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Turismo e patrimônio no município de Ouro Preto/MG: desigualdades territoriais e contradições socioespaciais circundantes aos valores histórico-culturais
Erick Alan Moreira Ferreira; Rafael H. Teixeira-da-Silva
Erick Alan Moreira Ferreira; Rafael H. Teixeira-da-Silva
Turismo e patrimônio no município de Ouro Preto/MG: desigualdades territoriais e contradições socioespaciais circundantes aos valores histórico-culturais
Tourism and heritage in Ouro Preto/MG: territorial inequalities and socio-spatial contradictions surrounding historical-cultural values
Turismo y patrimonio en Ouro Preto/MG: desigualdades territoriales y contradicciones socioespaciales en torno a los valores histórico-culturales
Caderno Virtual de Turismo, vol. 23, núm. 1, 2023
Universidade Federal do Rio de Janeiro
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Resumo: Ouro Preto é reconhecida nacional e internacionalmente por seu valor patrimonial e histórico materializado na monumentalidade das construções do período barroco-colonial. Estes fatores levaram a cidade a ser consagrada enquanto Patrimônio Mundial da UNESCO em 1980. A chancela da UNESCO permitiu que a cidade conquistasse mais renda diante do fluxo de capital em razão do reconhecimento de valores como singularidade, autenticidade e excepcionalidade. Nesse contexto, o objetivo da pesquisa é debater a relação conflituosa entre turismo e patrimônio, tecendo conexões com as motivações políticas, institucionais e econômicas que estão no entorno da sua preservação. Destarte, foi realizada uma pesquisa descritiva e exploratória que encaminhou-se por meio de técnicas de pesquisa bibliográfica e análise documental para efetivar a interpretação e a discussão dos resultados. O estudo foi construído a partir de dezenas de artigos científicos, trabalhos publicados em anais de eventos, capítulos de livros, dissertações e teses de doutorado, buscando aprofundar o conhecimento acerca das características que abarcam o objeto de investigação . Ao final foram perceptíveis as contradições socioespaciais e territoriais reveladas na relação do turismo com o patrimônio , pois ao passo que a municipalidade se aproxima do centro histórico, ela distancia-se das periferias. O processo de refuncionalização turística do centro histórico foi concebido priorizando os valores mercadológicos, prevalecendo a cenarização e a fetichização da paisagem como forma de atrair turistas. Espera-se que o poder local e as resistências sociais instituam instrumentos de enfrentamento úteis frente ao processo de segregação socioespacial, prezando pela manutenção de espaços multifuncionais voltados à fruição e à apropriação efetiva do patrimônio. Além disso, vislumbra-se uma política urbana mais justa, com foco em uma política patrimonial baseada na gestão participativa dos núcleos urbanos tombados. Há ainda a necessidade de ativar memórias que sejam integradoras, que estimulem o diálogo, que permitam escapar de imposições historicamente estabelecidas. Da mesma forma, é necessário suprir a carência de patrimônios identificados em todos os setores territoriais da cidade, sobretudo nos espaços marginais e não somente nos que estão localizados em seu centro histórico.

Palavras-chave: Ouro Preto, Patrimônio Cultural, Dinâmica Territorial.

Abstract: Ouro Preto was the first Brazilian city to be declared a UNESCO World Heritage Site in 1980. UNESCO’s endorsement included Ouro Preto in a world heritage context. This movement has increased the number of investments and tourists in the city. Therefore, we seek to discuss the conflicts in the relationship between tourism and heritage. In particular, the purpose is to consider the territorial, socio-spatial reverberations of this practice. A descriptive and exploratory research was carried out using bibliographic research techniques and document analysis. It was possible to point out that the relationship between tourism and heritage reveals numerous contradictions that materialize in territorial differences and socio-spatial segregation. It is expected that the local power and social resistance will institute useful confrontation instruments against this segregation process, aiming for the maintenance of multifunctional spaces that are focused on the fruition and effective appropriation of heritage. In addition, fairer urban heritage policies based on participative management are expected. There is also a necessity to activate memories that are integrative, which promote dialogue that allows us to escape from historically established impositions. It is important to supply the lack of heritage sites identified in all the city’s territorial sectors, especially in marginal spaces.

Keywords: Ouro Preto, Cultural Heritage, Territorial Dynamics.

Resumen: Ouro Preto fue la primera ciudad brasileña en ser consagrada como Patrimonio de la Humanidad por la UNESCO en 1980. El sello de la UNESCO insirió la localidad en medio del patrimonio mundial. Este movimiento aumentó el número de inversiones y turistas en la ciudad. Así, se busca discutir la relación conflictiva entre turismo y patrimonio. Específicamente, se objetiva abordar las repercusiones socioespaciales y territoriales a partir de esta práctica. Se realizó una investigación descriptiva y exploratoria utilizando técnicas de investigación bibliográfica y análisis de documentos. Se pudo señalar que la relación entre turismo y patrimonio revela numerosas contradicciones que son materiales en diferencias territoriales y de segregación socioespacial. Se espera que las autoridades locales y la resistencia social instituyan instrumentos útiles de confrontación frente al proceso de segregación, valorando el mantenimiento de espacios multifuncionales direccionados al disfrute y apropiación efectiva del patrimonio. Además, se prevé una política de patrimonio urbano más justa, basada en la gestión participativa. Hay todavía la necesidad de activar memorias que sean integradoras, que estimulen el diálogo, que permitan escapar de las imposiciones históricamente establecidas, así como suplir las carencias patrimoniales identificadas en todos los sectores territoriales de la ciudad, especialmente en los espacios marginales.

Palabras clave: Ouro Preto, Patrimonio Cultural, Dinámicas Territoriales.

Carátula del artículo

Artigos Originais

Turismo e patrimônio no município de Ouro Preto/MG: desigualdades territoriais e contradições socioespaciais circundantes aos valores histórico-culturais

Tourism and heritage in Ouro Preto/MG: territorial inequalities and socio-spatial contradictions surrounding historical-cultural values

Turismo y patrimonio en Ouro Preto/MG: desigualdades territoriales y contradicciones socioespaciales en torno a los valores histórico-culturales

Erick Alan Moreira Ferreira
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Brasil
Rafael H. Teixeira-da-Silva
Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (FEC/Rosana), Brasil
Caderno Virtual de Turismo, vol. 23, núm. 1, 2023
Universidade Federal do Rio de Janeiro

Recepción: 30 Diciembre 2022

Aprobación: 10 Abril 2023

1. Introdução

Sem a pretensão de estabelecer paternidades históricas a respeito do turismo, compreendido atualmente como um fenômeno de abrangência global, ainda assim considera-se necessário apresentar uma breve alusão acerca de sua conformação como uma atividade organizada e institucionalizada. Descrever tal conjuntura se torna importante para posteriormente identificar com mais clareza o contexto em que o turismo e o patrimônio cultural passam a se associar como parte de uma mesma racionalidade mercadológica.

Mesmo existindo registros indicando que os seres humanos já viajavam desde a antiguidade, compreende-se o turismo como fenômeno moderno fruto da revolução industrial. Conforme Lima (2020), diante das rupturas provocadas pela revolução, no caso do turismo cabe atentar para a mudança radical ocorrida na fragmentação do tempo, elemento primordial nessa matéria.

A partir da revolução industrial, em oposição ao tempo de trabalho emergiram outras noções como tempo disponível (tempo preenchido para a realização de outras esferas da vida, como as obrigações sociais, religiosas e familiares) e tempo livre (seria o tempo do lazer, podendo ser dedicado ao descanso, divertimento e ao próprio desenvolvimento pessoal). Assim defende-se o propósito no qual “deve-se ver o tempo de lazer como algo precioso, pois ele aloja várias outras atividades necessárias para se ter uma vida de qualidade, tais como o turismo” (Lohmann & Netto, 2012)

Apesar da compreensão do turismo enquanto fenômeno moderno ter emergido com a Revolução Industrial, cabe-se situar que foi apenas na segunda metade do século XX que a atividade alcançou proporções maiores, se tornando um fenômeno de massa, visto sob a ótica da ciência geográfica como uma atividade capaz de influenciar a produção e o consumo do espaço.

O turismo tem como objetivo o espaço e dele faz sua matéria-prima, pois ao mesmo tempo é produto e produtor de espaço, na medida em que se apropria dos lugares impondo-lhes novas dinâmicas, novos usos aos objetos existentes. O turismo é um consumidor de espaço que geralmente desfruta não somente da simples visão contemplativa da paisagem, como também dos elementos constitutivos deste espaço (Silva, 2009, p. 2).

A massificação do turismo motivou processos de turistificação associados ao consumo do espaço e à mercantilização dos lugares, dos quais incluem no Brasil grande parte das cidades tombadas como Patrimônio Cultural pelo Instituto Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN[1] e consagradas como Patrimônio Mundial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO.

É importante pontuar que atualmente, no Brasil, o conceito de Patrimônio Cultural está amparado através da Constituição Federal de 1988, especialmente o artigo 216, que define como “patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”.

A relação entre turismo e patrimônio pode ser interpretada pelo olhar de diferentes áreas do conhecimento, dentre as quais se coloca a Geografia, disciplina que visa contribuir com o debate suscitando reflexões que vão além da salvaguarda do patrimônio cultural “... com uma rica e particular contribuição que renovou as abordagens ao colocar no centro do debate a sua dimensão espacial, política, e como objeto dos interesses do presente, e não apenas a preservação do passado” (Paes & Sotratti, 2017, p. 14-15).

Categorias geográficas como espaço e território suscitaram-se como indispensáveis para o estudo do turismo e sua relação com o patrimônio. Segundo Silva (2009), o turismo, por se apropriar do espaço e tê-lo como seu principal objeto de consumo, encontra na Geografia uma dimensão capaz de proporcionar um entendimento profundo e abrangente das diferentes relações que se estabelecem nesta prática social.

Dessa forma, a interpretação do patrimônio enquanto bem econômico se faz “mediante a análise apurada da organização do espaço social a partir da escala do território” (Cifelli, 2010, p. 123) e das territorialidades que os diferentes agentes sociais tentam impor. Segundo Corrêa (2002, pp. 251-252), a territorialidade pode ser definida como o “conjunto de práticas e suas expressões materiais e simbólicas capazes de garantirem a apropriação e permanência de um dado território por um dado agente social”.

Enquanto agentes hegemônicos, o Estado e o capital se territorializam sobre as cidades-patrimônio, produzindo um espaço no qual o próprio patrimônio é reduzido essencialmente à mercadoria. Com isso, “nas últimas três décadas vem se consubstanciando com maior evidência o estreitamento da relação da esfera cultural aos desígnios do capital e a incorporação do patrimônio a esfera do consumo por meio de sua ligação com o turismo” (Cifelli, 2010, p. 122). Esses fatores podem ser facilmente visualizados na cidade mineira de Ouro Preto, localizada na região central do estado e distante cerca de 90 km da capital Belo Horizonte.

Ouro Preto apresenta uma íntima relação entre a atividade turística e o patrimônio, situando-se como referência neste segmento no Brasil. A cidade tem seu valor histórico e patrimonial reconhecido, sobretudo, em razão de possuir uma riqueza arquitetônica ímpar[2], materializada através da monumentalidade das construções do período barroco-colonial, herança dos tempos áureos da mineração na região. Os traços e as peculiaridades da arquitetura ouro-pretana consagraram a cidade como Patrimônio Mundial da Humanidade, chancelada pela UNESCO em 1980.

A chancela da UNESCO veio ampliar um movimento iniciado nas décadas anteriores através do tombamento efetuado pelo IPHAN; movimento esse que elegeu o município mineiro em razão da exuberância de sua arquitetura barroca-colonial, referência simbólica de uma pretensa unidade nacional. Nesse sentido, Ouro Preto se destaca como a localidade que veio inaugurar o processo de institucionalização do patrimônio cultural nacional ainda na década de 1930.

Apesar do tombamento inicial ter suscitado uma série de intervenções e estratégias de desenvolvimento turístico em Ouro Preto (Sotratti, 2014), foi nas décadas finais do século XX, especialmente após a elevação da cidade a Patrimônio Mundial da Humanidade, que a associação entre turismo e patrimônio se intensificou. A chancela da UNESCO inseriu a cidade mineira no bojo da patrimonializaçãoglobal (Costa, 2011; Teixeira-da-Silva, 2022), culminando com um aumento considerável de investimentos – muitas vezes de origem exógena – e a elevação do fluxo turístico para a cidade. Ambas as situações ocorreram em razão da ampliação da imagem da cidade internacionalmente.

O centro histórico de Ouro Preto, por abrigar parte considerável do patrimônio arquitetônico preservado do período barroco-colonial, se tornou locus para recebimento de investimentos públicos e privados voltados à espetacularização e à cenarização do patrimônio; e à sua respectiva refuncionalização turística. Assim, esse processo deve ser analisado à luz da mercantilização do patrimônio para fins turísticos, sem deixar de considerar as consequências territoriais e as contradições socioespaciais que engendram esse processo.

Tal viés analítico fornece subsídios consistentes para a compreensão da dinâmica territorial em núcleos urbanos apropriados pelo turismo cujos bens patrimoniais, ao serem submetidos aos desígnios do mercado, alteram substancialmente as formas de uso e vivência do território. As novas territorialidades decorrentes deste processo constituem-se num dos principais focos de reflexão geográfica, já que possibilitam a compreensão da relação intrínseca entre território, patrimônio e turismo na contemporaneidade (Cifelli, 2010, p. 115).

Portanto, a partir do preâmbulo apresentado, suscitam-se alguns questionamentos, como por exemplo: em que pesaram as motivações políticas de cunho nacional no movimento incipiente de institucionalização do patrimônio cultural da cidade de Ouro Preto? Quais são as principais problemáticas inerentes ao processo de mercantilização do patrimônio cultural para fins turísticos? Quais são as consequências territoriais e socioespaciais mais marcantes desse processo?

Diante das reflexões apontadas acima, elege-se como objetivo geral do trabalho debater a relação entre patrimônio e turismo em Ouro Preto. Especificamente, busca-se apresentar as motivações políticas, institucionais e econômicas acerca do tombamento da cidade pelo IPHAN e a sua consagração pela UNESCO; discutir a atividade turística na cidade face à mercantilização patrimonial e ainda refletir sobre as diferenças territoriais e as contradições socioespaciais circundantes à inserção da cidade no universo da patrimonialização global.

2. Metodologia

A metodologia empregada no desenvolvimento de uma pesquisa é a maneira concreta, racional e eficiente de se realizar a busca do conhecimento, pois um determinado problema de investigação torna-se conhecido não por intermédio do senso comum, mas ao se utilizar de uma linguagem própria (Santos Filho & Gamboa, 2013). De acordo com Gomes & Amaral (2005), enquanto o senso comum está baseado no conhecimento imediato, a atitude científica tem por base a problematização. Assim, a ciência distingue-se do senso comum: enquanto este representa uma opinião baseada em hábitos, preconceitos e tradições cristalizadas, a primeira baseia-se em pesquisas, investigações metódicas e sistemáticas.

Tomando tais preceitos como base, foi conduzida uma análise qualitativa da produção acadêmica sobre a temática do patrimônio e do turismo na cidade de Ouro Preto (Healey & Healey, 2016). Destarte, foi realizada uma pesquisadescritiva e exploratória (Köche, 2011) que encaminhou-se por meio de técnicas de pesquisa bibliográfica e análise documental para efetivar a interpretação e a discussão dos resultados.

Com o intuito de alcançar os objetivos propostos, foram realizadas buscas em sites indexados e bibliotecas científicas on-line[3] a partir de descritores específicos que auxiliaram na seleção dos trabalhos mais relevantes. A busca nos sites indexados foi organizada com base em critérios objetivos (Pazzetto, 2003) e visava direcionar e facilitar a análise da produção nacional e internacional a partir de uma perspectiva patrimonial e espacial crítica. Os principais descritores utilizados foram: “patrimônio cultural ouro preto”; “preservação ouro preto”; “paisagem cultural ouro preto”; “patrimonialização ouro preto”; “turismo ouro preto”; “barroco mineiro”; “arquitetura colonial minas gerais”; “geografia turismo ouro preto”.

Buscando aprofundar o conhecimento acerca das características do objeto de investigação, o estudo foi construído a partir de dezenas de artigos científicos, trabalhos publicados em anais de eventos, capítulos de livros, dissertações e teses de doutorado. Dentro do recorte temático definido, procurou-se privilegiar pesquisas que buscavam estabelecer as relações entre geografia, turismo e patrimônio, além de trabalhos que estivessem vinculados à institucionalização do patrimônio, à relação entre turismo e mercantilização e às contradições socioespaciais inerentes aos diferentes usos do patrimônio.

3. Revisão de Literatura
3.1 A institucionalização do Patrimônio Cultural em Ouro Preto

O início do processo de institucionalização do Patrimônio Cultural em Ouro Preto confunde-se com a própria gênese da política patrimonial de âmbito nacional que buscava, no início do século XX, forjar uma identidade tipicamente brasileira. Desse modo, a cidade mineira assumiu protagonismo na origem da política de proteção patrimonial a nível nacional pois, antes mesmo da criação do IPHAN em 1937, foi a primeira cidade brasileira elevada a monumento nacional.

foi no conjunto dos esforços realizados, em especial o dos intelectuais modernistas, de conhecer, compreender e recriar o Brasil, que se desenvolveu a ideia de proteção ao patrimônio. Ela se efetivou no governo de Getúlio Vargas (1930-1945) que, ao consagrar, pelo Decreto nº 22.928, de 12 de julho de 1933, Ouro Preto como “monumento nacional”, demonstrou conhecer o potencial simbólico dos bens culturais (Funari & Pinsky, 2001, p. 20).

A partir da criação do IPHAN estabeleceu-se no país uma política patrimonial em

busca de uma cultura e uma identidade “autenticamente brasileira”. Essa identidade foi encontrada nos bens representativos do período colonial, também conhecidos como ‘bens de pedra e cal’, ou seja, na arquitetura representativa do século XVIII, especialmente nas que possuem o estilo brasileiro mais original, tornando-se um símbolo emblemático da nação brasileira (Oliveira, 2010, p. 184).

Para Cifelli (2015), em total acordo com o projeto proposto pelo IPHAN, o tombamento da cidade de Ouro Preto respondeu de forma plena aos desígnios do Estado Novo na busca por símbolos materiais representantes de uma arte e uma arquitetura genuinamente nacionais como referência identitária de uma nação em construção. Assim, o início da institucionalização do patrimônio cultural no Brasil, que elegeu a cidade mineira como protagonista, estava associado à questão da afirmação identitária nacional, recebendo contorno e relevância na política nacional brasileira quando a cultura é posta como questão de Estado.

Foi diante de um ideário de cunho nacionalista que Ouro Preto se tornou pioneira no quesito preservação e conservação de parte de seu patrimônio edificado, sobretudo o de propriedade do Estado e da Igreja Católica, com destaque para seu núcleo histórico (Villaschi, 2014). Em Ouro Preto, as treze igrejas e capelas existentes e a expressividade e imponência dos monumentos cívicos evidenciam a importância dessas instituições na conformação da paisagem urbana da cidade no período barroco-colonial (Cifelli, 2010).


Figura 01
Paisagem urbana abarcando parte do Centro Histórico da cidade de Ouro Preto[4]
Disponível em http://portal.iphan.gov.br/mg/pagina/detalhes/1293. Acesso: 13/01/2022.

Sobre as ações iniciais do IPHAN na cidade, cabe ressaltar o caráter em essência excludente e elitista que foi adotado, pois foram definidos como patrimônios culturais os monumentos religiosos e cívicos, excluindo “a diversidade da memória de outras identidades culturais que não aquelas eleitas para a produção de uma imagem de riqueza, opulência, beleza, prestígio, entre outros atributos que conferem” (Paes & Sotratti, 2017, p. 166)

De acordo com Costa (2009), através do tombamento inicial ocorrido em Ouro Preto promoveu-se uma visão distorcida de preservação patrimonial concentrada especialmente no centro histórico da cidade, o que levou à negligência do território em sua totalidade. Assim revelou-se a primeira faceta segregacionista da política patrimonial implantada na cidade, uma vez que iluminaram-se certos momentos da história, enquanto outros deveriam permanecer na obscuridade. Muitas vezes, para se criar um símbolo nacional, apagam-se as marcas da história local que se sedimentaram ao longo dos anos (Castriota, 2003).

Foi apenas no ano de 1986 que o IPHAN redefiniu o perímetro de tombamento da cidade, englobando não só o centro histórico, mas também todos os morros circundantes. Conforme Vieira (2016), considerou-se importante estender o tombamento aos morros no entorno do núcleo histórico, onde se iniciava a periferização da cidade[5], para se estabelecer a preservação da materialidade de valor histórico-arquitetônico presentes nesses espaços.

É importante ressaltar que, apesar do processo de periferização da cidade de Ouro Preto apresentar suas próprias especificidades, esse fenômeno se desenvolveu conforme uma tendência mais geral, “com a expansão da cidade, a partir do processo de industrialização que se apresenta com mais potência a partir dos anos 1950, mas que tem seu auge nos anos 1970” (Alves, 2018, p. 115).

Conforme dados do IBGE[6], na década de 1940, a população economicamente ativa na indústria de Ouro Preto cresceu 70% ... na década seguinte, o crescimento da mesma população foi de 19%, intensificando-se na década de 1960, com um recorde de 131%... Dessa maneira, as indústrias, representando a iniciativa privada, tornaram-se importantes agentes econômicos. O desenvolvimento da indústria retomou também o crescimento populacional na cidade, que nesse período foi de 66,6%, por que muitas pessoas se mudaram para Ouro Preto na esperança de conseguir emprego (Oliveira, 2010, p. 182).

Talvez as ações do IPHAN implantadas na cidade a partir da década de 1980, atreladas à ausência de um planejamento urbano eficaz, tenham sido tardias. O processo de periferização, além de suscitar diversos problemas tangentes à inacessibilidade de grande parte da população migrante ao direito à cidade, resultou também de uma ocupação irregular e levou a uma consequente perda da possibilidade de manutenção da unidade estética e estilística do conjunto arquitetônico tombado.


Figura 02
Descaracterização da paisagem urbana de Ouro Preto[7]
Disponível em https://doidaporviagem.com.br/o-que-fazer-em-ouro-preto-em-um-dia/. Acesso: 13/01/2022.

Retomando a análise sobre a política patrimonial adotada no país que elegeu a cidade de Ouro Preto como marco introdutório, não se deve deixar de reconhecer a influência das Cartas e Normas patrimoniais[8], como as Normas de Quito redigidas em 1967. Segundo Vieira (2016, p. 230), essas normas “reconheceram o valor econômico dos monumentos e recomendaram seu aproveitamento com o objetivo de promover o desenvolvimento de uma região”. Assim “estava selado o processo simultâneo, relacional e contraditório de uma ‘preservação’ para a ‘mercantilização’ do patrimônio... necessária à reprodução do capital nas ‘cidades históricas’ através do turismo” (Costa, 2011, p. 151).

O assunto avançou sobre a década seguinte quando ocorreu a consolidação da noção de Patrimônio Mundial, através da inscrição das cidades estabelecidas nos territórios das nações de todo o planeta na Lista do Patrimônio Mundial da UNESCO, concomitantemente à corrida pela mercantilização dos lugares por parte das governanças urbanas (Costa, 2011; Leite & Brusadin, 2020).

Para Choay (2001), a UNESCO proclamou a universalidade do pensamento ocidental, criando regras e ditando o processo de identificação, proteção, conservação e valorização do patrimônio. Essa padronização objetivou a produção do ideário de universalidade do patrimônio mundial e do sentimento de que, independente da nação em que o bem esteja, ele pertence a toda a humanidade.

Assim,

É no contexto geral do final dos anos 1970 que Ouro Preto se torna a primeira cidade brasileira e a terceira das Américas - depois de Quito e Guadalajara - a receber o título de Patrimônio Cultural da Humanidade, pela Unesco, em 1980, o que intensificou a projeção de seus valores artísticos e patrimoniais e a consagração de sua imagem à escala internacional (Villaschi, 2014, p. 105).

É importante lembrar que a chancela da UNESCO, através da inserção na lista de cidades mundiais de destaque, inseriu a cidade mineira no universo da patrimonialização global, o que representa para Costa (2011) o brusco movimento universal e progressivo de espetacularização, cenarização e ressignificação dos lugares para fins turísticos. Ademais, a consagração da UNESCO incluiu Ouro Preto no circuito global[9] de cidades – reconhecida mundialmente em razão do valor excepcional e universal do seu patrimônio cultural –, despertando uma corrida por maiores investimentos e uma busca constante de atração de turistas para a localidade através da expansão da imagem internacional da cidade.

3.2 A atividade turística no município de Ouro Preto face à mercantilização do patrimônio histórico e cultural

Lazzarotti (2000) afirma que patrimônio cultural e turismo participam de um mesmo movimento mundial e de um mesmo sistema de valores inerentes à lógica de acumulação capitalista.

... para o turismo, o patrimônio é constituído “como uma particularidade do espaço construído pelo tempo acumulado”, pode ser considerado um valor a ser vendido e consumido no mercado cultural... o patrimônio como representação, tanto da sociedade, do mercado, como do Estado, capta a memória do tempo histórico e a transforma em abstração concreta na circulação do mercado (Paes & Sotratti, 2017, p. 16).

Segundo Paes (2017, p. 678), “patrimônio cultural, turismo e renovação urbana são vetores de um mesmo processo de reestruturação do território”. Assim, como dimensão espacial e política, a relação entre turismo e patrimônio intensificou-se a partir da chancela da UNESCO, refletindo em âmbito local na implantação de um novo modelo de urbanismo que se buscou desenvolver a partir da década de 1980.

A partir desse contexto, houve um acirramento das políticas neoliberais, com o início do que Pires (2010, p.2) compreende como a fase “representada pelo surgimento dos planos ou planejamentos estratégicos”, inclusive no âmbito das políticas urbanas. A gênese do novo urbanismo, ancorado à lógica do planejamento estratégico e dos seus projetos de desenvolvimento, evidencia conforme Harvey & Szlak (2005) a ideia de empreendedorismo urbano, que transforma a cidade em um sujeito econômico, convertida em uma mercadoria (objeto) a ser vendida em um mercado altamente competitivo.

As “cidades históricas”, sejam elas capitais ou cidades do interior, metrópoles ou cidades pequenas, são rendidas às novas lógicas de produção dos espaços urbanos, marcadas por características claramente empresariais que as transformam em mercadoria, atingindo apenas determinados bens, em geral aqueles de aspecto monumental ou os que interessam diretamente ao mercado turístico ou consumo cultural (Cruz, 2012; Scifoni, 2017). Assim, segundo Nigro (2010, p. 75), “cada vez mais, a indústria turística se apropria do patrimônio principalmente por intermédio de seu caráter meramente estético, algo a ser comercializado e consumido”.

Sob esta lógica da atividade turística, o patrimônio – uma das modalidades turísticas inserida no processo de mercantilização do espaço como produto e condição da acumulação capitalista – cria uma possibilidade de ampliação da base social de consumo necessária à expansão do processo de valorização pela expansão das possibilidades de criação de novas mercadorias e de novas formas de lugares de consumo decorrentes do desenvolvimento do “mundo da mercadoria” (Carlos, 2017, pp. 35-36).

À medida que as localidades passam a optar pela adoção de um viés unicamente economicista atribuído ao patrimônio, é suscitada a noção de cidade-patrimônio-mercadoria, concebida prioritariamente como produto. Nessa lógica, conforme Carlos (2017), a associação entre turismo e patrimônio amplia o movimento da acumulação através da implantação de um modelo de política urbana orientada para a espetacularização e cenarização da paisagem, que tem o centro histórico como locus de investimento e melhoria para atração de turistas.

Segundo Jeudy (2005), a espetacularização dos centros históricos das cidades inseridas no processo de patrimonialização global está ligada às estratégias de marketing urbano. Especificamente sobre Ouro Preto, os exemplares arquitetônicos e artísticos remanescentes do período barroco-colonial compõem a imagem da cidade amplamente divulgada, seja pelos meios de comunicação convencionais (jornais, revistas, redes sociais, etc.) ou pelos próprios canais oficiais do poder público local, transformando a antiga Vila Rica num dos principais destinos turístico do Brasil.

A intensificação da parceria público-privada no que concerne à esfera cultural eleva a importância do Estado e do mercado enquanto instâncias de produção dos bens simbólicos, utilizando-se da mídia e da publicidade como meio de difusão, consagração e valorização de tais bens enquanto mercadorias. Dessa forma os veículos publicitários, ao exaltarem sua dimensão imagética e evidenciarem seu valor histórico, cultural e artístico, reforçam a agregação do valor econômico aos bens patrimoniais com a conotação de que quanto mais antigo for, mais valorizado economicamente se torna (Cifelli, 2010, p. 123).

Em Ouro Preto, o próprio poder público local, através de seus meios oficiais de comunicação, privilegia a divulgação da imagem da cidade evidenciando o seu centro histórico, área de maior valoração econômica e financeira, ao passo que elementos materiais e imateriais situados em outros fragmentos da cidade e possuidores de valores histórico-culturais acabam sendo esquecidos por opção.

As ações de marketing urbano buscam reproduzir uma imagem espetacularizada da cidade, capaz de conceber o patrimônio cultural como uma mercadoria altamente rentável no mercado turístico. Assim, conforme Costa (2011, p. 417), a “espetacularização caminha para a mercantilização”.

A mercantilização de fragmentos espaciais específicos das cidades consagradas como patrimônio revela uma ação muito bem articulada através do estreitamento da relação entre política e marketing urbano. Sua finalidade acaba se desviando ao interesse privado diante da canalização de investimentos e projetos de desenvolvimento urbano nos centros históricos, culminando com a refuncionalização turística desses espaços.

Em regra, a refuncionalização turística de cidades históricas ocorre mediante a apropriação das formas simbólicas resistentes de um tempo pretérito, concebidas como rugosidade patrimonial. Essas formas abrem-se

ao mercado e a outro tipo de consumidor o que faz através das operações urbanas, muitas delas apoiadas pelas parcerias público-privadas, visando à revitalização de antigos marcos – muitos abandonados – capazes de gerar lucro através da instalação de outras funções e usos, com a manutenção das ‘formas históricas’ e apoiados em novos discursos (Carlos, 2017, p. 37).

Em Ouro Preto, especificamente, a refuncionalização turística do centro histórico privilegiou as formas simbólicas que compõem a paisagem urbana remanescente do período barroco-colonial e que passaram, em um contexto específico, a assumir novas funções consonantes à lógica de mercado.

Na cidade de Ouro Preto, a atividade turística é atraída pelo grandioso acervo patrimonial formado por monumentos religiosos e civis, entre os quais se encontram as igrejas, capelas, sobrados, casario térreo, vias calçadas em pedra, chafarizes e pontes. Além disso, os museus da cidade abrigam bens artísticos do período barroco e constituem grande parte da memória e da cultura local, além de representarem um importante papel na história e na tradição brasileira (Cunha & Caldeira, 2017, p. 208).

A cidade de Ouro Preto congrega no seu centro histórico um conservado arruamento setecentista composto pela monumentalidade das construções religiosas e cívicas e belíssimos casarões de propriedade privada erguidos no período barroco-colonial. Assim, o processo de turistificação do centro da cidade envolveu a refuncionalização de grande parte dessas edificações.

Monumentos cívicos foram refuncionalizados em museus como, por exemplo, a Casa de Câmara e Cadeia[10], que hoje funciona como Museu da Inconfidência; e o Palácio dos Governadores, que hoje abriga o Museu de Mineralogia. As igrejas coloniais também passaram por processo similar, assumindo função híbrida pois, em razão da valorização da arte barroca e da exuberância do ouro, elas saltam aos olhos dos turistas. Em algumas das igrejas, como a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição e a Igreja de São Francisco de Assis, foram incorporados no seu interior museus que retratam a história da cidade.

Uma quantidade considerável de casarões de propriedade privada situados no centro histórico da cidade exerce funções híbridas de moradia e comércio, quando não cumprem apenas a segunda opção, se tornando “lojas de souvenirs, restaurantes, cafés, hotéis e pousadas, centros culturais, museus e outras atividades comerciais e de serviços destinadas ao atendimento das demandas dos turistas e visitantes” (Cifelli, 2012, s.p.).

O incremento do turismo em Ouro Preto nos últimos 20 anos tem provocado uma grande procura por edificações no chamado núcleo turístico da cidade que envolve parte considerável do centro histórico. A valorização imobiliária destes bens tem feito com que muitos moradores tradicionais destas áreas priorizem a venda ou locação ou até mesmo o usufruto de seus imóveis destinados à implantação de estabelecimentos comerciais e de serviços de relevância turística (Cifelli, 2010, p. 129).


Figura 03
Refuncionalização turística da rua Conde de Bobadela, popularmente conhecida como Rua Direita[11].
Fonte: Disponível em: <aosplanejado.com/patrimonio-perverso-ouro-preto/>. Acesso: 13/01/2022.

Portanto, a estratégia de apropriação turística do centro histórico e a supervalorização estética de suas paisagens se sobrepõem ao lugar — espaço vivido cotidianamente pelos habitantes (Paes & Sotratti, 2017), pois processos de refuncionalização turística muitas vezes escancaram a dualidade de um espaço voltado para o lazer, o turismo e o consumo, ao passo que restringem os usos dos lugares da vida cotidiana pública aos moradores e frequentadores desse espaço.

4. Desigualdades territoriais e contradições socioespaciais tangentes ao uso do Patrimônio ‘Consagrado'

A incorporação do planejamento estratégico no bojo das políticas urbanas demonstrou uma nova forma de gestão neoliberal do território, modelo esse que também recai sobre cidades patrimoniais, culminando em impactantes desigualdades territoriais e contradições socioespaciais.

Ao serem elevadas ao posto de cidade global, as localidades chanceladas pela UNESCO passam a receber volumosos investimentos que na maioria das vezes não são repartidos de forma igualitária por todo o território. Os recursos angariados são destinados prioritariamente para as áreas de maior valorização econômica, geralmente onde a atividade turística se desenvolve em volta do patrimônio preservado.

O poder exercido pelas instâncias de gestão urbana e patrimonial elegem o centro histórico como locus para investimentos em razão da necessidade constante de atração de turistas e, contraditoriamente, outros fragmentos do espaço urbano que não possuem a mesma vocação para a atividade são negligenciados perante a ausência de investimentos que garantam à população o pleno direito à cidade.

“Nesse processo, a população local arca com a maior parte do ônus. Como Estado e o capital são atores hegemônicos dessa atividade, eles impõem suas territorialidades de forma mais avassaladora” (Albuquerque, 2020, p. 54).

Os projetos de revitalização urbana atuais propõem a valorização dos marcos simbólicos e históricos de áreas das cidades, diferenciando espacialmente essas áreas das demais. Na maioria dos casos, as revitalizações urbanas se executam sobre áreas pontuais do espaço urbano – sobretudo, áreas centrais – visando a readequação funcional (em vista de parâmetros econômicos e comerciais), a valorização imobiliária desses locais, o incremento de atividades de lazer e, principalmente, o turismo (Nigro, 2010, p. 76).

O caso de Ouro Preto deve ser analisado de maneira peculiar, pois diferentes microterritorialidades se manifestam no centro histórico da cidade. Convivem, através de uma intrigante relação de interesses e conflitos, residentes das freguesias locais, a população dos bairros e dos distritos distantes, trabalhadores, estudantes e turistas.

Através de um olhar mais atento sobre os fluxos que se constituem cotidianamente pelo centro histórico de Ouro Preto, é possível observar o convívio – nem sempre harmonioso – de diferentes atores sociais circulando pelas ladeiras da cidade: residentes (grande parte pertencente à elite local) realizando as suas atividades cotidianas; moradores de bairros mais distantes e dos distritos, pois o centro histórico da cidade representa a única centralidade em termos de oferta de serviços públicos e burocráticos; acadêmicos que ali também residem em razão da refuncionalização dos casarões coloniais em repúblicas estudantis; e visitantes e turistas afoitos pelo consumo cultural.

Em razão do forte apelo turístico do seu patrimônio cultural edificado, o centro histórico da cidade se constituiu como locus privilegiado para investimentos, ao passo que as periferias da cidade são cada vez menos assistidas em termos de oferta de infraestrutura básica. Assim, acabou se perpetuando na cidade “a fragmentação do tecido urbano entre áreas ricas e pobres, entre as infraestruturas concentradas e as áreas abandonadas pelos serviços públicos e pelos interesses privados” (Paes, 2017, p. 678).


Figura 4
Rua São José, uma das principais vias do centro histórico de Ouro Preto.
Fonte: Luciene Ferreira

Segundo Sotratti (2014, p. 41), o turismo é uma prática socioespacial capaz de deixar intensamente suas marcas no território urbano. “Normalmente aliadas a interesses econômicos ou mesmo políticos, as atividades de natureza turística se impõem aos interesses locais, criando territórios delimitados ou mesmo territorialidades claramente percebidas”. Enquanto o centro histórico é dotado de investimentos públicos e privados destinados à preservação do patrimônio e, por conseguinte, à atração turística, nos bairros periféricos a realidade é bem distinta, retratada através da ausência da municipalidade e da precariedade em relação à infraestrutura urbana.

Em Ouro Preto, são as áreas de médio para baixo padrão construtivo que apresentam uma frágil presença da municipalidade e enclaves onde o morar se desempenha de forma indesejada e imprópria para a vida digna, com baixíssimo padrão construtivo ou ausência mínima de infraestrutura urbana.

A população local, que faz parte do cotidiano da “cidade monumento”... é silenciada, não fazendo parte de todo o processo político mercantil que a cidade passou e vem passando. Nessas transformações, fatias espaciais de Ouro Preto foram eleitas para sua preservação e, consequentemente, para os investimentos econômicos, políticos e culturais a despeito de outros espaços que foram desprivilegiados (Leite & Brusadin, 2020, p. 405).

Portanto, os investimentos destinados prioritariamente para o centro histórico acabaram produzindo, contraditoriamente, marcantes desigualdades territoriais e, ainda, encobrindo descaradamente os processos de segregação socioespacial. De acordo com Serpa (2013), as microterritorialidades que se manifestam no espaço público da cidade contemporânea mostram a existência de territórios plásticos e móveis, que exprimem táticas segregacionistas de controle espacial. A segregação revela-se de modos distintos, transformadas em práticas de distinção de grupos, classes e frações de classe nos processos de apropriação do espaço público que ocorrem hoje nas cidades.

A diversidade de agentes e práticas sociais presentes no espaço urbano pode gerar a alternância e/ou sobreposição de diversas territorialidades, fazendo do território um campo de forças onde se interpolam interesses comuns, divergentes e até mesmo conflitantes, que determinam diversas formas de uso e apropriação do território, que envolvem uma multiplicidade de grupos sociais (Cifelli, 2010).

Dessa maneira, em Ouro Preto, o uso turístico do centro histórico tende a causar uma cisão entre o território da população mais pobre nos bairros carentes de infraestruturas (fora do perímetro tombado) e o território dentro do perímetro patrimonializado, que se torna uma espécie de núcleo do consumo capitalista (Brusadin e Silva, 2012; Paes, 2017).

Ao viabilizar o desenvolvimento turístico de determinada localidade, os programas de intervenção urbana em voga levantam certa contradição. Apesar de mascarados por discursos que prezam pelo desenvolvimento social e pelo estímulo à cultura, tais programas atendem prioritariamente a finalidades de cunho mercantil de certas porções dos núcleos históricos e à alteração do perfil socioeconômico de tais áreas, que passam a atender os desígnios de um público seleto e personalizado (Cifelli, 2010).

Cifelli (2012, s.p.), analisando as contradições socioespaciais decorrentes do processo de refuncionalização turística, acrescenta que:

Em Ouro Preto... parte do chamado centro antigo tende a se transformar em centro turístico devido ao grande adensamento de edificações refuncionalizadas para o atendimento das demandas de lazer e consumo... de turistas que têm condições de usufruir de tais benesses. Este processo acarreta numa refuncionalização turística do patrimônio arquitetônico que tende a reduzir a multifuncionalidade dos centros urbanos patrimonializados de Ouro Preto... numa dinâmica de apropriação do patrimônio socialmente excludente. (Cifelli, 2012, s.p.).

Assim, no centro histórico da cidade de Ouro Preto acaba prevalecendo uma territorialidade turística traduzida diante da concentração de investimentos de serviços e infraestrutura. Com isso ampliam-se a seletividade, a exclusão e a fragmentação no uso do território, medida sobretudo através do poder de compra de determinados grupos (Paes-Luchiari, 2005).

Segundo Ferreira (2019), a permanência dessa lógica nas cidades históricas tem instaurado uma verdadeira corrida pela implantação de serviços de alto valor agregado que não só expulsa e segrega o morador, mas também impede a ele o acesso democrático ao centro histórico, pois o consumo dos bens e serviços lá oferecidos é destinado a quem possui capacidade de consumo e renda mais elevados.

Sob o desígnio do capital o uso mercantilizado do centro histórico reduz o patrimônio a um bem de consumo acessível aos desejos dos turistas, todavia encobre diversas outras realidades que se manifestam diante de um processo de segregação socioespacial. Por exemplo, para o morador do centro histórico, o uso turístico do patrimônio significa aumento da especulação imobiliária, implicando em uma elevação substancial em relação ao custo de vida.

Portanto, conforme Serpa (2013), os territórios que se estabelecem no espaço público e que vão marcar diferenças/desigualdades relativas aos modos de consumo e estilos de vida de diferentes grupos e classes têm expressão material, mesmo que de modo efêmero e ainda que se trate também de uma projeção espacial de relações de poder. Emergem processos de segregação baseados em limites/barreiras que vão impor uma incipiente, ou mesmo nula, interação social e espacial entre os agentes que se apropriam do espaço urbano.

O processo de exclusão socioespacial relacionado ao patrimônio cultural reverbera sobre a própria população da cidade de uma maneira que ocorre uma superposição observada no descompasso entre a identidade plural e multiescalar da comunidade local e uma identidade externa, simbólica, imagética e midiaticamente construída para fins de mercantilização do lugar (Villaschi, 2014).

Ao analisar o turismo em Ouro Preto, é necessário fazer um balanço sobre os significados do tombamento para os moradores. Se o discurso oficial traz a “garantia da cidadania” e de que “sem o patrimônio eu não sou ninguém”, tal intenção não condiz com o cotidiano dos que lá vivem (Banducci & Barreto, 2001, p. 86). Segundo Castriota (2009, p. 151), “pode-se notar hoje uma falta de identificação entre a população e o cenário barroco criado, que é percebido como espaço para o turista. Para manter sua cultura e tradições, o habitante local desenvolve uma estratégia de ‘ensimesmamento’, fechando-se cada vez mais em seu próprio grupo”.

Portanto, a atividade turística em Ouro Preto, face ao processo de mercantilização patrimonial, evidencia processos dialéticos em que se pesam sobre as dinâmicas territoriais e socioespaciais. Se por um lado os investimentos são destinados prioritariamente ao centro histórico, por outro a municipalidade permanece inerte em relação às periferias. Se o processo de espetacularização/cenarização/mercantilização do centro histórico busca satisfazer o turista mais abastado economicamente, esse mesmo processo segrega o morador que não possui o mesmo poder de consumo e que não se sente pertencente ao patrimônio cultural da própria cidade.

5. Conclusão

O processo de tombamento de Ouro Preto pelo IPHAN decorrido no ano de 1938 marcou as primeiras contradições na esfera da política patrimonial implantada na cidade, pois caracterizou-se como um movimento ao mesmo tempo elitista e excludente, perpetuado inclusive nas décadas posteriores. A chancela da UNESCO inseriu a cidade no processo de patrimonialização global, repercutindo com o reconhecimento econômico dos bens patrimonializados, que passaram a adquirir valor de mercado principalmente para a atividade turística.

É importante ressaltar que a associação entre patrimônio e turismo não apresenta apenas aspectos positivos, como algumas vezes é transparecida em projetos e políticas que não reconhecem os direitos da população residente, fundamentados em uma visão limitada do turismo somente enquanto atividade econômica e não enquanto fenômeno complexo e permeado de subjetividades inerentes ao transcorrer de territórios globalizados. Tal perspectiva está evidenciada em contradições que se materializam no espaço, reproduzindo notórias desigualdades territoriais nas localidades.

Em Ouro Preto é evidente um acentuado processo de espetacularização/cenarização do centro histórico concomitante à fetichização da paisagem patrimonial, o que torna o espaço mercantilizado através da implantação de políticas urbanas voltadas prioritariamente para a refuncionalização turística. Através dessa lógica, o aumento do fluxo de capital internacional direcionado para a cidade, em razão da chancela da UNESCO, imprime sobre a totalidade do espaço urbano significativas desigualdades territoriais, tornando o centro histórico iluminado e suas periferias opacas.

Diante de tal realidade, verifica-se como possibilidade a implantação de políticas urbanas que busquem garantir o direito à cidade à toda população, sobretudo às parcelas socioeconomicamente mais vulneráveis e historicamente obliteradas. Em oposição ao modelo de urbanismo mediado por interesses econômicos, espera-se que o poder local e as resistências sociais instituam instrumentos de enfrentamento úteis frente ao processo de segregação socioespacial. Preza-se, assim, pela manutenção de espaços multifuncionais voltados para a fruição e apropriação efetiva do patrimônio, assim como para o exercício de uma cidadania plena.

Além disso, vislumbra-se uma política urbana mais justa, com foco em uma política patrimonial baseada na gestão participativa dos núcleos urbanos tombados. Há ainda a necessidade de ativar memórias que sejam integradoras, que estimulem o diálogo, que permitam escapar de imposições historicamente estabelecidas. Também é necessário suprir a carência de patrimônios identificados em todos os setores territoriais da cidade, sobretudo nos espaços marginais e não somente localizados em seu centro histórico.

Material suplementario
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Notas
Notas
[1] O Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - SPHAN foi o órgão que deu origem à criação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, em 1970. Neste trabalho, para termos de padronização, a sigla do IPHAN será utilizada sempre que se for remeter à gênese desse órgão.
[2] Cabe explicitar que a cidade é dotada de uma diversidade de “valores” patrimoniais que não se reduz apenas à materialidade do patrimônio cultural. De igual importância - do ponto de vista histórico-cultural e social - para a cidade situam-se os elementos do patrimônio imaterial. Contudo, devido a própria limitação do estudo, este artigo pretende-se ater à relação entre o turismo e o patrimônio material, incluindo as reverberações dessa prática no espaço e território.
[3] Os sites utilizados foram: https://scholar.google.com.br; https://www.scielosp.org; https://lume.ufrgs.br; https://www.b-on.pt; http://bdtd.ibict.br/vufind/.
[4] A paisagem contida na FIGURA 1 retrata a imponência das construções religiosas (em especial a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, que teve a sua construção concluída no início do século XIX) e cívicas (ao fundo da Igreja do Carmo tem a antiga casa de Câmara e Cadeia), além do preservado arruamento setecentista, emoldurado pelas belas montanhas que encobrem a cidade.
[5] “No caso de Ouro Preto, a consolidação dos bairros de periferia está diretamente vinculada ao dinamismo da indústria após a década de 1950 e da leva de migrantes que procuravam por melhores condições de vida na cidade, além da valorização da terra urbana (e do símbolo patrimonial) da área central da cidade” (Costa, 2011, p. 327).
[6] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
[7] A FIGURA 2 retrata uma paisagem possível de ser observada a partir do centro histórico, tendo a Igreja de São Francisco de Assis (um dos principais símbolos do barroco da cidade) em destaque e o bairro de Vila Aparecida como pano de fundo, evidenciado através das inúmeras construções irregulares que conformam o morro.
[8] Para aprofundar mais sobre o assunto, consultar: (Costa, 2012).
[9] “O usufruto do Patrimônio muda de escala por meio da atividade do turismo, perdendo seu estatuto local ao inserir-se em um plano espacial mais amplo se metamorfoseia em signos e representação para poder ser consumido por estranhos que vêm de outros lugares movidos pela descoberta, curiosidade e objetivo de desejo criados pela mídia (Carlos, 2017, p. 36).
[10] Antiga Casa de Câmara e Cadeia de Vila Rica é um dos mais notáveis exemplares da arquitetura civil colonial
[11] Essa rua é considerada uma das mais importantes da cidade. Os casarões situados nesse logradouro foram construídos no período barroco-colonial e hoje grande parte também exerce funções turísticas, como restaurantes, bares, joalherias, hotel, lojas de souvenirs, etc.

Figura 01
Paisagem urbana abarcando parte do Centro Histórico da cidade de Ouro Preto[4]
Disponível em http://portal.iphan.gov.br/mg/pagina/detalhes/1293. Acesso: 13/01/2022.

Figura 02
Descaracterização da paisagem urbana de Ouro Preto[7]
Disponível em https://doidaporviagem.com.br/o-que-fazer-em-ouro-preto-em-um-dia/. Acesso: 13/01/2022.

Figura 03
Refuncionalização turística da rua Conde de Bobadela, popularmente conhecida como Rua Direita[11].
Fonte: Disponível em: <aosplanejado.com/patrimonio-perverso-ouro-preto/>. Acesso: 13/01/2022.

Figura 4
Rua São José, uma das principais vias do centro histórico de Ouro Preto.
Fonte: Luciene Ferreira
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