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Percursos no Afuá*
Fernando Mesquita
Fernando Mesquita
Percursos no Afuá*
Caderno Virtual de Turismo, vol. 22, núm. 1, 2022
Universidade Federal do Rio de Janeiro
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Percursos no Afuá*

Fernando Mesquita
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Brasil
Caderno Virtual de Turismo, vol. 22, núm. 1, 2022
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Percursos no Afuá

As fotografias a seguir, foram produzidas no âmbito de pesquisa realizada nos anos de 2015 e 2016 na qual abordei a temática da identificação e valoração do patrimônio cultural edificado e tive Afuá, cidade do Pará, localizada ao norte do arquipélago do Marajó, como exemplo de reflexões sobre bens passíveis de reconhecimento, para além das características presentes nos sítios já protegidos no Norte do Brasil.


Foto 1
Rio Afuá, 2015

[sobre Afuá] A primeira coisa que vem na minha cabeça é aquele barco chegando numa cidade rodeada por água, e com as pessoas andando de bicicleta. (Andra Ataíde, 34 anos, 2016, em entrevista)

Para investigar os fenômenos culturais manifestados espacialmente, adotei pesquisa exploratória no núcleo urbano do município, subsidiada por entrevistas com pessoas residentes e roteiros de observação registrados com fotografias. As experiências de campo foram a oportunidade de observar e mesmo, interagir, nas tramas da vida cotidiana dos sujeitos em Afuá.


Foto 2
Canoeiro no rio Cajuúna, 2016


Foto 3
Crianças transitando na rua Firmino Coelho, 2015


Foto 4
Rua do Afuá, 2016

Então, também é uma cidade diferente de todas, eu sempre costumo dizer que Afuá é uma cidade que a mãe diz assim "Menino sai do meio da rua", aí a gente diz "menino sai de baixo da rua", eles estão embaixo da rua, juntando alguma coisa que caiu ali pra "menino sai de baixo da rua" em outras cidades você não diz isso, diz "sai do meio da rua" "olha carro".... "menino sai de baixo da rua, olha a formiga", então Afuá ela tem todo esse estilo de vida que nós temos. (Sarito, 2015, em entrevista)


Foto 5
As bicicletas são o principal meio de transporte nas ruas de Afuá, veículos automotores são proibidos, 2016


Foto 6
Bicicletas estacionadas à margem da praça Micaela Ferreira, 2015


Fotos 7, 8, 9, 10 e 11
Pessoas transitando em bicicletas pelas ruas de Afuá, 2015














Foto 12 e 13

As bicicletas e o “bicitáxi” são uma caraterística já intrínseca à paisagem urbana de Afuá. São vários os tipos e adaptações deste veículo, desde ambulâncias a carros de bombeiros e são adaptadas conforme a necessidade, são inseridos volantes, cores contrastantes, sistema de iluminação e de som..., 2016.




Por suas características topográficas e hidrográficas, de estar encerrada nos limites de três rios, e de estar, a cidade inteira, sobre área alagável, a população em Afuá lida constantemente com o regime de cheias, conhecido localmente como “lançante” ou dias de “água grande”. Essa relação com as águas também estabelece características únicas à cidade, que a destaca de outros contextos de vilas ribeirinhas nas Amazônias.


Foto 14
Cemitério tomado pela água em dia de “lançante”, 2015

Porque a maré aqui é grande, quando ela entra é como eu lhe digo, o Afuá todinho, o terreno mesmo vai no fundo, quando a lançante é grande e quem não está acostumado a ver, quando tá aqui fica com medo...porque vai tudo no fundo. (Professora Sibila Jardim, 2016, em entrevista)

De acordo com Tângari et al (2016, p. 3), Afuá é suscetível às ações de um mundo globalizado “que suprimem distâncias geográficas e dissolvem fronteiras físicas e sociais”, entretanto ainda se beneficia de um conjunto de atributos que lhe confere o status de uma cidade ribeirinha: “a ideia de cidade ribeirinha possui forma e conteúdo presentes na arquitetura, no traçado da cidade, nos jardins e na paisagem que estão inscritas aos elementos hídricos amazônicos.” (Tângari et al, 2016, p. 3)


Fotos 15 e 16
Placa de vermelha de venda de açaí, comum na região. Os caroços de açaí e a “moínha” (serragem) são também utilizados para aterrar as áreas alagadiças, vão sendo compactados e com o tempo servem de apoio para que sejam cravados novos esteios, 2016.




Sob o prisma do patrimônio edificado, no núcleo de ocupação inicial de Afuá já há grande diversidade tipológica, com construções de um e dois pavimentos, de madeira, ainda em maior quantidade, mas com várias unidades de alvenaria onde prevalecem unidades de uso comercial. Destaco que nas edificações com dois pavimentos é comum observar sacadas corridas, e guarda-corpos com balaustradas, mesmo naquelas unidades já substituídas por concreto. Essa solução funciona como uma separação visual e tipológica do programa de necessidades dessas unidades, onde geralmente o segundo pavimento abriga uma moradia e o térreo o comércio.


Fotos 17,18,19,20, 21, 22, 23 e 24
As casas são pintadas com cores vivas e contrastantes e o partido arquitetônico, geralmente comporta uma área de transição, que nas casas mais antigas é composto de uma varanda. Nas casas que já foram alteradas, há a presença de portões ou cercas. Todo o conjunto geralmente é coroado por um sistema de coberturas que não se encerra atrás de platibandas, ele é aparente e pode ser adornado com lambrequim ou “cachorros” simplificados. A geometria frequentemente apresenta um enviesamento, localmente conhecido como “quebrada”, 2015 e 2016.






















Para Simões (2014), as habitações em Afuá expressam uma maneira peculiar de utilização das cores. Há uma abundância delas e “do encontro entre as casas, igreja e comércios surgem composições inusitadas, que formam ruas inteiras de cores e nos enchem os olhos” (Simões, 2014, p, 76). Vale destacar que carpinteiros navais também atuam na construção de casas, o que, preliminarmente, pode ter reflexo na forma como os ornatos são trabalhados nos balcões e guarda-corpos.


Fotos 25 e 26
Diversidade tipológica nas casas de Afuá, 2016.





Foto 27
A “cruzeta” é um importante elemento para avaliar o recalque nas habitações. Inicialmente a altura do piso da casa é definida a partir da expectativa de que a maré das “águas grandes” não o atinja. Essa altura é observada com as marcas e manchas das águas nas paredes das redondezas, 2016.


Fotos 28, 29, 30 e 31
Quando as casas são avarandadas, os guarda-corpos são ricamente adornados, com elementos geométricos ou balaústres, que lembram muito uma embarcação. As varandas também servem como área de amortecimento para o ar aquecido do clima equatorial não penetrar na casa.










Ainda sobre a questão das edificações, percebi que ainda há um caráter que norteia a concepção das construções, uma referência na maneira de produzir a forma da casa e da cidade, independentemente da solução de sistema construtivo ou tecnologia adotada. Os ornatos de fachada, a configuração do sistema de coberturas e cromatismos são reproduzidos em vários substratos e seguem uma mesma linha estético-formal que caracteriza a ambiência do lugar.

Um dos achados da pesquisa em Afuá, aponta para a ainda atual necessidade de se repensar a proteção do legado edificado no Norte do Brasil, sobretudo se considerarmos a heterogeneidade das formas espaciais, hábitos de morar na região. No caso de bens culturais de natureza material ainda reproduzidos cotidianamente, como é o caso da arquitetura vernacular ribeirinha, o que deveria se buscar resguardar, para além dos objetos, são as referências aos modos de vida impressos neles. De outro modo, caso o foco da preservação seja a matéria, descolada da visão de mundo dos sujeitos que a produzem, instrumentos de patrimonialização pouco têm a oferecer, senão uma chancela institucional aos fenômenos sociais que já existem mesmo fora das fronteiras do reconhecimento dos agentes de Estado.

Por fim, outra questão trazida pela pesquisa é a preocupação de que a produção e reprodução do espaço urbano de Afuá entre nos circuitos hegemônicos da atual reorganização global da economia capitalista e se iguale a modelos homogeneizados urbano-industriais de outras regiões. Sobre essa questão, e para finalizar essa breve apresentação, recorro ao alerta de Boaventura de Souza Santos (2004, p. 45) quando afirma que “estamos perante uma luta cultural. A cultura cosmopolita e pós-colonial aposta na reinvenção das culturas, para além da homogeneização imposta pela globalização econômica”, e esse processo não reconhece a existência igualitária de outros saberes, tendendo a “silenciamentos, exclusões ou liquidações” do que não se adequa à conjuntura hegemônica.

Material suplementario
Referências
Santos, Boaventura de S. (2004). Semear outras soluções: os caminhos da biodiversidade e dos conhecimentos rivais. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.
Simões, V. C. F. (2014) Ideadores de bicitaxi: Cartografias de experiências estéticas em modos de viver e fazer bicitaxis na Veneza Marajoara (Afuá - PA). Dissertação (Mestrado em Artes). Belém: Universidade Federal do Pará.
Tângari, V.; Andrade, R.; Mergulhão, P. (2016) Perspectivas urbano-paisagísticas de uma cidade ribeirinha na Amazônia: a presença do rio e dos espaços livres públicos no desenho da paisagem e da morfologia urbana de Afuá/PA. In: Os Espaços da Morfologia Urbana - Atas da 5a Conferência Internacional da Rede Lusófona de Morfologia Urbana- PNUM 2016. Guimarães: Escola de Arquitectura da Universidade do Minho: Lab2PT Laboratório de Paisagens, Património e Território. p. 269–278.
Notas
Notas
* Este ensaio foi baseado nas reflexões contidas na dissertação “Arquitetura vernacular ribeirinha, patrimônio cultural nas Amazônias: o caso de Afuá-PA”, desenvolvida no âmbito do Mestrado Profissional em Preservação do Patrimônio Cultural do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 2017 e orientada pela Profa. Dra. Joseane Paiva Macedo Brandão.

Foto 1
Rio Afuá, 2015

[sobre Afuá] A primeira coisa que vem na minha cabeça é aquele barco chegando numa cidade rodeada por água, e com as pessoas andando de bicicleta. (Andra Ataíde, 34 anos, 2016, em entrevista)


Foto 2
Canoeiro no rio Cajuúna, 2016

Foto 3
Crianças transitando na rua Firmino Coelho, 2015

Foto 4
Rua do Afuá, 2016

Então, também é uma cidade diferente de todas, eu sempre costumo dizer que Afuá é uma cidade que a mãe diz assim "Menino sai do meio da rua", aí a gente diz "menino sai de baixo da rua", eles estão embaixo da rua, juntando alguma coisa que caiu ali pra "menino sai de baixo da rua" em outras cidades você não diz isso, diz "sai do meio da rua" "olha carro".... "menino sai de baixo da rua, olha a formiga", então Afuá ela tem todo esse estilo de vida que nós temos. (Sarito, 2015, em entrevista)


Foto 5
As bicicletas são o principal meio de transporte nas ruas de Afuá, veículos automotores são proibidos, 2016

Foto 6
Bicicletas estacionadas à margem da praça Micaela Ferreira, 2015

Fotos 7, 8, 9, 10 e 11
Pessoas transitando em bicicletas pelas ruas de Afuá, 2015













Foto 12 e 13

As bicicletas e o “bicitáxi” são uma caraterística já intrínseca à paisagem urbana de Afuá. São vários os tipos e adaptações deste veículo, desde ambulâncias a carros de bombeiros e são adaptadas conforme a necessidade, são inseridos volantes, cores contrastantes, sistema de iluminação e de som..., 2016.





Foto 14
Cemitério tomado pela água em dia de “lançante”, 2015

Porque a maré aqui é grande, quando ela entra é como eu lhe digo, o Afuá todinho, o terreno mesmo vai no fundo, quando a lançante é grande e quem não está acostumado a ver, quando tá aqui fica com medo...porque vai tudo no fundo. (Professora Sibila Jardim, 2016, em entrevista)


Fotos 15 e 16
Placa de vermelha de venda de açaí, comum na região. Os caroços de açaí e a “moínha” (serragem) são também utilizados para aterrar as áreas alagadiças, vão sendo compactados e com o tempo servem de apoio para que sejam cravados novos esteios, 2016.




Fotos 17,18,19,20, 21, 22, 23 e 24
As casas são pintadas com cores vivas e contrastantes e o partido arquitetônico, geralmente comporta uma área de transição, que nas casas mais antigas é composto de uma varanda. Nas casas que já foram alteradas, há a presença de portões ou cercas. Todo o conjunto geralmente é coroado por um sistema de coberturas que não se encerra atrás de platibandas, ele é aparente e pode ser adornado com lambrequim ou “cachorros” simplificados. A geometria frequentemente apresenta um enviesamento, localmente conhecido como “quebrada”, 2015 e 2016.






















Fotos 25 e 26
Diversidade tipológica nas casas de Afuá, 2016.




Foto 27
A “cruzeta” é um importante elemento para avaliar o recalque nas habitações. Inicialmente a altura do piso da casa é definida a partir da expectativa de que a maré das “águas grandes” não o atinja. Essa altura é observada com as marcas e manchas das águas nas paredes das redondezas, 2016.

Fotos 28, 29, 30 e 31
Quando as casas são avarandadas, os guarda-corpos são ricamente adornados, com elementos geométricos ou balaústres, que lembram muito uma embarcação. As varandas também servem como área de amortecimento para o ar aquecido do clima equatorial não penetrar na casa.









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