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ABANDONO E ATRASO ESCOLAR E SUA RELAÇÃO COM INDICADORES SOCIOECONÔMICOS: UMA ANÁLISE PARA A REGIÃO SUL DO BRASIL
DROPPING OUT OF SCHOOL, SCHOOL DELAY, AND THEIR RELATION TO SOCIOECONOMIC INDICATORS: AN ANALYSIS OF THE SOUTHERN REGION OF BRAZIL
ABANDONO E ATRASO ESCOLAR E SUA RELAÇÃO COM INDICADORES SOCIOECONÔMICOS: UMA ANÁLISE PARA A REGIÃO SUL DO BRASIL
Gestão e Regionalidade, vol. 34, núm. 101, pp. 4-22, 2018
Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS
Recepção: 05 Julho 2016
Aprovação: 05 Abril 2018
Resumo: O objetivo central deste artigo é realizar uma análise da distribuição e correlação espacial da proporção tanto de adolescentes que abandonaram os estudos quanto de adolescentes estudantes em situação de atraso escolar, com alguns indicadores socioeconômicos dos municípios da região Sul do Brasil. Para tanto, fez-se uso da Análise Estatística de Dados Espaciais. Os resultados mostraram que os indicadores sociais e econômicos afetam o abandono e o atraso escolar, a partir de um efeito vizinhança significativo. Entendeu-se, assim, que a decisão final dos adolescentes e de suas respectivas famílias, com relação à permanência na escola e à dedicação aos estudos, sofre a influência de um conjunto de fatores econômicos e sociais encadeados entre si. Concluiu-se, assim, que ações voltadas para estimular o nível de emprego e a atividade econômica, de modo especial, nas regiões em que os indicadores se apresentaram negativos, contribuem para estimular o nível educacional dos adolescentes.
Palavras chave: Abandono e atraso escolar, indicadores socioeconômicos, análise espacial, municípios da região Sul.
ABSTRACT: The main objective of this article is to analyze the distribution and spatial correlation of the proportion of both the teenagers who dropped out of school as well as teenage students in a situation of school delay, with relation to some socio-economic indicators of cities in the South region of Brazil. To this end, Statistical Analysis of Spatial Data was used. The results showed that social and economic indicators affect drop outs and school delay, due to a significant neighborhood effect. It was considered, therefore, that the final decision of adolescents and their families with respect to staying in school and the dedication to studies is influenced by a set of economic and social factors linked to each other. It was concluded that actions directed towards stimulating employment and economic activity, especially in the regions where the indicators were negative, assist in stimulating the educational level of adolescents.
Keywords: school dropout and delay, socioeconomic indicators, spatial analysis, cities in the South region of Brazil.
1. INTRODUÇÃO
As políticas públicas federais tanto na área da educação quanto na área da assistência social têm se constituído na principal iniciativa dos governos federais para a melhoria das condições de bem-estar dos jovens e adolescentes. Também têm sido usadas algumas estratégias para manter o adolescente na escola, assim como para estimular a progressão dos estudos. Tais iniciativas têm relação com as ideias defendidas por teóricos da Teoria do Capital Humano, a qual discute a importância do investimento em capital humano para os ganhos pessoais e, consequentemente, para o crescimento econômico de um país.
Neste caso, o capital humano é interpretado como um insumo de uma função de produção que tem a renda pessoal, ou o Produto Interno Bruto (PIB), ou o PIB per capita como a variável dependente ( MINCER, 1958 , 1974 ). De acordo com Schultz (1973) o componente não explicado do crescimento econômico originava-se da elevação do estoque de capital humano. As capacitações econômicas do homem podiam ser entendidas como funções de produção, nas quais os diferenciais de rendimento resultam das diferenças nos montantes que foram investidos nas pessoas. Essa e outras pesquisas comprovaram a importância da educação para o crescimento e desenvolvimento econômico de uma nação ( JOHNSON, 1970 ; NITZAN; PAROUSH, 1980 ), o que tem contribuído para justificar as iniciativas de políticas públicas voltadas para a melhoria das condições educacionais de crianças, jovens e adolescentes.
Sposito e Carrano (2003) explicam que, no caso do Brasil, somente no fim dos anos 90 e início deste século XXI passou a existir um conjunto de iniciativas, entendidas como políticas públicas voltadas para as pessoas inseridas na faixa etária própria da juventude – de 14 a 29 anos. Até então, os jovens eram abrangidos por políticas sociais destinadas às demais faixas etárias e que, de uma forma ou de outra, incluíam a população jovem em suas metas. Tais iniciativas foram impulsionadas, especialmente, pela aprovação do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), o qual define a faixa etária que abrange a infância e a adolescência/juventude, estabelecendo os direitos e deveres a serem respeitados para esta faixa etária (BRASIL, 2010). No capítulo IV do ECA determina-se o direito ao acesso e permanência na escola, visando ao pleno desenvolvimento da criança e do adolescente, além do preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho. Assim, a educação não deve se limitar ao ensino das disciplinas tradicionais, mas deve preparar para o exercício da cidadania, através do ensino de direitos fundamentais. Deve, também, preparar para o trabalho qualificado, por meio da aprendizagem técnica.
Digiácomo e Digiácomo (2013) entendem que essa lei estabeleceu uma ação conjunta e articulada entre as esferas particulares e públicas para garantir a defesa/promoção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes. Os autores também citam outras importantes normas e leis federais, aprovadas com o intuito de garantir o direito à educação para crianças, adolescentes e jovens, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
A atual Política Nacional de Juventude entende que “a juventude é uma condição social, parametrizada por uma faixa etária, que no Brasil congrega cidadãos e cidadãs com idade compreendida entre os 15 e os 29 anos” ( NOVAES et al., 2006 , p. 5). O referido documento discute e propõe políticas públicas de âmbito nacional que visam atender a uma faixa etária na qual se incluem aqueles que, de acordo com o ECA, são denominados como adolescentes. Com relação à discussão sobre o atual cenário da educação, o documento chama a atenção para a necessidade de ter que dobrar a velocidade de expansão do sistema educacional, em caso de o Brasil ter como meta um nível de escolaridade correspondente ao ensino médio completo para os jovens brasileiros.
Apesar de algumas iniciativas pontuadas no documento da Política Nacional de Juventude, a realidade educacional do Brasil apresenta um quadro em que as taxas de rendimento educacional são muito baixas e, portanto, com amplo espaço para consistentes crescimentos. Além disso, existem diferenças com relação aos níveis de educação alcançados por diferentes estratos sociais, como também dos indicadores das diversas regiões do Brasil, dos estados e até entre municípios do mesmo estado. Destacam-se, ainda, as diferenças entre os indicadores do ensino fundamental e do ensino médio.
A taxa de aprovação no ensino fundamental, em 2012, foi de 88,2% do total de estudantes, enquanto a taxa de reprovação foi de 9,1% e a taxa de abandono chegou a 2,7%. Com relação ao ensino médio, houve uma taxa de aprovação de 78,7%, uma taxa de reprovação de 12,2% e uma taxa de abandono de 9,1% ( BRASIL, 2006 ). Ou seja, a taxa de abandono do ensino médio é 6 pontos percentuais superior à observada para o ensino fundamental.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2012 mostram grande atraso escolar 1 e abandono dos estudos. No Brasil, do total de 14.000.422 adolescentes com idade entre 14 e 17 anos, 87,2% declararam estar estudando, o que diz respeito a 12.216.298 de indivíduos. Desses, apenas 49,27% estava cursando alguma das três séries do ensino médio, o que corresponde a 6,02 milhões de pessoas, ou 43% do total de adolescentes brasileiros com idade entre 14 e 17 anos. Na região Sul, tem-se que 85,45% do total de jovens e adolescentes eram estudantes, sendo que destes 55,37% estavam no ensino médio, totalizando 901.589 indivíduos. Cabe ressaltar que o percentual de adolescentes estudantes cai com a elevação da idade, chegando a 74,55% do total de brasileiros com 17 anos e a 69,85% do total de residentes na região Sul. Com relação ao percentual de estudantes para cada estado da região Sul, a proporção é a mesma nos estados do Paraná e Santa Catarina (85%) e pouco superior a 86% no Rio Grande Sul ( IBGE, 2012 ).
Os motivos para que os adolescentes abandonem a escola, ou reduzam sua dedicação aos estudos podem estar associados às escolhas individuais e familiares, bem como, segundo a teoria do capital humano, às taxas de retorno a serem obtidas ao longo da vida desses adolescentes. De acordo com Becker (1991) os pais altruístas estão dispostos a investir no capital humano de seus filhos e ficam satisfeitos quando estes estão em melhor situação. Isto porque, as interações entre membros de uma família são distintas daquelas que ocorrem entre pessoas não relacionadas, por exemplo as interações de mercado, porque na relação familiar existe amor e carinho. Assim, ao investir na educação da criança (ou adolescente), a família compara os custos diretos e os custos de oportunidade com o benefício esperado no futuro. Os investimentos continuarão enquanto a taxa marginal de retorno exceder os custos associados à melhoria de vida da criança. A taxa de retorno depende da renda esperada futura, a qual tem relação com as possibilidades de sucesso no mercado de trabalho e com a realidade socioeconômica em que a criança está inserida.
Diante disso, pergunta-se: a proporção de adolescentes 2 que optaram por não estudar, ou a média de adolescentes em condições de atraso escolar, tem relação com indicadores sociais e econômicos do município ou região em que estes adolescentes estão inseridos? Visando responder esse questionamento, o objetivo desta pesquisa foi de analisar a média municipal de abandono e atraso escolar, relacionando-a com alguns indicadores socioeconômicos dos municípios da região Sul do Brasil.
Supõe-se, assim, que o adolescente em idade para cursar o ensino médio toma sua decisão de estudar (ou não), ou atrasa-se nos estudos, influenciado pelas características tanto do mercado de trabalho, quanto da realidade social e econômica do ambiente em que está inserido. Dado que o município representa a realidade mais visível do adolescente, acredita-se que em municípios com possibilidades mais promissoras para o mundo do trabalho o interesse em ingressar na escola e concluir o ensino médio seja maior.
Na análise proposta, leva-se em conta a dinâmica do mercado de trabalho, considerando que a região Sul passou por mudanças recentes de forte impacto, por conta da desconcentração produtiva e, principalmente, industrial. Além disso, a região Sul tem estados que podem ser comparados de forma mais equilibrada pela semelhança do nível de renda per capita e da estrutura produtiva, no entanto, as diferenças podem, em certa medida, refletir nas políticas educacionais, e na trajetória e dinâmica das economias regionais ao menos das últimas três décadas.
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E FONTE DE DADOS
A autocorrelação espacial, como demonstração básica da dependência local entre observações espaciais, indica que as relações existentes entre os parâmetros estão em função da distância, ou seja, são concepções que possibilitam a edificação de uma dimensão estatística a partir de dados reais ( GOODCHILD, 1986 ). A Análise Exploratória de Dados Espaciais (AEDE), usada para testar a existência de organizações espaciais com padrões similares dentre regiões vizinhas, foi proposta por Anselin (1988) e tem contribuído com estudos da economia regional, ao descrever distribuições espaciais e identificar tanto observações divergentes no espaço quanto padrões de associação espacial.
Além disso, Becker e Tomes (1979) , expõem um modelo no qual o investimento em educação continua até que o indivíduo, ou o indivíduo e sua família, acreditem que os retornos a serem obtidos de tais investimentos sejam maiores que o custo de oportunidade do consumo em bens e serviços no presente. A partir disso, diversas pesquisas têm se preocupado em identificar os fatores que conduzem ao maior (ou menor) nível de escolaridade ( BIRDSALL, 1985 ; TODD; WOLPIN, 2003 ; WOLFE; BEHRMAN, 1984 ). Tendo como base essas pesquisas, as variáveis para as quais se fez uma AEDE foram calculadas para o ano 2010, em nível de município, sendo definidas conforme descrito a seguir:
Participação do emprego setorial formal, em relação ao total de empregos formais: Calculado para os setores de atividade industrial, da construção civil, da agropecuária e, no caso do setor de serviços, para as atividades do comércio e da administração pública;
Taxa de rotatividade do emprego formal: indicador que mede o percentual de trabalhadores substituídos anualmente, em relação ao estoque vigente no primeiro dia do ano;
Taxa de desemprego: calculado a partir da razão entre o total de Desempregados no município e a População Economicamente Ativa, tratando-se assim do desemprego aberto;
Produto Interno Bruto (PIB) per capita: utilizou-se as estimativas do PIB dos municípios, a preços correntes, as quais foram divididas pelo valor referente à população total;
Índice de Gini: Usado para identificar o nível de concentração de renda;
Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM): calculado levando-se em consideração as condições de renda, educação e longevidade da população em questão;
Proporção de adolescentes que abandonaram a escola: refere-se à razão entre o número de adolescentes que declararam não estar estudando, em relação aos que declararam ser estudantes;
Proporção de adolescentes estudantes em situação de atraso escolar: diz respeito à razão entre o número de adolescentes que não estavam cursando a série ideal para sua idade, com relação aos que estudavam a série ideal.
Conforme a metodologia proposta por Anselin (1995 , 2005 ), para as variáveis descritas, testou-se a hipótese nula de que os valores observados não dependiam de sua localização e estavam distribuídos aleatoriamente ao longo do espaço, a partir do teste estatístico I de Moran, cuja descrição é a que segue.
Estatística I de Moran global univariada:
Almeida (2004) afirma que a estatística I de Moran fornece a associação linear do tipo produto cruzado para dois termos, em que o primeiro é ∑ ( yi – ȳ)2 e refere-se à variância dos dados de interesse; o segundo termo é n / ∑∑ wij3 e permite a ideia da configuração espacial dos dados. O número de unidades espaciais está indicado por n ; yi é a variável de interesse e; wij é o peso espacial para o par de unidades espaciais i e j , medindo o grau de interação entre elas.
Conforme destaca Anselin (1995 , 2005 ), se não houvesse padrão espacial nos dados, o valor esperado para a estatística I de Moran seria – [1/(n – 1)]. Denominando-se Icalc. como o valor calculado para a estatística I de Moran e Iesp. para seu valor esperado, tem-se:
Icalc. = Iesp. se yi é independente dos valores de yi nos municípios vizinhos;
Icalc. > Iesp. no caso de existência de uma autocorrelação espacial positiva;
Icalc. < Iesp. sinaliza uma autocorrelação negativa.
Assim, uma autocorrelação espacial positiva indicaria que há uma semelhança entre os valores do indicador estudado para um município e a localização espacial deste indicador. Do contrário, uma autocorrelação negativa revelaria dissimilaridade entre os valores do indicador estudado e sua localização espacial.
Estatística I de Moran local univariada:
Calculado isoladamente, o I de Moran global pode ocultar duas situações distintas: a primeira, em que “a ausência de autocorrelação global oculta padrões de associação local; do contrário uma forte autocorrelação global pode camuflar padrões locais de associação ( clusters ou outliers espaciais)” ( ALMEIDA, 2004 , p. 42). A estatística I de Moran local é apresentada como alternativa para identificar a ocorrência de autocorrelação local ( ANSELIN, 2005 ; CÂMARA et al., 2002 ; LOPES, 2005 ), podendo ser estabelecida como:
Em que: n é o número de municípios; yi é a variável de interesse; ȳ é a média dessa variável; yj é a variável de interesse nos municípios vizinhos e wij é a matriz de peso espacial. Nesta estatística, a somatória de j inclui somente os valores dos vizinhos j ϵ Ji quando Ji é o conjunto dos vizinhos da observação i .
Também, através do I de Moran local é possível identificar clusters espaciais estatisticamente significantes em torno de uma observação i . Conforme Anselin (1995 , 2005 ), tais clusters são divididos em quatro tipos de associação espacial, quais sejam:
Alto-Alto (AA): quando as unidades espaciais pertencentes a um agrupamento exibem valores altos da variável observada, rodeados por unidades espaciais que apresentam valores também altos da mesma variável;
Baixo-Baixo (BB): situação em que as unidades espaciais pertencentes a um agrupamento mostram valores baixos desta variável, circundados por unidades que possuem valores também baixos;
Alto-Baixo (AB): quando o grupamento de uma variável tem um alto valor e é rodeado por unidades espaciais circunvizinhas de baixo valor;
Baixo-Alto (BA): para um cluster de um lugar espacial qualquer com um baixo valor da variável observada e circundado por agrupamentos de alto valor.
Tem-se, assim, a decomposição do indicador global de autocorrelação em quatro categorias, cada uma correspondendo a um quadrante do diagrama de dispersão de Moran.
Estatística I de Moran global multivariada:
Para descrever e visualizar as distribuições no espaço, identificar situações excepcionais, descobrir padrões de associação no espaço ( clusters ) e preconizar regimes espaciais ou formas de heterogeneidade no espaço, Anselin (1995) recomenda que se utilize a estatística I de Moran global multivariada, a partir da seguinte equação:
Neste caso, a meta é descobrir se os valores de uma variável observada em determinado município mantêm uma relação sistemática com valores de outra variável observada em outro município. As variáveis zk e zl são padronizadas e a soma dos quadrados, tanto de uma, quanto de outra, é igual a n , chegando-se à equação (4), conforme segue:
Tem-se, desse modo, uma equação em que o numerador se refere a uma medida de associação linear do tipo produto cruzado. O denominador diz respeito a um reescalonamento por dividir tal medida pelo tamanho da amostra n . Verifica-se, assim, a existência de um grau de associação entre uma variável padronizada zk e outra diferente variável padronizada, que é vizinha à primeira, zl .
Estatística I de Moran local multivariada:
Conforme destaca Anselin (1995 , 2005 ), para calcular a estatística I de Moran local em um contexto bivariado, a fórmula do I de Moran local pode ser readaptada conforme o exposto abaixo:
Com a equação acima, também se busca verificar se os valores de uma variável observada numa dada unidade espacial guardam uma relação sistemática com os valores de outra variável observada em unidades espaciais vizinhas. Do mesmo modo que na análise univariada, tal verificação é feita a partir do cálculo de clusters , que decompõe o indicador global de autocorrelação multivariada em quatro categorias.
Nesta pesquisa, uma semelhança na distribuição espacial dos indicadores econômicos e sociais, com o indicador educacional sinalizaria que os primeiros podem influenciar o último.
2.1. FONTE DE DADOS
As informações utilizadas para compor as variáveis foram provenientes de diferentes bases de dados, sendo estas:
A Relação Anual de Informações Sociais (Rais). Sua base de dados foi utilizada para calcular os indicadores municipais denominados: participação do emprego setorial formal em relação ao total de empregos formais e taxa de rotatividade do setor formal ( BRASIL, 2013 ). A divisão dos setores e subsetores da atividade econômica foi feita respeitando-se a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) e, para calcular os indicadores municipais foram selecionadas as seções A – agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura; B e C – indústrias extrativas e de transformação; F – construção civil; G – comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas; e O – administração pública, defesa e seguridade social ( IBGE, 2015 ).
Contas regionais do IBGE. Foram utilizadas as informações de 2010, com os resultados do PIB municipal, calculado segundo a ótica da produção e respeitando-se as contas nacionais trimestrais. A informação referente ao PIB foi dividida pelo valor correspondente à população total de cada município da região Sul (Idem, 2010).
Atlas do desenvolvimento humano no Brasil. Desta base de dados foram extraídos: o IDHM e o Índice de Gini dos municípios da região Sul brasileira (IPEA, 2013).
Censo Demográfico 2010. Utilizando-se os microdados da amostra foram selecionados os adolescentes com idades entre 14 e 17 anos, para os quais identificou-se a média de estudantes e não estudantes, por municípios da região Sul do Brasil. A partir da manipulação dos dados, também se identificaram os adolescentes que estavam cursando uma série inferior à adequada para sua idade. De posse desta informação, calculou-se a média de adolescentes em situação de atraso escolar, também por município. Da população com idade entre 18 e 80 anos, extraiu-se a taxa de desemprego média municipal ( IBGE, 2010 ).
Utilizando-se o software Stata SE 12 reuniu-se os bancos de dados contendo as informações de interesse. A análise espacial proposta foi efetuada através do software GeoDa – Estatística open source para dados geográficos.
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Para a análise da autocorrelação global dos dados calculou-se o valor esperado da estatística I-Moran, para os 1.188 municípios da região Sul do Brasil, a qual apresentou um valor de E(I) = 0,0008. Assim, um valor calculado da estatística I-Moran superior a -0,0008 revela a existência de autocorrelação espacial positiva para o indicador analisado. Se, do contrário, o valor calculado de I-Moran for inferior a – 0,0008 ocorre uma autocorrelação espacial negativa.
Na Tabela 1 tem-se os resultados para a estatística I de Moran, levando-se em consideração as convenções “Rainha”, “Torre”, “K-3 vizinhos” e “K-4 vizinhos” 4 , para a análise global univariada dos indicadores educacionais. Nota-se que todos os coeficientes resultaram em um valor maior que o I esperado e significância ao nível de 1%, podendo-se dizer que os dois indicadores educacionais têm autocorrelação espacial positiva. Neste caso, a maioria das unidades espaciais ajustavam-se na forma de dois agrupamentos distintos: o primeiro grupo de agrupamentos é do tipo Alto-Alto (AA), nos quais os municípios que apresentaram valores altos, tanto para o abandono, quanto para o atraso escolar, estavam rodeados por municípios com valores igualmente altos. O segundo grupo refere-se a municípios em que os indicadores de evasão e atraso escolar relacionavam-se a partir de agrupamentos do tipo Baixo-Baixo (BB), em que unidades espaciais com baixa evasão escolar estavam circundadas por unidades espaciais com evasão escolar igualmente baixa, ocorrendo situação semelhante com relação ao abandono escolar.
| Variável | Convenção | |||||||
|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
| Rainha | Torre | K-3 vizinhos | K-4 vizinhos | |||||
| I de Moran | p-valor | I de Moran | p-valor | I de Moran | p-valor | I de Moran | p-valor | |
| Evasão escolar | 0,2856 | 0,001 | 0,2848 | 0,001 | 0,3091 | 0,001 | 0,3009 | 0,001 |
| Atraso escolar | 0,2984 | 0,001 | 0,2988 | 0,001 | 0,3163 | 0,001 | 0,3081 | 0,001 |
A autocorrelação local usa como referência o mapeamento de unidades espaciais com I de Moran significantes. Almeida (2004) salienta que o mapa de cluster reúne a informação do diagrama de dispersão de Moran, com a informação relativa ao mapa de significância que mede a associação local para cada Ii .
A Figura 1 apresenta os clusters significativos para a média municipal dos dois indicadores municipais. Nota-se que o Paraná concentra o maior número de clusters do tipo AA para a evasão escolar, localizados nas mesorregiões: Metropolitana de Curitiba, Sudeste, Centro-Sul e Centro Oriental paranaense. Tais clusters também podem ser observados nas mesorregiões Serrana e Norte de Santa Catarina, além das regiões Centro Oriental e Nordeste do Rio Grande do Sul. Trata-se de regiões com localidades em que existe um maior número de adolescentes fora de escola e cuja situação afeta as localidades vizinhas. Pode-se assim dizer, que existe um efeito vizinhança negativo entre essas localidades, mas um efeito vizinhança positivo poderia ocorrer no caso de municípios que tem uma baixa evasão escolar e afetam significativamente os municípios vizinhos, revelando similaridades espaciais. Tal situação aparece com destaque nos clusters do tipo BB localizados, em grande maioria, no Rio Grande do Sul (mesorregiões Noroeste, Centro Ocidental e Nordeste).

No Rio Grande do Sul também está concentrado o maior número de clusters do tipo AA para o atraso escolar, nas mesorregiões Sudoeste, Sudeste e Metropolitana de Porto Alegre, chamando-se a atenção, também, para a mesorregião Metropolitana de Curitiba. Neste caso, municípios em que os estudantes adolescentes têm alto índice de defasagem escolar afetam os municípios vizinhos, fazendo com que a evasão escolar seja realidade em toda uma região. Os clusters do tipo BB, para o atraso escolar, estão distribuídos em diversas mesorregiões do Sul do Brasil, chamando-se a atenção para o Oeste de Santa Catarina.
Detecta-se, assim, a existência de diferenças regionais na autocorrelação espacial dos indicadores educacionais. Bezerra e Ramos (2008) , ao analisar indicadores de qualidade educacional para o Brasil, comprovaram que as regiões mais pobres também são aquelas com menor qualidade educacional (Norte e Nordeste). Em vista disso, demonstraram preocupação com relação a políticas que objetivem a reversão da má distribuição de renda do país, pois as regiões que mais precisam do impulso que o capital humano pode gerar, também são as mais carentes, do ponto de vista da qualidade desse capital humano. No que compete à análise para a região Sul, entende-se que possíveis diferenças econômicas, sociais e educacionais, entre suas mesorregiões, também devam ser levadas em consideração, nas discussões sobre o desenvolvimento da região como um todo.
3.1. AUTOCORRELAÇÃO GLOBAL BIVARIADA
Para Almeida (2004) , na autocorrelação bivariada (ou multivariada), plota-se os valores de uma variável, observados em um município ou região, com o valor médio de outra variável, observada em municípios ou regiões vizinhas. Na Tabela 2 , tem-se os resultados para o I de Moran bivariado 5 , cruzando-se os valores dos indicadores municipais, sociais e econômicos, com os valores dos dois indicadores educacionais. Os cálculos foram realizados para as convenções “Rainha”, “Torre”, “K-3 vizinhos” e “K-4 vizinhos”, tendo-se obtido resultados significativos para uma boa parte dos índices. Assim, optou-se em fazer uma análise mais detalhada para a convenção “K-3 vizinhos”, uma vez que se encontraram valores maiores para seus coeficientes.
| Variável | Rainha | Torre | K-3 vizinhos | K-4 vizinhos | ||||
|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
| I de Moran | p-Valor | I de Moran | p-Valor | I de Moran | p-Valor | I de Moran | p-Valor | |
| Evasão escolar x IDHM 2010 | -0,1755 | 0,001 | -0,1744 | 0,001 | -0,1823 | 0,001 | -0,1698 | 0,001 |
| Evasão escolar x taxa de rotatividade | 0,1246 | 0,001 | 0,1245 | 0,001 | 0,1349 | 0,001 | 0,1315 | 0,001 |
| Evasão escolar x taxa de desemprego | 0,0873 | 0,001 | 0,0849 | 0,001 | 0,0941 | 0,001 | 0,0918 | 0,001 |
| Evasão escolar x PIB per capita | -0,0701 | 0,001 | -0,0688 | 0,001 | -0,0802 | 0,001 | -0,0741 | 0,001 |
| Evasão escolar x ind. emp. indústria | 0,0745 | 0,001 | -0,0756 | 0,001 | 0,0860 | 0,001 | 0,0821 | 0,001 |
| Evasão escolar x ind. emp. adm. pública | -0,0615 | 0,001 | -0,0626 | 0,001 | -0,0607 | 0,001 | -0,0630 | 0,001 |
| Evasão escolar x ind. emp. comércio | -0,0744 | 0,001 | -0,0739 | 0,001 | -0,0840 | 0,001 | -0,0729 | 0,001 |
| Evasão escolar x ind. emp. agropecuária | 0,0218 | 0,047 | 0,0212 | 0,042 | -0,0013 | 0,474 | -0,0009 | 0,459 |
| Atraso escolar x IDHM 2010 | -0,2069 | 0,001 | -0,2068 | 0,001 | -0,2235 | 0,001 | -0,2183 | 0,001 |
| Atraso escolar x taxa de rotatividade | 0,0343 | 0,004 | 0,0343 | 0,006 | 0,0320 | 0,041 | 0,0310 | 0,014 |
| Atraso escolar x taxa de desemprego | 0,1514 | 0,001 | 0,1514 | 0,001 | 0,1635 | 0,001 | 0,1684 | 0,001 |
| Atraso escolar x PIB per capita | 0,0173 | 0,091 | 0,0174 | 0,095 | 0,0062 | 0,347 | 0,0107 | 0,252 |
| Atraso escolar x ind. emp. indústria | -0,1122 | 0,001 | -0,1112 | 0,001 | -0,1212 | 0,001 | -0,1161 | 0,001 |
| Atraso escolar x ind. emp. adm. pública | 0,0454 | 0,112 | 0,0451 | 0,131 | 0,0493 | 0,132 | 0,0442 | 0,141 |
| Atraso escolar x ind. emp. comércio | -0,0030 | 0,429 | -0,0038 | 0,386 | -0,0134 | 0,206 | -0,0073 | 0,301 |
| Atraso escolar x ind. emp. agropecuária | 0,0953 | 0,251 | 0,0943 | 0,263 | 0,0937 | 0,241 | 0,0953 | 0,237 |
Com relação à influência dos indicadores sociais e econômicos dos municípios sobre a evasão escolar, obteve-se sinal negativo nos casos do IDHM, do PIB per capita , assim como dos indicadores de emprego na administração pública e no comércio. Neste caso, um alto IDHM e um elevado PIB per capita em determinados municípios conduzem à redução da evasão escolar em outros municípios de uma mesma vizinhança.
Os indicadores de emprego na administração pública e no comércio, mostram que o aumento do emprego formal nesses dois setores de atividade, conduz à redução da evasão escolar nos municípios vizinhos. É cada vez mais comum a exigência do ensino médio completo para a participação em concursos públicos ligados à carreira técnico-administrativa. Também tem aumentando, ao longo do tempo, a exigência do ensino médio completo, para que se possa exercer atividades próprias do comércio. Sendo assim, em municípios que tenham uma proximidade geográfica, espera-se que o interesse em cursar o ensino médio aumente, quando há o crescimento do emprego, para essas duas atividades, na vizinhança.
Os indicadores cujo I de Moran apresentou sinal positivo foram: a taxa de rotatividade, a taxa de desemprego e o indicador de emprego na indústria, sendo que os dois primeiros dão um indicativo de condições negativas no mercado de trabalho.
Nos municípios com alta taxa de rotatividade os trabalhadores estão em situação de trocas constantes de emprego, seja em função de ajustes econômicos, ou devido à baixa estabilidade para as ocupações disponíveis no ambiente de trabalho. Uma elevada taxa de desemprego indica uma discrepância entre a demanda e a oferta de mão de obra no mercado de trabalho. Nota-se, assim, que a instabilidade no mercado de trabalho de um município afeta positivamente a taxa de abandono escolar em municípios vizinhos. O efeito é ligeiramente maior para a taxa de rotatividade.
Quanto ao indicador de emprego na indústria, sua relação com a evasão escolar deu-se através de um I de Moran positivo, revelando a existência de um efeito vizinhança, no qual o aumento do emprego industrial, conduz à elevação da evasão escolar nos municípios vizinhos. Tal situação é possível de ocorrer, pois o emprego no setor industrial costuma exigir o cumprimento de jornadas de trabalho extras, ou em horários que são incompatíveis com a permanência na escola. A necessidade de deslocamento de um município ao outro, para cumprir essas jornadas de trabalho, associada ao cansaço que as atividades laborais provocam poderiam conduzir ao abandono escolar, especialmente por parte de adolescentes trabalhadores.
Na Tabela 2 também estão os resultados para a estatística I de Moran global bivariada, cruzando-se os indicadores socioeconômicos com o indicador educacional de atraso escolar. Grande parte dos resultados foi não significativa, sendo estes: o PIB per capita e os indicadores de emprego na administração pública, no comércio e na agropecuária.
Os resultados significativos e negativos dizem respeito ao IDHM e ao indicador de emprego na indústria. Comprova-se, assim, que municípios com alto desenvolvimento humano afetam negativamente a defasagem escolar de municípios vizinhos. Além disso, um aumento do emprego formal na indústria, de um determinado município, reduz a defasagem escolar média dos municípios vizinhos. Ressalta-se que esse efeito é diferente do observado para o caso da evasão escolar, quando o índice de I de Moran para o setor industrial apresentou sinal positivo. No entanto, pode ser que a necessidade de permanência no emprego afete negativamente a decisão de estudar, quando se trata do efeito cruzado entre municípios vizinhos. Mas, uma vez que os adolescentes tomam a decisão de permanecer na escola, o desejo por oportunidades de trabalho melhores conduza a uma dedicação que contribui para a redução do atraso escolar médio dos municípios.
Para a taxa de desemprego e a taxa de rotatividade obteve-se I de Moran global bivariado positivo e significativo, ao cruzar estes dois indicadores com o indicador de atraso escolar. Assim, pode-se dizer que uma maior instabilidade no mercado de trabalho, de determinado município da região Sul brasileira, aumenta a defasagem escolar dos municípios vizinhos. Esse efeito é maior para a taxa de desemprego, em comparação à taxa de rotatividade.
3.2. AUTOCORRELAÇÃO LOCAL BIVARIADA
A autocorrelação local bivariada entre a evasão escolar e quatro diferentes indicadores, a saber: o IDHM 2010, a taxa de rotatividade, a taxa de desemprego e o PIB per capita , podem ser visualizados na Figura 2 . Nota-se que para o IDHM, a maioria dos clusters foi do tipo Baixo-Alto (BA), ou Alto-Baixo (AB), o que revela uma relação de vizinhança inversa entre o indicador de abandono escolar e o indicador de desenvolvimento humano. Na região paranaense mais próxima à capital – Curitiba – encontra-se a maioria dos clusters do tipo BA, em que municípios com um baixo IDHM são vizinhos de municípios com um alto índice de evasão escolar. Situação semelhante ocorre nas mesorregiões Sudeste e Centro-Oriental paranaenses, assim como nas mesorregiões Serrana e Norte de Santa Catarina, no Nordeste e no Sudeste do Rio Grande do Sul. Quanto aos clusters do tipo AB, os quais mostram a condição de municípios com alto IDHM com vizinhos em que o abandono escolar é baixo, sua ocorrência é mais evidente no estado do Rio Grande do Sul, destacando-se as mesorregiões Noroeste e Centro Ocidental.

A taxa de rotatividade e a taxa de desemprego apresentaram um maior número de clusters do tipo Alto-Alto (AA) e Baixo-Baixo (BB) na sua correlação espacial com a evasão escolar, o que comprova a existência de uma relação direta na espacialidade desses indicadores. Para os dois indicadores, a maioria dos clusters do tipo AA está concentrado nas regiões Metropolitanas de Curitiba e Porto Alegre, ou próximos a elas, podendo-se destacar, também, a mesorregião de Florianópolis. Tal condição era esperada, uma vez que essas são regiões com um maior índice de urbanização nos três estados e regiões mais urbanizadas também costumam apresentar uma heterogeneidade maior em relação aos seus indicadores. Isto porque, ao mesmo tempo em que as oportunidades de empregos para estas regiões são maiores, seu crescimento populacional também é maior, o que pode provocar uma elevada taxa de desemprego. Por outro lado, as condições de precariedade vividas pelas populações das periferias podem influenciar um alto índice de evasão escolar.
Quanto aos clusters do tipo BB, tanto para a taxa de desemprego, quanto para a taxa de rotatividade, visualiza-se grande número desses clusters na mesorregião Noroeste e parte da mesorregião Nordeste do Rio Grande do Sul. Trata-se, assim, de municípios com baixa taxa de rotatividade e com baixa taxa de desemprego, que têm em sua vizinhança municípios com baixa evasão escolar.
No cruzamento entre PIB per capita e evasão escolar também se encontrou um maior número de clusters dos tipos BA e AB, confirmando-se uma situação em que, municípios com um alto PIB per capita influenciam na redução da evasão escolar dos municípios vizinhos, ocorrendo o oposto para o caso de municípios com baixo PIB per capita . O mapeamento dos clusters significativos para o PIB per capita é bem semelhante ao observado para o IDHM 2010, confirmando-se uma proximidade entre esses indicadores.
A Figura 3 mostra os mapas de cluster da relação entre a evasão escolar e os indicadores de emprego na indústria, na administração pública, no comércio e na agropecuária.

O resultado para o indicador de emprego na indústria ficou bem heterogêneo, havendo 133 clusters que mostram uma relação de espacialidade direta entre os dois indicadores e 84 clusters confirmando uma relação de espacialidade inversa. A maioria dos clusters que confirmam a relação direta (do tipo AA e BB) localiza-se nas mesmas mesorregiões em que se observou essa situação para a taxa de desemprego e a taxa de rotatividade. Os clusters do tipo AA estão próximos às regiões em que se encontram as capitais dos três estados, as quais também são as mais industrializadas. Uma vez que o desemprego nessas regiões também é elevado, acredita-se que o efeito vizinhança da taxa de desemprego tenha influenciado o efeito vizinhança do indicador de emprego industrial.
O mapa para a relação de vizinhança entre o abandono escolar e o indicador de emprego na agropecuária também apresentou um maior número de clusters do tipo AA e BB, mas vale lembrar que o I-Moran global entre estes dois indicadores não foi significativo, o que é um indicativo de que a relação direta entre os clusters não é sustentável. Salienta-se que os clusters do tipo BA se localizam próximos a clusters do tipo AA e clusters do tipo AB estão na vizinhança de clusters do tipo BB. Assim, é possível que a influência direta de um grupo de clusters esteja afetando a relação indireta de outro grupo de clusters , o que dificulta uma análise mais sistemática do efeito do emprego na agropecuária de certos municípios sobre a evasão escolar de municípios vizinhos.
Os indicadores de emprego, tanto da administração pública quanto do comércio, mostram um maior número de clusters em relação inversa com o abandono escolar. Os clusters do tipo BA aparecem em maior número no caso da administração pública, referindo-se a municípios em que o baixo valor para este indicador, são vizinhos de municípios com elevada média para a evasão escolar. Na relação entre o indicador de emprego no comércio e o abandono escolar, nota-se um grande número de clusters do tipo AB, a grande maioria situada na região central do Rio Grande do Sul. Nesta região, o alto índice de emprego no comércio afeta os municípios vizinhos, no sentido de reduzir a média de adolescentes que abandonam a escola. É possível, portanto, que o emprego gerado no setor de atividade comercial esteja estimulando os adolescentes a darem continuidade nos estudos, mesmo que seja para empregar-se em municípios próximos a seu local de residência.
Na Figura 4 é possível observar o efeito cruzado entre o atraso escolar e os seguintes indicadores sociais e econômicos: o IDHM, a taxa de rotatividade, a taxa de desemprego e o PIB per capita . No caso do IDHM, encontrou-se 88 clusters significativos do tipo BA, nos quais municípios com baixo IDHM são vizinhos de municípios com alto índice de atraso escolar, a maioria situados nas mesorregiões Sudeste e Sudoeste do Rio Grande do Sul. Situação semelhante pode ser relatada para o caso do PIB per capita , apesar de o número de clusters do tipo BA para este indicador ter sido ligeiramente menor (81). Também nesta região está a maior parte dos 79 clusters do tipo AA, no mapa que identifica a relação de vizinhança entre taxa de desemprego e atraso escolar. Tem-se, desta forma, municípios com alta taxa de desemprego, circundados por municípios em que o atraso escolar também é elevado. Sendo assim, o elevado atraso escolar da região justifica-se pela existência de indicadores sociais e econômicos que contribuem para desestimular os adolescentes estudantes.

Mas, os indicadores sociais e econômicos também podem favorecer o indicador educacional em foco. Isto porque, encontrou-se 80 clusters do tipo AB para o IDHM e 44 clusters com esta característica para o PIB per capita . Tais clusters estão dispersos em diversas regiões do Sul do Brasil e revelam a existência de municípios com um alto valor dos dois indicadores, contribuindo para uma redução do atraso escolar nos municípios vizinhos. No mapa para a taxa de rotatividade é possível visualizar 57 clusters do tipo BB, e no resultado para a taxa de desemprego soma-se 65 desses clusters . Trata-se de regiões contendo municípios com baixo desemprego e baixa taxa de rotatividade, que são vizinhos de municípios com um atraso escolar reduzido.
Na Figura 5 fica evidenciada a relação de espacialidade do tipo inversa entre os indicadores de emprego formal e o atraso escolar. Esta relação é mais evidente no caso do indicador de emprego industrial, para o qual se encontrou 91 clusters do tipo BA e 56 clusters do tipo AB. Os clusters do tipo BA também estão mais concentrados na região Sul do Rio Grande do Sul, do mesmo modo que os 69 clusters , com a mesma característica, no mapa para o indicador de emprego na administração pública.

Ainda com relação aos indicadores de emprego na indústria e na administração pública, os clusters do tipo AB totalizaram 56 na relação entre emprego industrial e atraso escolar, e chegaram a 45 no efeito vizinhança entre administração pública e atraso escolar. Mas, não se pode ignorar os 66 clusters do tipo BB no mapa para o indicador de emprego na administração pública. Ou seja, há um número significativo de casos em que municípios com baixo índice de emprego no setor público são vizinhos de municípios com atraso escolar também baixo. Acredita-se que tais municípios estejam recebendo a influência positiva de outros indicadores sociais e econômicos.
Ao observar os mapas que contêm os indicadores de emprego no comércio e na agropecuária, cruzando-se com o indicador de atraso escolar, vê-se um elevado número de clusters do tipo AA, tanto em um caso quanto em outro. Nota-se, com isso, que ao baixo índice de emprego formal na indústria e na administração pública, contrapõe-se os indicadores de emprego elevados no comércio e na agropecuária, em municípios cuja vizinhança é formada por outros municípios com alto índice de atraso escolar. Mas, esses dois indicadores também possuem um significativo número de clusters do tipo AB e BA, os quais somam 108 no caso do indicador de emprego no comércio e 87 quando se trata do indicador de emprego na agropecuária. Pode-se, então, dizer que a relação de espacialidade entre esses indicadores e a média municipal do atraso escolar depende, também, de outros fatores econômicos e sociais que devem ser levados em consideração.
Cardoso Gomes, Bresciani e Amorin (2016) afirmam que os resultados positivos na área da educação correlacionam-se com a realidade local e regional no que diz respeito às relações humanas, profissionais e políticas; também têm relação direta com a qualidade dos insumos escolares, com o ambiente de trabalho disponibilizado aos educadores e com o comprometimento da comunidade local. Ou seja, os fatores educacionais dizem respeito a um fenômeno complexo e a decisão educacional do adolescente também sofre a influência de diversos aspectos ligados à sua realidade, incluindo-se entre estes, as características sociais e econômicas dos municípios.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta pesquisa objetivou-se realizar uma análise da média municipal de abandono e atraso escolar, relacionando-as com alguns indicadores socioeconômicos dos municípios da região Sul do Brasil. Para isso, utilizou-se como ferramenta a AEDE, usada para testar a existência de organizações espaciais com padrões similares entre regiões vizinhas.
Nos resultados para a análise espacial univariada verificou-se a existência de autocorrelação espacial positiva dos dois indicadores educacionais (o abandono e o atraso escolar), o que foi corroborado com a existência de clusters significativos em que municípios com um valor alto para o indicador analisado estão rodeados por municípios em igual situação e vice-versa. Notou-se, com isso, a existência de agrupamentos de municípios com altos índices de evasão e atraso escolar e, por outro lado, agrupamentos de unidades espaciais com reduzidos índices para os dois indicadores educacionais.
A análise espacial bivariada mostrou que a instabilidade no mercado de trabalho, representada pela taxa de rotatividade e pela taxa de desemprego, afeta positivamente a taxa de abandono e atraso escolar em municípios vizinhos. Por outro lado, detectou-se a existência de efeito vizinhança negativo na relação, tanto do PIB per capita , quanto do IDHM, com os dois indicadores educacionais. Assim, o maior crescimento econômico e a melhoria do desenvolvimento humano, em determinados municípios, conduzem à redução do abandono e atraso escolar em municípios vizinhos. Os indicadores de emprego formal que se apresentaram significativos também apresentaram relação negativa na autocorrelação espacial com os indicadores educacionais.
Comprovou-se, com esses resultados, que os indicadores sociais e econômicos municipais afetam o abandono e o atraso escolar, a partir de um efeito vizinhança significativo. Desta forma, os adolescentes estão tomando a decisão de permanecer na escola e/ou dedicar-se aos estudos a partir da observação em relação à realidade na qual estão inseridos. Uma vez que a realidade local sofre o efeito das condições econômicas e sociais da região, a decisão final dos adolescentes e suas respectivas famílias sofre a influência de um conjunto de fatores econômicos e sociais encadeados entre si. Conclui-se, assim, que a melhoria dos níveis de emprego e da atividade econômica contribuem para elevar o nível educacional de adolescentes em idade para cursar o ensino médio. De modo especial, o estímulo econômico e social deveria ser maior nas regiões em que os indicadores aqui estudados se apresentam baixos, ou até mesmo negativos, o que caracterizaria a existência de bolsões de pobreza.
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Notas
Autor notes
Endereço dos autores: Rosangela Maria Pontili E-mail: rpontili@yahoo.com.brJefferson Andronio Ramundo Staduto E-mail: jarstaduto@gmail.comJonas da Silva Henrique E-mail: jhenriquebass@gmail.com