Em Pauta/Agenda

IMAGENS EM ESPIRAL: da circulação à aderência da sombraa

IMAGES IN SPIRAL: from circulation to the shadow adherence

Ana Paula da Rosa b
Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Brasil

IMAGENS EM ESPIRAL: da circulação à aderência da sombraa

Matrizes, vol. 13, núm. 2, pp. 155-177, 2019

Universidade de São Paulo

Recepção: 20 Setembro 2018

Aprovação: 13 Janeiro 2019

Resumo: : No cenário da midiatização verifica-se a complexificação das relações sociais, atravessadas por lógicas midiáticas que convocam memórias e transformam a noção de referência, potencializando a fixação de imagens-sombra. Em nossa visada, as imagens midiatizadas apresentam uma tripla condição: a) afetam o coletivo e a consolidação ou não de imaginários sociais; b) emergem de uma disputa pela atribuição de valor ao visível e c) implicam no desenvolvimento de domínios técnicos e apropriações. Neste artigo discute-se a circulação do que transita no imaginário midiático vinculado ao atentado à revista Charlie Hebdo desde as coberturas de 2015e seus intervalos até 2018. Como aportes teóricos mobilizamos Warburg e Didi-huberman, bem como os contributos específicos da midiatização, em especial a circulação e seus movimentos fágicos.

Palavras-chave: Midiatização, Circulação, Imagem, Imaginário.

Abstract: In the mediatization scenery, there is a complexification of the social relations, crossed by the media logic that convenes memories and transforms the notion of reference, potentializing the fixation of images into shadows. In our view, mediatized images present a triple condition: a) they affect the collective and the consolidation or not of social imaginary; b) they emerge from a dispute for the attribution of value to the visible, and c) they imply the development of technical domains and appropriations. In this article we discuss the circulation of what transits on the media imaginary linked to the attack to Charlie Hebdo magazine from the 2015 coverage and its intervals until 2018. As theoretical contributions, we mobilize Warburg and Didi-Huberman, as well as the specific contributions from mediatization, especially circulation and its phagic movements.

Keywords: Mediatization, Circulation, Image, Imaginary.

AJUSTANDO O FOCO - APONTAMENTOS INICIAIS

A imagem nunca teve tamanha importância como nos dias atuais: ela está nas telas, ao mesmo tempo em que constitui as telas que nos cercam. As imagens são compartilhadas, seja como selfies, como representações de um cotidiano nem sempre real ou mesmo como imagens de imagens feitas para circular. Isto traz um desafio essencial para a comunicação: compreender quais imagens e, consequentemente, quais imaginários estão sendo postos em circulação. Quando nos referimos à imagem aqui, estamos tratando de dois aspectos centrais: sua materialidade e sua imaterialidade1, sendo que o segundo aspecto nos parece decisório para compreender o primeiro e, por conseguinte, suas inscrições no espaço midiático. O imaginário midiático, na perspectiva deste texto, é aquele composto por um conjunto de imagens apresentadas e reapresentadas na mídia, mas que, para além de sua característica como representação, passam a constituir ou a convocar um conjunto de imagens e de relações interiores que nos permitem constituir sentidos.

O sentido, por sua vez, é aquilo que está em jogo no processo de circulação, sendo sempre fruto de produções e cocriações. É resultado da ação da mente e, portanto, sempre produto de defasagens e dissonâncias, já que não há condições de definir um sentido único. Ao nos situarmos na ambiência da midiatização (Gomes, 2017), esse processo em contínuo desenvolvimento que se estende para muito além do estar na mídia, consideramos como ponto de partida que as imagens são partes integrantes da cultura, ao mesmo tempo em que fomentam operações culturais que se instalam no seio da sociedade. Se a midiatização implica o afetamento social por lógicas midiáticas, é possível dizer que as imagens midiatizadas apresentam uma tripla condição: a) afetam o coletivo, mobilizando a produção de sentido e a consolidação ou não de imaginários sociais; b) emergem de uma disputa pela atribuição de valor ao visível e c) implicam o desenvolvimento de domínios técnicos e apropriações não antes necessários, mas que no espaço da midiatização se consolidam pelas condições de acesso aos aparatos. É neste cenário que nos deparamos com novos modos de pensar, ver, produzir e compartilhar imagens. As questões que se colocam são: que imagens midiatizadas são estas? Como nos tocam e como as tocamos? E ainda: que imaginários sociais emergem do que transita no imaginário midiático?

Assim, partimos do pressuposto de que as imagens inseridas no processo de circulação, seja por instituições jornalísticas ou atores sociais, possuem um “tempo de exposição” dilatado. Ou seja, não são mais configuradas como referências de acontecimentos, mas como as imagens-sínteses que duram para além da vida dos acontecimentos a que se referem. Desta forma, por movimentos de fagia (Rosa, 2016a), portanto de consumo, a circulação se configura numa relação de valor, onde o visível é definido em disputa, mesmo quando a visibilidade implica em invisibilidades e, logo, em sombreamentos, isto é, imagens que aderem mesmo em sua ausência. Este artigo visa discutir a circulação de imagens, e especialmente aquelas vinculadas ao atentado à revista Charlie Hebdo, que transitam no imaginário midiático transcorridos três anos do fato. Para isso, nos propomos a um percurso que parte da constituição do caso de investigação, para posterior acionamento dos fundamentos teóricos e da análise da circulação.

O CASO CHARLIE HEBDO - ENTRE SUA CIRCULAÇÃO FÁGICA E AS IMAGENS-SOMBRA

O foco deste artigo não está na fotografia em si e em seus aspectos técnicos, mas no processo de circulação das imagens que dizem respeito ao atentado terrorista ocorrido em 2015. Trata-se de pensar que devorações já foram registradas e como tais consumos incidem nas imagens que circulam atualmente, passados três anos do fato inicial. O caso deste trabalho é configurado a partir da produção/circulação de reportagens e imagens, em especial fotografias e charges, vinculadas ao atentado à redação da revista Charlie Hebdo ocorrido no dia 07 de janeiro de 2015. Supostamente em protesto à publicação de charges contra o Islã ou ao mundo árabe2, o ataque resultou na morte de 12 pessoas, dentre as quais alguns dos principais integrantes da equipe do periódico. O alvo, no entanto, não foi somente o veículo de comunicação, mas a própria França que reagiu ao terrorismo e ao ataque à liberdade de expressão. A cobertura jornalística deu ênfase à narrativa do que se chamou de “atentado” e dos seus impactos. Tendo em vista o processo de midiatização, consideramos, aqui, que não foi somente a mídia canônica3 a responsável pela cobertura e pela circulação dos sentidos do acontecimento, mas que os atores sociais tiveram papel decisório seja no engajamento à manifestação “Je suis Charlie” via redes sociais, alteração de imagens de perfil no Facebook, protestos e vigílias nas ruas do mundo todo, como também na criação de imagens como charges e fotografias.

Por se tratar de um atentado terrorista, tendo em vista a sobreposição do 11 de setembro de 2001 no imaginário coletivo, as instituições midiáticas jornalísticas, tão logo tiveram conhecimento do fato, passaram a promover uma cobertura minuto a minuto dos desdobramentos e dos impactos da ação. Esta, diferentemente da ocorrida nos Estados Unidos, não podia ser descrita ou apresentada visualmente, já que não se tratava da destruição de um prédio-símbolo, mas da tentativa de calar profissionais da imprensa que defendiam a crítica e a liberdade. Dito de outro modo, as imagens produzidas do atentado ao Charlie Hebdo, ainda que buscassem se constituir em uma representação, não tinham o caráter do registro do instante, porque o acesso ao local do atentado e a sua própria forma de execução foram diferentes daquela vista em 2001. Os assassinatos se deram no interior da redação, sendo impossível reviver o instante, pois as primeiras imagens já dão conta do resultado da ação (corpos, feridos, ação policial). No 11 de setembro, o atentado ocorre diante dos olhos, não apenas dos presentes no local, mas pela televisão e registros de celular, o que resulta em uma re-ocorrência. Além disso, há de se destacar que as Torres-Gêmeas tinham um alto grau de reconhecimento e, portanto, de identificação. Já as imagens do atentado ao Charlie não permitem uma distinção clara de imagens de outros atentados. Isto implica dizer que as imagens do prédio da redação sendo invadido, da retirada das vítimas (Figura 1), do cordão de isolamento policial, não foram suficientemente aderentes a ponto de figurativizar o atentado, ainda que tenham sido amplamente utilizadas.

Retirada das vítimas foi uma fotografia recorrente mas incapaz de dimensionar o ataque
Figura 1.
Retirada das vítimas foi uma fotografia recorrente mas incapaz de dimensionar o ataque
https://glo.bo/2ux3KP4

Neste sentido, receberam destaque as imagens da mobilização social com o slogan Je Sui Charlie (Figura 2), assumido popularmente tão logo o site do jornal francês passou a publicar a frase em diferentes idiomas. A comoção foi mundial, a ponto de manifestações serem realizadas em diversos países, dentre eles o Brasil (Figura 3). No entanto, o slogan tornou-se clamor social contra o terrorismo, de um lado, e, de outro, contra a censura à liberdade de expressão.

Imagem do site da revista Charlie Hebdo horas após o ataque
Figura 2.
Imagem do site da revista Charlie Hebdo horas após o ataque
https://bit.ly/2FIgusL

Manifestações no Rio de Janeiro
Figura 3.
Manifestações no Rio de Janeiro
https://glo.bo/2TIYT7X

Dezenas de imagens sobre as manifestações e vigílias foram realizadas, no entanto a fotografia mais forte, em termos plásticos e de sentido, derivada do ocorrido foi publicada pela primeira vez no jornal Le Monde e posteriormente repercutida. Trata-se da única imagem do interior da redação após o fato. Publicada no dia 08 de janeiro de 2015, a fotografia (Figura 4) é precedida pela manchete “Atentado ao Charlie Hebdo: “vocês vão pagar caro por ter ofendido o profeta”. A frase teria sido dita por um dos atiradores, porém, ao ser transformada em manchete, ela atualiza a cena do crime, permite a reocorrência do fato, com a diferença de que coloca o leitor como espectador da cena do crime, como se o rastro de sangue pudesse ser seguido. Além disso, o destaque da frase, em tom de ameaça, gera um afetamento social que vai além do atentado ao Charlie, mas um atentado ao Ocidente, o que de algum modo já antecipa as ações de islamofobia4 presentes em atentados posteriores como o de Londres em 2017.

Única imagem da cena do crime, publicada no jornal Le Monde
Figura 4.
Única imagem da cena do crime, publicada no jornal Le Monde
https://bit.ly/2OxkGOF

Para além das fotografias, o atentado também ficou marcado pela resposta de cartunistas, chargistas e atores sociais que compartilharam imagens tensionadoras do fato nas redes sociais. Algumas vinculando explicitamente o ataque de 2015 com o de 2001 (Figura 5), como fez o cartunista holandês Ruben L. Oppenheimer.

Charge holandesa homenageia jornal francês.
Figura 5.
Charge holandesa homenageia jornal francês.
https://bit.ly/2T8VPD4

Deste modo, percebem-se movimentos importantes na cobertura de 2015: 1) as fotografias de registro, ainda que amplamente exploradas para representar o atentado, perderam força com o passar dos dias, pela sua incapacidade de figurativizar o ocorrido. As cenas das vítimas, dos policiais davam conta da situação, mas não de sua dimensão; 2) a ação dos atores sociais foi rápida, como que assumindo uma causa a defender, de tal modo que os sites de redes sociais foram amplamente utilizadas para mobilizar para manifestações nas ruas e promover uma sincronicidade de posicionamento ideológico, uma vez que pessoas dos mais variados países do Ocidente assumiram a bandeira da liberdade de expressão contra a postura extremista do Islã; 3) um intenso processo de circulação midiática das imagens que desencadearam fagias e replicações múltiplas em pluridispositivos; 4) as charges surgiram como imagens alternativas que tentavam atribuir um sentido ao fato, seja vinculando a outros atentados anteriores, seja consolidando no imaginário social o inimigo a se combater. Por fim, mas não menos importante, temos 5) a aderência da palavra atentado5 a uma imagem anterior, o ataque às Torres Gêmeas, que ressurge como sombra mesmo em sua ausência.

Decorridos três anos dos atentados, as coberturas seguem um calendário-tempo6 orientado pela rememoração, mas com sentidos aparentemente diversos em jogo. Percebe-se, na mídia canônica brasileira, por exemplo, uma espécie de uníssono em 2018, tendo em vista que as principais revistas e jornais publicaram o texto distribuído pela agência Agence France-Presse (AFP) em que se enfatiza que a revista está mais fraca. Com a manchete “Após três anos, Charlie Hebdo não é mais a mesma”7, a imagem que aparece não é a da polêmica ou da defesa da liberdade de expressão, mas a do enfraquecimento econômico e de resistência da revista. A ilustração que acompanha as matérias é a capa da revista Charlie Hebdo referente aos três anos do atentado, mas sem adentrar em seu conteúdo (Figura 6). Algumas publicações optaram pela Agência Reuters e, neste caso, as manchetes das revistas e sites de busca voltaram-se para a abordagem da presença do atual presidente francês nas homenagens, destacando apenas a informação de que a França relembra as vítimas.

Diferentemente, o jornal Le Monde e outros veículos internacionais deram ampla cobertura, reconstituindo o atentado, disponibilizando bancos de imagens de 2015, nomeando os cartunistas e repórteres como mártires. No entanto, a imagem-síntese dos três anos se divide entre a homenagem prestada pelo atual presidente da França, em uma solenidade formal, ou a capa do jornal Charlie Hebdo já mencionada. Interessante observar que o Le Monde, por exemplo, traz trechos da carta-editorial do atual diretor de redação da Charlie Hebdo, mas com contextos diferentes do que a leitura oferecida pela agência AFP à mídia brasileira. Isto implica dizer que aquilo que foi valorado pela agência de notícias e pelos jornais que reproduzem seu conteúdo é apenas um aspecto do texto-desabafo do jornalista, Francisco Nicolino, que inclusive questiona onde estão os Je sui Charlie? Um movimento de atores sociais foi organizado com a expressão Toujours Charlie, mas com um caráter mais político, de convenção, do que explicitamente um manifesto mundial. A dor e a bandeira antiterror teriam se tornado apenas europeias ou o avançar dos anos consegue apagar as imagens e sentidos anteriores? Entendemos que não, mas importa pensar, para este trabalho, que a imagem simbólica vai além da imagem-representação. Isso no leva a refletir: o quanto a imagem do atentado, das vítimas ou mesmo da redação precisaria ser novamente inserida na circulação? Até que ponto sua presença não se coloca como a sombra, isto é, aciona um imaginário que não se apresenta enquanto imagem, porque esta já está acessível em nosso repertório iconográfico? Logo, vemos sem ver. A ideia de imagem-sombra vincula-se a percepção de que há imagens que se instauram no imaginário coletivo, de tal forma que, mesmo quando não estão presentes, elas ressurgem em nossa memória, fantasmáticas.

Capa da publicação de 2018 – “Três anos dentro de uma lata de conserva. O calendário do Estado Islâmico? Já demos”
Figura 6.
Capa da publicação de 2018 – “Três anos dentro de uma lata de conserva. O calendário do Estado Islâmico? Já demos”
https://bit.ly/2UoeoXj

Deste modo, nosso campo de observação se intensifica. A configuração do caso8 não é uma ou outra imagem fotográfica, mas a imagem que transita desde 2015 até o momento atual. Quando pensamos ou rememoramos o ataque à revista francesa, que imaginário midiático e social é convocado? Podemos perceber que as imagens não se constituem descoladas das manchetes ou dos contextos em que foram inseridas, mesmo quando atores sociais as colocam em circulação questionando as visões da mídia tradicional. Assim, após a apresentação desse conjunto de imagens e de acontecimentos podemos, de fato, delimitar o caso de pesquisa. Enfatizamos que não se trata apenas da imagem-registro do ataque, mas da imagem que permanece em circulação, que é valorizada em dispositivos midiáticos, mesmo quando apenas referida. Observam-se, deste modo, alguns aspectos centrais entre as coberturas jornalísticas e midiáticas neste período de três anos: a) as imagens-registro do fato deixam de aparecer, acredita-se que pela pouca referencialidade; b) as lógicas de circulação intra e intermidiática alteram-se com o passar dos anos, o que implica uma redução da presentificação da imagem material ou representação; c) a capa da própria edição especial da revista em 2018 torna-se critério de noticiabilidade e imagem-síntese, uma vez que a nova charge é criada como um novo fato e d) a imagem como fantasmagoria ou sombra se consolida na manutenção do inimigo a se combater, reiterando processo iniciado em 2001 e ratificado nos atentados posteriores. Destaca-se ainda que f) as defasagens de sentido se fortalecem na circulação ao longo dos intervalos, pois agências de notícias, atores sociais e imprensa internacional atualizam ângulos de abordagem distintos. Tais atualizações, via circulação, levam ao debate sobre as imagens e seus consumos múltiplos, portanto, sua potencialidade de fixação, bem como a pós-vida das imagens em relação a suas formas de contato.

Para pensar o tempo de exposição e, deste modo, a duração da imagem do atentado ao Charlie Hebdo no tempo, o conceito de circulação é central. De um lado, porque é atualmente um dos conceitos mais caros à discussão da midiatização, principalmente a que vem sendo desenvolvida na América Latina, uma espécie de herança teórica de Eliséo Verón, falecido em 2014. De outro, porque mesmo não sendo uma expressão nova, ela apresenta uma ampliação de sua importância no fenômeno comunicacional, principalmente mediante o advento das redes e da web. Isto porque a relação entre lógicas ou gramáticas de produção e de reconhecimento (Verón, 2004, 2013) se atravessam, possuem ordens ascendentes e descendentes, o que não víamos até meados dos anos 90. Com isto, o espaço (temporal e de ação) entre a produção e o reconhecimento que foi denominado, durante muitos anos, como uma espécie de intervalo ou um hiato, torna-se uma instância operadora da comunicação, já que o sentido é produzido efetivamente não por um ou outro elo do processo, mas em disputa, no contato.

Quando tratamos da circulação como espaço não estamos nos referindo a meios de comunicação, embora a circulação tenha sua ponta visível exatamente nos dispositivos midiáticos. Mas para recuperar a circulação é preciso ir mais a fundo do que simplesmente identificar o que emerge, é necessário recuperar os rastros. Neste propósito, a noção de circulação aqui empregada está voltada para este momento invisível, passível de ser reconstituído pelos rastros das materialidades e que nos dá condições de compreender a dinamicidade do sentido. Em termos de imagem, isso demanda observar suas inscrições e ausências em pluridispositivos, de múltiplos “atores”. Entendemos que as imagens, no contexto da midiatização, são produzidas e pensadas para a circulação, ou seja, não há um fato como um atropelamento, uma ação social, um atentado que não seja transformado em acontecimento midiático e em imagem. Chegamos ao ponto de termos suicídios sendo transmitidos pelo Facebook ou assaltos filmados pelas próprias vítimas feridas o que indica que a imagem não é um registro, mas é a condensação do mundo, a metáfora visual do que somos incapazes de traduzir. Significa dizer que, no cenário da midiatização, a imagem não é um documento, aquilo que atesta que algo aconteceu, mas ela própria é o fato, o acontecimento autonomizado. A imagem traduz as dores, revela as mazelas sociais, que já não se combatem somente no plano político ou policial, mas na e pela própria circulação. Ao colocar imagens de um suicídio, de um crime ocorrendo diante de nossos olhos, estamos deslocando o lugar da ação, não mais do espaço físico tangível, mas para o da circulação, onde as condições de visibilidade e de afetação são maiores.

No entanto, as imagens que são postas em circulação, produzidas para dar visibilidade e para que sejam visíveis, nem sempre são imagens produzidas por quem as coloca no fluxo (Braga, 2012), muitas vezes, ao contrário, são fruto de apropriações, reelaborações e perlaborações. Tais movimentos implicam novos sentidos em curso ou a manutenção de sombras que se acoplam ao processo de circulação e, inevitavelmente, de circularidade9. Este aspecto do sombreamento ainda será discutido neste artigo.

A circulação é fruto de um intenso jogo interacional que se dá a partir da noção de contatos e hibridizações. Fausto Neto (2013) destaca que a tecnologia possibilita o encurtamento das distâncias, uma vez que os polos produção-recepção já não podem mais ser pensados senão como contatos. Cada contato ou acoplamento demanda um esforço de produção de sentido, ou seja, a imagem do registro do atentado ao Charlie Hebdo publicada na mídia canônica, que se liga às publicações e ações desencadeadas no Facebook é acoplada a novas produções de cartunistas em seus dispositivos. Isto é, há uma cadeia de produções, coproduções, apropriações, ressignificações que levam o sentido adiante por meio de circuitos. Para Braga (2012)

os ritmos da circulação se encontram modulados por articulações diversas possíveis entre as táticas da instantaneidade que procuram abreviar o tempo de acesso e de circulação; e as táticas de acervo, voltadas para a permanência e para a recuperação. O fato de que os circuitos em desenvolvimento tenham a tendência assinalada, de “atravessar” os campos sociais estabelecidos – mesmo quando o ponto de origem de um circuito é um desses campos, como, por exemplo, o educacional –, leva a uma espécie de “recontextualização”. As referências habituais se encontram deslocadas ou complementadas por referências menos habituais – fazendo com que os próprios circuitos em desenvolvimento elaborem e explicitem os contextos requeridos para atribuição de sentidos aos produtos e falas que circulam. (p. 49).

Cabe destacar que, na midiatização, a criação e cocriação contínua de circuitos são uma marca, sejam tais circuitos desenvolvidos na esfera da mídia ou fora dela, como uma reverberação de seus temas. Neste sentido, interessa pensar que a circulação não se restringe aos produtos que circulam ou que desenvolvem potencial de circularidade (idas e vindas), mas no embate pela produção de sentido que se realiza no âmbito dos dispositivos midiáticos. As imagens que compõem nosso campo de observação, podem ser entendidas como agenciadoras de circuitos interacionais, pois a cada nova publicação ocorrem repercussões, reelaborações, interpretações diversas que resultam em tensões, ratificações ou apagamentos da força da imagem. Assim, sustentamos a hipótese teórica de que a circulação se constitui como uma relação de atribuição de valor. Isto é verificável na própria criação dos circuitos, pois apenas as imagens percebidas e tomadas como relevantes passam a permanecer em circulação, o que demonstra que a cada nova inserção, tais imagens são acrescidas de valor, potencializadas. Em parte, isso explica o porquê de algumas imagens desaparecerem, embora estejam disponíveis para o acesso.

Em nossa ótica, é a força de pregnância de determinadas imagens que, quanto mais reinscritas na circulação, desenvolvem um poder de fixação. No entanto, o que dizer das imagens que deixam de ser inscritas e ainda assim se fazem presentes? Neste caso, temos de voltar nossa atenção para a ideia de circulação e não para o produto material, ou seja, a fotografia ou um vídeo. Se recuperarmos a noção de circulação como o espaço entre produção e reconhecimento, como o trabalho neste espaço-temporal para a produção do sentido, perceberemos que as imagens materiais deixam de ser inscritas10 quando as imateriais ganham força e adquirem condição de circular como decalques ou emblemas, quando as imagens integram o imaginário e se tornam, assim, autonomizadas. Quando falamos do atentado ao Charlie Hebdo já não precisamos mais ver os corpos, as armas, pois temos clareza do acontecimento como se ele jamais tivesse se afastado de nossas retinas.

Neste sentido, consideramos que tanto os discursos de crítica (“Charlie Hebdo: a vitória do Estado Islâmico” – manchete do Antagonista de 3 de janeiro de 2018) como de adesão (Toujours Charlie – movimento social organizado na França) endossam a imagem primeira, mesmo quando é retomada em 2018 para contextualizar a situação financeira da revista transcorridos três anos do episódio. Esse percurso entre aparecimento − valorização nas interações – reiteração – reaparecimento suscita um processo de autonomização da imagem em relação ao acontecimento, pois as remissões feitas estão voltadas mais à força imagética do que ao próprio fato.

Não se trata, portanto, dos atentados em si, nem dos conflitos ideológicos Ocidente-Oriente, mas da transformação de imagens valorizadas na circulação em decalques ou em imagens-totens (Rosa, 2012). O conceito de imagens-totens, ancorado nas formulações de Cassirer e de Durkheim, se refere às imagens que convocam um laço profundo do social, acionando, assim, um imaginário coletivo. No entanto, a diferença central da imagem-totem é que esta implica restrições ao acesso de novas imagens ou de imagens diversas e à própria interpretação, já que as imagens primeiras se transformam em espécies de barreiras que impedem sua exclusão ou questionamento. Importa dizer que, no caso em análise, as imagens restritoras são exatamente aquelas produzidas de modo aparentemente livre, como as charges e os cartoons, mas que trazem à tona uma espécie de fio que interliga todos os atentados, pregressos e futuros, a dualidade do bem e do mal.

Ressalta-se que é no processo de circulação que as imagens-totens se evidenciam, em especial a partir dos movimentos de fagia que ocorrem no âmbito da circulação intra e intermidiática (Ferreira & Rosa, 2011). Entendemos por circulação intramidiática aquela que acontece dentro do dispositivo, exemplo, as repercussões, comentários e interações que se realizam internamente. Diferentemente, a circulação intermidiática é a que perpassa os pluridispositivos, portanto, contém a intra, mas exaspera-se em circuitos outros, muitas vezes alternativos. A imagem do Charlie Hebdo não circula apenas na própria edição da revista e em seus meios vinculados, mas se espalha por lugares diversos e difusos, o que nos leva a considerar que a imagem em si, esta imaterial, é fruto não só das inscrições na circulação, mas das atribuições de valor feitas ao longo do tempo, que permitem sua permanência em circuitos.

A ideia de permanência dialoga, diretamente, com os movimentos de circulação identificados por Rosa (2016a). A autora, ao se referir à fagia social11, volta sua atenção para o ato de deglutição dos atores sociais que consomem as imagens disponíveis para expeli-las na circulação na forma de mais (ou das mesmas) imagens. Em sentido complementar, a fagia midiática se instaura quando as instituições jornalísticas retomam a imagem expelida pelos atores sociais e a recobrem com novos sentidos, agora os das regras do jornalismo. Isto é, uma fagia leva a outra, um consumo deriva em outros consumos e em fluxos intermináveis e, principalmente, imprevisíveis, porque seu controle extrapola a gramática de produção, tornando-se dependente da gramática de reconhecimento que se manifesta nas interações. Micael Behs (2017) apresenta proposição complementar e sugere a ideia de fagia intramidiática, isto é, quando a mídia passa a consumir a própria mídia. No caso, percebe-se que em 2015, há a devoração das imagens do atentado, das charges, das vítimas, pelos atores sociais e pelas instituições jornalísticas, em um processo de retroalimentação contínua. Contudo, em 2018, observa-se que os intervalos marcados pelo ritual do calendário indicam uma diminuição da fagia social e uma intensificação da fagia intramidiática, ou seja, o assunto permanece em pauta, mas o devorado já não é mais o alvo central de novas devorações, isto porque a imagem já devorou a todos.

Desta forma, para compreender a transformação da sociedade e as operações de circulação movidas, tanto por atores quanto por instituições midiáticas jornalísticas, voltamos-nos a considerar: 1) a circulação como uma relação de atribuição de valor; 2) que tal relação se vincula à capacidade de proliferação e permanência material ou imaterial de determinadas imagens no imaginário midiático e 3) gera consumos ou fagias múltiplas.

AUSÊNCIA DA IMAGEM VERSUS PRESENTIFICAÇÃO COMO SOMBRA

A partir do conceito de circulação e recuperando nossas questões centrais, passamos a ponderar sobre a imagem em si e sua capacidade de presentificação. Nosso propósito é refletir sobre os imaginários sociais que emergem daquilo que transita no imaginário midiático. Certamente uma tarefa bastante complexa, mas da qual já podemos identificar algumas nuances. Um primeiro aspecto a se considerar é que a midiatização implica na complexificação das relações sociais e, consequentemente, da produção de sentido. Quando pensamos a imagem que circula nos meios de comunicação diversos (de atores sociais ou de instituições jornalísticas) chama-nos a atenção a repetição de determinadas fotografias e vídeos, mesmo quando utilizados de modo a tensionar o acontecimento que lhe origina. Porém, a repetição da imagem material não nos permite inferir que apenas por isto estamos assegurando a sua manutenção no imaginário. Certamente, a replicação e a proliferação derivam em um tempo de exposição mais prolongado, porém a imagem imaterial se concretiza mesmo na ausência da imagem-representação, isto porque muitas vezes esta imagem sequer é possível.

Embora cientes da importância de perspectivas ancoradas nos estudos do imaginário, principalmente a partir de Gilbert Durand e Ana Taís Portanova Barros, optamos por tratar o imaginário na esteira de Hans Belting (2004) ao defender que o imaginário é abastecido por imagens exógenas, exteriores ao corpo, e endógenas, que envolvem nossa ação sobre as imagens. Também coadunamos com a visão de Kamper (2002) quanto à órbita do imaginário. Neste sentido, Maurício Ribeiro da Silva (2012) destaca que o imaginário em Kamper “deve ser entendido a partir das imagens exógenas constituídas a priori, isto é, sem o estabelecimento de vínculo lastrado simbolicamente com aqueles que nela orbitam” (p. 65). Nessa direção, sua leitura aponta para o esvaziamento simbólico das imagens e para o seu consumo. Nossa proposição, não está focada no esvaziamento em si, mas em como as imagens exteriores contatam as interiores, seja pelos movimentos de fagia e circulação, portanto consumo, seja pela capacidade de acionar imagens anteriores, mais antigas que o próprio homem, e que de alguma forma o constituem.

Nosso trabalho volta-se para a produção de circuitos interacionais que colocam as imagens em um fluxo adiante, no que Rosa (2017) chama de duplo movimento: a extensão do imaginário12 para fora do corpo, para depois retrai-lo, abastecendo-o de imagens já vistas. Esses circuitos são baseados na rememoração, uma vez que os fluxos são constituídos de imagens repetidas e autonomizadas, mas que podem se instalar como uma espécie de sombra. Isto é, a sua presença é protagonizada em sua ausência. Neste aspecto, a ideia de sombra nos parece essencial. A sombra se manifesta, no caso em análise, quando o atentado ao jornal Charlie Hebdo se distancia em termos temporais, mas se faz reatulizado por sua imagem-sombra, já que a ausência da imagem material não elimina o comparecimento da imagem que integra nossa memória. Cabe destacar, porém, que no período de três anos a imagem original, ainda que sobreviva, já não é mais a mesma em sua totalidade. Kamper (2016, p.102) esclarece que nem o original e nem a cópia conseguem se perpetuar sem transformações de sentido. Isto é latente na circulação, pois tanto o original quanto a cópia ou a apropriação passam a ser ressignificadas por novas camadas de sentido, pelo deslocamento do contexto e pelos próprios usos, assim a imagem se perpetua, mas não incólume aos “afetamentos” da circulação.

A instalação da imagem como sombra é mais facilmente verificada quando temos condições de acompanhar (ou recuperar) os intervalos de inscrição na circulação. Para Warburg, a iconologia dos intervalos não reside na significação das figuras, mas nas relações que estas mantêm entre si e que duram para além do tempo. Transpondo para nossa abordagem da midiatização, podemos considerar que as imagens, na atualidade, são potencialmente prolongadas13. Os intervalos adquirem uma relevância maior quando pensamos que as tecnologias permitem baús de memória, arquivos infindáveis de coisas que parecem ter desaparecido de nossas vistas. Tome-se como exemplo imagens que ressurgem, muitas vezes vinculadas a contextos novos, para explicar fenômenos ou satirizar situações. No entanto, geralmente tomamos como foco aquilo que aparece e não as relações perceptíveis entre as fotografias, vídeos, obras de arte e imagens arraigadas na cultura. Este é o aspecto que nos interessa em nossa investigação.

Michaud (2013) ao se referir ao álbum de imagens de Warburg, o Atlas Mnemosyne, destaca que este é “o lugar no qual é possível devolver às figuras arcaicas sedimentadas na cultura moderna a energia expressiva original e no qual a ressurgência pode tomar forma” (p. 296). Neste caso também identificamos uma ressurgência, não apenas das imagens produzidas em 2015, mas de outras imagens que tratam de atentados, conflitos entre Ocidente-Oriente ou contra o Estado Islâmico. Uma delas é a charge da capa da edição de janeiro de 2018 da revista Charlie Hedbo, que nos permite ver, através dela, as sombras das imagens anteriores, que também se ligam a outras precedentes. Significa dizer que estamos imersos em sequências descontínuas, em intervalos de tempo que não resultam somente em apagamentos, mas em imagens–potência, imagens em espiral, uma vez que tais imagens têm condições de aparecer, reaparecer e de acionar a circulação de um modo cíclico, mesmo quando apenas são uma evocação através de uma manchete ou de legenda. Cabe destacar que não é o jornalismo o responsável pela evocação ou pela “gestão” dos intervalos, mas é a própria sociedade que convoca imagens já vistas, imagens estas com laços profundos. Se, para Warburg, a iconologia dos intervalos implicava uma espécie de fantasmagoria, como pensar a presença-ausente de uma imagem que não como sombra? Vale lembrar, porém, que tudo aquilo que recebe uma valorização, em especial esta ao longo do tempo, acaba por gerar um não-valor. Desta forma, ao valorizar, nos intervalos, uma imagem-sombra, impedimos que a luminosidade atinja outras imagens, inclusive uma diversidade de imagens materiais.

Interessa aqui um conceito de Didi-Huberman (1997) a respeito do que ele chama de imagens de contato. Estas são imagens que tocam em algo e depois em alguém.

tocar para ver ou, pelo contrário, tocar para não mais ver; vendo não mais tocar, ou pelo contrário, vendo tocar. Imagens muito próximas. Imagens aderentes. Imagens obstáculos, mas obstáculos que fazem as coisas aparecerem. Imagens acopladas entre si, até mesmo para as coisas de que são a imagem. Imagens contiguas, imagens que se apoiam14. (p. 1)

As imagens de uma presença-ausente nada mais fazem do que nos tocar, aderir e ao mesmo tempo acoplar em imagens outras, em textos outros. São imagens “modeladas pela sombra” e que demandam um prolongamento, uma expansão do tempo de exposição, o que é muito propício no cenário da midiatização pelos circuitos adiante. No caso das imagens do atentado ao jornal satírico francês, a aderência óptica não está no contorno, na nossa sensação de tatilidade e concretude, mas na sensação de que nossa visão tocou os objetos, de que estivemos lá, de que integramos o mesmo horror. Os nossos sentidos físicos são afetados, para além do visual. Em síntese, Didi-Huberman (1997) ressalta “entrar em contato com imagens? Um leve tremor de frente para trás. Um tateio dialético da mão que procura ver e o olho que procura tocar”15 (p. 5). O que nossa mão procura ver ante o imaginário midiático é aquilo que nosso olho já parece tocar mesmo quando não há nada para ser visto, exceto a sombra.

A sombra do atentado de janeiro de 2015, que carrega consigo os atentados de Londres, Madri, Nova York, se torna “apresentável” aos olhos em três momentos criativos desenvolvidos pelo jornal Charlie Hebdo, que, de alvo, se transforma em zona de contato. Em 2016, no aniversário de um ano do ocorrido, a publicação francesa trouxe como capa (Figura 7):

A manchete da publicação indica: "Um ano depois. O assassino ainda está solto".
Figura 7.
A manchete da publicação indica: "Um ano depois. O assassino ainda está solto".
https://bit.ly/2OxCuZW

Observa-se que a charge que integra a totalidade da capa é de autoria do então editor da revista, Laurent Riss, um dos sobreviventes ao atentado e que a figura é um muçulmano, identificado pela roupa, armado e com sangue nas mãos. Ao mencionar que os assassinos estão soltos, o leitor é diretamente levado a recuperar, em sua memória, as imagens do atentado, das vítimas, do sangue derramado. Não é preciso que as imagens-registro voltem à cena, elas “ainda” estão presentes. Já em 2017, a publicação nos contata, ou tenta criar o vínculo, a partir da investida “Finalmente, o fim do túnel” (Figura 8).

Capa da edição especial de 2017, dois anos depois
Figura 8.
Capa da edição especial de 2017, dois anos depois
https://bit.ly/2TGfb1d

Entretanto, o túnel é a figurativização do cano da arma de um muçulmano que coloca na mira a cabeça de um ocidental. Ou seja, após dois anos, o final do túnel parece ainda mais sem luz do que em 2015, isto porque as pressões e conflitos não findaram. Nesta capa já temos a presença da sombra. Não é preciso dizer quem foi atingido, nem mesmo rememorar os acontecimentos na redação, a charge já os torna táteis novamente. Além disso, o eixo esquerda-direta adotado na construção da capa coloca o ocidental, o alvo, exatamente no lugar do leitor, já que efetuamos a leitura da imagem da esquerda para a direita. Isto implica no acionamento da sombra, porque quando vemos esta imagem, os conflitos vivenciados desde 2001 ressurgem ou permanecem acoplados. E, por fim, em 2018 (Figura 9), a circulação nos intervalos, em função dos ritos calendários, traz à tona a noção de um desgaste total e não mais da bandeira da liberdade, mas do sistema carcerário imposto à sociedade.

A imagem da transformação do mundo em uma “lata de conserva”.
Figura 9.
A imagem da transformação do mundo em uma “lata de conserva”.
https://bit.ly/2UfWfdV

Significa, portanto, que a leitura da agência de notícias AFP de que o jornal já não é mais o mesmo não é 100% equivocada. Porém, o não ser mais o mesmo não diz respeito apenas às questões econômicas e políticas que possam decretar a vitória do Estado Islâmico. A publicação francesa reforça em suas edições especiais, por movimentos cíclicos de afastamento, devoração e contato que se cristalizam como acontecimentos, que o terror ainda prevalece, talvez agora mais forte em função da desmobilização social. Reforça ainda que as vidas já foram “dadas”, o que resta é permanecer sentindo os afetamentos das ações terroristas, mesmo aquelas que já nem mesmo fazemos questão de rememorar. A sombra do atentado se faz presente discursivamente, seja em forma de manifesto, seja na reiteração de que nada mudou apesar do transcorrer dos anos. A imagem-representação da redação atingida passa a pairar sobre as imagens-metafóricas do ocorrido. Entende-se, assim, que a imagem-representação pode desaparecer enquanto fotografia ou vídeo, mas ela se instala como um duplo na própria palavra atentado. Não é preciso “reavivar” imageticamente a ação terrorista, porque ela permanece viva no imaginário midiático e social enquanto imagem-sombra que circula.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da compreensão de que a circulação é infindável, podemos considerar que as imagens materiais que estão sendo produzidas e publicadas nos meios de comunicação possuem um papel central para a definição do visível. Não porque sozinhas deem conta de traduzir o mundo, nem porque são imagens-representação ou metaforizações, mas porque se instalam no tecido social, sendo constituintes de práticas coletivas. Dentre estas práticas destaca-se a apropriação para replicação em dispositivos de atores sociais, a cocriação por meio de charges, cartoons, gifs e memes e a prática do arquivamento ou da memorização. Tais atividades só ocorrem em função do caldo cultural em que estamos imersos, a midiatização. Isto não significa, de nenhum modo, o uso da midiatização como um termo para designar o estar na mídia, mas o fato de que a sociedade atual age via mídia e, como destaca Braga (2006, p. 40), não apenas “sofre mídia”. Ou seja, os processos de reação social, de interação ocorrem tanto em espaços extramidiáticos como dentro deles. A diferença central é que a produção e o reconhecimento já não são assimétricos em termos de condições de fala. Ora, isto não assegura nenhuma garantia de igualdade na produção de sentidos, ao contrário, assegura a amplificação da complexidade dos contatos entre produção e reconhecimento, que não só se atravessam como se confundem.

Ao pensar tais contatos com relação às imagens, passamos a perceber que as materiais, como as fotografias e vídeos, podem ser criadas para serem postas em circulação, desenvolvem estratégias de circularidade, indo e vindo com o passar dos anos, sendo repetidas, expelidas no fluxo por movimentos fágicos tanto de atores sociais quanto de instituições midiáticas. Porém, a capacidade de fixação ou permanência destas imagens não está na quantidade de vezes em que elas aparecem estampando capas de jornais, blogs e revistas. Esta capacidade é verificada quando, ante sua completa ausência, aparecem como espécie de espectros ou sombras que viabilizam, de um lado, a rememoração (acionar um passado distante recorrendo ao nosso arcabouço interior) e, de outro, a vinculação entre o imaginário midiático e o coletivo em um esforço tentativo16 de fusão. Portanto, a imagem imaterial adquire mais força, porque ela nos toca de tal forma que se transforma, como bem aponta Didi-Huberman (1997), em imagem-obstáculo. Como transpô-las?

Assume-se, neste trabalho, a perspectiva de que a midiatização é, em essência, a complexificação das relações sociais e, consequentemente, da produção de sentido derivada. Se, de um lado, os atores sociais ascendem aos meios através de suas produções, de outro, a mídia canônica busca realizar uma espécie de chancela do visível, derivando em uma disputa pelo que deve ser visto. O pressuposto aqui defendido é o de que as fotografias e vídeos convocam estruturas profundas do social, acionando as imagens interiores já consolidadas no social. Ao serem apresentadas na paisagem circulatória, passando por um processo de valorização, estas imagens se autonomizam, constituindo-se nos próprios acontecimentos. Implica dizer que a referência passa a ser a imagem socializada. No caso analisado neste artigo, ainda que não tenhamos uma imagem que simbolize o atentado à redação do jornal, no intervalo entre 2015 e 2018, podemos verificar que a imagem socializada do inimigo a se combater e do que o terror representa se configura como acontecimento. Já não nos referimos somente ao dia 07 de janeiro de 2015, mas aos atentados posteriores. Todos se vinculam, atrelam-se.

É importante destacar, deste modo, que uma imagem não morre junto com o fato a que se reporta. Como está ancorada em códigos culturais, convenções e, acima de tudo, operações sociais, tende a perdurar, ainda que tentativamente, conforme se mantém ou ressurge na circulação. Todavia, esta imagem não perdura livre de modificações, em especial de sentido. A vida póstuma das imagens está exatamente em sua aptidão para se transformar em novos fluxos e, consequentemente, portar camadas de novos e velhos sentidos. Quanto mais a imagem está aderida aos acontecimentos, mais força de permanência adquire, em especial como uma presença-ausente em duplo processo: a vemos, mas não a tocamos/tocamos, mas não a vemos. Certamente, há um desgaste natural das imagens, o seu esvaziamento figurativo e simbólico, uma tendência ao vazio. Contudo, este desgaste acaba por ser diminuído com o jogo interacional, ou seja, as elaborações e reelaborações feitas tanto por produção como por reconhecimento para atribuir valor ao visível.

Recuperando nossos questionamentos iniciais, temos: primeiro, que imagens midiatizadas são estas? Difícil definir o tipo de imagens específico com o qual estamos lidando. Temos a imagem-registro que rapidamente sucumbe à imagem-metáfora. Temos a imagem-representação que dá lugar à imagem-potência, pulsão. Temos a imagem figurativa que cede espaço para a imagem sombra. Ante tantas imagens, podemos inferir que a imagem midiatizada é o conjunto, em especial a capacidade de fazer contato, de tocar, ainda que tenhamos de mobilizar estratégias e operações para perceber e rastrear seus circuitos. Quanto à provocação de como as imagens nos tocam e como as tocamos, podemos considerar que já não tocamos imagens, nós as deglutimos e expelimos, cada vez com menos tempo de digestão, como já apontava Flusser (2006), afinal a digestão demanda um momento amplo e intenso de reflexão, que já não cabe em nossa aceleração cotidiana. Assim, ainda que as imagens sejam trabalhadas tecnicamente, apropriadas, produzidas com ânsia antes não vista, são elas que nos tocam e dominam, estimulando o surgimento de imagens invisíveis, mas amplamente perceptíveis, que chamo aqui como imagens em espiral. Por fim, que imaginários sociais emergem do que transita no imaginário midiático? Uma via de mão dupla, os imaginários sociais são permeados pelo imaginário midiático e vice-versa. O risco é a preponderância do segundo sobre a capacidade criativa mais profunda, de organizar e ligar as imagens simbólicas que nos cercam.

A partir da análise e reflexão de nosso caso empírico temos dois pontos a ressaltar: 1) a questão da perda da materialidade (ou da corporeidade em Kamper) e sua conformação às bordas da imagem e 2) a instalação da imagem como uma sombra. Quanto à perda da corporeidade, podemos dizer que as imagens icônicas até podem desaparecer, mas, ao longo dos anos, sua valorização se dá a ver não apenas em sua forma tangível, mas na configuração do sentido sobre o acontecimento. Já quanto à instalação da imagem como sombra, destaca-se não só a possibilidade de reaparecimento, mas a retomada de seus traços em imagens posteriores. A ideia de vida póstuma acentua o aspecto espectral, já que mesmo quando a imagem primeira não é explicitada, sua sombra forma espirais que se mantêm ao longo e para além dos intervalos. Em 2019, e quem sabe no aniversário de 10 anos da ação terrorista ao satírico Charlie Hebdo, ainda estejamos sendo tocados pelo que não está mais lá, exceto enquanto sombra.

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Notas

a Este texto integra pesquisa que tem como agência de fomento o CNPQ através de projeto Universal.
1 A perspectiva e imagens materiais e imateriais pode ser encontrada em diversos autores desde Martine Joly até Hans Belting. A imagem material é aquela com caráter de representação, uma fotografia, um vídeo, um desenho. Já a imaterial é aquela que acionamos de olhos fechados, que envolve a nossa capacidade imaginativa e o repertório iconográfico individual.
2 Em 2011 o jornal já havia sido alvo de um ataque quando publicou na capa da edição charges satíricas do profeta Maomé.
3 Adotamos neste texto a expressão mídia canônica para aludir aos veículos de comunicação tradicionais, que têm como essência a produção da notícia, mas que se vinculam a regras e sistemas de grandes grupos e corporações. O termo foi desenvolvido por Bruno Vinhola (2016) em sua dissertação de mestrado e passou a ser adotado no âmbito da linha de Midiatização e Processos Sociais do PPG em Ciências da Comunicação da UNISINOS, onde a autora deste texto atua como docente e pesquisadora
4 Nos remetemos aqui ao atentado de Westminster onde uma jovem afegã é alvo de crítica pelas redes sociais, mesmo não estando envolvida no fato. A muçulmana passa a ser perseguida por sua orientação religiosa e identificada como ameaça. Mais sobre o caso em Prass e Rosa (2017).
5 Esta discussão sobre a palavra atentado foi desenvolvida em artigo anterior publicado na Revista Famecos (Rosa, 2015).
6 Expressão cunhada por Harry Pross para designar os rituais calendários como os desenvolvidos pela imprensa que todo ano reproduzem determinadas práticas e lógicas para manter a sincronização social, caso das datas marco, a exemplo dos três anos do atentado.
7 No original: “Trois-ans-aprestoujours-charlie-Charlie n’est plus le même” Esta e demais traduções da autora
8 Adotamos nesse artigo uma metodologia de construção do caso que vem sendo organizada e discutida no âmbito do PPG em Ciências da Comunicação, na Unisinos. Trata-se de uma perspectiva em desenvolvimento por pesquisadores como Ferreira (2012), Rosa (2015) e estudantes da linha de Midiatização e Processos Sociais ancorados na ideia de que é indispensável, antes do arcabouço teórico, a constituição de um campo de observação que permita aproximação do empírico.
9 Há uma diferença importante entre circulação e circularidade. A circulação está voltada para a processualidade interacional, que implica em novas camadas de sentido e interações. Já na circularidade temos objetos que efetivamente são repetidos, aparecem, reaparecem e se instalam. A circularidade envolve o próprio processo do olhar como já indica Flusser (2002) a respeito do scanning. Temos, em nossos casos de análise, uma circularidade do tempo e das imagens no tempo.
10 Muitas vezes elas só deixam de ser inscritas após um processo contínuo de apresentação, replicação e reelaboração.
11 A base conceitual para a discussão das fagias e dos movimentos de devoração está em Flusser, em especial em sua obra A história do Diabo (2006).
12 Entendemos o imaginário na acepção de Gilbert Durand como um repertório iconográfico individual que é abastecido de imagens interiores (nunca materializadas e representadas) e de imagens exteriores, como as fotográficas. Kamper fala em órbita do imaginário, referindo-se às ruínas da humanidade (desde a religião à técnica) que resulta num “caldeirão pós-histórico de estratégias ligadas à realidade e à aparência” (p. 116).
13 Embora seja importante destacar que esta potencialidade de prolongamento não signifique o fim de seu esvaziamento. É possível permanecer em circulação, mas nem sempre as imagens que se perpetuam continuam sendo portadoras de símbolos, em muitas vezes se tornam uma espécie de resíduo que se banaliza.
14 No original: “Touching to see or, on the contrary, touching to no longer see; seeing to no longer touch or, on the contrary, seeing to touch. Images that are too close. Adherent images. Image obstacles, but obstacles that make things appear. Images coupled to each other, indeed even”.
15 No original: “Contact images? A slight trembling from front to back. A dialectical groping of the hand that seeks to see and the eye that seeks to touch”.
16 Tentativo porque no âmbito da midiatização tanto os circuitos quanto as operações e práticas são tentativas, por isso nem sempre passíveis de repetição. Por se tratar de um trabalho interacional, os contatos são sempre de ordem tentativa ou experimental. Essa talvez seja a diferença central para conceitos como o de agenda-setting, em que havia uma espécie de certeza de seu efeito em médio ou longo prazo. Aqui, por ser tentativo, não há certezas, mas tentativas.

Autor notes

b Jornalista, doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e mestre em Comunicação e Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná. Atualmente é docente e pesquisadora no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos.
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