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INOVAÇÃO, APRENDIZAGEM E COOPERAÇÃO NA CADEIA DE SUPRIMENTO TÊXTIL DA REGIÃO DE AMERICANA/SP
Marcos de Carvalho Dias
Marcos de Carvalho Dias
INOVAÇÃO, APRENDIZAGEM E COOPERAÇÃO NA CADEIA DE SUPRIMENTO TÊXTIL DA REGIÃO DE AMERICANA/SP
INNOVATION, LEARNING AND COOPERATION IN THE TEXTILE SUPPLY CHAIN FROM THE REGION OF AMERICANA/SP
Gestão e Regionalidade, vol. 34, núm. 100, pp. 127-144, 2018
Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS
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RESUMO: As abordagens que tratam da cooperação entre empresas numa cadeia de suprimentos geralmente consideram os aspectos benéficos desta cooperação, como ganhos de competitividade e produtividade, porém não consideram o fato de que as relações de cooperação ocorrem de forma assimétrica na cadeia, devido à heterogeneidade dos participantes. Com objetivo de analisar cooperação, aprendizagem e processos de inovação em uma cadeia cujo relacionamento é reconhecidamente assimétrico e que o grau de competitividade tem se acirrado nos últimos anos, como no caso da indústria têxtil brasileira, este trabalho foi realizado a partir de entrevistas, baseadas em questionários, com 14 empresas têxteis da região de Americana/SP. Essas entrevistas mostraram a existência de relações superficiais de cooperação entre os membros da cadeia entrevistados, e que essa forma de cooperação implica a inexistência de um processo sistemático e coordenado de aquisição de conhecimento e, por consequência, de inovações tecnológicas e organizacionais entre as empresas.

Palavras chave: InovaçãoInovação,aprendizagemaprendizagem,cooperaçãocooperação,indústria têxtilindústria têxtil.

ABSTRACT: Approaches that deal with cooperation among companies in a supply chain generally consider the beneficial aspects of this cooperation, such as gains in competitiveness and productivity, but do not consider the fact that the cooperative relations occur asymmetrically in the chain, due to the heterogeneity of the participants. In order to analyze the cooperation, learning and innovation processes in a chain whose relationship is known as asymmetrical and that the degree of competitiveness has increased in recent years, as in the case of the Brazilian textile industry, this work was based on interviews with 14 textile companies from Americana region, São Paulo, Brazil. These interviews showed the existence of superficial relations of cooperation among the members of the chain interviewed, and that this form of cooperation implies in the inexistence of a systematic and coordinated process of knowledge acquisition by companies and, consequently, of technological and organizational innovations.

Keywords: Innovation, learning, cooperation, textile industry.

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INOVAÇÃO, APRENDIZAGEM E COOPERAÇÃO NA CADEIA DE SUPRIMENTO TÊXTIL DA REGIÃO DE AMERICANA/SP

INNOVATION, LEARNING AND COOPERATION IN THE TEXTILE SUPPLY CHAIN FROM THE REGION OF AMERICANA/SP

Marcos de Carvalho Dias
Faculdade de Tecnologia de Americana, Brasil
Gestão e Regionalidade, vol. 34, núm. 100, pp. 127-144, 2018
Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS

Recepção: 29 Setembro 2015

Aprovação: 18 Agosto 2017

1. INTRODUÇÃO

A cooperação entre empresas que compõem uma cadeia de suprimento tem sido explorada na literatura, principalmente nas áreas de organização industrial, de administração e de engenharia de produção.

Tais abordagens em geral consideram o aspecto benéfico desta cooperação, pois resulta no aumento da competitividade e pode ultrapassar, inclusive, o aspecto mercadológico, pois permite a inclusão de ações que permitem o aumento do processo de aprendizagem e no surgimento de inovações de produtos e processos no âmbito interno das empresas componentes. Apesar disso, essas abordagens geralmente negligenciam o fato de que as relações de cooperação ocorrem de forma assimétrica na cadeia, devido à heterogeneidade dos componentes.

Assim, em redes verticais de cooperação, como é o caso das cadeias de suprimento, por exemplo, a força tecnológica de grandes fornecedores, por um lado, e a força mercadológica de grandes empresas varejistas, por outro, podem levar as pequenas empresas, que executam atividades intermediárias, a uma posição desfavorável quanto à apropriação dos benefícios da cooperação.

É a partir dessas observações gerais sobre a cooperação em cadeias de suprimento que surgiu o questionamento-base deste artigo: como ocorrem as relações de cooperação e quais as consequências para a inovação e aprendizagem em cadeias cujo relacionamento é reconhecidamente assimétrico e o grau de competitividade tem se acirrado nos últimos anos, como no caso da indústria têxtil brasileira?

Para responder tal questionamento, este artigo possui como objetivo principal avaliar a forma de relacionamento entre membros de uma cadeia de suprimentos têxtil na região de Americana/SP, e de que forma este relacionamento permite a transmissão e apropriação de conhecimento (tácito e explícito) e a adoção de inovações tecnológicas e organizacionais entre as empresas da cadeia.

O método utilizado para a realização da pesquisa foi, além da revisão bibliográfica dos temas abordados, uma sondagem baseada na aplicação de um questionário, em parceria com o sindicato patronal do setor na região (Sinditec), que contribui com a indicação das empresas e avaliação prévia do questionário antes da aplicação nas empresas selecionadas.

A realização deste trabalho é justificada pela importância histórica da indústria têxtil na região de Americana, pois representa a atividade produtiva em torno da qual as cidades da região se desenvolveram. Além disso, tal segmento produtivo possui importância econômica por ser uma das principais atividades produtivas na geração de emprego e renda em algumas destas cidades.

Assim sendo, as transformações pelas quais esta indústria tem passado afetam diretamente a dinâmica social e econômica da região, e abordar tais transformações em pesquisa representa uma forma de contribuição para o debate sobre os caminhos a serem tomados pela indústria têxtil regional.

2. INOVAÇÃO, COOPERAÇÃO E APRENDIZAGEM

A inovação tecnológica realizada pelas empresas representa uma das principais condições para o estabelecimento de níveis de competitividade no mercado.

Originário da Ciência Econômica, assim como os conceitos de competitividade e desenvolvimento, o conceito de inovação passou por transformações e foi adotado por diversas correntes teóricas e por várias linhas de pensamento nas muitas áreas do conhecimento, como Administração, Engenharia, Sociologia, História, Filosofia, entre outras (TIGRE, 2006).

Nestas áreas a inovação passou a ter diversas abordagens, como a que trata do processo inovador, dos contextos organizacionais, dos atributos da inovação e das perspectivas teóricas subjacentes (WOLFE, 1994).

Porém, tais variações resultam da releitura e reinterpretação do conceito estabelecido por Joseph Alois Schumpeter, introduzido em sua obra em 1911, visando distinguir noções de invenção, ligado à técnica, e a criação de novos produtos com fins econômicos (produção e comercialização), e de forma geral as definições do conceito de inovação que se aproximam desta concepção.

No Manual de Frascati (OCDE, 2002/2007), a inovação é definida como a criação de um produto, processo, serviço, sistema ou método novos ou substancialmente melhorados pela empresa, inserido no mercado com êxito, sendo resultado de diversas atividades científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras, comerciais e mercadológicas.

Posteriormente este conceito foi aprimorado no Manual de Oslo (OCDE, 2005), que considera a inovação como a implementação de um bem ou serviço significativamente melhorado, ou um novo método de marketing organizacional.

Dessa forma, ambas as definições se referem às inovações no âmbito da empresa e de suas relações com o mercado, ou vistas como um processo que se desenvolve economicamente de forma endógena. Isso porque a inovação é considerada, no caso destes Manuais, como resultado da interação das empresas com as atividades desempenhadas “a jusante” (ligadas aos clientes) e “a montante” (ligadas a fornecedores), sendo o conhecimento do qual se originam as inovações resultado das interações ocorridas no sistema econômico, e não fora dele. Por isso, as empresas desempenham um papel determinante no processo de inovação.

Para Nelson e Rosenberg (1993, p. 3), a inovação possui um sentido mais amplo e engloba o processo pelo qual as firmas “criam e colocam em prática produtos, projetos e processos de manufatura”. Portanto, a inovação se refere a um processo de mudança tecnológica direcionado à comercialização de produtos e serviços, além da difusão do novo produto ou processo no sistema econômico. Ou seja, estes autores consideram que o conceito de inovação vai além da concepção de um novo produto ou processo, incorporando também a difusão de algo novo, ou seja, sua disponibilidade no mercado ou utilização na produção. Isso significa, para esses autores, que uma empresa inovadora é aquela que comercializa um novo produto ou utiliza um novo processo produtivo, ambos por primeira vez, sejam estes novos ou não para seus concorrentes ou utilizadores (KIM; NELSON, 2005).

Para Edquist (2001), a inovação tecnológica corresponde à criação de novos produtos ou serviços com significado econômico (passíveis de serem comercializados visando à obtenção de lucro) e, geralmente, realizados pelas firmas ou indivíduos.

Archibugi e Lundvall (2001) apresentam uma definição mais ampla do conceito de inovação tecnológica, ao apontar as origens do processo de inovação tecnológica em empresas e instituições como resultado de um processo complexo de aprendizagem acumulada, e que resulta na criação de novos conhecimentos ou no melhoramento de conhecimentos já existentes. Os autores consideram o processo de aprendizagem como elemento fundamentalmente interativo e cumulativo e essencial para o processo inovativo nas empresas.

De qualquer forma, existe consenso entre autores, como Dosi (1988), Lundvall (1988) e Edquist (1997), ao afirmarem que o conceito de inovação possui um significado econômico, normalmente resultado das ações realizadas pelas empresas, em alguns casos, por indivíduos. A capacidade de empresas e instituições de interpretar o mercado representa um dos principais elementos da inovação tecnológica, correspondendo à possibilidade de identificar os principais desejos dos consumidores em potencial, o que permite a introdução de novos produtos e processos para satisfazer tais necessidades (NELSON, 1994).

Portanto, as atividades inovativas resultam do comportamento das firmas em mapear as oportunidades existentes no mercado e aproveitá-las por meio da criação de novos produtos, serviços, processos ou modelos de negócio. Tais atividades inovativas estão ligadas à capacidade das firmas em utilizar o conhecimento existente internamente ou de fontes externas por meio da imitação, aquisições ou licenciamento (KYLÄHEIKO et al., 2011).

Outra forma de constituição de um processo inovativo pelas empresas ocorre por meio do estabelecimento de relações de cooperação produtiva entre empresas que, de forma geral, concentram suas atividades produtivas em segmentos complementares entre si, como as que compõem uma cadeia produtiva, e que podem resultar na troca de informações e ideias que se consolidarão em um processo de aprendizagem tecnológica (PENROSE, 2006).

Lööf (2000) aponta que os atuais processos de inovação tecnológica se caracterizam por ser crescentemente complexos e interdependentes entre os diferentes atores que os realizam, e que os diversos obstáculos existentes na busca pela inovação pelas empresas podem ser superados no momento em que esta mesma empresa identifica suas próprias capacidades e fraquezas e, em seguida, os potenciais parceiros (fornecedores ou consumidores) que permitem a constituição de uma rede informal de distribuição de conhecimentos que podem resultar em inovações.

As abordagens sobre cooperação entre empresas em cadeias passaram a ganhar espaço a partir das tentativas de difusão do modelo japonês de produção, quando esse modelo passou a estabelecer um novo padrão de subcontratação entre empresas, com base no relacionamento de longo prazo e na cooperação entre os diversos componentes de uma cadeia produtiva. Esta cooperação não se baseava simplesmente no estabelecimento conjunto de quantidades a serem produzidas, dos preços e qualidades do produto. Além disso, tinha como foco central a redução dos estoques entre os elos da cadeia (FREEMAN, 2008).

Tal modelo produtivo propunha também a cooperação para a inovação entre as empresas da cadeia por meio do compartilhamento de conhecimento e do aprendizado durante a execução do processo produtivo, entre estas empresas.

Para Bessant, Kaplinsky e Lamming (2003), o entusiasmo dos gestores ocidentais por esse novo modelo produtivo resultou na criação de uma nova técnica gerencial: a gestão da cadeia de suprimento (Supply Chain Management).

Outra abordagem teórica sobre a cooperação em cadeias é a de autores como Lundvall (1992) e Freeman (1993), resultado da tentativa destes em entender o processo de inovação nas empresas que forma tais cadeias. Para estes autores, a inovação é o principal motor do desenvolvimento das empresas, e é resultado da interação entre elas no sentido de promover a aprendizagem por meio da implementação de processos e produtos que geram informações qualitativas e que são trocadas ao longo da cadeia.

Isso resulta num processo de aprendizagem interativa estabelecido entre os diversos agentes da cadeia, pois as rotinas promovidas durante os processos produtivos são compartilhadas e modificadas conjuntamente pelos agentes (PEREIRA; DATHEIN, 2012).

Assim, a aprendizagem no âmbito das relações interorganizacionais se constitui de arranjos institucionais que permitem uma organização eficiente das empresas no mercado, por meio da coordenação das ligações que são estabelecidas entre empresas independentes (AZEVEDO, 2011).

Do ponto de vista da aprendizagem e inovação, tais ligações podem ser de três níveis, distintos qualitativamente (FONTES, 2005): a) limitadas a um plano mercadológico; b) vinculadas à coordenação do processo produtivo; c) baseadas na troca de conhecimento e competências obtidos pelas empresas, permitindo o processo de inovação.

Porém, Freitag (2011) considera que tais relações de cooperação entre empresas componentes de uma cadeia pressupõem a existência de relações de confiança e lealdade entre estas, vinculadas aos padrões sociais, culturais e históricos, além do contexto regional em que estão inseridas. Isso porque, para esse autor, confiança e lealdade são atributos que, em oposição ao comportamento oportunista, assumem diversas dimensões em função do ambiente e da cultura gerencial de um país ou região.

Outro aspecto apontado em trabalhos que tratam da gestão de cadeias de empresas é o carácter assimétrico das relações de poder estabelecidas entre os membros da cadeia, gerando resultados insatisfatórios em termos de inovação. Tais assimetrias, conforme apontam Teixeira (2009) e Dias (2014), consistem nas relações de poder baseadas em maior poder financeiro ou em influência política de um dos membros dessa cadeia, por exemplo.

Assim, as relações de cooperação entre os membros de uma cadeia podem ser estabelecidas de forma polarizada, com a concentração de empresas que agregam maior valor ao produto final, por um lado, e, por outro por empresas que possuem pouco poder de barganha no mercado competindo por meio de preços baixos (TIGRE, 2006).

3. O CONCEITO DE CADEIA DE SUPRIMENTOS

Os processos produtivos de uma empresa não estão somente circunscritos aos seus limites, mas se iniciam e terminam fora dela com a escolha criteriosa dos parceiros externos (fornecedores e clientes) que irão contribuir com as etapas de produção e distribuição dos bens e serviços produzidos.

Por isso, muitas empresas buscam frequentemente se organizarem em redes integradas para realizarem, de forma ágil e eficiente, o fluxo de materiais, desde os fornecedores até os consumidores finais, controlando o fluxo de materiais e de informações de forma sincronizada.

Entre as organizações em rede de empresas, a formação de uma cadeia integrada de empresas autônomas e semiautônomas responsáveis pela produção e distribuição de um bem ou serviço ao cliente final objetiva controlar o fluxo de informações e de materiais visando obter benefícios em termos de velocidade, confiabilidade, flexibilidade, custos e qualidade em relação ao controle interno dos fluxos (SLACK et al., 2009). Essa forma de relacionamento entre empresas tem por objetivo maximizar os ganhos e reduzir os custos de produção, estabelecida dentro de um ambiente conhecido como cadeia de suprimentos.

Jacobs e Chase (2010) definem cadeias de suprimento como um conceito que considera a integração, de forma eficiente, de todos os componentes desta cadeia, ou seja, fornecedores, fabricantes, armazéns e lojas, no momento em que a mercadoria é produzida e distribuída em determinadas quantidades e enviada para os locais certos e na hora certa, a fim de minimizar os custos de todo o sistema, atendendo aos requisitos de nível de serviço satisfatórios. Tal conceito se refere ao conjunto de organizações interdependentes que atuam de forma conjunta para realizar o controle e a gestão do fluxo de bens e serviços desde sua origem até a entrega final ao consumidor, visando à satisfação deste último no menor custo possível.

Estes autores consideram ainda que o objetivo específico da cadeia de suprimento é permitir que sejam fornecidas as quantidades certas, no momento certo e pelos fornecedores certos, no menor custo possível. A integração de fornecedores, fabricantes, distribuidores e comerciantes de forma alinhada, formando um complexo empresarial virtual cujo foco é a obtenção de vantagens competitivas em relação aos concorrentes, por meio do melhor atendimento ao consumidor.

Já os objetivos derivados da gestão deste tipo de cadeia são: redução de estoques, elevação do nível (qualidade) dos serviços oferecidos aos clientes e constituição de vantagens competitivas de forma sustentável (COOPER; ELLRAM, 1993).

As cadeias de suprimento convencionais englobam todas as atividades intra e interempresariais de um conjunto de empresas que compartilham as atividades de aquisição de insumos, produção de bens ou serviços, transporte e entrega destes aos clientes (MAIOUX, 2000).

Assim, uma cadeia de suprimento aparece como um processo contínuo que inclui as tradicionais funções atribuídas a cada elemento da cadeia isoladamente. Por meio da integração das atividades logísticas de cada elemento ao longo da cadeia de suprimento, é possível evitar a ocorrência de duplicidade na cadeia, ou seja, dois ou mais elementos produzindo o mesmo tipo de bem ou serviço.

Porém, Carvalho (1996) adverte que a cadeia de suprimento não se refere simplesmente a um conjunto de elementos que realizam atividades sequenciais entre si, mas sim de uma rede de produtores que buscam chegar ao consumidor final com um bem ou serviço mais adequado às necessidades deste, ao mais baixo custo possível. Por isso, a competição não ocorre mais entre os membros de uma única cadeia, mas entre cadeias que produzem o mesmo bem ou serviço.

Ao descrever uma cadeia de suprimento convencional, Chopra e Meindl (2010) a dividem em etapas de acordo com o processo estabelecido durante a produção. Estas etapas são:

  • Planejamento: corresponde à necessidade de estabelecimento, pelas empresas componentes, de metas a serem atingidas a partir de critérios pré-determinados, que objetivem a visão integrada e ampla do ambiente em que está inserida. Isso é feito por meio do desenvolvimento de canais de distribuição e de compras, planejamento de estoques, de produção e de distribuição, planejamento de demanda, entre outras ações.

  • Compras: compreende ao processo de aquisição de matérias-primas e insumos por meio da seleção criteriosa de fornecedores e estabelecimento de contratos de negociação. Na atuação da empresa em redes e cadeias, o processo de compra não se limita somente ao ato de aquisição e monitoramento, mas também do controle estratégico dos custos, qualidade e prazo de entrega dos produtos.

  • Produção: processo pelo qual as matérias-primas e insumos são transformados em bens e serviços finais. Tais processos podem ser o de produção contínua (make to stock), sendo uma parte da produção armazenada para atender às oscilações do mercado, ou de produção por encomenda (make to order), sendo as matérias-primas e insumos armazenados e utilizados quando ocorre o recebimento do pedido.

  • Distribuição: corresponde ao movimento do bem ou serviço do produtor ao consumidor final. Nesta etapa são realizadas ações como gestão e controle de estoque, manuseio de materiais ou produtos acabados, transporte, armazenagem, administração de pedidos, análises de locais e rede de distribuição, e objetiva basicamente a redução dos custos e o aumento da competitividade do produto final.

3.1. A cadeia de suprimentos têxtil tradicional

A cadeia produtiva é vista como uma rede de trabalho e processos de produção cujo resultado é um produto acabado. Processos específicos dentro de uma cadeia produtiva são representados como “nós” interligados em redes.

A cadeia produtiva têxtil tradicional engloba a produção de fios e filamentos, manufaturados têxteis – tecidos ou malhas e tingimento ou estampagem – (LA ROVERE; HASENCLEVER; MELO, 2001), e pode ser dividida em segmentos industriais: fiação, tecelagem e acabamento.

Conforme Cruz-Moreira (2003), estas atividades podem ser realizadas de maneira separada, ou seja, uma planta produtiva executa somente uma parte do processo (fiação, por exemplo), ou de forma integrada, em que uma planta executa várias etapas do processo (tecelagem e acabamento de tecidos).

A atuação de uma mesma firma em dois ou mais segmentos da cadeia pode ser explicada por problemas de fornecimento de matérias-primas, produtos ou serviços, e também por necessidades financeiras ou busca do aumento da competitividade, pois a integração produtiva pode resultar em redução nos custos devido aos ganhos obtidos com a maximização dos recursos disponíveis, como instalações e mão de obra.

Assim, o resultado final de cada etapa constitui o insumo principal da seguinte, como está demonstrado na Figura 1, que representa a forma do processo produtivo têxtil.


Figura 1
– A cadeia têxtil tradicional
Fonte: IEMI (2009).

O complexo têxtil, por sua vez, constitui o núcleo de uma cadeia produtiva ao qual estão associados segmentos de outros setores industriais, como o químico, o agroindustrial, o de máquinas e equipamentos, entre outros, que estão ligados à cadeia como fornecedores de matérias-primas, insumos e máquinas.

Quanto às etapas que compõem a produção da cadeia têxtil, são caracterizadas da seguinte forma:

  • Fiação: corresponde à produção de fios naturais, artificiais ou sintéticos, a partir da matéria-prima bruta. As fibras naturais são obtidas a partir do beneficiamento de produtos de origem animal (seda e lã), mineral (amianto) e vegetal (algodão, linho, juta, rami etc.). Já as fibras artificiais são obtidas por meio da regeneração da celulose natural, resultando em fibras, como viscose, acetato e triacetato. As fibras sintéticas são derivadas de subprodutos do petróleo e dão origem a fios, como poliéster, náilon, acrílico e polipropileno.

  • Tecelagem/malharia: compreende à produção de tecidos planos (tecelagem) ou malhas (malharia), que é resultado do entrelaçamento de conjuntos de fios, fornecidos pela fiação, realizados por um tear. Ao contrário da fiação, a tecelagem possibilita o ingresso de micro e pequenas empresas na indústria. O tear, por si só, é uma unidade produtiva independente, logo o aumento de produção é consequência da agregação de um maior número de teares.

  • Acabamento: corresponde a um conjunto de operações visando beneficiar o tecido cru, tornando-o confortável, durável e maleável, adequado ao uso pelo segmento de confecção. Tal processo não é uniforme, sendo variável de acordo com as características que se pretende obter do tecido, utilizando as várias formas de acabamento existentes por meio da realização de combinações entre as várias etapas que compõem o processo.

Portanto, de forma geral, as empresas que compõem esta cadeia são de baixa tecnologia, não havendo fortes barreiras à entrada, pois a tecnologia é difundida e disponível no mercado mundial. Entre as empresas líderes dos diferentes países, não há um distanciamento tecnológico radical. Por essa razão, os dois insumos do processo produtivo – mão de obra e matéria-prima – desempenham um papel crucial na definição da competitividade dessa indústria (RANGEL, 2008).

4. A REGIÃO TÊXTIL DE AMERICANA/SP

A região conhecida como “região têxtil de Americana” corresponde a um conjunto de municípios interligados, localizado a leste do estado de São Paulo e distante aproximadamente 120 km da capital entre os municípios de Piracicaba e Campinas, do qual fazem parte os seguintes municípios: Americana, Santa Bárbara d’Oeste, Nova Odessa e Sumaré, conforme informações na Figura 2:


Figura 2
– Localização da região têxtil de Americana/SP
Fonte: Elaborado pelo autor, 2015, adaptado de Google Maps.

Essa região possuía em 2010 uma população em torno de aproximadamente 683 mil habitantes em um território de aproximadamente 988 km2. Caracteriza-se por ser um importante polo industrial do estado, devido à quantidade e diversidade de empresas localizadas na região. Além da indústria têxtil, possui também importantes empresas da indústria automobilística, metal-mecânica, autopeças, borracha, química, entre outras (IBGE, 2012).

O surgimento e desenvolvimento da indústria têxtil se confundem com a própria história da região, havendo, portanto, uma ligação entre o desempenho desta indústria e o comportamento socioeconômico regional.

A primeira planta têxtil na região foi criada após a chegada dos imigrantes norte-americanos no final do século XIX. Em 1880, o imigrante norte-americano Clement Wilmont instalou na então Vila Americana uma unidade produtiva de fiação e tecelagem de tecidos de algodão, com máquinas e equipamentos importados da Europa. Esta unidade, denominada “Carioba”, ou “pano branco” em tupi-guarani, consistia em uma planta têxtil com todas as etapas incorporadas, desde a produção do fio até a produção e acabamento de tecidos de algodão (IBGE, 2001).

Na primeira década do século XX, com o crescimento da produção e a modernização da empresa, alguns trabalhadores adquirem máquinas antigas vendidas por ela e passam a produzir em casa os mesmos tecidos produzidos na fábrica, passando, depois de alguns anos, a produzir como terceirizados. Surge, a partir de então, um conjunto de pequenas empresas ligadas à Têxtil Carioba e que se tornou, nas décadas seguintes, empresas independentes originando a aglomeração têxtil atual.

De acordo com Bryan (1971), a região já se consolidava na década de 1920 como um aglomerado industrial na região, onde se encontrava instalada uma rede de produtores têxteis, além de mão de obra especializada na produção de tecidos. A partir de então, estas empresas passaram a fornecer tecidos para diversas regiões do estado e do país.

Na década de 1950, a região passou a se adaptar às novas condições impostas pelo mercado internacional: a produção de tecidos sintéticos. Isso se deu pela instalação, no município de Americana, de uma fábrica de fios sintéticos, que passou a fornecer o produto para as empresas da região.

Neste mesmo período ocorre também a instalação, no município, da primeira fábrica de máquinas e equipamentos têxteis, o que incentivou a instalação de diversas outras empresas têxteis na região. A disponibilidade de teares mais modernos e produtivos permitiu a substituição das máquinas obsoletas pelos produtores têxteis locais, sendo estas máquinas adquiridas por outros produtores autônomos terceirizados, dando início a uma terceira onda de crescimento da produção têxtil na região (RODRIGUES, 1978).

Desta forma, a concentração e a especialização produtiva, a divisão técnica de trabalho e o aumento do nível de renda real na região resultaram no aumento da demanda por bens de consumo não duráveis e de serviços. Isso resultou na expansão do número de empresas de prestação de serviços, comerciais e de recreação.

No início da década de 1990, com a maior participação dos países asiáticos na comercialização de produtos têxteis acompanhado das medidas adotadas pelo governo federal (governo Collor), representadas principalmente pela redução das tarifas de importação de bens, esse novo cenário internacional resultou na alteração da estrutura produtiva da cadeia têxtil nacional.

Na região têxtil de Americana, isso resultou na demissão em massa de trabalhadores devido ao fechamento de plantas produtivas ou, no caso das empresas que se mantiveram no mercado, da substituição técnica do trabalhador por novas máquinas e equipamentos com o objetivo de aumentar a produtividade e a competitividade diante dos produtores asiáticos (DIAS, 1999).

No início da década de 1990, a região possuía cerca de 1.480 empresas têxteis, com um total de aproximadamente 31 mil trabalhadores. Ao final desta mesma década, o número de empresas têxteis era de 620, e o de trabalhadores contratados era de aproximadamente 13.400 (Ibidem). Tais dados mostram que houve uma redução, neste período, de aproximadamente 58% do número de empresas e do total de trabalhadores empregados no setor têxtil regional.

Durante a década de 2000-2010, ocorre uma retomada na produção e no emprego nas indústrias têxteis da região, notadamente devido ao aumento da renda e do consumo nacional.

Em 2014 a região possuía 1.779 indústrias têxteis, que compunham todos os segmentos da cadeia produtiva, empregando cerca de 31.100 trabalhadores, o que representava 15,6% do total de trabalhadores formais da região, e aproximadamente 5,4% do total de estabelecimentos, conforme informações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE, 2015) presentes na Tabela 1.

Tabela 1
– Região têxtil de Americana: total de trabalhadores e empreendimentos têxteis em 2014 (em unidades)


Isso mostra que o setor têxtil ainda possui grande importância na região como principal segmento produtivo da indústria de transformação, representando o principal segmento empregador de mão de obra da região.

5. A PESQUISA NAS EMPRESAS DA REGIÃO

São apresentados a seguir os principais aspectos da pesquisa realizada nas empresas têxteis da região de Americana, as características da amostra, a metodologia utilizada e os resultados obtidos na pesquisa.

5.1. Características da amostra pesquisada

A pesquisa foi realizada no segundo semestre de 2014 em 12 empresas que compõem a cadeia têxtil na região de Americana, sendo 2 empresas de fiação, 8 empresas de tecelagem e 2 de acabamento. Quanto à localização, a maioria se encontra instalada no município de Americana (10) e 1 em Nova Odessa e 1 em Santa Bárbara d’Oeste.

As empresas pesquisadas foram indicadas pelo sindicato têxtil patronal na região, que apresentou uma relação de 268 empresas, sendo deste universo selecionada a amostra da pesquisa. Não foram estabelecidos critérios para a escolha desta amostra a partir do universo apresentado, sendo a única condição a de pertencerem a uma mesma cadeia e estabelecerem relações de produção entre si.

As principais características desta amostra estão apresentadas no Quadro 1, com a omissão dos nomes das respectivas empresas por exigência dos entrevistados. Estes nomes foram substituídos pelas letras iniciais dos segmentos da cadeia têxtil em que estas empresas estão localizadas (“F” de fiação, “T” de tecelagem e “A” de acabamento).

Quadro 1
– Características da amostra pesquisada


Considerando tais características das empresas pesquisadas neste estudo, são apresentadas na Figura 3 o posicionamento dessas empresas na cadeia têxtil pesquisada.


Figura 3
– Posição das empresas pesquisadas na cadeia produtiva
Fonte: O autor, a partir da pesquisa realizada.

5.2. Metodologia utilizada

A pesquisa foi realizada por meio de entrevistas com responsáveis administrativos (proprietários ou gerentes) das empresas da amostra escolhida, baseadas em um questionário com questões abertas previamente definidas, que tratavam das relações entre empresas da cadeia, as atividades de cooperação produtiva e como isso resultava em processos de aprendizado e inovação tecnológica. Algumas das entrevistas foram realizadas in loco (8 empresas), outras por meio de correio eletrônico (2 empresas) e por meio telefônico (2 empresas).

5.3. Resultados da pesquisa

Os resultados obtidos a partir das entrevistas realizadas nas empresas da amostra são relatados a seguir:

5.3.1. Cooperação

As relações estabelecidas entre as empresas da amostra se caracterizam basicamente por ser de cooperação produtiva entre empresas. A maioria das empresas pesquisadas (80%) declarou a existência desse tipo de relacionamento e considerou isso importante para a obtenção de vantagens competitivas em relação aos concorrentes no mercado.

As duas empresas de fiação pesquisadas (F1 e F2) declararam que as ações de cooperação são estabelecidas principalmente com as empresas de tecelagem (T1 à T8), pela necessidade de desenvolver novos produtos, que são testados por essas tecelagens antes de serem lançados no mercado. Os entrevistados das fiações declararam que esse procedimento é realizado não somente com as tecelagens da amostra, mas também com diversas outras tecelagens da região, sendo parte da política mercadológica de suas empresas.

Conforme declaração do entrevistado da empresa de fiação F1, quando a empresa lança um novo tipo de produto no mercado, é feito um teste preliminar nas tecelagens que são seus clientes, para verificar a viabilidade e o comportamento do produto durante o processo produtivo.

Tal relacionamento de cooperação produtiva entre as empresas é realizado, conforme o entrevistado, de maneira informal sem nenhum contrato ou documento que regularize estas relações de cooperação. Ao ser questionado se era estabelecido algum tipo de contrato formal entre a fiação e as tecelagens, esse entrevistado apontou que em muitos casos os acordos para os testes de produtos são feitos por telefone ou e-mail diretamente com os responsáveis pela produção na tecelagem. Quando a pessoa aceita realizar o teste proposto, os produtos são, então, enviados pela fiação para serem testados na tecelagem.

Essa relação de cooperação entre as empresas de fiação e as tecelagens resulta, entretanto, em vantagens produtivas para as primeiras, principalmente no aspecto financeiro, pois as atividades desenvolvidas em conjunto permitem a redução de alguns custos operacionais decorrentes dos testes realizados, como os de devolução futura de produtos sem conformidade. Isso foi percebido no relato do entrevistado das empresas F2, para quem os testes são importantes para a empresa porque evitam o desperdício de material, e assim o desperdício de dinheiro, pois, quando a tecelagem faz os testes nos teares das tecelagens clientes, ela antecipa vários defeitos e problemas na produção do tecido, que só seriam observados posteriormente, quando a empresa já havia colocado o produto no mercado.

As empresas de tecelagem declararam que os testes realizados pelas fiações são a única forma de cooperação produtiva estabelecida entre estes membros da cadeia, e que é a partir dos novos fios fornecidos pelas elas que surgem as oportunidades de desenvolvimento de novos produtos, como tecidos com novos desenhos e novas combinações de fios. As empresas alegaram que geralmente os fios são entregues, na produção, aos cuidados de um responsável pela programação, com as especificações para a utilização do produto, e que nenhum engenheiro ou técnico da empresa de fiação acompanha os testes realizados, limitando-se somente a solicitar posteriormente um relatório simples sobre o comportamento do novo fio.

As empresas de acabamento da amostra declararam que promovem ações de cooperação na cadeia, principalmente com as empresas do segmento anterior, as tecelagens. Tal relação de cooperação ocorre por meio de modificações nos aspectos técnicos dos produtos, nas estampas e nas cores utilizadas no processo de acabamento do tecido cru. Esse fato foi relatado por um dos entrevistados das empresas de acabamento (A1), ao declarar que as tecelagens enviam para a empresa o tecido e, muitas vezes, sugerem uma nova estampa ou um novo tratamento, sendo a solicitação enviada ao departamento técnico, que analisa a possibilidade de atendê-la, e caso isso seja possível, a tecelagem é comunicada sobre os testes de um novo acabamento.

Porém, da mesma forma que a relação entre as empresas de fiação e as de tecelagem, as relações entre as empresas de acabamento ocorrem superficialmente, limitando-se à troca de comunicados e de relatórios de operações realizados na produção. Inexiste, portanto, entre as empresas de tecelagem e de acabamento, um processo regular e coordenado de cooperação produtiva, sendo este processo de cooperação eventual e pontual, relacionado às necessidades específicas da produção em determinado momento.

Além disso, as empresas alegaram, nas entrevistas, estabelecer relações de cooperação técnica com outros fornecedores fora da cadeia têxtil, principalmente as empresas fornecedoras de produtos químicos, por meio de testes de novos produtos no processo produtivo.

5.3.2. Aprendizagem

A natureza das relações estabelecidas entre os membros da cadeia têxtil pesquisada indica as implicações destas relações para a constituição de um processo de aprendizagem tecnológica entre estes membros. Nesse sentido, todas as empresas pesquisadas declararam que essas relações se baseiam em visitas eventuais aos seus fornecedores e clientes, sendo pontual a troca de informações técnicas, limitando-se à resolução de problemas específicos.

No caso da cooperação técnica entre a fiação e a tecelagem para teste de um novo produto, a troca de informações é feita por um técnico ou engenheiro da fiação com outro técnico da tecelagem, sendo que o primeiro limita-se a discutir aspectos pontuais do produto e a solicitar informações específicas, que, por sua vez, são repassadas, também de forma pontual e específica, pelo segundo.

Conforme declarações do entrevistado da empresa F1, durante o processo de cooperação técnica, as informações repassadas à tecelagem são superficiais, e não é dado nenhum treinamento ou qualificação anterior para que os operadores da tecelagem possam fazer os testes com o produto (fio têxtil) enviado. Ele mencionou que nunca houve interesse da tecelagem e nem da fiação em repassar informações ou treinar os trabalhadores da tecelagem e que algum tipo de conhecimento somente é repassado para as tecelagens pela fiação caso haja alguma solicitação ou iniciativa da primeira.

Essas declarações foram confirmadas pelas empresas de tecelagem, mencionando que as informações e discussões realizadas com os profissionais das fiações não permitem, num primeiro momento, a absorção de conhecimento mais aprofundado sobre novas formas de aplicação do fio na produção, além daquela sugerida pela empresa fornecedora.

Tanto o entrevistado da empresa T2 quanto o da empresa T6 declaram que não é possível, com as informações repassadas pela fiação, gerar conhecimento que possa ser replicado nas empresas, por meio da utilização em outros produtos ou mesmo desenvolver novos tecidos que tenham como base a matéria-prima fornecida pela fiação.

Isso também ocorre no relacionamento entre as empresas de tecelagem e as de acabamento, cuja cooperação técnica se resume à troca de informações sobre aspectos relacionados ao acabamento do tecido, como a cor do desenho e padronagem (tipo de desenho).

O entrevistado da empresa de acabamento A2 declarou que a troca de informações entre a empresa e as tecelagens em relação aos novos padrões a ser adotados nos tecidos se limitam ao envio do desenho a ser estampado ou às novas cores a serem utilizadas no tingimento e que nenhum acompanhamento é feito durante o processo de acabamento do tecido. Os técnicos da tecelagem repassam poucas informações que possibilitem a adoção de novas formas de produção ou de novos produtos, pois não existe a troca de conhecimento entre os técnicos destas empresas.

Percebe-se, portanto, que não existe um processo sistemático de transmissão de conhecimento (tácito ou explícito) nas relações de cooperação técnica entre as empresas que compõem a cadeia têxtil pesquisada.

5.3.3. Inovação

O caráter superficial das relações de cooperação resulta, portanto, da falta do estabelecimento de um processo de aprendizagem, que culmina na inexistência de inovações resultantes da cooperação entre as empresas da cadeia têxtil.

As poucas inovações promovidas pelas empresas pesquisadas originaram, conforme mencionado anteriormente, de esforços tecnológicos internos da empresa e de conhecimento adquirido em ambientes externos ao da cadeia, como instituições de ensino e pesquisa frequentados por funcionários durante a realização de cursos formais técnicos ou tecnológicos, ou feiras e eventos em que amostras de novos produtos são obtidas e depois copiadas.

Outro aspecto percebido durante as entrevistas e já mencionado em trabalhos anteriores sobre a cadeia produtiva têxtil (GIBBON, 2001; GEREFFI; MEMEDOVIC, 2003) é que as inovações na cadeia geralmente são introduzidas pelas empresas de fiação (principal fornecedor de matéria-prima), que são empresas de grande porte, e algumas multinacionais, e que por isso coordenam a cadeia. Esse fato é explicado, segundo Viana, Barros Neto e Añez (2014), pelos ganhos financeiros e tecnológicos resultantes da cooperação em cadeias de suprimentos que são influenciados pela existência de assimetrias na coordenação destas, resultado das diferenças de capacitação, recursos financeiros e tamanho dos agentes participantes.

Conforme apontou o entrevistado da empresa F2, as operações a serem realizadas pela tecelagem, quando da realização de teste de algum produto, são previamente determinadas pela fiação, e não cabe à tecelagem a adoção de novas formas de realização do processo ou a introdução de novos produtos na produção de tecido a partir do fio fornecido pela fiação. Ele citou o caso de testes que a empresa fez com um novo fio um pouco mais espesso e com um número de torção diferente do convencional (o que mostra uma inovação incremental em um produto já existente no mercado), e que os testes com este novo fio têm sido feitos em duas tecelagens da região, cujas informações sobre os procedimentos durante o processo de produção do tecido foram previamente combinados com os técnicos das empresas.

As inovações nas tecelagens são resultado, geralmente, da ação de um técnico ou tecnólogo têxtil a partir de um processo de tentativa e erro, com base em conhecimentos deste profissional adquiridos nos cursos realizados externamente. Um exemplo é a declaração do entrevistado da empresa T3, que apontou uma situação em que determinado tipo de fio que havia sido enviado para a realização de testes pela empresa de fiação F1 foi aplicado pelo tecnólogo da empresa na produção de outro tecido, a partir da mistura com outro fio de composição diferente, dando origem a um outro tipo de tecido que foi muito aceito pelas empresas de decoração.

As declarações dos entrevistados das tecelagens indicam que as inovações nos tecidos surgem, inicialmente, das inovações nos fios, e que as tecelagens criam este novo tecido a partir do novo fio. Assim, as inovações na cadeia são originárias das inovações na fiação.

Além disso, essas tecelagens apontaram que inovam também de forma incremental em produtos, por meio do desenvolvimento de novas características em tecidos já conhecidos no mercado, como novos desenhos, mistura de fios, novas cores etc., desenvolvidas por profissionais das empresas pesquisadas e fornecidas aos clientes.

Os entrevistados de quatro empresas de tecelagem pesquisadas declararam que suas empresas têm buscado produzir tecidos com novos desenhos e relevos, para tentar conquistar novos clientes, e que isso tem sido desenvolvido por desenhistas e técnicos de suas empresas. Esses novos produtos são modificações incrementais nos tecidos já produzidos pelas elas, com matérias-primas já utilizadas atualmente.

Isso também ocorre com as empresas de acabamento, cujas inovações também se caracterizam por serem incrementais e de produtos e são resultado, em sua maioria, dos testes realizados nos laboratórios químicos a partir dos conhecimentos de seus técnicos.

O entrevistado da empresa A2 exemplificou este fato ao declarar que a empresa tem desenvolvido novas padronagens (desenhos), a partir dos desenhos já existentes, geralmente copiados de amostras obtidas em feiras e eventos têxteis internacionais, e que tem buscado modificar algumas combinações nos produtos químicos já utilizados no beneficiamento dos tecidos, inclusive com o objetivo de gerar menos poluição e reduzir o consumo de água no processo.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cooperação entre empresas do mesmo setor e que compõem uma cadeia integrada, do tipo das cadeias de suprimentos, tem sido tratada por diversos autores como um elemento resultante do aumento da inovação e do aprendizado tecnológico nas empresas componentes e que podem resultar em aumento da produtividade e da competitividade entre estas empresas individualmente. Essas abordagens, porém, desconsideram na sua maioria algumas imperfeições do modelo e que podem comprometer tais ganhos, como a assimetria de poder e desequilíbrio na coordenação e na governança da cadeia.

Os resultados dessas imperfeições e desequilíbrios podem ser representados, inicialmente, pelas dificuldades nas relações de cooperação e na transmissão de informações que resultem no aprendizado e em inovações tecnológicas adotadas na cadeia.

No caso das empresas analisadas nesta pesquisa, que compõem uma amostra da cadeia têxtil da região de Americana, tais dificuldades nas relações de cooperação foram percebidas nas entrevistas realizadas com os responsáveis pela produção ou proprietários. Essas entrevistas mostraram a existência de relações superficiais de cooperação entre os membros da cadeia entrevistados e que essa forma de cooperação implica a inexistência de um processo sistemático e coordenado de aquisição de conhecimento e, por consequência, de inovações tecnológicas e organizacionais pelas empresas.

Isso porque as entrevistas indicam que as relações de cooperação estabelecidas entre as empresas pesquisadas ocorrem de forma superficial, não havendo nenhum planejamento que estabeleça diretrizes, forma de coordenação e objetivos destas relações.

Por isso, as informações e conhecimentos transmitidos entre as empresas da cadeia analisada são praticamente inexistentes e se resumem aos relatórios técnicos simplificados, que não permitem às empresas pesquisadas a troca de conhecimento técnico sobre o produto ou processo utilizado na produção.

Tal comportamento pode ser explicado pela forma assimétrica como ocorrem essas relações, sendo o fornecedor de fio (o primeiro elo da cadeia) representado por uma empresa, cujo tamanho, volume de produção e forma de inserção e atuação no mercado diferencia das outras empresas da cadeia (tecelagens e acabamento), que são, na sua maioria, empresas de pequeno porte e com atuação regional, não possuindo, portanto, poder dentro da cadeia.

Considerando o aumento da competitividade observado nos últimos anos na indústria têxtil nacional em decorrência do aumento das importações dos países asiáticos, a carência de inovações na indústria têxtil regional representa a perda constante de parcelas do mercado já restrito, bem como a sobrevivência dessa indústria na região. Como resultado tem-se o agravamento de problemas econômicos e sociais para os municípios onde a cadeia está instalada, por ser este segmento industrial um dos maiores empregadores e geradores de renda na região.

Material suplementar
REFERÊNCIAS
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Notas
Autor notes

Endereço dos autores: Marcos de Carvalho Diasmarcos.dias@fatec.sp.gov.br


Figura 1
– A cadeia têxtil tradicional
Fonte: IEMI (2009).

Figura 2
– Localização da região têxtil de Americana/SP
Fonte: Elaborado pelo autor, 2015, adaptado de Google Maps.
Tabela 1
– Região têxtil de Americana: total de trabalhadores e empreendimentos têxteis em 2014 (em unidades)


Quadro 1
– Características da amostra pesquisada



Figura 3
– Posição das empresas pesquisadas na cadeia produtiva
Fonte: O autor, a partir da pesquisa realizada.
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