Resumo: O município de Florianópolis tem no turismo, hotelaria e eventos, um importante setor de desenvolvimento. Durante a pandemia de Covid-19, o setor foi bastante afetado devido à redução na mobilidade de pessoas e medidas de controle do contágio. Com o objetivo de identificar e compreender as lições aprendidas por profissionais do setor público de turismo de Florianópolis durante a gestão da pandemia em 2020, foram entrevistados seis profissionais da Secretaria Municipal de Turismo, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico. Para a análise dos dados foi utilizado o método qualitativo de análise temática. Os resultados mostram oito conjuntos de temas inter-relacionados que agregam o aprendizado: decisões técnicas e protocolos sanitários; informação e comunicação; capacidade de aprendizagem e capacitação; resiliência organizacional; retomada e recuperação; lições pessoais; fiscalização e penalização; alteração na forma de turismo.
Palavras-chave: Pandemia Covid-19, Turismo, Lições aprendidas, Gestão de crise e desastre.
Abstract: The municipality of Florianópolis has tourism, hotels and events as an important development sector. During the Covid-19 pandemic, the sector was greatly affected due to the reduction in the mobility of people and measures to control the contagion. In order to identify and understand the lessons learned by professionals in the public tourism sector in Florianópolis during the management of the pandemic in 2020, six professionals from the Municipal Secretariat of Tourism, Technology and Economic Development were interviewed. For data analysis, the qualitative method of thematic analysis was used. The results show eight sets of interrelated themes that aggregate learning: technical decisions and health protocols; information and communication; learning and capacity building; organizational resilience; resumption and recovery; personal lessons; supervision and penalty; change in the form of tourism.
Keywords: Covid-19 pandemic, Tourism, Lessons Learned, Crisis and disaster management.
Resumen: El municipio de Florianópolis tiene el turismo, la hotelería y los eventos como importante sector de desarrollo. Durante la pandemia del Covid-19, el sector se vio muy afectado por la reducción de la movilidad de las personas y las medidas para controlar el contagio. Con el objetivo de identificar y comprender las lecciones aprendidas por los profesionales del sector público del turismo en Florianópolis durante la gestión de la pandemia en 2020, se entrevistó a seis profesionales de la Secretaría Municipal de Turismo, Tecnología y Desarrollo Económico. Para el análisis de datos se utilizó método cualitativo de análisis temático. Y los resultados muestran ocho conjuntos de temas interrelacionados que agregan aprendizajes: decisiones técnicas y protocolos sanitarios; información y comunicación; capacidad de aprendizaje y capacitación; resiliencia organizacional; reanudación y recuperación; lecciones personales; vigilancia y sanción; cambio en la forma de turismo.
Palabras clave: Pandemia Covid-19, Turismo, Lecciones aprendidas, Gestión de crisis y desastres.
Artigos
Lições aprendidas para gestão de crise no setor de turismo de Florianópolis durante a pandemia Covid-19[1]
Lessons learned to crisis management in the Florianópolis tourism sector during the Covid-19 Pandemic
Lecciones aprendidas para gestión de crisis en el sector turístico de Florianópolis durante la pandemia Covid-19
Recepción: 04 Enero 2022
Aprobación: 30 Agosto 2022
Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde declarou pandemia, definida pela Secretaria Nacional de Defesa Civil, pelo aumento brusco, significativo e transitório da ocorrência de doenças infecciosas geradas por vírus (Brasil, 2012). O surto do coronavírus Sars-CoV-2 exigiu das organizações uma capacidade extra para lidar com crises, tanto epidemiológica quanto político-financeira.
Como em todo desastre, a gestão da resposta à pandemia de Covid-19 inicialmente utilizou de protocolos já existentes, firmados com as lições aprendidas de epidemias como a Sars, H1N1 e o Ebola. No entanto, cada desastre tem uma evolução inédita e os protocolos se mostraram insuficientes. Foi necessário aprender fazendo, para se adaptar rapidamente ao cenário, que mudava constantemente.
Nesse ínterim, o conhecimento adquirido pelas pessoas e pelas organizações pode ser transformado em novos protocolos, se passar por um ciclo de gestão, com técnicas e metodologias adequadas a cada contexto. Uma dessas técnicas é a de lições aprendidas, que visa estabelecer práticas exitosas, com base em métodos diversos de coleta de histórias e depoimentos de pessoas que estiveram envolvidas em um determinado evento ou projeto. Com as lições aprendidas, é possível desenvolver modelos, frameworks, protocolos de ação, guias de boas práticas e outros meios de compartilhamento de conhecimento, que apoiem a tomada de decisões para gerir desastres, crises e riscos (Xu & Grunewald, 2009; Mccoole & Mccool, 2010; Larsen, 2011).
Lições aprendidas é uma prática usual na Gestão de Risco e de Desastres, que pode ser definida como um instrumento que envolve múltiplas instituições, com o objetivo de reduzir e mitigar riscos e coordenar a resposta e recuperação diante de eventos adversos sobre um cenário vulnerável (Eyerkaufer, 2016).
Dentre as definições utilizadas neste artigo, a de desastres vem do Escritório para a Redução de Risco e Desastres da Organização das Nações Unidas (UNDDR, 2022, tradução nossa, s/p), que o considera uma “grave interrupção do funcionamento de uma comunidade ou sociedade em qualquer escala devido a eventos perigosos que interagem com condições de exposição, vulnerabilidade e capacidade, levando a [...] perdas e impactos humanos, materiais, econômicos e ambientais”.
Crise, de acordo com Castro (1998, p. 47), é uma “manifestação violenta e repentina de ruptura de equilíbrio. Momento perigoso e decisivo. Situação que implica a ruptura da normalidade ou do equilíbrio dinâmico de um sistema e favorece sua desorganização”.
Uma das crises provocadas pelo Covid-19 foi a econômica, que afetou diversos segmentos, inclusive o de turismo, hotelaria e eventos, prejudicados pelo fechamento de fronteiras, pela restrição do convívio social e deslocamento de pessoas, e pela paralisação de atividades por um período longo, marcado por incertezas em relação à retomada (Yang et al., 2020).
Crises não são novidade para o setor de turismo, e seu histórico mostra que a capacidade de gestão e a habilidade de lidar com situações complexas e críticas são limitadas (Santana, 2004), pois são poucos os destinos turísticos que estão preparados para enfrentar os impactos econômicos e sociais (Mccool & Mccool, 2010).
A atividade do turismo é historicamente afetada por desastres (como o terremoto seguido de tsunami em 2011, no Japão), riscos de biossegurança (como a Síndrome Respiratória Aguda Grave, SARS, em 2003), ataques terroristas (como nos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001) e conflitos armados (como as guerras do Afeganistão e da Líbia) (Faulkner, 2001; Santana, 2004; Larsen, 2011). E a ausência de pesquisas que abordem a gestão de crises e desastres no setor cria uma dificuldade extra ao turismo (Faulkner, 2001; Larsen, 2011; Paraskevas et al., 2013; Jiang et al., 2019).
Esta lacuna instigou a realização deste estudo, cujo objetivo foi identificar e compreender quais as lições aprendidas por profissionais do setor público de turismo de Florianópolis durante a gestão da pandemia da Covid-19, em 2020.
Sendo um município que investe no setor turístico – com destaque para o turismo de sol e praia, no período de verão, e de eventos, ao longo do ano – parte da economia do município de Florianópolis foi impactada pela crise iniciada pela pandemia. Nesse contexto, a Secretaria Municipal de Turismo, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico foi a organização escolhida para o levantamento de lições aprendidas. Os resultados apresentados podem contribuir para o planejamento de ações de recuperação econômica do setor, a partir do reconhecimento de boas práticas de gestão pública para o enfrentamento de crises.
Para tanto, além desta parte introdutória, o artigo está dividido na apresentação da metodologia adotada, na exposição e discussão dos resultados, e considerações finais.
Esta pesquisa tem caráter qualitativo, exploratório-descritivo (Gil, 2008). As informações foram coletadas a partir de entrevistas roteirizadas. Determinou-se o estudo em um cenário (pandemia), em um período (2020), e em um setor (Secretaria Municipal de Turismo de Florianópolis).
A amostragem, assim, foi do tipo proposital, uma vez que a escolha dos informantes se fez por experiência especial e competência. Devido ao cenário de pandemia, no in
A coleta de dados foi feita por meio de entrevistas semiestruturadas (Merriam & Tisdell, 2015) com seis profissionais ligados à Secretaria Municipal de Turismo de Florianópolis, no período entre 29 de dezembro de 2020 e seis de fevereiro de 2021, com duração média de 40 minutos.
O primeiro entrevistado foi selecionado por indicação de uma especialista em turismo conhecida dos pesquisadores, o que facilitou a tarefa de entrada em campo. Os demais entrevistados foram indicados por este primeiro, e cada entrevistado fazia indicações de outros, técnica esta conhecida como snowball (Taylor & Bogdan, 1997). Pela característica da snowball, os nomes indicados foram dez, sendo que quatro deles não responderam aos contatos realizados.
A amostragem, assim, foi do tipo proposital, uma vez que a escolha dos informantes se fez por experiência especial e competência. Devido ao cenário de pandemia, no início de 2021, as entrevistas ocorreram de forma online, coletadas por meio de videoconferência com o uso de ferramentas digitais, gravadas e transcritas. E como alguns entrevistados optaram pelo anonimato, decidiu-se por deixar todos os nomes identificados por códigos: E1, E2, E3, E4, E5, E6.
O método escolhido foi a análise temática, para identificar, organizar e oferecer uma visão sistemática dos padrões de significado (temas) em um conjunto de dados (Braun & Clarke, 2012), com base em seis passos (Braun & Clarke, 2006): (I) familiarização com os dados; (II) criação de códigos iniciais; (III) busca por temas; (IV) revisão dos temas; (V) definição e nomenclatura dos temas; (VI) produção do relatório para apresentação dos resultados.
Os dados foram analisados pelos pesquisadores de forma independente até o passo IV, a partir do qual, os temas foram debatidos e definidos por consenso, para categorização.
Os entrevistados (do gênero masculino, quatro com experiência com o setor privado) relataram alguns fatos marcantes: (a) o setor de turismo, hotelaria e eventos foi um dos mais impactados pela pandemia; (b) a polarização política na esfera nacional, que existia antes da pandemia, dificultou a resposta, devido à discrepância de ações; (c) 2020 foi um ano eleitoral na esfera municipal, o que acrescenta incertezas e polaridade política a uma crise instalada pela pandemia e uma expectativa de mudança de pessoal, esperada para o início de 2021; (d) a organização pesquisada abrange outros setores estratégicos além do turismo: tecnologia e desenvolvimento econômico. Por esses motivos, a visão dos entrevistados é mais ampla a respeito do turismo.
A análise das entrevistas evidenciou oito temas, agrupados em assuntos recorrentes entre os entrevistados, como pode ser observado na figura 1. E foi possível compreender como os temas, apesar de estarem categorizados em oito, são inter-relacionados. Em especial os primeiros, que são os mais abrangentes, pois decisões técnicas e protocolos sanitários orientam toda a resposta e dependem de ações de informação e comunicação, que têm a tarefa de facilitar a aprendizagem.
O primeiro tema surgiu da evidência de que as ações e decisões de resposta em relação ao enfrentamento da Covid-19 foram centralizadas na Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis (E1, E2 e E4), por conta de sua competência na questão sanitária, como se observa no relato a seguir.
E2: Questão de abrir comércio, fechar comércio, lockdown, não lockdown, tem eventos com limitações, não tem eventos… sabe? Essa discussão para mim não cabe discutir como Secretaria de Turismo. Acho que isso é uma discussão técnica da área da Saúde.
Esse reconhecimento da liderança é primordial para a gestão de crises ou desastres, pois fornece direcionamento e orientação à situação (Mccool & Mccool, 2010). Principalmente em uma circunstância em que o tempo para reflexão, tomada de decisões e ações é limitado, sendo complicado realizar um processo por consenso (Faulkner, 2001; Ritchie, 2003).
Hystad e Keller (2007) reforçam a necessidade de uma figura de liderança em seu estudo sobre um incêndio florestal na Colúmbia Britânica (Canadá). Os autores perceberam que a abordagem top-down e especializada (no caso uma agência de resposta a emergências) é mais eficaz para enfrentar crises e desastres, pela agilidade nas decisões. Até porque foi identificada a significativa falta de colaboração entre empresas de turismo e organizações de resposta a emergências.
Assim, os protocolos sanitários foram os guias de resposta à pandemia, estudados e repassados por profissionais da área da Saúde para serem adotados pelos órgãos decisores e pela população de Florianópolis de forma geral.
Os protocolos sanitários são procedimentos com o objetivo de proteger e reduzir as chances de contaminação pela Covid-19 e incluem ações como: uso de “álcool, luva, [...] máscara” (E6); “a higienização dos ambientes, o álcool gel, [...] o distanciamento, a não ocupação integral de tudo, a limitação para uso de espaço” (E5), dentre outras medidas, como a restrição de mobilidade de pessoas (Grimm et al., 2021).
Assim, foram tomadas ações específicas para o setor, por exemplo: (a) instalação de barreiras físicas de acrílico em bares e restaurantes para evitar a contaminação por parte dos músicos (E3); (b) o funcionamento parcial (E1; E3; E5) ou a ocupação restrita de assentos, em transportes, e de quartos, em hospedagens, com higienização frequente (E3); (c) o uso obrigatório de máscara nos estabelecimentos (E3; E5; E6); (d) o estímulo ao distanciamento social nas praias (E2; E5).
De todos os procedimentos adotados, o respeito aos protocolos é um fator crítico, pois foi citado constantemente pelos entrevistados, principalmente no que diz respeito a lidar com pessoas que desrespeitam as regras de segurança (E1; E3; E4; E5; E6), e como uma tendência que poderia ser mantida como forma de prevenir outras doenças (E6).
Mas para que os protocolos sejam respeitados, é preciso que sejam reconhecidos pela população, o que demarca a importância do próximo tema. Isso porque a informação de qualidade pode salvar vidas, fornecer meios de subsistência e recursos e é a forma de prevenção mais acessível, financeiramente, à população vulnerável (IFRC, 2005).
Informação correta e comunicação adequada foram reconhecidas por todos os entrevistados em expressões e palavras agrupadas: intermediação; interlocução; diálogo; buscar consenso; canais de comunicação; comunicação; alinhar comunicação; informação atualizada; dados (ou pesquisas); informação; canal de informação; fluxo informacional. Como pode ser percebido na seguintes fala:
E1: a gente [Secretaria de Turismo] acabou tendo de ser um canal de comunicação, interlocução muito forte do setor privado com o setor público, né? É claro que aqui em Florianópolis, ainda bem, a gente tem um diálogo muito aberto do prefeito diretamente com as entidades e com a população [...] a gente realmente participou das discussões.
Outros assuntos agrupados neste tema foram: relacionamento; reuniões com externos; debate; facilitador; trabalho coletivo; interesse coletivo; estratégias coletivas; senso comum; alinhar com prefeitos; comitê gestor de crise; plano de gestão de crise. Elementos que ajudaram na aproximação entre o setor público e o privado, relação citada pelos entrevistados como fator relevante na tomada de decisões, pois facilita a compreensão do cenário e a abrangência de necessidades distintas dos setores impactados na pandemia.
A utilização da tecnologia como suporte para a comunicação foi ressaltada por E2, E3 e E6 como fundamental para a comunicação, devido ao isolamento social e o trabalho remoto.
Conscientização e sensibilização (E1; E6) também foram relacionadas à comunicação e citadas por E1 como uma “competência nossa”, característica do trabalho da Secretaria Municipal de Turismo, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico durante a pandemia, principalmente para educar moradores e turistas e poder retomar as atividades com segurança. A conscientização foi, inclusive, citada como uma forma de envolver as pessoas na resposta à pandemia (E1; E2; E3; E5; E6).
A comunicação é importante para sensibilizar e conscientizar o público e os tomadores de decisão, e é considerada um dos aspectos centrais na implantação de diretrizes de redução de riscos, desenvolvimento de capacidades e redução de vulnerabilidades (Mccool & Mccool, 2010; UNISDR, 2011).
Lidar com pessoas (E1; E3; E4; E5; E6) também recebeu destaque por se mostrar um desafio constante de comunicação, de “tentar buscar consenso em algo que é muito polarizado” (E1). Principalmente por conta da divisão de opiniões que se formou em um contexto de crise política no cenário nacional, causada por desinformação e mau exemplo de autoridades (E1; E4; E6). Os entrevistados descreveram dificuldades para lidar com pessoas, principalmente por contestarem as medidas de prevenção e protocolos estabelecidos.
E4: Teve muita gente que não concordava. A gente vive um momento muito tenso, não só pela pandemia, mas um momento tenso, politicamente falando, né, bolsonaristas e os outros, cloroquina, agora mais vacina. É um momento bastante tenso.
Por isso é relevante observar que a informação também tem o poder de confundir e desmobilizar ações de resposta, dependendo de como é processada e trabalhada. No contexto da pandemia, a polarização política provocou uma crise de desinformação, movimentada por fake news divulgadas em mídias sociais, que possuem o formato de divulgação em rede, sem verificação. Propagadas largamente pelo público não especializado, de forma intencional ou ingênua, as fake news não só atrapalham a gestão da crise e a resposta ao desastre, como expõem a população ao risco, com informações falsas (IFRC, 2005).
Como a pandemia é um desastre de evolução lenta e de longa duração, a comunicação deve ser feita em fluxos contínuos e com estratégias específicas para cada período, nicho e demanda, sendo revista a cada nova dinâmica que o evento apresentar. Isso previne lacunas de informação e ajuda a coibir as fake news, que podem causar ansiedade pública e alimentar rumores, geralmente provenientes da falta de informação oficial confiável (Zenatti & Sousa, 2010).
O próximo tema também tem potencial de prevenir o desgaste ocasionado pelas fake news, pois ajuda as pessoas a desenvolverem senso crítico frente às informações que chegam até elas.
O terceiro tema, aprendizagem, se une ao tema capacitação, pois ambos se juntam na forma de educação para lidar com a crise, considerado fator diferencial para lidar com a pandemia (E2; E3; E4). Como o treinamento de ambulantes credenciados para trabalhar nas praias com os protocolos sanitários.
E2: [...] demos treinamentos [...] de ocupação na faixa de areia, como dispor distanciamento entre uma barraca e outra, mandamos confeccionar algumas bandeiras de sinalização para dispor nas praias e estimular de maneira geral o distanciamento.
Além disso, como a Secretaria de Turismo divide a atuação com a de Desenvolvimento Econômico, a qualificação profissional apareceu na ação chamada Floripa Mais Empregos (E4). Uma proposta para capacitar pessoas para trabalharem em vários setores.
A capacitação pode ser por vias formais e informais. A primeira ajuda no processo de melhoria para uma ação específica (uma função nova ou um novo processo, por exemplo), geralmente incentivada pela organização a fim de que os indivíduos aprendam capacidades requisitadas. Já na aprendizagem informal não existe um período de ensino, toda a experiência de vida é oportunidade para aprender e a organização pode facilitar o compartilhamento de conhecimentos, criando uma estrutura descentralizada (Stonehouse & Pemberton, 1999).
Tanto que a necessidade de capacitação também foi levantada no contexto da própria Secretaria de Turismo, que teve de se preparar para dar assistência, trabalhando no sentido de alinhar a equipe para passar informações (E4).
Os entrevistados acreditam que quem passar pela pandemia vai sair mais inteligente (E1) e mais robusto, sabendo como agir em casos semelhantes: “pessoal que é efetivo, o pessoal tá mais cascudo, ele já teve a experiência de uma zebra grande. Então, o pessoal tá mais preparado para lidar com outras crises” (E4).
Pela perspectiva da aprendizagem social (Ridder et al., 2005, p. 11), um coletivo aprende junto para gerenciar junto. Sendo que seu sucesso depende da construção de um ambiente de confiança, gerenciamento de conflito, pouca competição e acesso à informação e conhecimento (McCool & Guthrie, 2001).
Para North e Kumta (2018, p. 231, tradução nossa), “a qualidade da sociedade é amplamente determinada por sua capacidade de gerar aprendizagem genuína e trabalhar em conjuntos para produzir novos conhecimentos visionários”.
Ao aprender com a experiência, torna-se possível melhorar a forma de trabalho, evitando se “abalar tanto economicamente” (E5) a cidade e fornecendo uma resposta mais assertiva, mesmo em um cenário dinâmico.
Por isso, a relevância de se trabalhar com lições aprendidas, pois a aprendizagem pode ser facilitada e o conhecimento gerado pode ser repassado às próximas gerações de gestores, caso haja um ciclo de gestão do conhecimento. Para Serrat (2010), a aprendizagem é um dos pilares para arquitetar a gestão do conhecimento, que incorpora a comunicação interna da organização, a promoção de equipes multifuncionais e a criação de uma comunidade de aprendizagem (comprometidas em realizar estudos, assimilar experiências, e desenvolver instruções).
Com isso, a arquitetura da gestão do conhecimento e de lições aprendidas pode fortalecer organizações para crises futuras semelhantes, tornando-as mais resilientes. Um fator não só de resistência às crises, mas de desenvolvimento de soluções em rede para a adaptação e recuperação de um ecossistema.
Resiliência organizacional é a capacidade da organização de se ajustar diante de alterações e perturbações, para manter as operações em funcionamento sob quaisquer condições (Hollnagel, 2010).
É provavelmente por este motivo que todos os entrevistados relataram situações que demonstraram a necessidade de as organizações do setor se adaptarem na pandemia, tanto públicas, quanto privadas, como destaca E3: “se todas as empresas tivessem um preparo para suportar a crise, com certeza ela seria menor”.
Entretanto, o setor de turismo não tem um histórico significativo em gestão de crise e desastre, o que o deixa frágil e limitado para lidar com situações críticas e complexas (Faulkner, 2001; Santana, 2004; Santana, 2004; Mccool & Mccool, 2010; Larsen, 2011). As pesquisas na área são igualmente incipientes (Faulkner, 2001; Larsen, 2011; Paraskevas et al., 2013; Jiang et al., 2019), o que enfatiza a necessidade de estudos futuros.
De forma geral, os assuntos abordados neste tema foram: alocação de recursos diversos e recursos humanos; reinvenção; continuar criando; criatividade; inovação; trabalho coletivo; apoio interorganizacional; determinação; adaptação; capacidade de lidar com crises; capacidade de adaptação a curto prazo; decisões/ações de curto prazo; documento de gestão de crises.
Como observado principalmente nos termos “trabalho coletivo” e “apoio interorganizacional”, este tema reforça que a resposta a uma crise deve ser conjunta, unindo os setores e organizações para medidas que contribuam com a sustentabilidade coletiva. Ou como reforçam Xu e Grunewald (2009), as partes interessadas devem se envolver nessa gestão, pois sua colaboração é fundamental para a estratégia de ação diante de crises e desastres.
A cooperação surge como um elemento fundamental para a tomada de decisões, pois o que as pessoas fazem individualmente está entrelaçado com o que é feito coletivamente. E os desastres expõem ações que se tivessem sido diferentes, teriam resultado em menos mortes e menos danos (World Bank, 2010), ou seja, expõem as fragilidades de todo o sistema.
Fragilidades notórias no setor turístico, principalmente em relação à saúde financeira das organizações privadas, que para se sustentar, necessitam de ações de retomada. E a necessidade de se pensar em ações de promoção imediatas, para o retorno das atividades (que em 2020, ainda não tinha ocorrido completamente) e a recuperação econômica, a longo prazo.
O entrevistado E4 destacou a retomada e a promoção de Florianópolis como destino turístico seguro “para não deixar que as empresas quebrem mais”. E observa a recuperação como um processo posterior, quando a pandemia se encontrar em estabilização e as decisões de médio e longo prazo puderem ser tomadas.
Três entrevistados relataram preocupação com a fase de retomada e posterior recuperação (E1; E3; E4), sendo que os seguintes assuntos também foram relacionados a este tema: estímulo ao empreendedorismo; auxílio financeiro; burocracia para financiamento; legislação; agilidade nos processos.
Aqui também foi incorporado o que pode ser chamado de “Entender a dinâmica do desastre”, que é a dificuldade de fazer um planejamento de ações quando o cenário muda a todo instante, o que era crítico em 2020, na primeira onda da pandemia. E1, E2, E4, E5 e E6 ressaltaram a dificuldade em compreender o cenário para planejar ações de médio prazo e mesmo tomar decisões imediatas. Isso ocorre devido à insegurança de tomar decisões sem ter como prever cenários futuros.
E6: Fiquei, realmente, sem saber o que fazer. Eu próprio, que trabalho na prefeitura, fiquei sem reação e sem saber o que fazer. O que eu posso fazer? O que é pra fazer? [...] Nós vivemos nesta pandemia uma coisa desconhecida. Então, como sempre, é muito arriscado você tomar uma postura de uma situação de que você não sabe realmente o que tá acontecendo.
Como muitas empresas encerraram atividades por não conseguirem se manter durante a pandemia, a preocupação dos entrevistados estava relacionada a fornecer subsídios para apoiar as empresas de turismo, hotelaria e eventos, que ainda estavam em funcionamento e facilitar a retomada de empresas que estavam em espera.
Neste sentido, a retomada e recuperação é um tema que revela a necessidade de articulação entre os setores. Em uma pesquisa com segmentos turísticos de Santa Catarina, identificaram-se as ações mais solicitadas ao Estado para mitigar os efeitos da pandemia: (a) a redução de impostos; (b) a articulação para fornecer linhas de crédito específicas para o turismo; (c) o investimento em campanhas de marketing que reforcem o destino Santa Catarina; (d) o desenvolvimento de um programa de incentivo para o turismo interno, com roteiros curtos de base comunitária local. A fim de viabilizar estas ações, a SANTUR (Agência de Desenvolvimento do Turismo de Santa Catarina) se esforçou, durante a pandemia, para realizar ações em conjunto com o BADESC (Banco de Desenvolvimento Econômico de Santa Catarina) e o Ministério do Turismo (MTUR) com o fim de facilitar o acesso ao crédito e pensar em programas de incentivo ao turismo estadual, como o “Viaja+SC” (Emmendoerfer & Biz, 2020).
Também ficou evidente neste tema, a dificuldade de compreensão de um cenário dinâmico, no qual não é possível tomar decisões de médio e longo prazo, sob pena de elas se tornarem obsoletas em pouco tempo. Essa dinâmica é uma constante em momentos de resposta a desastres. As lições aprendidas são um primeiro passo para treinar gestores para uma resposta mais efetiva. Prescritivamente, as organizações devem fortalecer as instituições, conhecer seus colaboradores, cultivar redes de apoio e facilitar o compartilhamento de conhecimento para a tomada de decisões.
A prevenção e preparação para desastres é realizada de modo a facilitar a supervisão das decisões do governo por parte das organizações privadas e Ongs (World Bank, 2010). E o que fortalece e torna mais efetivas as decisões de retomada e recuperação é essa integração das redes.
E, como evidenciam as referências em gestão do conhecimento e gestão integrada, organizações são formadas por pessoas. Quanto mais resilientes são os indivíduos, mais fortes são as organizações. O próximo tema que emergiu das entrevistas traz assuntos de nível indivíduo-pessoal, diferente dos outros temas que são de nível indivíduo-organização.
Neste tema, os relatos de lições pessoais evidenciam o papel dos fatores psicológicos do indivíduo é fundamental para o desenvolvimento de uma organização sadia, funcional, inovadora e integrada com a sociedade.
Neste tema, os relatos dos entrevistados E1, E2, E3 e E6 trouxeram assuntos relativos à resiliência psicológica individual, desenvolvida durante a pandemia. Os entrevistados disseram terem passado por um período de reflexão, de repensar valores, mas também de preocupação com os parentes, com a própria segurança e com o cenário como um todo. Que nem todos se adaptaram às restrições e acabaram “aprendendo pela dor” (E6). E descrevem que saem deste período se sentindo mais fortes e preparados.
E2: Como pessoa física aproveitei o momento para viver... me reencontrar, trabalhar um pouquinho meu mindset, dar valor às coisas que importam, me aproximar da minha esposa [...] fortalecer o meu eu interior, assim... acho que sai muito mais maduro e preparado e confiante.
A mudança de mentalidade (mindset) para a adaptação a um cenário de crise é um fator que contribui para a resiliência. A definição de resiliência individual indica um processo de adaptação diante de adversidades, por meio de estratégias individuais que se relacionam à capacidade de lidar com a crise, aprendendo com a experiência da adversidade, com apoio na flexibilidade e nos vínculos de afeto (Barbosa, 2006). No aspecto positivo da resiliência psicológica, a crise se torna aprendizado. No aspecto negativo, a crise se torna uma tragédia. Ambos os aspectos foram apreendidos pelos relatos dos entrevistados, tanto de reflexões que eles fazem sobre suas vidas, quanto de relatos que eles fazem de conhecidos.
A forma como cada indivíduo age dentro da organização é influenciada por sua mentalidade e resiliência, que é testado particularmente frente a uma crise. Suas decisões refletem plenamente em qual dos aspectos, positivo ou negativo, que o indivíduo se encontra. Ao aprender com a crise, o gestor pensa mais nas pessoas que são afetadas por suas decisões.
E6: Ela [a pandemia] nos ensinou [...] muita coisa. A ter respeito pelo próximo, [...] conhecer a fundo as pessoas, as necessidades de cada um, ter calma, mais calma, você não pode sair e fazer as coisas sem pensar. Então, essa pandemia me ensinou muito isso, parar, pensar, resolver as coisas com cautela, não posso ver só por mim, tenho que ver pelas pessoas, por outras famílias.
A absorção do conhecimento não se dá apenas pela razão, mas principalmente pelas emoções. Por isso, a importância de se considerar as lições pessoais em um cenário de crise, onde todos são colocados à prova e precisam aprender a lidar com as emoções. Nonaka e Takeuchi (2019) refletem sobre isso ao enfatizar a necessidade de as organizações cultivarem a sabedoria prática, na qual o indivíduo absorve o conhecimento e, a partir disso, desenvolve a organização sábia, que passa a tomar decisões para o bem comum. Quando consideramos uma abordagem sistêmica, que é a mais adequada para lidar com desastres e crises, percebemos que a visão mecanicista que moldou as organizações até o século passado, não é mais compatível com as novas formas de gestão. Gareth Morgan (2002), Peter Senge (2016) e Nonaka e Takeuchi (2019) revisitaram as teorias da administração, para trazer novos pontos de vista sobre as organizações enquanto sistemas formados por pessoas, não como máquinas.
Este é um assunto emergente na gestão de organizações, que conecta a resiliência individual com a organizacional e a comunitária, em um sentido sistêmico e integrado de ações e reações conjuntas e complexas.
O tema a seguir, frente a comportamentos prejudiciais aos protocolos sanitários, vem na sequência, porque mostram que reconhecer o valor do indivíduo torna as decisões frente a uma crise mais assertivas. Pois, o indivíduo pode se opor às decisões das organizações públicas e, quando se trata de um surto como o de Covid-19, isso causa impacto a pessoas e empresas.
Este tema abrange ações que fortalecem a necessidade de seguir os protocolos, decretos e recomendações estipulados. E5 e E6 relataram limitações da Prefeitura de Florianópolis em fiscalizar toda a cidade.
E5: A falta de fiscalização para os espaços que não respeitam o que foi decretado pela Prefeitura. Então a Prefeitura faz um decreto, publica, isso vira uma lei. [...] Eu acho que a prefeitura não tem poder de fiscalização disso. Eu acho que é esse o principal erro da prefeitura aí é decretar e não conseguir fiscalizar.
E1 e E6 preferem utilizar da conscientização e sensibilização da população para que a fiscalização seja compartilhada. É o que defende a United Nations International Strategy for Disaster Reduction (UNISDR, 2011), sobre ampliar a capacidade de fiscalizar: a gestão de desastres conta com a mobilização comunitária, que, por meio da comunicação e conscientização pública, consegue que uma parcela maior da população atenda aos protocolos de segurança e participem da gestão da crise.
É uma forma de educar o morador da cidade e o turista para a segurança de todos. E assim, a fiscalização e a penalização seriam adotadas em “situações que são mais extremas” (E1). Situações exemplificadas por E6:
E6: Teve eventos, festas clandestinas, lugares que continuaram abrindo escondido na pandemia. O que eu acho que devia ser feito: esses lugares serem multados, mas com multas muito grandes. Parece que a multa era de R$400. Só que a bebida e tudo que ele vendia ultrapassava. O lucro dele era muito grande. Valia mais a pena ele pagar multa, do que manter fechado. Agora, se você bota que a cada dia que for pego, vai pagar multa de 50 mil reais, não vai abrir nenhum dia.
As multas brandas para os indivíduos e empresas acabam se tornando um incentivo para a ilegalidade, mas a penalização é vista como uma forma de criar exemplos para coibir comportamentos de risco. Nessas condições em que a conscientização/sensibilização não surte efeito, a ideia seria fiscalizar e penalizar utilizando multas com valor elevado.
Por fim, o último tema emergente está relacionado diretamente à atividade turística de Florianópolis.
Neste tema foram reunidos os relatos que apresentaram mudanças que o turismo sofreu na pandemia, em 2020. A Covid-19 trouxe a saúde ao foco, e acabou relegando outros assuntos, como o turismo, para o segundo plano (E2). Por conta disso, os entrevistados relataram dificuldade em adaptar as atividades, como por exemplo, transferir eventos para o modo online, como o Réveillon.
E6: As pessoas não têm essa educação de chegar em casa e ficar vendo [show de fogos de artifício na praia]. As pessoas vão pra Beira Mar. Se souberem que vão filmar de lá, ninguém quer ver a filmagem, as pessoas vão pra lá. É fato.
Em um primeiro momento, a mobilidade foi completamente impedida e turistas que se encontravam em viagem tiveram problemas para voltar para casa (E6). A partir do momento em que os protocolos começaram a permitir maior mobilidade e os gestores públicos da Secretaria de Turismo foram compreendendo a dinâmica do vírus e as medidas que funcionavam para o controle, o turismo em Florianópolis foi retornando devagar, com restrições, e evidenciou um perfil diferente de turista, refletido na alta temporada, como relata E2: “o perfil turístico mudou um pouco nesse [...] período”.
Antes da pandemia a maior parte dos visitantes era de estrangeiros (argentinos, uruguaios e paraguaios), e durante a pandemia passou a ser em maior parte de turistas brasileiros (E3), caracterizando visitantes do tipo doméstico e regional.
E1: A gente entende que está tendo um fluxo de um turismo regional. Então o próprio catarinense tá vindo bastante para Florianópolis, os estados vizinhos... São Paulo vem bastante. [...] Até porque muitas pessoas que historicamente viajam para fora nesse período, como não podem viajar para fora ou por restrições ou por uma questão realmente de câmbio acabam fazendo turismo dentro do Brasil... e boa parte dessas pessoas que tomam decisão de fazer turismo dentro do Brasil, uma parte com certeza veio ou virá para Florianópolis.
Assim, as mudanças ocasionadas por conta dos protocolos sanitários para enfrentar a Covid-19 podem ser vistas como oportunidades para a atividade turística. Por exemplo, o crescimento do turismo regional incentiva a necessidade de trabalhar o potencial local (o senso de lugar e a coesão social), e de criar empregos duradouros (Clarke et al., 2009).
Como pontuam Makkonen et al. (2018), pensar em um desenvolvimento do turismo regional significa investir principalmente em três elementos: (a) na infraestrutura turística, que geralmente recebe o foco das ações; (b) no capital humano; e (c) no capital social.
Contudo, pelos relatos dos entrevistados não houve apenas uma mudança de perfil dos visitantes, mas também de comportamento, que passaram, por exemplo, a planejar e a reservar hospedagem pensando no curto prazo.
E4: os principais players do mercado, como a Decolar.com, claramente nos mostraram que as pessoas estavam comprando pra mesma semana, quando compravam. [...] O pessoal que viajava dentro de Santa Catarina para outros destinos daqui, deixavam pra fazer reserva faltando três ou quatro dias, temendo uma reviravolta.
Para lidar com este tipo de turismo (doméstico e regional) e de turista (nacional com planejamento de curto prazo) e “viabilizar que as empresas desse setor possam minimizar seus impactos” (E1), a Secretaria decidiu por um tipo de promoção turística pautada na segurança. Divulgando a forma como Florianópolis vinha tomando medidas sanitárias para controle do contágio a Covid-19, como relatado por E1: “aqui teve o melhor combate, então isso por si só de uma certa forma já impulsionou Florianópolis como um destino seguro”. Além disso, foi enfatizado que a cidade estava seguindo os protocolos sanitários.
A análise temática apresenta recursos que facilitam a revelação e sistematização de lições aprendidas. A busca por soluções que ofereçam medidas de combate à pandemia passa pela capacidade de criar conhecimento sobre o contexto em que a crise se desenrola. E apesar de haver poucos estudos sobre gestão de riscos e desastres, o turismo se encontra entre as atividades mais impactadas e precisa começar a pensar de forma sistemática em respostas mais eficazes.
Na busca por identificar e compreender as lições aprendidas por profissionais do setor público de turismo de Florianópolis durante a gestão da pandemia de Sars-CoV-2, oito temas que agregam lições aprendidas emergiram: decisões técnicas e protocolos sanitários; informação e comunicação; capacidade de aprendizagem e capacitação; resiliência organizacional; retomada e recuperação; lições pessoais; fiscalização e penalização; e alteração na forma de turismo.
Os temas se interligam, de forma não hierarquizada, criando uma recombinação de fatores e aprendizados que podem vir a gerar ainda mais reflexões. No entanto, a discussão levantada deve servir para contemplar o objetivo proposto, trazendo referências para as lições aprendidas durante a pandemia. Como contribuição principal, o artigo aborda um assunto pouco estudado, que une a gestão do turismo com a gestão de risco e desastres e também de crises.
Para a área de gestão de crises e de desastres, o estudo acrescenta uma visão de um setor que não costuma se envolver nos planos de contingência, prevenção e preparação, para a redução de riscos, mas é afetado com frequência. A partir deste estudo, a percepção mais ampliada das dificuldades e fortalezas do setor de turismo diante de um desastre pode colaborar para sua inserção no sistema de resposta a emergências de uma forma mais ativa. As ações preventivas e preparatórias não apenas reduzem riscos de desastres, como mitigam o impacto de crises econômicas e ampliam a qualidade de vida e a sustentabilidade geral, reduzindo a desigualdade social.
Assim, envolver o setor de turismo na gestão de risco e desastres é trazer uma perspectiva mais realista para o desenvolvimento sustentável de suas atividades. Principalmente, face à inevitabilidade dos eventos extremos, cada vez mais frequentes com as mudanças climáticas.
Dificuldades durante a pesquisa ocorreram devido ao período da coleta de dados (entre dezembro de 2020 e fevereiro de 2021), momento em que, mesmo com as restrições estabelecidas para combater a pandemia, Florianópolis vivia um período de alta temporada turística e as repercussões de um ano eleitoral. Mesmo o prefeito tendo sido reeleito, este período foi de transição e requisitou atenção e mudança de funcionários e, consequentemente, menos disponibilidade para exercer atividades extras, como participar de uma pesquisa de um órgão externo.
Além disso, em nível nacional o Brasil viveu no mesmo ano uma polarização política, acirrada pela divisão que a pandemia gerou e que é habitual em momentos de crises e desastres. Essas dificuldades podem ter influenciado a visão dos entrevistados. No entanto, ao realizar a pesquisa naquele momento, respostas frescas do primeiro momento de combate foram obtidas.
O fato de a pesquisa ser realizada logo após a primeira onda da pandemia, em 2020, traz respostas parciais sobre o aprendizado adquirido, o que pode ser considerado uma limitação.
Como agenda de pesquisa, sugere-se a sequência deste estudo, após a declaração do fim da pandemia e retorno à normalidade das atividades turísticas. Outro estudo pode ser feito com o mesmo método no setor privado, tanto para comparar os resultados com os do setor público, quanto para se chegar a um guia de boas práticas para a gestão em momentos de crise. Em relação aos temas, percebe-se que o tratamento de alguns deles pode trazer novas perspectivas para a pesquisa em desastres. Como no tema “lições pessoais”, que traz uma abordagem que une a resiliência psicológica individual com a resiliência comunitária diante de desastres, uma confluência de conceitos pouco abordada, que traz uma perspectiva mais completa da gestão de organizações e momentos de crise.