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Jogos e brincadeiras: tempos, espaços e diversidade

Games and child’s play: times, spaces and diversity

Laudeth Alves dos Reis
Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil
Wagner Wey Moreira
Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil
Natalia Papacidero Magrin
Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil
Regina Simões
Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil

Jogos e brincadeiras: tempos, espaços e diversidade

Educação, vol. 42, núm. 3, pp. 765-767, 2017

Universidade Federal de Santa Maria

. KISHIMOTO, T. M.; SANTOS, M. W. (org.). Jogos e brincadeiras: tempos, espaços e diversidade (Pesquisa em Educação). São Paulo: Cortez, 2016.. 2016. São Paulo - Brasil. Cortez Editora. 264pp.. 978-85-249-2491-0

Recepção: 07 Junho 2017

Aprovação: 05 Dezembro 2017

Jogos e brincadeiras: tempos, espaços e diversidade, é uma obra coletiva organizada em dez capítulos por Tizuko Morchida Kishimoto e com prefácio de João Amado, professor da Universidade de Coimbra.

A autora destaca que a publicação é fruto de dissertações e teses defendidas entre 2000 e 2010 na Faculdade de Educação da USP e de investigações com foco em aspectos lúdicos. Os estudos estão estruturados prioritariamente em pesquisas qualitativas, ancoradas em abordagens como a etnográfica e a análise documental. A obra possui abrangência sobre o jogo, o brincar e o brinquedo, situados no contexto histórico e na diversidade cultural brasileira, explorando as potencialidades educativas nos âmbitos formais e informais. Permite compreender a essência da atividade lúdica e contribui para o fomento de políticas públicas legitimando à criança o direito de brincar.

O primeiro capítulo, denominado “Pesquisas sobre brinquedo no início do século XX”, aborda o estudo do lúdico e sua compreensão nos contextos político e educacional que instigaram os pesquisadores a identificar a preferência dos brinquedos entre crianças do ensino primário nas cidades de Belo Horizonte e de São Paulo. Investiga a relevância do brincar nesse período escolar, assim como as teorizações ali adotadas. Evidencia a imagem de uma criança imatura, em que o brincar está direcionado ao preparo e ou antecipação do futuro na ação lúdica, realidade ainda presente na contemporaneidade.

“Felicidade Guerreira: brincar no quilombo”, reflete a constituição histórica dos quilombos contemporâneos e destaca as formas de brincar que perpetuaram e se revelaram no cotidiano de seus habitantes e na escola. Através do estudo de caso etnográfico, evidencia a necessidade de redimensionar os currículos, ainda em formato tradicional – único e padronizado – e reitera a potencialidade do brincar, do lúdico, considerando-os processos dinâmicos e importantes para a preservação da História e da Cultura, ao mesmo tempo em que as transforma e as reinventa.

O texto, “Jogos de tabuleiro: análise na perspectiva histórica”, foca a origem dos jogos. Utiliza dois jogos de tabuleiros numa versão (posteriormente industrializada, mas mantendo sua originalidade) de jogos indianos que visavam o ensino de valores e crenças espirituais da cultura hindu, identificando e analisando sua materialidade (peças do tabuleiro) e imaterialidade (figuras representativas de diferentes sentimentos e situações habituais), os quais imitam diferentes gestos da vida diária, emergindo representações e significações contextualizadas, além de permitir apropriar-se de elementos legíveis do real e imaginário das sociedades de origem desses jogos.

O quarto capítulo, “O lúdico na época de Anchieta”, se apropria de documentos da época como cartas jesuíticas, gravuras e escritos de viajantes, pautando sua análise acerca dos jogos no Renascimento, na Igreja e na Companhia de Jesus. Embora nesse período as crianças fossem consideradas tábulas rasas, Anchieta procurou compreender os indígenas e propôs que os conhecimentos formais fossem vivenciados por meio de jogos educativos, apropriando-se de uma metodologia ativa que não rompesse com os seus hábitos, costumes, língua, rituais e crenças.

“O brincar na formação inicial de pedagogos”, apresenta um estudo de caso envolvendo o desenrolar de um processo de formação com 57 discentes do curso de Pedagogia, os quais puderam analisar a importância do brincar no aprendizado infantil, abrangendo as concepções e fundamentações teóricas, a relevância das escolhas institucionais, além da utilização dos materiais junto às crianças. A experiência proporcionou aos discentes compreender a relação entre a teoria e a prática vivenciada durante os momentos formais (entrevistas) e os informais (jogos, oficinas e conversas).

“Brincar: oportunidade lúdica nos tempos livres da criança?” mostra a escassez de tempo livre destinado às brincadeiras espontâneas, além da crescente institucionalização da criança. Com base em estudo de caso de orientação etnográfica, a pesquisa foi realizada em jardins de infância estatais, os quais possuem horários prolongados, entendidos como tempo pós-letivo ou tempo livre da criança – após o término da aula – constatou que esses prolongamentos de horários não oportunizam o brincar espontâneo, pois priorizam as atividades convencionais.

No sétimo capítulo, a investigação denominada “Brinquedos e gênero na Educação Infantil: estudo etnográfico”, objetivou identificar, segundo a perspectiva foucaultiana, as diferentes formas de representação de gênero produzidas no contexto da Educação Infantil. Destaca que uma vez (re)conhecendo-as há a possibilidade de desconstruir o fomento de discriminações. Evidencia que os corpos vão sendo disciplinados e condicionados, como bonecas serem destinadas apenas às meninas e carrinhos aos meninos.

“O lúdico e a emergência da literacia em creche”, é uma investigação-ação sobre a criança, com vistas a garantia de produção de novos conhecimentos, assim como a transformação dos envolvidos nesse processo de escolarização. Discute os efeitos do brincar na emergência da literacia, a partir da criação de ambientes educativos em que seja reconhecida a participação ativa da criança. Revela que ao brincar as crianças fazem inúmeras descobertas e desde a mais tenra idade têm contato com a linguagem escrita e se apropriam desta para efeitos de comunicação.

O nono capítulo “Mukashi banashi: narrativas antigas japonesas e transmissão cultural”, investiga a transmissão das narrativas infantis entre os membros de famílias nikkeis de Mogi das Cruzes/SP. A investigação possibilitou uma análise mais apurada da transmissão dos mukashi banashi, que são histórias infantis difundidas oralmente pelas gerações, concluindo que está enfraquecido pelo advento da modernidade e irrelevância exposta frente ao grupo investigado.

O último capítulo “Classificações de objetos lúdicos: sistema COL na brinquedoteca”, trouxe estudos que tratam da investigação dos usos dos sistemas de classificação de objetos lúdicos e sua aplicabilidade no contexto das bibliotecas, brinquedotecas ou centros comprometidos com a cultura lúdica.

Concluímos que o livro permite reflexões oportunas sobre a essência da cultura lúdica, possibilitando ampla visão da natureza do jogo, do brincar e do brinquedo, assim como seu potencial educativo nos diferentes espaços da educação formal e informal. Constitui-se referência para outros trabalhos que desejam difundir e aprofundar a discussão sobre essa temática, além de direcionar possíveis e necessárias mudanças que envolvam as políticas públicas. Indicamos a leitura da obra, pois traz à tona apontamentos que nos instigam a continuar no propósito da defesa de uma Educação Infantil que possa ser reinventada a partir da compreensão da essência da atividade lúdica.

Referência

KISHIMOTO, T. M.; SANTOS, M. W. (org.). Jogos e brincadeiras: tempos, espaços e diversidade (Pesquisa em Educação). São Paulo: Cortez, 2016.

Autor notes

Wagner Wey Moreira – Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Departamento de Ciências do Esporte. Av. Getulio Guaritá, 159, Abadia. CEP: 38025440. Uberaba, Minas Gerais, Brasil.

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