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Recepção: 27 Dezembro 2016
Aprovação: 12 Janeiro 2018
DOI: https://doi.org/10.13037/gr.vol35n103.4431
RESUMO: O presente estudo tem por objetivo identificar os fatores que acarretam o insucesso da relação entre consultorias empresariais e empreendedores em Santana do Livramento, Rio Grande do Sul/Brasil. A metodologia consiste em uma pesquisa exploratória, com abordagem qualitativa e utilização do método comparativo. Os dados foram coletados a partir de entrevistas com cinco consultores e cinco empreendedores de micro e pequenas empresas que já contrataram algum serviço de consultoria. Nos resultados, constatou-se que os principais fatores de insucesso ressaltados referem-se ao pré-diagnóstico mal feito por parte do consultor e a falta de comprometimento do cliente. Além destes, o fato do empreendedor não estar preparado para receber uma consultoria, a falta de disseminação dos líderes para os colaboradores sobre os benefícios da consultoria, a não definição de um responsável para aplicar o que é solicitado pelo consultor e a má qualidade dos serviços prestados por consultores despreparados e inexperientes, foram outros fatores mencionados como causadores dos insucessos na prestação da consultoria.
Palavras chave: Consultoria Empresarial, Relação consultor-cliente, Insucesso.
ABSTRACT: This study aims to identify the factors that may cause the failure in the relationship between business consultants and entrepreneurs in Santana do Livramento, Rio Grande do Sul/Brazil. The methodology adopted for this study consists of an exploratory research, with a qualitative approach and use of the comparative method. Data were collected from interviews with five consultants and five entrepreneurs of micro and small enterprises who have hired a consulting service. The results found that the low quality pre-diagnosis performed by the consultant and the lack of customer commitment was the main failure factors highlighted by respondents. In addition, the fact that the entrepreneur is not prepared to receive a consultation, the lack of dissemination about the benefits of consulting from leaders to employees, the lack of responsible for applying what is requested by the consultant, and the poor quality of services provided by untrained and inexperienced consultants, were other factors cited as causing the failures in the provision of advice.
Keywords: Business Consultancy, Relationship client-consultant, Failure.
1 INTRODUÇÃO
Ao considerar a importância da gestão empresarial para o desenvolvimento econômico e social do país, surgem as empresas que prestam serviços de consultoria. Estas empresas são constituídas para auxiliar empreendedores a guiarem os seus negócios e evitar seu encerramento precoce. As atividades de consultoria são vistas como ações estratégicas que concedem aos gestores a oportunidade de idealizar uma rota que os levem a tomarem decisões mais eficazes na administração de sua empresa (LEITE et al., 2009).
Conforme relatório do SEBRAE (2013), a taxa de sobrevivência de empresas constituídas em 2007 e com até dois anos de atividade foi de 75,6%, sendo superior as taxas das empresas constituídas em 2005 e 2006, que foram de 73,6% e 75,1 %, respectivamente, representando um índice de encerramento inferior. Estes dados mostram que é possível reduzir a taxa de mortalidade das micro e pequenas empresas (MPEs) por meio de ações adequadas de auxílio e suporte aos empreendedores, como, por exemplo, o trabalho das consultorias empresariais (BORGES; OLIVEIRA, 2014).
No entanto, o trabalho das consultorias pode não ter o efeito esperado, seja pela falta de confiança por parte do empreendedor em relação ao trabalho da consultoria (ALMEIDA; FEITOSA, 2010), por arrogância do empreendedor, sendo que tal comportamento parece atrapalhar sua capacidade de visualização do mercado e de seus próprios erros (MINELLO; ALVES; SCHERER, 2013) demorando a perceber a necessidade de apoio externo ou, até mesmo, pela falta de qualidade no serviço prestado pelas empresas de consultoria (WEISS, 2012).
A regionalidade também pode alterar os fatores que prejudicam a relação entre as empresas de consultorias e os empreendedores, pelo fato das realidades regionais e as capacidades de reagir às dificuldades encontradas na gestão do negócio serem distintas; assim as medidas de auxílio adotadas também deverão ser diferenciadas (SANTINI et al., 2015).
Nesse sentido, é importante estudar o papel das consultorias e sua relação com os empreendedores. Porém são poucos os estudos que detalham a relação consultor-cliente e mostram o fracasso deste relacionamento (CARVALHO; ARAÚJO; REZENDE, 2008; ALMEIDA; FEITOSA, 2010; SILVA JÚNIOR et al., 2012).
Além disso, o estudo se justifica por analisar o contexto de micro e pequenas empresas, visto que Christensen e Klyver (2006) apontam que há diferença significativa entre grandes e pequenas empresas, no que tange a utilização de consultorias de gestão. Mais especificamente, os autores mostram que em um período de dois anos, 72% das grandes empresas privadas contrataram serviços de consultoria, enquanto que apenas 33% das pequenas empresas o fizeram. A baixa frequência pode ser atribuída como um dos aspectos que prejudicam a relação entre consultores e pequenas empresas. E, quando há a contratação de uma consultoria, Christensen e Klyver (2006) mostram que o insucesso pode ser resultado de alguns paradoxos entre consultores e gestores das pequenas empresas, já que muitos consultores apontam que estes gestores são amadores, sem foco estratégico e também tendem a concentrar-se em problemas triviais. Por outro lado, os gestores evidenciam que os serviços prestados pelos consultores são de pouco ou nenhum uso efetivo na empresa.
A partir deste contexto, o presente estudo tem como objetivo identificar os fatores que acarretam o insucesso da relação entre consultorias empresariais e empreendedores em Santana do Livramento, município da região da campanha gaúcha, metade sul do Rio Grande do Sul-RS, Brasil, onde as empresas são, em sua maioria, de micro e pequeno porte. Ao compreender estes fatores espera-se que seja possível para consultores e empreendedores planejar ações para evitar erros ou minimizá-los.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
O mercado empresarial está cada vez mais competitivo e, nesse sentido, as empresas precisam focar no crescimento a partir da identificação de novas oportunidades, gerando inovação e desenvolvimento, e não apenas cortar despesas (HASHIMOTO, 2006). Se o empreendedor não estiver preparado e corretamente amparado para gerenciar o seu negócio, mesmo sendo otimista, ele poderá encontrar diversas adversidades no seu caminho, transformando o sonho do próprio empreendimento em um pesadelo (DORNELAS, 2008).
Neste contexto, os “sistemas de suporte”, os quais as consultorias, as incubadoras, as associações de empresas e as universidades são alguns exemplos, surgem como forma de apoio a esses empreendedores (DOLABELA, 2008). Os mesmos necessitam de mudanças nos processos produtivos e nos métodos de gestão da sua empresa, para conseguirem se adaptar a alta competitividade do mercado e as variações econômicas do país (BELFORT, 2004; CARVALHO; ARAÚJO; REZENDE, 2008; LEITE et al., 2009).
Essas mudanças devem ser bem planejadas para que tenham êxito, sendo que o planejamento é diretamente afetado pela rapidez do ambiente externo e pelas dificuldades em pensar algo para médio e longo prazo, exigindo ações rápidas (LEITE et al., 2009). Whittington (2006) exalta a participação de consultores externos especializados nos processos de mudanças e melhorias na gestão empresarial.
A palavra consultor é proveniente do latim, “consultore”, cuja tradução literal significa aquele que dá conselhos ou pede aconselhamento de alguém (LEITE et al.,2009). O consultor é contratado com o intuito de facilitar a realização das mudanças necessárias pelas empresas, sendo que, para ter êxito, deve buscar o comprometimento dos líderes da empresa e construir uma relação de confiança mútua com seu cliente em todas as etapas da consultoria (LEITE et al., 2009).
Em âmbito de relação entre consultor e empreendedor, pode-se destacar aspectos positivos e negativos que serão determinantes para o sucesso ou insucesso do serviço. Ao considerar que a consultoria não é executada apenas pelo consultor, mas da união de esforços entre consultor-cliente (CONCEIÇÃO, 2015), destaca-se a importância de uma boa relação entre as partes e de se trabalhar em equipe para que os resultados projetados durante a contratação do serviço de consultoria possam ser alcançados (ALMEIDA; FEITOSA, 2010; ALVES; DIAS; MONSORES, 2015).
Neste sentido, por terem poucas informações em relação ao trabalho das consultorias, vários micro e pequenos empreendedores julgam o consultor como sendo quem irá resolver todos os problemas e dificuldades na gestão do seu negócio, e quando a “mágica” não acontece, eles concluem que o serviço de consultoria não funciona (SANTOS; GOÉS, 2015). Cabe ressaltar que o consultor não tem a função de tomar decisões, mas de identificar os problemas e propor soluções em comum acordo com os responsáveis pela empresa que o contratou. Assim a responsabilidade de tomada de decisão é do cliente (ARTIOLI JÚNIOR; BORGES, 2015).
Desta forma, é demonstrado em estudos, como de Borges e Oliveira (2014) e Ralio e Donadone (2015), que com o auxílio e suporte adequado, é possível reduzir as taxas de mortalidade das micro e pequenas empresas, ressaltando a importância das consultorias na realização desse papel junto aos empreendedores e de uma boa relação consultor-cliente. No entanto, o papel das consultorias pode gerar críticas por parte dos clientes, pelo fato da percepção de que a única função do consultor é questionar tudo dentro da empresa e depois oferecer uma proposta de mudanças que não realiza e/ou apenas acompanha indiretamente os efeitos obtidos. Tal situação pode gerar um sentimento de desconfiança e distanciamento da empresa-cliente em relação à consultoria empresarial (CARVALHO; ARAÚJO; REZENDE, 2008).
Neste cenário, aspectos que podem gerar insucesso na relação consultoria e empreendedor referem-se a conduta da consultoria e resistência a mudanças do cliente. Para Block (2013) a resistência do cliente não ocorre pelo fato dele não concordar com as ideias propostas pelo consultor, mas sim por ser uma reação natural, emocional e previsível contra o fato dele estar sendo ajudado por um desconhecido e de estar sendo obrigado a enfrentar problemas organizacionais que não consegue, ou que até mesmo não quer enxergar.
O consultor deve ser um profissional preparado e com uma conduta ética na prestação dos seus serviços, para que possa realizar bons trabalhos junto aos empreendedores (OLIVEIRA, 2010; BLOCK, 2013; SANTOS; GOÉS, 2015). Contudo, ainda há um gradual aumento na prática dos serviços de consultorias por pessoas não especialistas em gestão. Por esse motivo é necessário que os empreendedores fiquem atentos para não contratar um serviço sem antes pesquisar sobre e, até mesmo, conversar com outros clientes desta consultoria, a fim de não confiar sua empresa para qualquer desconhecido (BELFORT, 2004).
Outro aspecto ressaltado por Oliveira (2010) é o fato de que ninguém é especialista em tudo, pois até consultorias de grande porte devem ter especialistas em cada setor específico o qual ela atua. O autor salienta que, para evitar problemas, as empresas-cliente das consultorias devem analisar o perfil de cada consultor em relação a suas experiências e capacitações, além de conversar com outros empresários que já buscaram esses serviços.
A pouca participação do cliente durante a consultoria prejudica o trabalho do consultor e, provavelmente, as ações planejadas poderão ser executadas de maneira não desejada, interferindo negativamente no desfecho da consultoria (SILVA JUNIOR et al., 2012). Em alguns casos, o cliente não possui a competência exigida ou o tempo necessário para a realização de determinado projeto dentro de sua empresa, ou ainda ele pode até considerar relevante uma visão externa e com neutralidade do consultor acerca de tal projeto, mas peca na sua realização ao não fazer o que lhe é proposto (LEITE et al., 2009).
Por isto, para Alves, Dias e Monsores (2015), além de resolver conflitos, a consultoria auxilia a aperfeiçoar a alocação dos recursos disponíveis, sendo que, geralmente, as pequenas empresas não possuem profissionais com qualificações em diversas áreas como finanças, logística, marketing, controle de estoques, etc., e em outras, o próprio empreendedor realiza todas as funções sem ter profundo conhecimento sobre elas. Com isso, os autores enfatizam que, ao contratar consultorias, além de minimizar erros, economiza-se com o custo de contratar profissionais especializados para cada área administrativa.
3 METODOLOGIA
Optou-se por uma pesquisa do tipo exploratória que, conforme Gil (2010), tem como objetivo proporcionar maior familiaridade sobre determinado problema, buscando torná-lo mais explícito. A pesquisa é considerada exploratória visto que, mesmo existindo vários estudos que descrevem a importância das consultorias e sua relação com os empreendedores, são poucos os que mostram o fracasso do relacionamento empreendedor-consultoria. Em relação à abordagem, trata-se de uma pesquisa qualitativa, que busca analisar profundamente aspectos relacionados a um determinado fato ou objeto, para proporcionar a realização de análises mais específicas a respeito de determinadas atitudes e tendências de comportamento (MARCONI; LAKATOS, 2011).
Para tanto, utilizou-se o método comparativo que, segundo Marconi e Lakatos (2011), é empregado para compreender o comportamento humano por meio de comparações, com o intuito de apurar similaridades e esclarecer diferenças entre pessoas, grupos ou sociedades. Buscou-se compreender a percepção de dois grupos de respondentes, os representantes das consultorias, denominados nesta pesquisa de C1 a C5, e os empreendedores que contrataram serviço de consultoria empresarial, denominados nesta pesquisa de E1 a E5, em relação a um mesmo fato: os fatores de insucesso na relação empreendedor-consultoria. O intuito desta análise foi o de comparar as opiniões dos grupos de respondentes entre si e, assim, analisar as semelhanças e diferenças do ponto de vista dos entrevistados sobre o tema em estudo.
As consultorias e os empreendedores foram escolhidos por meio de buscas na internet e nas principais redes sociais e por meio de indicações de contatos. Esta técnica é denominada purposeful sampling, que consiste no fato das informações serem obtidas por meio das redes de contatos dos pesquisadores, e é muito utilizada na realização de pesquisas qualitativas com o intuito de encontrar indivíduos, grupos e/ou organizações que tenham familiaridade com o tema/fenômeno em estudo (SURI, 2011).
Foram localizadas e contatadas, via e-mail, oito consultorias em Santana do Livramento-RS, sendo que cinco retornaram aceitando participar da entrevista. Já os empreendedores foram contatados depois de realizadas as entrevistas com os consultores, buscando equivaler à quantidade de consultorias e empreendedores, totalizando cinco empreendedores entrevistados.
Os dados foram coletados a partir da realização de entrevistas semiestruturadas, com base em dois roteiros, um para cada grupo, construídos a partir de estudos apresentados no referencial teórico, tais como os de Belfort (2004), Carvalho, Araújo e Rezende (2008), Almeida e Feitosa (2010), Silva Júnior et al. (2012), Block (2013), Alves, Dias e Monsores (2015) e Santos e Góes (2015). Como validação semântica dos roteiros houve a avaliação de um especialista da área de empreendedorismo, o qual realizou trabalhos acadêmicos e práticos a respeito do serviço de consultoria. As entrevistas foram realizadas pessoalmente com cada consultor (ou representante da empresa de consultoria) e empreendedor selecionado, sendo gravadas e posteriormente transcritas.
Na análise foram seguidas as fases de pré-análise, exploração do material e interpretação dos dados referentes à técnica de análise de conteúdo, que, segundo Bardin (2011), é um conjunto de métodos de análise que auxiliam na obtenção de indicadores que possibilitem aos pesquisadores tirarem conclusões sobre os dados obtidos com seus entrevistados.
A pré-análise, conforme a autora supracitada, equivale a etapa em que os documentos para análise são organizados e é planejada a maneira que será conduzida as etapas subsequentes. No caso deste estudo, os documentos são as transcrições das entrevistas, que após agrupar todas as transcrições em um só documento foi feita uma leitura flutuante deste, para destacar trechos e elaborar indicadores que auxiliem na interpretação das respostas dadas pelos representantes das consultorias e pelos empreendedores.
A exploração do material, segunda etapa da análise de conteúdo, consiste na realização do que foi planejado na pré-análise por meio da categorização, ou seja, classificar os conjuntos de elementos comuns por títulos genéricos (BARDIN, 2011). Primeiramente foram elaborados quadros com o perfil dos entrevistados no intuito de conhecer as peculiaridades do negócio das consultorias e dos empreendimentos, bem como facilitar a análise do estudo. Posteriormente, foram estabelecidas duas categorias de análise: insucesso nos serviços de consultoria e aprendizados com o insucesso das consultorias.
Já a última etapa, denominada interpretação dos dados, consiste em analisar os dados que foram organizados por categorias e comparar com a literatura existente sobre o tema em questão. Neste trabalho, a interpretação dos dados foi realizada comparando com os estudos apresentados no referencial teórico, sendo agrupados com os principais trechos retirados das entrevistas, seja textualmente, com quadros comparativos ou com figuras, tendo o propósito de melhor explicar os resultados. Após a análise das categorias foi feita uma síntese com os principais resultados da pesquisa.
4 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Nesta seção é apresentado o perfil dos entrevistados, seguido das duas categorias de análise – insucesso nos serviços de consultoria e aprendizados com o insucesso das consultorias – e, por fim, a síntese dos resultados.
4.1 Entrevistados
Os entrevistados estão divididos em dois grupos, o primeiro composto por gestores de empresas que prestam serviços de consultoria empresarial (categorizados pela letra C) e o segundo por empreendedores que em algum momento já buscaram o serviços de consultoria (categorizados pela letra E). Foram efetuadas dez entrevistas, das quais, além das questões relacionadas ao problema em estudo, foram coletadas informações a fim de apresentar o seu perfil, conforme quadro 1.

Em relação ao grupo das empresas de consultoria, ressalta-se que dos cinco entrevistados, quatro são consultores, exceto C2 que representou a consultoria do SEBRAE em Santana do Livramento-RS, sendo que sua função na instituição é relacionada à gestão de projetos. Dos quatro consultores efetivos, constam duas mulheres e dois homens, e a faixa etária e o tempo de atuação dos consultores são variados, de 26 a 49 anos e de 2 a 24 anos, respectivamente. Além disso, destaca-se que a maioria dos consultores são autônomos e externos às empresas, sendo que apenas um é consultor interno em uma organização, mas também dedica certa carga horária para prestação de serviços autônomos.
Quanto ao grupo de empreendedores, os entrevistados possuem faixa etária média de 30 anos. Ressalta-se que apenas E2, E3 e E5 ainda estão em atividade na cidade, sendo que E1 fechou seu empreendimento e E4 mudou-se para outro município. Possuem poucos colaboradores, sendo dois deles microempreendedores individuais. Vale destacar que todos os empreendedores entrevistados possuem algum tipo de formação acadêmica com ênfase em administração.
4.2 Insucesso nos serviços de consultoria
As ocasiões em que o trabalho do consultor não surte o efeito desejado podem ser consequência de diversos fatores como, por exemplo, o comportamento do empreendedor (MINELLO; ALVES; SCHERER, 2013) por defender exaustivamente seus ideais e rejeitar as propostas dos consultores; a desconfiança em relação ao fato de ter alguém externo “intrometido” nos processos da empresa (ALMEIDA; FEITOSA, 2010); a prestação de um serviço de má qualidade por parte do consultor (WEISS, 2012), dentre outros. Tendo conhecimento dos fatores, os fracassos na prestação do serviço de consultoria podem ser impedidos ou, ao menos, minimizados, porém isso não assegura que o trabalho do consultor produza melhorias significativas nas empresas-cliente (BLOCK, 2013).
Dos fatores de insucesso evidenciados nas entrevistas, o caso do empreendedor não estar preparado para receber uma consultoria foi considerado um dos mais relevantes para o insucesso. Este fator foi mencionado tanto pelos consultores quanto pelos empreendedores, ao mencionarem casos de insucesso na prestação do serviço, conforme os relatos de C4 e E1.
Em certo caso, a consultoria foi interrompida pelo empreendedor, [...] ele mesmo acreditava que ainda não estava pronto para contratar um serviço de consultoria, pois ele se sentiu pressionado com o que estava sendo proposto, [...] por ter que “puxar a responsabilidade para si”. E, conversando com ele, a gente concluiu que ele precisava de um tempo de amadurecimento para que ele pudesse progredir (C4).
Contratei uma consultoria bem conceituada, mas notei que eles não fazem um diagnóstico anterior para saber o meu nível de conhecimento gerencial, então ele chegou só com o “remédio”, olhando por cima o problema, sem tentar analisar a fundo a situação [...]. No meu caso ofereceram um plano de ação pra resolver meus problemas, só que naquela época eu não tinha conhecimento do que era isso, então eu ficava ouvindo o consultor, sem saber do que ele estava falando e isso acabou mostrando que eu ainda não estava pronto para uma consultoria [...] sendo que isso me ocorreu nas duas vezes, o que gerou apenas custos (E1).
Outro caso semelhante é o de E5, que contratou o serviço de consultoria, porém na hora de receber o serviço ele percebeu que não iria ser executado o que foi combinado inicialmente com o responsável pela consultoria. Isso se deve ao fato da consultoria em questão terceirizar consultores e, possivelmente, a comunicação não estar adequada. Este caso também é relatado por C1, que é uma consultora credenciada a organizações que terceirizam seus consultores e já passou por um caso parecido.
Fui até a empresa que presta a consultoria, a qual eles terceirizam os consultores, e conversei com um técnico especializado que realiza o atendimento. Nessa conversa ficou estabelecido que o consultor teria conhecimento do caso e iria para me auxiliar na realização do que foi combinado. Mas quando o consultor veio até a minha empresa, ele não tinha conhecimento do meu caso e propôs aplicar algo diferente do que foi concordado inicialmente. E daí resolvi trancar a consultoria pois percebi que a comunicação entre o técnico que me atendeu e o consultor que veio conversar comigo não foi feita corretamente, pois queria realizar algo que não foi combinado inicialmente (E5).
Por eu, além de consultora autônoma, ser consultora credenciada a empresas de apoio aos empreendedores que terceirizam seus consultores, às vezes acontece de alguns técnicos, que são os que fazem o primeiro contato com os empreendedores, desconhecerem alguns detalhes das consultorias e acabarem não passando para o empresário. E quando o consultor chega na empresa se depara com essa situação em que o empresário diz “bah não, isso aí não é pra mim, não é o que eu procuro” (C1).
Nos casos de E1 e E5, percebe-se que existe a possibilidade do pré-diagnóstico não ter sido realizado corretamente, pois o consultor não identificou o nível de conhecimento do empreendedor antes da efetivação do contrato, gerando custos que não trouxeram benefícios ao cliente. O caso de E5, especificamente, compara-se ao que é mencionado por Alves, Dias e Monsores (2015), que em certos casos os clientes idealizam um tipo de serviço, mas assumem outro ponto de vista após a apresentação da proposta de trabalho do consultor.
Nestes casos, C2 ressalta a importância do consultor perceber a velocidade da empresa, o grau de entendimento do empreendedor quanto à gestão empresarial, o nível da equipe que atua com ele, dentre outras características da empresa-cliente. Assim, pode definir a intensidade de consultoria que deve ser aplicada para surtir o efeito desejado, e não apenas aplicar pacotes prontos de consultoria. Para Conceição (2015), consultorias prontas são insuficientes no atual contexto empresarial com um mercado tão diversificado, tornando-se necessário que o consultor se posicione em relação às situações adversas das empresas e analise cada “doença organizacional” isoladamente.
Conscientizar a cúpula decisória e os gestores sobre a necessidade de se realizar mudanças nos processos da empresa não é tarefa simples, sendo considerado um dos principais desafios do consultor (LEITE et al., 2009). Os entrevistados mencionaram duas situações relacionadas à participação do cliente no processo de consultoria: a primeira quando não há a participação das lideranças da empresa no processo da consultoria e a segunda quando a liderança está ciente do seu papel, mas não são disseminados para o restante da equipe de trabalho os benefícios que a consultoria trará para o futuro da empresa.
A primeira situação, referente a não participação das lideranças nos processos da consultoria, pode ser visualizada na fala de C4. Já na segunda, que corresponde a participação das lideranças sem disseminar ao restante da equipe, ressalta-se a necessidade das lideranças comunicarem aos colaboradores sobre as melhorias que a consultoria trará à empresa, conforme relato de C1.
Chegamos a completar todo o ciclo da consultoria, que exigia comprometimento da direção, porém ela se eximiu do projeto e deixou na mão de um gerente, gerando dificuldades, pois quando o gerente ia implantar algo, trancava na direção, que demorava a aprovar as mudanças [...]. Quando os líderes não se comprometem fica difícil cobrar dos colaboradores por não fazerem e por quererem deixar do jeito que está. [...] a partir deste caso decidimos começar um projeto apenas se percebermos comprometimento da direção, pois se não há, acaba sendo frustrante depois (C4).
Muitas vezes a liderança está ciente da consultoria, mas quando chego na empresa percebe-se que não foi disseminado, que não foi acordado com a equipe de trabalho. Eles deixam a cargo do consultor realizar essa disseminação, enquanto o correto seria os líderes trabalharem essa questão da consultoria com a equipe, divulgando os seus benefícios, e depois, quando a consultoria entra na empresa para efetivamente trabalhar, o ambiente já está propício (C1).
As empresas possuem diferentes culturas, estratégias, portes e recursos e, por isso, é importante que a relação consultor-cliente esteja em sincronia, para que o empreendedor entregue ao consultor as informações solicitadas durante todas as fases da consultoria. Ele faz, portanto, um papel de intermediário entre consultor e empresa, para que o consultor possa analisar essas informações e propor as soluções e melhorias na gestão organizacional (LEITE et al., 2009; OLIVEIRA, 2010; SILVA JUNIOR et al., 2012). Assim, C5 menciona a necessidade da empresa possuir alguém que realize o que foi combinado entre consultor e cliente, sendo também citado por C2, ao responder sobre quando começou a indicar que a consultoria poderia não ter o efeito esperado.
Quando sentimos a dificuldade em agendar a próxima visita com o cliente, ou seja, o consultor faz a primeira visita, levanta as necessidades e detalha um plano de ação junto a um cronograma de execução [...]. Na segunda visita já começamos a cobrar o cliente perguntando: “você fez o que a gente combinou?! Conseguiu aplicar a metodologia?!”. Daí ele começa a perceber que deve colocar a “mão na massa” [...]. Nisso percebemos as dificuldades, seja através do consultor ou do cliente, pois muitas vezes o consultor pode ter problema, pode ter uma dificuldade qualquer e não conseguir concluir o cronograma (C2).
Quando o empreendedor não está totalmente em sintonia com o consultor, quando ele está com um comportamento mais contrariado, daí já é um grande sinalizador que não está fluindo o trabalho. Por isso deve acontecer uma mudança no empreendedor, pois é ele que promove este processo [...]. O consultor vai embora e quem fica é o empreendedor para seguir com o trabalho, por isso é importante que ele lidere todo o processo desde o início, e se ele não comprar a ideia, então não adianta, não vai surtir efeito (C5).
A responsabilidade pelo insucesso na prestação de consultoria não pode ser credenciada apenas aos empreendedores. Como mencionado no trecho de C2, muitas vezes o problema pode estar no consultor por não realizar o que foi acordado com o cliente durante a etapa de contratação do serviço. Weiss (2012) destaca que, embora a consultoria seja um serviço que apresentou um dos maiores crescimentos de demanda nos últimos anos, provavelmente a consultoria crescerá pouco no aspecto qualidade.
Qualquer pessoa pode ser consultor, pois não há legislação que proíba alguém de desempenhar esta atividade profissional (WEISS, 2012; BLOCK, 2013) e, provavelmente, por este motivo muitos profissionais desqualificados acabam manchando a imagem dos consultores ao prestarem serviços de má qualidade e que não dão resultado (BELFORT, 2004). Este caso com consultores inexperientes e que não prestam serviços de qualidade ocorreu com E4 e é ressaltado no trecho de C5.
No meu caso, contratei a consultoria mais em conta possível e, no final, acabei me arrependendo. [...] pelo meu conhecimento em administração eu conseguia ver que não estavam fazendo certo o trabalho, principalmente em relação à gestão de custos. No fim acabou não gerando impactos negativos na minha empresa, mas me trouxe um aprendizado de que serviço de consultoria deve ser contratado pela qualidade do consultor e não pelo preço, só que fiz essa escolha, pois não tinha como pagar uma consultoria (E4).
Quando o consultor assume uma empresa, está assumindo um relacionamento, tem que levar a sério e tem que entrar de corpo e alma na empresa, investindo seus esforços para alavancar aquele negócio, com comprometimento, pois o sucesso da empresa é o teu sucesso, [...] deve-se ter esse envolvimento verdadeiro em alavancar a empresa por parte do consultor, não fazer só tantas horas de trabalho e voltar com o dinheiro, mas sim deixar algo de valor para aquela empresa (C5).
A prestação de consultoria empresarial por não especialistas em administração é um fator crescente nos últimos anos, e isso obriga os empreendedores a pesquisarem bem o currículo do consultor, suas competências e até mesmo conversar com antigos clientes destes antes de colocar alguém de fora para trabalhar dentro de sua empresa (BELFORT, 2004). Após analisados os casos de insucesso vivenciados pelos consultores e empreendedores entrevistados, serão apresentados os principais aprendizados adquiridos com o insucesso na consultoria empresarial na categoria a seguir.
4.3 Aprendizados com o insucesso das consultorias
Conviver com ocasiões desafiadoras, relacionadas aos riscos e insucessos, é considerado um pré-requisito para a aprendizagem, sendo que novos conhecimentos são assimilados quando estamos diante da relação complexa entre refletir, aprender e agir (DIAS; MAERTENS, 2016). Às vezes é necessário vivenciar o fracasso para conseguir perceber os importantes aprendizados que eles podem trazer para o âmbito empresarial (WEISS, 2012).
Neste contexto, considera-se o insucesso como uma importante fonte de aprendizados e de novas competências empresariais (COPE, 2011; MINELLO; ALVES; SCHERER, 2013), seja para os empreendedores ou para os consultores, sendo que ambos são empresários. Este ponto de vista relacionado aos aprendizados que o insucesso proporciona pode ser evidenciado nos relatos de C3 e C4.
Todas as consultorias nos trazem aprendizados, pois conforme adquirimos experiência, começamos a melhorar a relação com nossos clientes, melhorar a maneira de se comunicar com eles e, assim, conseguir realizar um trabalho mais ágil e eficaz para os clientes saírem satisfeitos (C3).
Cada consultoria é um aprendizado novo, pois consultoria não é receita de bolo, e apesar de termos ferramentas e metodologias, não são todas que vão se enquadrar em todas as empresas. Então isso já é um aprendizado, de entender o perfil de cada empresa, sua cultura, suas individualidades (C4).
Conforme Weiss (2012), a consultoria empresarial é uma das raras profissões em que se aprende a cada trabalho realizado, seja ele um caso de sucesso ou fracasso. E o aprendizado é mantido no próximo trabalho, no próximo cliente, agregando valor ao serviço prestado, sendo que nenhum consultor de sucesso vive a mesma experiência mais de uma vez durante sua carreira.
Dos aprendizados que o insucesso na prestação da consultoria gera ao consultor, um deles é a questão da comunicação com o cliente, a qual o consultor deve buscar melhorar se quiser realizar um serviço de qualidade e que tenha êxito. Este contexto pode ser percebido nas falas de C1 e C3.
Meus principais erros estão relacionados à comunicação [...]. Eu tive que fazer todo um check-list dos pontos que eu devia clarear mais com os empresários, a própria comunicação com os colaboradores, pois hoje mesmo eu tenho um enorme cuidado ao conversar e fazer as entrevistas com eles. [...] e isso confirma que, se tudo ficar claro no início, se for bem comunicado ao cliente, o que significa a consultoria e os seus benefícios, daí não tem erro. Agora se não for bem comunicado no início, pode ter certeza que no decorrer da consultoria vai dar problema (C1).
Nós buscamos cada vez mais melhorar a nossa comunicação com o cliente, que é um aspecto importantíssimo para o sucesso das consultorias [...]. É fundamental uma boa relação com o cliente para que ele tenha confiança ao passar informações sobre sua empresa. [...] É importante ter uma boa comunicação consultor-cliente para que o trabalho da consultoria tenha êxito (C3).
A boa comunicação é de suma importância para a relação exitosa entre consultor e cliente, principalmente comunicação com as lideranças da empresa-cliente. São os líderes que possuem papel crucial ao acompanhar sua equipe de trabalho durante a realização da consultoria, sendo os responsáveis por repassar valores e disseminar a cultura organizacional do empreendimento para o melhor entendimento do consultor (LEITE et al., 2009).
Ressalta-se a importância do consultor pesquisar e entender o contexto vivenciado pela empresa-cliente, a fim de que, como sujeito externo, apresente um ponto de vista diferente dos colaboradores habituados à rotina da empresa e recomende planos de ação coerentes com as necessidades e com os recursos disponibilizados pela organização (SILVA JUNIOR et al., 2012).
A maioria dos empreendedores possui boas ideias e está disposto a pôr em prática, mas muitas vezes não consegue por falta de conhecimento gerencial, sendo que este desconhecimento pode transformar seu sonho em um fracasso. Porém, se tiver o auxílio de um profissional especializado, as chances de iniciar bem ou ampliar seu próprio negócio são enormes (SANTOS; GÓES, 2015). Essa combinação entre a criatividade do empreendedor e o conhecimento gerencial do consultor é incentivada por C5.
Se houver mesmo essa parceria de que ambas as partes se comprometam ao projeto, então vai para frente e tem tudo para dar certo [...]. Essa é a primeira conscientização, de se envolver realmente, pois existem excelentes consultores aqui em Livramento. E o corpo empresarial daqui também é bom, que querem fazer, mas às vezes falta conhecimento técnico. E se conseguir juntar a vontade do empreendedor com o conhecimento do consultor, alcançamos o sucesso (C5).
Experiências positivas ou negativas com consultorias empresariais influenciam diretamente na velocidade pela qual o cliente se envolverá nos processos de mudanças e depositará sua confiança no consultor (LEITE et al., 2009). Além disso, empreendedores que já contrataram um serviço de consultoria são os principais divulgadores deste serviço por meio da propaganda boca a boca, pois assim futuros clientes adquirem informações de quem são os consultores, como eles trabalham e se o serviço prestado é de qualidade (OLIVEIRA, 2010).
Buscar a recomendação de outros empresários que já contrataram um serviço de consultoria é uma atitude sugerida por C1, sendo que assim o cliente já adquire informações sobre o consultor para saber se ele possui capacidades que possam melhorar a situação da empresa e a qualidade dos serviços prestados.
Por parte das empresas, dos empreendedores, acredito que o que deve ser feito é buscar mais informações sobre o que é efetivamente uma consultoria, sobre o papel do consultor e sobre os ganhos que uma consultoria pode trazer, [...] fazer benchmarking com outras empresas que já realizaram consultoria e tiveram resultados significativos e mensuráveis. E, no momento de buscar alguma consultoria ou consultor, pesquisar a qualificação e experiência dos mesmos (C1).
Conforme relatado por C1, o benchmarking está relacionado ao fato de dialogar com empresários que já contrataram o serviço e que tiveram êxito, para compreender o funcionamento da consultoria e, logo, conhecer o sujeito externo que poderá ser contratado para analisar e vivenciar o cotidiano de sua empresa. Assim como menciona Belfort (2004), o empreendedor não entrega a sua empresa nas mãos de qualquer desconhecido.
O estudo de Almeida e Feitosa (2010) demonstrou que recomendações de outros empresários, experiências de sucesso ou fracasso, e negociações durante a elaboração do contrato de trabalho são os principais fatores para consolidação da confiança do cliente, sendo que recomendações influenciam a consultoria antes mesmo do seu início. Com isso, deve-se verificar se os empreendedores de Santana do Livramento, apesar de terem passado por algum caso de insucesso com os serviços de consultoria, possuem algum ressentimento em relação a ela e se contratariam novamente esse serviço no futuro (Quadro 2).

Observando o quadro, ressalta-se que, dos cinco empreendedores entrevistados, três já tiveram casos de insucesso com consultoria, mas esses casos não influenciam suas respostas quando perguntados se contratariam novamente esse tipo de serviço. Isso mostra que os empreendedores entrevistados reconhecem que a consultoria tem um importante papel para auxiliar as empresas nos processos de expansão e de melhorias na gestão.
Receber a opinião do cliente após a consultoria é importante para se alcançar a excelência na prestação do serviço, além de que é necessário fazer um acompanhamento das mudanças realizadas na empresa-cliente após o seu término (LEITE et al., 2009). Essa questão é ressaltada por C2, ao mencionar a importância de avaliar os resultados da consultoria para aperfeiçoar o serviço.
Temos um departamento encarregado de avaliar e monitorar as consultorias, então essa avaliação justamente traz para o departamento chamado “Gestão de Soluções”, os gaps, ou seja, as falhas e melhorias apontadas pelo cliente, ou identificadas por nós mesmos [...]. Isso naturalmente traz um resultado de assertividade daquilo que estamos aplicando, ajudando-nos a melhorar, adequar o serviço à “velocidade” que cada região possui, com sua disponibilidade de tempo e de recursos para uma consultoria (C2).
Conhecida internacionalmente como Follow-up, a etapa pós-consultoria serve para consolidar o trabalho do consultor e fidelizar clientes, pois nela o consultor avalia os resultados, analisa se há necessidade de corrigir eventuais erros, avalia os serviços prestados e recebe o feedback do cliente (LEITE et al., 2009). É uma etapa importante, pois um possível fracasso afeta diretamente a percepção do cliente sobre os serviços de consultoria, diminuindo as chances de acontecer um futuro trabalho do consultor na empresa (BLOCK, 2013). Com o feedback, o consultor identificará se a consultoria surtiu os efeitos esperados e analisará os possíveis erros ocorridos, para assim qualificar sua metodologia de trabalho.
4.4 Síntese dos Resultados
No quadro 3 estão apresentados os principais resultados obtidos nas entrevistas. O quadro está estruturado com duas colunas, sendo que a da esquerda indica a categoria de análise e a da direita apresenta um resumo das principais respostas dos consultores e dos empreendedores entrevistados.

Na primeira categoria – insucesso nos serviços de consultoria – apresentou-se os principais fatores que influenciam negativamente a relação consultor-cliente. Para melhor ilustrar as causas que acarretaram os casos de insucesso, mencionados pelos representantes das consultorias e pelos empreendedores entrevistados, utilizou-se como modelo o diagrama de causa e efeito, também conhecido como espinha-de-peixe. Segundo Araujo (2008), trata-se de um diagrama que relaciona um efeito/problema a suas possíveis causas, sendo uma importante ferramenta para ações de planejamento, pois facilita organizar de maneira racional o pensamento, motivando debates mais produtivos sobre determinado assunto. O diagrama está representado na Figura 1 e corresponde a percepção dos consultores e empreendedores entrevistados quanto aos fatores que acarretam o insucesso dos serviços de consultoria empresarial.

Dos fatores de insucesso ressaltados, o pré-diagnóstico equivocado por parte do consultor e a pouca participação do cliente durante os processos foram considerados os mais relevantes ao analisar os relatos dos entrevistados, pois podem prejudicar todas as etapas da consultoria. O primeiro fator prejudica no caso do consultor não ter adquirido as informações necessárias em relação às competências do empreendedor e aos recursos disponibilizados pela empresa. Já o segundo, prejudica por ser fundamental a participação do cliente, o qual possui o conhecimento sobre sua empresa, sobre como ocorrem os processos, sobre quem são seus clientes e, com isso, tem a função de passar essas informações para o consultor. Além disso, durante as entrevistas, notou-se que cada caso de insucesso mencionado era decorrente de apenas um fator, apesar de que nada impede que outros casos possam ter influência de mais de um fator e de que a ocorrência de apenas um dos fatores mencionados já possa deixar a relação consultor-cliente instável.
Já a segunda categoria – aprendizados com o insucesso das consultorias – proporcionou uma análise do que pode ser tirado de positivo dos casos de insucesso, sendo que cada consultoria é considerada um novo aprendizado para o consultor, do qual ele busca aperfeiçoar seus métodos de trabalho e realizar serviços mais eficientes e eficazes.
A comunicação com os clientes é ressaltada como a característica das quais os consultores devem buscar aperfeiçoamento constantemente, sendo que isto se deve a necessidade de conquistar a confiança do cliente desde o primeiro contato. É importante que o consultor realize um pré-diagnóstico preciso, ou seja, uma primeira avaliação da situação da empresa e das possíveis melhorias a serem executadas, sendo este pré-diagnóstico sem custos para o cliente. Assim o consultor compreende o caso da empresa, analisa se é realmente uma consultoria empresarial que ela necessita, transmite confiança para o cliente, podendo diminuir os riscos do insucesso. Outro ponto a ser destacado é a questão de o empreendedor realizar o benchmarking em relação aos serviços de consultoria, ou seja, conversar com empreendedores que já contrataram o serviço e tiveram experiências positivas ou negativas. Para, deste modo, obter informações sobre os consultores, principalmente no que tange a qualidade do serviço prestado e, então, contratar consultores com boas referências no mercado.
Como reflexões a respeito do processo de consultoria empresarial e os fatores potenciais de insucesso elencados pelo presente estudo, percebe-se que questões relacionadas à economia e ao ambiente externo, não foram mencionadas como uma relação/causa direta no insucesso das consultorias, sendo que os fatores são voltados, principalmente, aos comportamentos e atitudes, tanto do consultor quanto do cliente, fatores internos da relação. Destaca-se que os fatores não são direcionados a apenas uma das partes da relação consultor-cliente, ou seja, a responsabilidade pelo insucesso pode ser tanto do consultor quanto do cliente, seja pelos comportamentos e características do empreendedor, ou pelo método e qualificação do consultor.
A partir disso, em uma perspectiva conjectural, pode-se considerar outro fator a respeito do empreendedor, como um possível comportamento de excesso de confiança. O mesmo busca pelo serviço de consultoria, mas de maneira geral, tal solicitação pode ser apenas no sentido de confirmar as suas decisões pessoais. Em outras palavras, o excesso de confiança induz o indivíduo a confiar em suas opiniões e conhecimentos, acreditando que sua tomada de decisão está sempre correta e adequada ao contexto. Tal viés é frequentemente explorado em estudos de insucesso do empreendedor que, geralmente, não consegue perceber tal fato antes da falência de sua empresa (UCBASARAN et al., 2010; MINELLO; ALVES; SCHERER, 2013). Neste sentido, pode-se conjecturar que a falta de comprometimento por parte dos empreendedores está relacionada a vieses comportamentais, os quais prejudicam o processo de condução da consultoria. Além disso, podem criar um cenário de desconfiança mútua (ALMEIDA; FEITOSA, 2010), já que o empreendedor crê que suas escolhas estão mais acertadas que as recomendações realizadas pelos consultores.
Depois de realizada a síntese dos resultados apresenta-se as considerações finais, relembrando os objetivos do estudo, as contribuições obtidas, as limitações na realização da pesquisa e sugestões de novos estudos.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo teve por objetivo identificar os fatores que acarretam o insucesso da relação entre consultorias empresariais e empreendedores em Santana do Livramento-RS. Constatou-se que, dos fatores identificados, o pré-diagnóstico equivocado e a falta de comprometimento do empreendedor durante os processos da consultoria foram os mais ressaltados pelos entrevistados como aqueles que influenciam diretamente no insucesso da relação consultor-cliente. Além destes, observou-se como fatores de insucesso: o fato do empreendedor não estar preparado para receber a consultoria, a falta de disseminação dos líderes para os colaboradores em relação às melhorias provenientes da consultoria, a não definição do responsável da empresa em aplicar o que é solicitado pelo consultor e a má qualidade dos serviços prestados por consultores despreparados e inexperientes.
Percebeu-se que a culpa pelo insucesso é passada do consultor para o cliente e vice-versa, embora os consultores entrevistados concordem que há muitos profissionais que realizam maus trabalhos e acabam manchando a imagem do serviço de consultoria empresarial. Neste sentido, há concordância nas opiniões dos consultores e dos empreendedores entrevistados em relação às causas do insucesso, sendo que, além do fator consultores inexperientes e que prestam serviços de má qualidade, também concordaram no fator “primeiro contato”, considerada etapa mais importante para consolidar a boa relação desta parceria. Nenhum dos entrevistados mencionou questões relacionadas à economia e ao ambiente externo como fatores de insucesso, sobressaindo-se as questões comportamentais. Contudo, também não foi mencionado o excesso de confiança que induz o indivíduo a pensar que está sempre correto e a não confiar no outro, fator já apontado em estudos de insucesso empreendedor e que, neste trabalho, apresenta-se como uma conjectura.
O estudo sobre a relação existente entre as consultorias e os empreendedores de micro e pequenas empresas mostra que este assunto ainda não esgotou os argumentos afins, sendo este um estudo inicial que propicia novas perspectivas acerca da temática investigada. Vale ressaltar, como limitação, que os resultados refletem a realidade do contexto analisado, o qual é representado pelos empreendedores e consultores de Santana do Livramento-RS. Nesse sentido, os fatores identificados podem ser considerados potenciais fatores de insucesso e futuros estudos podem identificar outros aspectos que não foram encontrados nesta pesquisa.
Destaca-se, ainda, a dificuldade para encontrar empreendedores que contrataram consultoria e que se dispusessem em realizar a entrevista, fato este que dificultou a delimitação do número de entrevistados para este estudo, que seriam somente empreendedores que já tiveram algum caso de insucesso com consultoria. Esta dificuldade se deu, principalmente, pelo critério de sigilo adotado pelos consultores em relação as suas empresas-cliente, os quais não divulgam os empreendedores em que seus serviços não tiveram êxito. Com isso, encontrar apenas empreendedores que tiveram casos de insucesso com consultorias não foi possível, limitando a pesquisa para empreendedores que já contrataram serviços de consultoria.
Por conseguinte, sugere-se para futuros estudos a realização de uma pesquisa quantitativa, com empreendedores e consultores, para testar hipoteticamente os fatores que acarretam o insucesso nos serviços de consultoria identificados no presente estudo. Tal sugestão permitirá uma análise mais abrangente e a generalização dos resultados encontrados neste grupo de respondentes para uma coletividade maior. Além disso, a utilização de outras técnicas qualitativas, tais como o grupo focal e o Delphi, são propostas pertinentes e que podem possibilitar uma análise mais profunda acerca do insucesso nos serviços de consultoria.
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Autor notes
Endereço dos autores: Leonardo Caliarileonardo_caliari@hotmail.comLaura Alves Schererlauralvescherer@gmail.comSilvia Amélia Mendonça Floressilviaamflores@gmail.com