Pesquisa
Adesão de mães de bebês prematuros com indicadores clínicos de saúde emocional à grupos psicoeducativos
Adherence of mothers of premature babies with clinical indicators of emotional health to psychoeducational groups
Adhesión de madres de prematuros con indicadores clínicos de salud emocional a grupos psicoeducativos
Adesão de mães de bebês prematuros com indicadores clínicos de saúde emocional à grupos psicoeducativos
Vínculo – Revista do NESME, vol. 19, núm. 2, pp. 210-221, 2022
Núcleo de Estudos em Saúde Mental e Psicanálise das Configurações Vinculares
Recepção: 19 Setembro 2021
Aprovação: 11 Setembro 2022
Resumo: Diversos fatores podem interferir na saúde emocional materna e, dentre eles, o nascimento prematuro do bebê. Este estudo pretendeu: a) descrever e comparar a saúde emocional de mães de bebês prematuros que aderiram ou não a grupos psicoeducativos, com indicadores clínicos de ansiedade, estresse e depressão pós-parto e, b) identificar quais variáveis sociodemográficas influenciaram a saúde emocional das participantes de cada um dos grupos. A amostra foi composta por 42 mães de bebês prematuros que apresentaram indicadores clínicos de saúde emocional, que foi avaliada por meio de inventários de estresse, ansiedade e depressão. Elas compuseram dois grupos: 22 mães que participaram dos grupos e 20 que não participaram. Não foram observadas diferenças significativas entre as variáveis sociodemográficas e nem entre os indicadores de saúde emocional entre os dois grupos. Todavia, é importante identificar os indicadores emocionais clínicos de mães de bebês e oferecer intervenções para minimizá-los, enquanto medidas preventivas de saúde mental da população feminina e, consequentemente, infantil.
Palavras-chave: Saúde emocional materna, psicoeducação, adesão, prematuridade.
Abstract: Several factors can interfere in maternal emotional health and, among them, the premature birth of the baby. This study aimed: a) to describe and compare the emotional health of mothers of premature babies who joined or not to psychoeducational groups, with clinical indicators of anxiety, stress and postpartum depression and, b) identify which sociodemographic variables influenced the emotional health of participants in each of the groups. The sample consisted of 42 mothers who presented clinical indicators of emotional health, which was assessed through inventories of stress, anxiety and depression. They composed two groups: 22 mothers who participated in the groups and 20 who did not. No significant differences were observed between sociodemographic variables or between emotional health indicators between the two groups. However, it is important to identify the clinical emotional indicators of mothers of premature babies and offer interventions to minimize them, as preventive measures for mental health in the female population and, consequently, in children.
Keywords: Maternal Emotional Health, psychoeducation, accession, prematurity.
Resumen: Varios factores pueden interferir con la salud emocional materna y, entre ellos, el nacimiento prematuro del bebé. Este estudio tuvo como objetivo: a) describir y comparar la salud emocional de madres de bebés prematuros que ingresaron o no a grupos psicoeducativos, con indicadores clínicos de ansiedad, estrés y depresión posparto y, b) identificar qué variables sociodemográficas influyeron en la salud emocional de las madres en cada uno de los grupos. La muestra estuvo conformada por 42 madres de bebés prematuros que presentaron indicadores clínicos de salud emocional, la cual fue evaluada a través de inventarios de estrés, ansiedad y depresión. Compusieron dos grupos: 22 madres que participaron en los grupos y 20 que no. No se observaron diferencias significativas entre variables sociodemográficas ni entre indicadores de salud emocional entre los dos grupos. Sin embargo, es importante identificar los indicadores clínicos emocionales de las madres de bebés prematuros y ofrecer intervenciones para minimizarlos, como medidas preventivas para la salud mental de la población femenina y, en consecuencia, de los niños.
Palabras clave: Salud Emocional Materna, psicoeducación, adhesión, precocidad.
Introdução
A gestação e o parto são acontecimentos importantes na vida de uma mulher. Quando associado ao nascimento prematuro do bebê pode gerar impactos significativos na saúde emocional e no bem-estar da puérpera, ocasionando em novos desafios a serem vivenciados pelos pais (Henderson, Carson, & Redshaw, 2016). Nessa situação, a mãe que acompanha o bebê hospitalizado vivencia mudanças significativas em seu contexto familiar, nos hábitos diários, projetos de vida e na relação com seus familiares, com maiores chances de ter a sua saúde emocional afetada (Marciano, Evangelista, & Amaral, 2019).
Alvarenga et al. (2018) também consideraram alguns fatores de contexto como, por exemplo, a quantidade de filhos, a falta de convivência com o pai do bebê e a baixa escolaridade, que podem contribuir para o desencadeamento de transtornos emocionais. De acordo com os autores, mães com maior número de filhos podem apresentar escores elevados de sofrimento emocional.
A relação entre variáveis sociodemográficas e a depressão pós parto de mães de bebês com Síndrome de Down foi analisada por Ferreira, Campos e Rodrigues (2019). As autoras encontraram que a escolaridade, o tipo de família e a idade do bebê foram preditores para depressão pós parto para essa população.
Alves, Rodrigues e Cardoso (2018) analisaram a influência de variáveis sociodemográficas sobre a saúde emocional de mães de bebês com doenças graves. Os resultados apontaram que, quanto menor a escolaridade e mais avançada a idade da mãe, maior a Ansiedade Traço.
Neste sentido, variáveis sociodemográficas parecem influenciar a saúde emocional materna que, por sua vez, incide negativamente na interação entre a díade e no desenvolvimento do bebê. Os bebês de famílias economicamente vulneráveis e com menores níveis de escolaridade, tendem a apresentar atrasos no desenvolvimento cognitivo (Clearfield, Stanger, & Jenne, 2015; Mermelshtine & Barnes, 2016). Com relação aos indicadores emocionais, é possível verificar que mães com depressão pós-parto interagem e se relacionam menos com seus bebês, apresentando menor demonstração de afetividade (Brummelt & Galea, 2016; Choi, 2013; Edwards & Hans, 2016).
Considerando que diversas variáveis e fatores podem interferir na saúde emocional materna e, também, repercutir na relação da díade e no desenvolvimento do bebê, Manente e Rodrigues (2016) reforçaram a importância da avaliação da saúde emocional materna durante o período da gestação e no puerpério. Para as autoras, o rastreio dos indicadores de estresse, ansiedade e depressão de mães de bebês, seguido de intervenções pontuais, poderiam favorecer o bem-estar e saúde emocional da mulher e, consequentemente, proporcionarem melhor relação entre a díade, contribuindo para o melhor desenvolvimento da criança.
Meschino et al. (2016) utilizaram o Índice de Estresse Parental (PSI), a Escala de Depressão Pós-natal de Edimburgo (EPDS) e o Inventário de Ansiedade de Beck (BAI) para avaliar a saúde emocional de mães de bebês de seis a 12 meses, antes e depois de um programa de intervenção com o objetivo de refletir sobre estratégias para o enfrentamento de transtornos de humor e parentalidade. Os dados do pré-teste apontaram para frequências mais altas de depressão e ansiedade, concluindo para a importância de vigilância da saúde emocional de mães de bebês.
Divididos randomicamente, um com acompanhamento tradicional em consultas e outro com apoio terapêutico utilizando escrita expressiva, Horsch et al. (2016) compararam os indicadores de estresse e a depressão materna, avaliados antes e depois dos procedimentos. A escrita expressiva mostrou-se mais efetiva para a diminuição dos indicadores clínicos de saúde mental materna. Das 105 mães avaliadas inicialmente, 54 concluíram o pós-teste. Os autores compararam as variáveis sociodemográficas das participantes que abandonaram qualquer um dos tipos de procedimentos e as que permaneceram, mas não encontraram diferenças significativas entre elas.
Peres e Santos (2018) realizaram um estudo para verificar a eficácia do grupo de apoio por meio do aconselhamento terapêutico oferecido às mães de bebês. Nos resultados obtidos constataram a presença de estratégias de enfrentamento mais funcionais em relação às adaptações do nascimento prematuro e restabelecimento de equilíbrio emocional por meio da troca de experiência entre as participantes. Contudo, apesar dos resultados e da literatura apontar para a importância e eficácia dos grupos terapêuticos, os autores reconheceram dificuldades com relação à adesão das mães a este tipo de intervenção.
A adesão às intervenções propostas pode ser um entrave na eficácia de programas de saúde. Moraes, Rolim e Junior (2009) caracterizaram a adesão como um conjunto de respostas cuja característica comum é o seguimento de orientações proporcionadas pelos profissionais de saúde (praticar exercícios físicos, tomar medicamentos etc.) devendo envolver, também, mudanças no repertório comportamental e cognitivo de indivíduos e grupos (deixar de fumar, prevenir situações evocadoras de estresse, adquirir hábitos seguros de relacionamento sexual). Calvetti, Marques e Gauer (2002), por exemplo, explicaram que a adesão pode ser considerada similar à aquisição de um hábito, onde informações são absorvidas e habilidades aprendidas, resultando na incorporação do tratamento à rotina diária.
Dentre as variáveis que contribuem para adesão a tratamentos pode-se citar o incentivo da rede de apoio do participante e a confiança no profissional e, entre as que dificultam está o conflito de horário entre participantes e instituição e/ou profissional (Santos, 2016; Mazzaia & Souza, 2017). Santos (2016) destacou que a preocupação dos terapeutas em conciliar horários com as participantes foi o diferencial para o sucesso de grupos terapêuticos com famílias participantes de grupos de educação parental. Mazzaia e Souza (2017) ressaltaram que um aspecto essencial para adesão é a construção da confiança entre o paciente e profissional. A participação da família é fundamental para adesão e a equipe deve direcionar os cuidados e as orientações para os familiares, considerando o sofrimento vivenciado por aquele que precisa de acompanhamento ou tratamento.
Um outro aspecto relacionado à adesão a serviços são as variáveis sociodemográficas. Capela (2020) analisou variáveis responsáveis pelo baixo envolvimento e a elevada taxa de desistência em um programa de intervenção parental. Um maior nível socioeconômico e grau de escolaridade dos pais e um menor número de filhos foram preditores de níveis mais elevados de adesão ao programa. Há um conjunto expressivo de produções científicas sobre a influência de variáveis sociodemográficas relacionadas a adesão a tratamentos medicamentosos, mas poucos relacionados a grupos terapêuticos, especialmente com pais de crianças com questões diversas como prematuridade, problemas de comportamento entre outros.
Identificar variáveis sociodemográficas que incidem sobre a adesão ou não a grupos de intervenção quando há indicação para tal, poderia indicar estratégias que seriam mais eficientes para aumentá-la, garantindo o acesso ao tratamento terapêutico daqueles que dele necessitam. Todavia, também é importante verificar se mães que não aderem tem mais indicadores clínicos de saúde emocional do que mães que aderem. Neste caso, seria importante uma ênfase maior no encaminhamento para serviços de atendimento individuais.
Pretendeu-se nesse estudo descrever e comparar a saúde emocional de mães de bebês prematuros que aderiram ou não a grupos terapêuticos, todas com indicadores clínicos de ansiedade, estresse e depressão pós-parto e quais variáveis sociodemográficas influenciaram a saúde emocional das mães de cada um dos grupos.
As hipóteses que nortearam este estudo foram: a) mães que aderiram ao grupo terapêutico teriam mais indicadores de saúde emocional do que as que não aderiram; b) haveria diferenças entre as variáveis sociodemográficas dos dois grupos que explicariam a não adesão ao grupo terapêutico.
Método
Participantes
A amostra deste estudo foi composta por 42 mães e seus respectivos bebês nascidos pré-termo (≤ 35 semanas de idade gestacional) com baixo peso (≤ 2000g). As díades participavam do projeto Bebês prematuros: programa de estimulação ao desenvolvimento e apoio emocional às mães (NUP 25000/079132/2015-80), financiado pelo Ministério da Saúde, por meio do Programa Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência (PRONAS/PCD) e aprovado pelo Comitê de Ética. Antes do início da coleta todos os cuidados éticos foram tomados. O referido projeto foi desenvolvido em parceria com o Centro Especializado em Reabilitação, a Sorri-Bauru. SP. As mães e seus bebês foram encaminhados ao projeto por meio da Secretaria de Saúde, via Banco de Leite Humano, que mensalmente disponibilizava uma lista de todos os bebês nascidos prematuros. A amostra foi composta por mães de bebês prematuros que apresentaram dois ou mais indicadores emocionais clínicos, avaliadas aos três meses de idade do bebê, por ocasião da sua entrada no projeto. As mães foram divididas em dois grupos. O Grupo 1 (G1) era constituído por 22 mães que participaram de um grupo de psicoeducação e o Grupo 2 (G2), era formado por 20 mães que não participaram do referido grupo por motivos diversos, como incompatibilidade de horário com o oferecido pela instituição, falta de interesse em participar, não ter com quem deixar outros filhos entre outros.
Instrumentos
Os dados sociodemográficos foram obtidos por meio de uma entrevista inicial com a mãe, informações estas transcritas para protocolos específicos do Serviço Social da instituição na ocasião da primeira avaliação do bebê. Os dados referentes ao bebê foram obtidos do prontuário eletrônico da criança que registra sua história enquanto paciente da instituição.
Para avaliar a depressão materna foi utilizado a Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgo (Edinburgh Postpartum Depression Scale - EPDS) de Cox, Holden e Sagovsky (1987), foi validada para a população brasileira por Santos, Martins e Pasquali (1999) e por Santos et al. (2007). É um instrumento autoaplicável composto por 10 questões que avaliam como a mulher se sentiu na última semana. Os sintomas abordados são: humor deprimido ou disfórico, distúrbio do sono, perda do prazer, ideias de morte e suicídio, diminuição do desempenho e culpa. Para cada pergunta, há quatro opções de resposta, sendo que a cada resposta uma pontuação é atribuída variando de zero a três. A somatória dos pontos das respostas resulta no escore da escala que varia de zero a 30. Sugere-se um ponto de corte maior ou igual a dez para identificar mulheres com provável depressão pós-parto ou depressão em nível clínico. O coeficiente alfa de Cronbach encontrado por Malloy-Diniz, Schlottfeldt, Figueira e Corrêa (2010) foi de 0,87 e o melhor ponto de corte foi o de 10 pontos, o qual apresentou 86,4% de sensibilidade e 91,1% de especificidade para indicadores de depressão pós-parto ou depressão em nível clínico.
O Inventário de Ansiedade Traço-Estado (IDATE) (State-Trait Anxiety Inventory - STAI) de Spielberger, Gorsuch e Lushene (1970), validado no Brasil como Inventário de Ansiedade Traço-Estado (IDATE) por Biaggio e Natalício (1979), foi utilizado como medida da ansiedade. O IDATE é formado por duas escalas, cada uma com 20 afirmações sendo que uma avalia a maneira com o indivíduo se sente em determinado momento (IDATE-estado) e a outra como o indivíduo geralmente se sente (IDATE-traço). Os escores podem variar de 20 a 80 pontos. Análises do alfa de Cronbach revelaram índices de consistência altos, variando entre 0,82 e 0,89 para IDATE Traço e Estado (Fioravanti et al., 2006).
O estresse materno foi avaliado pela Escala de Estresse Percebido (Perceived Stress Scale - PSS-14) (Cohen; Karmack & Mermelsteinm, 1983) e foi traduzida no Brasil como Escala de Estresse Percebido (PSS-10) e validada em três estudos (Faro, 2015; Lufftet al., 2007; Reis et al., 2010). A PSS avalia a percepção do indivíduo sobre quão imprevisíveis e incontroláveis lhe parecem os eventos de vida vivenciados no último mês. É composta por 14 itens com opções de resposta que variam de zero a quatro (0=nunca; 1=quase nunca; 2=às vezes; 3=quase sempre; 4=sempre). A soma da pontuação das questões fornece escores que podem variar de zero a 56 pontos. O valor do alfa de Cronbach obtido foi com o PSS-14 e PSS-10 foi de 0,967 (Faro, 2015).
A Escala de Estresse Parental (Parenting Stress Index - PSI) (Abidin, 2012) é um questionário de aplicação a pais (mãe/pai) e faculta uma medida da intensidade do estresse que ocorre no sistema pais-criança. Adaptada para o Brasil como Índice de Estresse Parental (PSI) (Pereira et al., 2016) e para avaliar sintomas de estresse nas mães foi utilizado o Índice de Estresse Parental-Forma Curta (PSI-4-SF), constituído por 36 questões cujas respostas são ajustadas a uma escala do tipo Likert: concordo completamente (1), concordo (2), não tenho certeza (3), discordo (4) e discordo completamente (5). São divididas em três domínios, sendo o primeiro deles denominado “Angústia dos pais” (AP), que determina o nível de angústia que a mãe experimenta em seu papel de mãe, em função de fatores pessoais que estão diretamente relacionados à parentalidade. O outro domínio compreende a “Disfuncionalidade na interação mãe-filho” (IC), o qual foca a percepção materna de que a criança não atinge as expectativas de sua mãe e o fato das interações com a criança não reforçarem o seu papel como mãe. O terceiro domínio, denominado “Criança difícil” (CD) incide sobre algumas das características comportamentais básicas das crianças que são tomadas como fáceis ou difíceis de administrá-las. É possível obter um escore geral de estresse e o nível de estresse em cada domínio. A interpretação desses níveis pode resultar em estresse normal (percentil de 16 a 84), estresse elevado (percentil de 85 a 89), estresse clinicamente significativo (igual ou acima do percentil 90) (Abidin, 2012). A confiabilidade do instrumento avaliada pelo Alfa Cronbach foi satisfatória em seu conjunto (α=0,91) e em seus domínios: Domínio da criança (α=0,87) e domínio dos pais (α=0,88) (Pereira et al., 2016).
Local
Os dados foram coletados em sala de atendimento individual contendo mesa e cadeiras, garantindo a privacidade das mães.
Procedimento de coleta de dados
A coleta de dados com as mães foi realizada individualmente, por ocasião da entrada do bebê no programa de Intervenção Precoce, em horário previamente agendado. Inicialmente a mãe respondia a uma entrevista para coleta dos seus dados sociodemográficos e do bebê. Em seguida era convidada a responder aos instrumentos de avaliação da saúde emocional, apresentados na seguinte ordem: EPDS, IDATE, PSI e PSS. As mães que apresentaram indicadores emocionais clínicos de ansiedade, depressão e estresse foram convidadas a participar de um grupo de psicoeducação que objetivou oferecer apoio à saúde emocional no pós-parto. Constituído por cinco encontros com temáticas diferentes abordando tópicos educativos e estratégias de enfrentamento, as mães foram convidadas a refletir sobre seu histórico de vida e sua possível influência nas respostas de parentalidade e no desenvolvimento do seu bebê. Mediante o conhecimento adquirido foram levantadas possibilidades de aplicabilidade do conhecimento e adoção de estratégias de relacionamento com seu bebê.
Procedimentos de análise de dados
Os dados das avaliações da saúde emocional foram analisados segundo as normas de correção prevista nos manuais de cada instrumento. A ansiedade, depressão e estresse foram considerados a nível clínico com base nos seguintes critérios: Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgo (EPDS) - Pontuações igual ou acima de 10; Inventário de Ansiedade Traço-Estado (IDATE) - Estado: acima de 48 ou mais; Traço: acima de 49 pontos ou mais; Escala de Estresse Percebido (PSS) - Pontuações acima de 30 pontos e, Indicie de Estresse Parental (PSI) - Angústia Parental: 38 pontos ou mais; Interação com a Criança: 34 pontos ou mais; Criança Difícil: 38 pontos ou mais; Estresse total: 110 pontos ou mais. O tratamento estatístico incluiu análises por meio do Teste t de Student, para amostras independentes, para avaliar a existência de diferença significativa entre as médias de duas amostras (G1 X G2), após a verificação de normalidade dos dados. Análises de correlação de Pearson também foram conduzidas para avaliar a associação entre os resultados de saúde emocional e variáveis sociodemográficas das mães e dos bebês. Os dados foram analisados utilizando o pacote estatístico SPSS 27 (Statistical Package for the Social Sciences) com critério de significância p<0,05.
Resultados
A Tabla 1 apresenta os dados sociodemográficos das mães dos dois grupos. Quanto à idade, nos dois grupos houve uma prevalência de mães com idade entre 31 a 35 anos. Quanto à escolaridade, a maioria das mães do G1 tinha Ensino Médio completo e as do G2 Ensino Fundamental completo. Tanto no G1 como no G2, a maioria das mães não trabalhava. A família nuclear prevaleceu nos dois grupos. Também, a maioria das mães dos dois grupos não planejou a gravidez, prevalecendo o parto cesárea.
A Tabla 2 apresenta a caracterização dos bebês dos dois grupos, filhos das mães que compuseram a amostra deste estudo. Nos dois grupos prevaleceram bebês do sexo masculino. Quanto à idade gestacional, no G1 e G2, a maioria dos bebês nasceu entre 34 a 36 semanas de gestação, com peso entre 2.001 a 2.500grs. A maioria deles permaneceu internado até 10 dias e tinha pelo menos um irmão.
Análises estatísticas foram conduzidas comparando as variáveis sociodemográficas tanto dos bebês como de suas mães e não foram encontradas diferenças significativas entre elas. Para as variáveis contínuas utilizou-se o Teste t para amostras independentes e para as variáveis nominais utilizou-se o teste de Kolmogorov-Smirnov.
A Tabla 3 mostra a frequência das participantes da amostra que apresentaram indicadores clínicos nos instrumentos utilizados para avaliar a saúde emocional. Observou-se que tanto no G1 quanto no G2 as pontuações em termos de frequência foram semelhantes para ambos os grupos, sobressaindo depressão pós-parto (EPDS), seguido da ansiedade traço (IDATE-Traço), ansiedade estado (IDATE- Estado), angústia parental (PSI-AP). Nesse último, observou-se pontuações mais elevadas para o G1, indicando uma frequência maior de mães com Angústia no exercício da função materna (PSI-AP).
A Tabla 4 expõe a comparação das médias dos dois grupos em relação aos instrumentos aplicados. Médias mais elevadas foram observadas em seis das oito medidas dos instrumentos que avaliaram a saúde emocional para o Grupo 1. Todavia, não foram observadas diferenças estatísticas entre os grupos.
Análises de correlação foram conduzidas para verificar a relação entre indicadores de saúde emocional e variáveis sociodemográficas dos bebês e das mães. Os resultados apresentados na Tabla 5 mostraram que para as mães do G1 a dimensão do PSI-IC (estresse na interação com a criança) foi mais alta. Quanto menor a idade gestacional e peso da criança e, quanto maior o tempo de internação, mais alto era o nível de estresse. Também o PSI total correlacionou negativamente com o peso do bebê. Quanto menor o peso maior o estresse total. Quanto às variáveis maternas, quanto maior a escolaridade das mães maior o estresse na interação com a criança e, quanto menor o número de filhos, maior o estresse total.
A Tabla 6 mostra relação entre indicadores de saúde emocional e variáveis sociodemográficas dos bebês e das mães do Grupo 2, que não participaram da intervenção. Mães de meninos apresentaram maior ansiedade traço. Quanto às variáveis maternas a depressão pós-parto foi mais alta entre as mães que não planejaram a gestação, enquanto que a ansiedade estado foi mais presente entre as mães mais velhas e a ansiedade traço entre as mães que tiveram seus filhos via cesárea.
Discussão
Estudos têm demonstrado a eficácia de intervenções terapêuticas para o controle dos indicadores clínicos de saúde emocional de mães de bebês (Alvarenga et al., 2018, Horsch et al., 2016, Meschino et al., 2016, Peres & Santos, 2018). Todavia, observa-se um descompasso entre o oferecimento de intervenções psicoterapêuticas para mães e a efetiva adesão delas aos programas (Horsch et al., 2016). No presente estudo, também foram encontrados resultados semelhantes uma vez que das 42 mães elegíveis para os grupos psicoterapêuticos, 47,6% não aderiram, alegando motivos diversos.
Análises das variáveis sociodemográficas foram conduzidas com o objetivo de verificar se havia alguma diferença entre os grupos que sugerisse alguma hipótese plausível. Não foram encontradas diferenças significativas entre as variáveis estudadas, ainda que se observasse que, percentualmente, a escolaridade das mães do G2, que não aderiram, fosse menor. Capela (2020) encontrou menor adesão em mães com nível socioeconômico mais baixo, menor escolaridade e mais filhos.
Uma análise da frequência dos indicadores emocionais clínicos encontrados na presente amostra apontou para alta prevalência de depressão, avaliada pelo EPDS e de estresse, avaliada pela dimensão AP (Angústia dos Pais), do PSI nos dois grupos. Esses dados são coincidentes com os encontrados por Meschino et al. (2016) e Horsch et al. (2016) que também utilizaram o PSI e o EPDS para avaliar o estresse e a depressão das mães. Independente se as mães aderem ou não é um fato que um percentual importante de mães apresentou instabilidade emocional que pode afetar suas vidas e a de seus filhos, justificando práticas sistemáticas de avaliação da sua saúde emocional, o desenvolvimento de estratégias para aumentar sua adesão aos programas de intervenção, de preferência oferecidas sistematicamente a essa população (Manente & Rodrigues, 2016). Santos (2016) destaca que um dos entraves é o horário de oferecimento dos atendimentos, em geral, durante o dia, impedindo que mães trabalhadoras ou aquelas que cuidam sozinha dos filhos e dos afazeres do lar ficam impedidas de participarem.
Não foram encontrados estudos que comparassem a saúde emocional de mães de prematuros que aderem ou não a programas psicoterapêuticos. No presente estudo, ao realizar essa comparação, partiu-se da hipótese de que as mães que aderem seriam aquelas que já identificaram que não estão bem e que precisavam de auxílio especializado. Os dados inicialmente analisados em termos de frequência relativa mostraram que, percentualmente, mais mães do G1 apresentaram indicadores cínicos em cinco das oito dimensões de saúde emocional analisadas, aparentemente confirmando a hipótese levantada. Todavia, análises estatísticas comparando as médias de pontos obtidas nos diferentes instrumentos não apontaram para diferenças estatisticamente significativas.
Um outro objetivo deste estudo foi identificar se havia correlação entre variáveis sociodemográficas e os indicadores de saúde emocional que justificasse a adesão ao grupo psicoterapêutico. Os resultados obtidos apontaram que as mães que aderiram (G1) apresentaram maior estresse na interação com a criança (PSI-IC), quanto menor a idade gestacional do bebê, consequentemente, com menor peso e maior tempo de internação. Também se observou que mães mais velhas e mães de primeiro filho foram as mais estressadas. Portanto, para o G1 parece que o estresse pode ser considerado um motivo para a adesão das mães ao grupo.
Para as mães do G2, que não aderiram, observou-se relação da depressão com o não planejamento da gestação. Esse dado reforça o encontrado por Hartmann, Mendonza-Sassi e Cesar (2017) de que o planejamento da gestação é um fator de proteção para a depressão pós-parto. A ansiedade estado correlacionou-se positivamente com a idade materna e, quanto mais velha, maior a pontuação. A ansiedade traço esteve mais presente entre as mães que tiveram seus bebês via cesárea.
Chemello, Levandowski e Donelli (2017) realizaram um estudo de revisão sobre a ansiedade na gestação e no puerpério e destacaram a importância de identificar e avaliar a ansiedade já na gestação, como medida preventiva e protetiva para a saúde mental das mães, o desenvolvimento do bebê e a qualidade da relação dessa díade. Todavia, alertaram para a necessidade de instrumentos específicos para essa população uma vez que os instrumentos utilizados não consideram as questões típicas da maternidade, como as questões que comumente são encontradas nesse período, relativas à saúde do bebê e à própria saúde, bem como às mudanças de vida decorrentes da maternidade.
Considerações finais
Neste estudo, pretendeu-se, ao comparar os dois grupos de mães de bebês, verificar se haviam diferenças entre as variáveis sociodemográficas e os indicadores clínicos de saúde emocional que explicassem a adesão a grupos psicoterapêuticos. Não foram observadas diferenças significativas entre as variáveis sociodemográficas e nem entre os indicadores de saúde emocional. Todavia, ao relacionar as variáveis sociodemográficas de cada um dos grupos com a saúde emocional observou-se que o estresse esteve mais presente no G1 associado, principalmente, às condições dos bebês, como a pouca idade gestacional, muito baixo peso e tempo de internação.
Entre as limitações do estudo estão o baixo número de participantes e o uso de instrumentos para avaliar a ansiedade que não são específicos para esta população, assim como os demais escolhidos (EPDS e PSI). Considerando que o objetivo deste estudo foi analisar fatores que impactam a adesão às intervenções oferecidas às mães, uma outra limitação foi não analisar, por falta de dados sistematizados, os motivos para a não adesão.
Enquanto sugestão para futuros estudos está a elaboração de um instrumento que colete dados sobre a não adesão que pode, também, subsidiar estratégias para a fidelização dos participantes às intervenções propostas. Todavia, um dado importante do presente estudo é a importância da identificação dos indicadores emocionais clínicos de mães de bebês e o oferecimento de intervenções para minimizá-los, enquanto medidas preventivas de saúde mental da população feminina e consequentemente, infantil.
Referências
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