos (2016).

A Ilha da Tanimbuca é vista pelas associações e comunidades indígenas como um lugar muito importante, por vários fatores, a saber: valoriza as suas culturas e viabiliza a venda de seus produtos; bem como recebe os indígenas com respeito e lhes permite o contato com várias pessoas com as quais trocam experiências, inclusive entre as próprias associações indígenas.

O Bosque da Ciência é um local muito visitado, não só por moradores da cidade de Manaus, mas também por turistas de vários estados brasileiros e outras nacionalidades. Em vista dessa particularidade, sugeriu-se durante a pesquisa de campo, a elaboração de informativos contendo dados sobre as associações e comunidades que vendem seus produtos na maloca da Ilha da Tanimbuca. Tais informativos/folhetos poderiam dispor dados sobre as etnias, o mapa com a localização onde residem essas associações, e descrição dos produtos vendidos. Assim, tanto o Bosque da Ciência quanto as associações indígenas poderiam recepcionar os visitantes/turistas contando um pouco da história dos povos indígenas e de suas trajetórias na cidade de Manaus.

O Museu da Amazônia (Musa) do Largo São Sebastião é um espaço que merece destaque. Durante a pesquisa de campo verificou-se a sua importância para visibilidade e valorização da diversidade cultural amazônica, e em particular a indígena. O referido Museu foi inaugurado há pouco tempo, mas desde então segue com uma programação intensa e diversificada. Nele é possível encontrar duas exposições permanentes: dos mitos indígenas e dos artefatos de pesca, ambas de etnias da região do Alto Rio Negro; também é possível presenciar a produção de camisas feitas por um indígena da etnia Dessana, que expõe seu trabalho no local. A Figura 3 mostra um panorama das exposições.



Figura 3 – Exposição sobre a mitologia e artefatos indígenas
Fonte: Santos (2016).

Além das exposições, o Musa também realiza palestras e encontros científicos relacionados à temática indígena; promove eventos com a apresentação de grupo de dança e outras manifestações culturais indígenas. Por meio de parcerias, o museu viabiliza apresentações em seu espaço e em outros locais de visibilidade na cidade, a exemplo do Teatro Amazonas, onde articulou a apresentação do grupo Mamaphia Bahsamorï Mahsa, que representou a cultura do Alto Rio Negro – os mitos e dança de Kariçu. Esse grupo conta com a participação de acadêmicos indígenas dessa região, a exemplo do artesão Dessana que cursa mestrado em Antropologia Social na Universidade Federal do Amazonas (Ufam). A Figura 4 destaca uma apresentação do referido grupo realizada no Musa.



Figura 4 – Apresentação do grupo de música e dança Mamaphia Bahsamorï Mahsa
Fonte: Santos (2016).

Um ponto positivo, e que merece destaque, é o fato de o Museu estar localizado nos fundos da Galeria Amazônica – uma loja de suvenir que revende artefatos indígenas de diversas associações presente não só no Amazonas e/ou na cidade de Manaus, mas em outros estados do País. Tanto a Galeria quanto o Musa encontram-se em uma localidade do centro histórico de Manaus (o Largo São Sebastião) onde há muitas atividades culturais e turísticas.

O Musa é um lugar que traz a ideia de valorização da cultura indígena, incluindo em seus espaços exposições sobre a cosmologia e organização dos povos indígenas, bem como o uso que estes fazem de seu patrimônio cultural na sociedade contemporânea, mostrando a cultura indígena reelaborada e sua etnicidade contextualizada às relações sociais contemporâneas, fugindo ao anacronismo recorrentemente presente nas iniciativas de inclusão dos povos indígenas no turismo. É um local que merece destaque pelo reconhecimento dessa cultura marginalizada e estigmatizada, e pela iniciativa de inseri-la, ainda que de forma tímida, no turismo da cidade de Manaus.

Em muitos lugares destinados ao turismo na cidade de Manaus, observa-se, salvo as exceções destacadas ao longo deste artigo, que boa parte representa padrões culturais que não são característicos da nossa região. É latente a necessidade de políticas públicas capazes de valorizar a identidade amazonense – que é formada pelos povos indígenas, caboclo, ribeirinho e outros – e, portanto, que viabilizem a valorização da cultura local e o rompimento com as visões colonizadoras.

A participação das comunidades e associações indígenas, tanto nos lugares nos quais podem comercializar os artesanatos quanto naqueles que divulgam suas culturas, a exemplo dos Centros Culturais, chama atenção pela cooperação e organização social dos indígenas envolvidos, cuja motivação, para estarem e participarem das atividades, vai além da busca por benefícios econômicos. Nota-se um empenho em se fazerem presentes nas discussões e nos lugares, de se inserirem no contexto da cidade como parte dela, ou seja, como de fato devem ser vistos.

4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

As reflexões acerca da presença indígena na cidade de Manaus e de sua importância enquanto patrimônio cultural, bem como o potencial dessa diversidade no âmbito do turismo, pressupõem uma análise das políticas e programas públicos de turismo voltados para a promoção da diversidade cultural indígena. Infelizmente, a realidade observada nos mostra as limitações e os equívocos que perpassam a política local no que tange ao lugar da diversidade cultural indígena e sua relação com o turismo.

Tendo em vista o objetivo central da pesquisa de analisar a presença da diversidade cultural indígena nos espaços apropriados pelo turismo na cidade de Manaus, considera-se que, apesar de casos pontuais, a exemplo do Musa do Largo e da Ilha Tanimbuca no Bosque da Ciência, há poucas ações dos órgãos públicos de turismo para evidenciar a cultura indígena. Para além de ações pontuais e descontinuadas, sugere-se a criação de um projeto que contemple os povos indígenas na cidade e a presença destes nos espaços que se encontra o turismo. Por meio de grupos de trabalho seria possível a elaboração de um calendário anual voltado para o (co)planejamento das ações culturais e turísticas em consonância com os cronogramas das instâncias municipal e estadual de turismo.

Os estudos sobre a relação dos povos indígenas com o turismo recorrentemente são pautados em contextos rurais e na visitação aos territórios desses povos. Nesse sentido, o recorte espacial deste estudo apresenta-se como uma contribuição significativa para os estudos do turismo, tendo em vista o déficit de trabalhos que contemplem as dinâmicas socioculturais indígenas em contexto urbano.

Durante a pesquisa, deparou-se com os povos indígenas organizados em comunidades, centros culturais e associações. Por outro lado, percebeu-se a necessidade da criação, planejamento e execução de políticas públicas eficientes, que possam promover essa diversidade cultural indígena presente na cidade de Manaus. Nesse processo, além do papel das políticas públicas, também é importante a participação das Universidades, mediante a realização de estudos e ações que viabilizem a pesquisa e a extensão, nas quais esses povos indígenas que vivem na cidade possam participar como sujeitos ativos na promoção e valorização da diversidade cultural, propiciando modificações na forma equivocada como são vistos.

Reconhece-se como limitações do estudo a não incorporação dos atuais espaços com intensa presença do turismo na cidade de Manaus, como o Museu da Cidade, inaugurado em 2018 – após o encerramento e a submissão deste estudo. Outros locais, como restaurantes e bares na região do Centro Histórico, inaugurados nos últimos dois anos, também se configuram como lócus possíveis do estudo, dada a forte presença de turistas e do ambiente focado na cultura amazônica.

Para pesquisas futuras, recomenda-se a ampliação do recorte espacial do estudo, contemplando os locais supracitados. Ademais, a realização de visitas em cada uma das associações e comunidades indígenas elencadas nesta pesquisa para compreender melhor suas reelaborações culturais e formas de inserção no turismo.

REFERÊNCIAS

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Notas

[1] Disponível em: . Acesso em: out. 2015.
[2] O top 10 atrativos turísticos de Manaus é fruto de um projeto que tinha como objetivo elencar os 10 principais atrativos turísticos da cidade de Manaus. De acordo com entrevista realizada com a ex-diretora de marketing da ManausCult, a escolha dos Top 10 atrativos turísticos foi uma iniciativa da Fundação, com a finalidade de elencar atrativos da cidade, considerados pela ManausCult como indispensáveis para o turista e o autóctone visitarem. A ex-diretora (2016) destaca que a escolha dos locais foi feita por uma equipe multidisciplinar composta por turismólogos, jornalistas e administradores. Ao total, a equipe elencou inicialmente 20 atrativos. Desses 20 atrativos, foram escolhidos 10 durante uma reunião realizada com o trade turístico, divididos em 4 atrativos culturais e 6 naturais
[3] A autodeclaração ou consciência da identidade indígena é um direito individual e social da pessoa indígena de estabelecer a sua identidade e pertencimento a um grupo indígena ou tribal. Tal direito é assegurado pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), promulgada no Brasil pelo Decreto nº 5.051/2004. O Estatuto do Índio (Lei nº 6.001/73) reconhece a pessoa indígena pelo conjunto da autodeclaração com o reconhecimento dessa identidade por parte do grupo de origem. O órgão indigenista nacional, a Funai, utiliza os dois princípios para garantir o direito individual da identidade étnica.
[4] A divisão dos bairros da cidade de Manaus por Zonas está prevista no Plano Diretor.
[5] A ascensão do Movimento Indígena organizado na década de 1970, conhecido pela forte e exitosa atuação a favor da demarcação das terras indígenas, proporcionou o surgimento de diversas associações, que nada mais eram que a descentralização do Movimento Indígena em organismos políticos autônomos de reivindicação, com abrangência local e/ou, muitas vezes, com referência nacional na luta pelos direitos indígenas. Exemplos marcantes dessas associações são a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).


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