Artigo
Recepção: 10 Julho 2018
Aprovação: 14 Março 2019
DOI: https://doi.org/10.5007/1518-2924.2019.e58115
Resumo:
Objetivo: Analisa o acesso à informação pública sob a ótica da cultura organizacional de uma universidade pública, buscando saber se as instituições de ensino, mesmo afeitas à produção e disseminação de informações sistematizadas na forma de conhecimento, revelam uma cultura organizacional diferente quando se trata de informações públicas.
Método: A pesquisa de campo, com abordagem quantitativa foi realizada com professores e técnicos do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Pará e revelou os seguintes fatores de influência: Legitimidade da Administração Pública,
Resultado: Utilização Indevida da Informação Pública e Perda do controle da informação, em dois grupos: um favorável à política de amplo acesso às informações e outro que se mostrou reticente quanto à divulgação das informações.
Conclusões: Embora os entrevistados percebam a política de amplo acesso às informações públicas como um avanço na perspectiva social, ainda persiste na cultura organizacional a perspectiva do segredo e da propriedade da informação pública.
Palavras-chave: Cultura Organizacional, Acesso à Informação Pública, Transparência Pública.
Abstract:
Objective: Analyze the access to public information from the perspective of the organizational culture of a public university, seeking to know if educational institutions, even if they are concerned with the production and dissemination of systematized information in the form of knowledge, reveal a different organizational culture when it comes to public information
Methods: Field research, with a quantitative approach, was carried out with professors and technicians from the Institute of Applied Social Sciences of the Federal University of Pará and revealed three factors of influence denominated: Legitimacy of Public Administration,
Results: Misuse of Public Information and Loss of control of information and two groups: one favorable to the policy of broad access to information and another that was reluctant to disclose information.
Conclusions: It was concluded that, although interviewees perceive the policy of broad access to public information as an advance in the social perspective, the perspective of the secrecy and ownership of public information still persists in the organizational culture.
Keywords: Organizational Culture, Access to public information, Public transparency.
1 INTRODUÇÃO
O direito a saber, como também é conhecido o direito de acesso às informações, materializa-se, essencialmente, na transparência pública a qual, garante o acesso às informações governamentais e possibilita maior controle social sobre o governante ao reduzir as assimetrias de informações e viabilizar uma participação mais efetiva da sociedade na fiscalização das ações do Estado. Conforme a Controladoria Geral da União (2013), o amplo acesso às informações públicas traz inúmeros benefícios de ordem social e para a própria administração pública, sendo que alguns deles podem ser percebidos pelo aprimoramento de mecanismos de combate à corrupção, maior respeito aos direitos humanos, fortalecimento da democracia, melhoria na qualidade da gestão pública e no processo decisório dos governantes, que passam a ser beneficiados pela aproximação com a sociedade.
Assim, o acesso à informação e a transparência pública revelam construtos muito relacionados e, até certo ponto, indissociáveis. Cruz, Silva e Spinelli (2016), ao se referirem à transparência pública, destacam que ainda há grande falta de consenso quanto à sua conceituação. Contudo, os mesmos autores evidenciam que a disseminação da informação é um elemento comum às mais diferentes abordagens que versam sobre transparência. No Brasil, o acesso à informação está assegurado por diversos normativos legais, principalmente a Constituição Federal de 1988, a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº101/00), a Lei da Transparência (Lei Complementar n° 131/09) e a Lei de Acesso à Informação – LAI (Lei nº 12.527/11) (CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO, 2017).
Por outro lado, Da Matta (2011) destaca que há entre os servidores públicos do poder executivo brasileiro a presença de uma cultura organizacional marcada pelo segredo, segundo a qual as informações públicas devem ser protegidas e resguardadas do eventual mau uso, que pode ocorrer se forem amplamente divulgadas. Nessa perspectiva, a informação passa a ser protegida como se fosse uma propriedade do Estado, não da sociedade. Essa característica, como destacam Mathias e Andrade (2012), ainda é resquício do período dos governos militares no Brasil.
Inserida nesse contexto, a presente investigação concentra-se em instituições de ensino superior, nas quais se disseminam, naturalmente, informações, seja na forma do processo educacional, das pesquisas científicas ou nos projetos de extensão. Desta forma, busca-se saber se as instituições de ensino, mesmo afeitas à produção e disseminação de informações sistematizadas na forma de conhecimento, revelam uma cultura organizacional diferente quando se trata de informações públicas. Para tanto, esse estudo estabeleceu como problema de pesquisa responder ao questionamento: quais as características da cultura organizacional do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas - ICSA da Universidade Federal do Pará - UFPA quando se avalia o amplo acesso às informações públicas? Isso posto, o objetivo da presente investigação é identificar os fatores que caracterizam a cultura organizacional sob a perspectiva da disseminação das informações e classificar os servidores nesses fatores para identificar a cultura predominante.
2 CULTURA E MUDANÇA ORGANIZACIONAL
Diversos estudos (BERGUE, 2011; PIRES; MACÊDO, 2006; WARRICK, 2017) destacam que não há consenso quanto à conceituação de cultura, pois ela exprime um construto em constante evolução (MIKLOS, 2014). Entretanto, a cultura pode ser compreendida, em uma perspectiva ampla, como o conjunto de explicações, conhecimentos, valores, crenças, formas de comunicação e parâmetros de comportamento de diferentes contingentes de pessoas, que compartilham o mesmo espaço físico em um dado momento no tempo (KHOULY; FADL, 2016). A cultura, nessa perspectiva, confere essencialmente um sentido de proteção à identidade (MIKLOS, 2014).
Warrick (2017) destaca que todos os contingentes humanos, independentemente de seu tamanho, têm propensão para criar uma cultura específica e, nessa perspectiva, insere-se a compreensão de cultura organizacional. Assim, quando a compreensão de cultura se concentra na organização, ela traduz valores, crenças e normas que, ao serem compartilhados, influenciam na maneira como os trabalhadores pensam, agem, se sentem e como se comportam no local de trabalho (BERGUE, 2011; KHOULY; FADL, 2016; WARRICK; MILLIMAN; FERGUNSON, 2016). Com isso, a cultura organizacional acaba por alinhar o comportamento dos trabalhadores com relação aos padrões esperados (REIS; TRULLEN; STORY, 2016) e assume, essencialmente, uma perspectiva de regulação e aprendizagem (SILVA; FADUL, 2011).
A cultura organizacional tem um caráter abrangente na organização, pois orienta tanto os processos de gestão, quanto as formas como são realizadas as atividades administrativas (CASEMIRO; LICORIO; SIENA, 2014). As investigações de cultura organizacional se difundiram com mais intensidade a partir da década de 1980 (SILVA; FADUL, 2011; WARRICK, 2017) e, com o tempo, passaram a ocupar posição central quando se trata de desenvolvimento organizacional e gerenciamento de mudanças (HARRISON; BAIRD, 2015), uma vez que a cultura organizacional mantém forte relação com aspectos típicos do cotidiano da organização, como o comportamento dos trabalhadores, a qualidade do trabalho realizado, a produtividade obtida, a orientação para resultados, inovação, gestão da qualidade, formas de comunicação, entre outros aspectos (HARRISON; BAIRD, 2015; MIKLOS, 2014; KHOULY; FADL, 2016).
Nesse contexto, compreender a cultura organizacional pode trazer insights, especialmente no que se refere à qualidade das estratégias organizacionais, relações de empoderamento e autonomia dada aos trabalhadores para realizar suas tarefas cotidianas (KHOULY; FADL, 2016). Estudos pautados na cultura organizacional mostraram evidências das relações da cultura com aspectos cruciais para o sucesso organizacional, como desempenho individual e coletivo, satisfação no trabalho, lealdade dos trabalhadores, motivação, compromisso com a organização, entre outros (WARRICK, 2017).
Assim, a cultura organizacional se reflete na eficácia da organização e possibilita que os trabalhadores fiquem familiarizados com os sistemas organizacionais, já que por meio da cultura que são difundidos o histórico e a forma de atuação da organização. Destarte, ao compartilhar valores organizacionais, a cultura exprime uma condição necessária para alcançar a eficácia (KHOULY; FADL, 2016), uma vez que, entre outros aspectos, ela exerce forte influência no apoio e na forma como os trabalhadores são encorajados a se engajarem no trabalho (REIS; TRULLEN; STORY, 2016).
Muito influenciada pela cultura nacional, a cultura organizacional pode diferir, tanto entre organizações, quanto dentro de uma mesma organização (WARRICK, 2017), devendo estar integrada a um sistema que inclui metas, recursos e infraestrutura (KHOULY; FADL, 2016). Em termos práticos, a cultura organizacional revela aspectos do ambiente de trabalho e, mais que isso, mostra como o ambiente se reflete nas atitudes dos trabalhadores. A cultura pode contribuir para a promoção de um ambiente agradável e produtivo ao trazer para as relações interpessoais o que os trabalhadores têm de melhor. Da mesma forma, pode destacar-se ainda na formação de ambientes disfuncionais, marcados pelo estresse, pela discórdia e pela tensão (WARRICK, 2017).
Harrison e Baird (2015), ao se referirem à cultura organizacional no setor público, afirmam que ela age como uma “mão invisível” que, em certa medida, apoia, mantém, restringe e influencia na gestão das organizações controladas pelo Estado. Os mesmos autores reforçam que a cultura ocupa lugar central nos processos de mudança e na busca por objetivos estratégicos. Assim, a cultura organizacional se revela de forma essencial para a melhoria do desempenho, seja ele individual, das equipes, ou mesmo, organizacional (KHOULY; FADL, 2016). No entanto, esses resultados, já sedimentados em organizações privadas, ainda carecem de evidências sólidas quando se trata de organizações públicas (HARRISON; BAIRD, 2015). Esse aspecto reforça a necessidade de ampliar e aprofundar as pesquisas com foco na cultura organizacional nesses tipos de organizações.
Bergue (2011), ao discorrer sobre a cultura organizacional na administração pública brasileira, destaca que, mesmo sem ser formalizada, ela pode ser percebida pelo apego a elementos formais, que incluem condecorações, honrarias, ritos e solenidades. Na perspectiva da administração de pessoas, ela envolve aspectos paternalistas, materializados em licenças, vantagens e concessões que beneficiam os servidores públicos de forma desproporcional, quando comparada com a maioria dos trabalhadores da iniciativa privada.
Outros aspectos da cultura organizacional da administração pública brasileira dizem respeito à ênfase nas relações pessoais, à baixa sensibilidade a alterações e instabilidades ambientais como consequência da estabilidade no emprego, ritmo de trabalho constante, corporativismo e condescendência. Essas características devem ser consideradas em planos de mudança organizacional, pois, como destaca Bergue (2011), as organizações públicas não são afeitas a mudanças bruscas, reforçando a preocupação com o diagnóstico e a qualidade da comunicação organizacional para conduzir processos de mudança (BERGUE, 2011).
Quanto aos processos de mudança na administração pública, Harrison e Baird (2015), em pesquisa com organizações públicas australianas, reforçam que gerir mudanças nessas organizações tem se revelado uma tarefa difícil e desafiadora, pela prevalência de um comportamento inercial da cultura organizacional que compromete aspectos mais contemporâneos de gestão e que revela organizações muito voltadas para o ambiente interno, estruturada em torno de um modelo burocrático e de hierarquia rígida, em que as tarefas, as regras e os aspectos técnicos se sobrepõem às atividades fim das organizações. Ao referir-se a esses aspectos, Bergue (2011, p. 539) reforça a compreensão dos autores ao colocar em evidência que as mudanças nas organizações públicas têm mostrado “[…] processos complexos, que percorrem caminhos tortuosos e, sobretudo, lentos”.
Carapeto e Fonseca (2014) evidenciam que todas as organizações, sejam públicas ou privadas, estão em constante processo de transformação, visto que essas transformações se materializam em situações de mudanças. Contudo, para que a mudança organizacional tenha sucesso, é necessário que a organização desenvolva a capacidade de se antecipar às necessidades do ambiente e, mais que isso, tenha habilidade para conduzir situações em contextos de relativa instabilidade. Na administração pública, essas habilidades também são necessárias, especialmente para atender novos arranjos nos modelos de atuação (CARAPETO; FONSECA, 2014) que ocorrem principalmente pelas alterações nas estruturas, processos e pessoas (BERGUE, 2011).
Diversas circunstâncias são desencadeadoras de mudanças na administração pública e decorrem de causas variadas, como: reformas de início de ciclos políticos, inovações tecnológicas, mudanças de valores na sociedade, novas legislações, alterações na força de trabalho, entre outras. A administração pública é constantemente pressionada para melhorar sua produtividade e promover melhorias na qualidade dos serviços prestados à sociedade. Essas pressões, intrínsecas às organizações, são elementos promotores de mudanças constantes (CARAPETO; FONSECA, 2014). A administração pública vem mudando drasticamente nos últimos anos, e as pressões por maior eficiência forçam progressivamente a busca por uma maior semelhança com as organizações privadas, mas principalmente as exigências por maior transparência e accountability têm impactado fortemente na cultura das organizações públicas (HARRISON; BAIRD, 2015).
3 TRANSPARÊNCIA PÚBLICA E ACCOUNTABILITY
Newbold (2011) destaca que a transparência e a accountability são dimensões valiosas para a administração pública e, por seu intermédio, é possível assegurar, além da democracia, melhores resultados econômicos, uma gestão mais eficiente e a seleção de objetivos mais legítimos para as políticas públicas. O autor reforça ainda que um bom governo se faz com boa administração e que a transparência deve refletir os limites que garantam a atuação dos agentes públicos, tanto gerencial quanto legalmente. Nesse contexto, fornecer informações para a sociedade é uma atividade crucial para fundamentar qualquer regime democrático (VIEIRA, 2013; HONG, 2014; CRUZ; SILVA; SPINELLI, 2016;).
Pinho e Sacramento (2009) ao se referirem à origem da palavra accountability no Brasil, afirmam que ela ocorreu no início da década de 1990 e que seu significado evoluiu ao longo dos anos e continua evoluindo, pois as práticas da accountability são uma consequência das mudanças na administração pública brasileira. Assim, a expressão accountability assumiu ao longo do tempo uma conotação fortemente relacionada ao controle, à responsabilização, à transparência, à explicação por atos praticados e por aqueles não praticados, à premiação, à justificativa e à punição. O significado dessa expressão emergiu das mudanças observadas na administração pública, das transformações institucionais, da modernização dos aparatos legais e da atuação do Estado no combate a práticas como: nepotismo, autoritarismo, casuísmo político, populismo, entre outros.
Nesse contexto, insere-se fortemente o acesso às informações públicas, tendo em vista que a política de amplo acesso à informação contribui para aumentar a confiança da população em seus governantes, especialmente no que se refere às políticas, recursos e ações do governo (CRUZ; SILVA; SPINELLI, 2016). Assim, ao dar acessibilidade a informações públicas, ficam evidentes para a sociedade as ações dos gestores públicos, aspecto que possibilita sua responsabilização. Desta forma, viabilizar o acesso às informações, com clareza, simplicidade e praticidade, deve compor a agenda política de todos os governos que desejam ser legitimados pela sociedade e que reconheçam que o acesso à informação pública é um direito humano fundamental (CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO, 2013).
Na perspectiva do acesso à informação, o Estado desempenha papel de guardião e, ao reconhecer que as informações são públicas por natureza, possibilita compreender que o sigilo é uma exceção e a divulgação, uma regra (CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO, 2013). De maneira geral, as informações de instituições do poder público podem ser disponibilizadas de duas maneiras: uma de caráter proativo (ativa), que ocorre quando a própria instituição divulga informações de interesse coletivo voluntariamente ou no cumprimento da legislação; e outra, quando há uma solicitação específica (passiva) por parte de algum integrante da sociedade (HONG, 2014). Assim, a possibilidade de ter acesso às informações públicas fundamenta a compreensão do que se conceitua como transparência pública.
Cruz, Silva e Spinelli (2016, p. 724) advertem que o aparato legal, expresso principalmente pela legislação, por si só não garante a transparência, pois “[...] é preciso provocar mudanças culturais e atitudinais tanto naqueles que lidam diretamente com a informação pública como naqueles que precisam da informação [...]”. Essa compreensão é compartilhada por Pinho e Sacramento (2009) e Almad (2016).
Vieira (2013), ao relacionar a corrupção com a transparência pública, coloca em evidência que inúmeras pesquisas buscam explicar as causas da corrupção. Entretanto, em geral, os estudos convergem ao entender que a transparência pública se constitui como um elemento-chave para o combate à corrupção, visto ser por meio da transparência que ficam claros os eventuais desvios de conduta de agentes públicos, sendo a informação necessária para a punição.
Nesse contexto, a atuação do Estado vem se modernizando, posto que os mecanismos de controle herdados do estado-nação, centralizador e burocrático, não se mostraram tão eficientes em uma administração pública voltada para a delegação, baseada em uma estrutura de governança mais horizontal, fragmentada e organizada com diferentes agentes atuando em rede, sejam eles públicos e/ou privados, e com fronteiras menos definidas quanto às responsabilidades e à atuação esperada de cada um no processo (ALMAD, 2016).
Os novos arranjos institucionais da administração pública demandam uma cultura organizacional que reflita valores sociais como diretrizes e tenham por base a ética no envolvimento e compromisso que fundamentam a autorregulacão e o autocontrole no fortalecimento de comportamentos desejáveis por parte dos agentes públicos, porquanto a compreensão de controle como concebida no passado foi substituída pela perspectiva da accountability, à medida que as organizações públicas passam a ser cobradas por uma orientação cada vez mais voltada para resultados e baseada na autoridade especializada, na qual a deliberação e a transparência devem promover o escrutínio das organizações, sendo essa perspectiva fundamental para a sociedade contemporânea (ALMAD, 2016).
4 MATERIAIS E MÉTODOS
Os procedimentos metodológicos deste estudo caracterizam uma investigação classificada, segundo Martins e Theóphilo (2017), como exploratória e descritiva, feita na forma de levantamento transversal, com amostragem probabilística e tratamento quantitativo de dados. Desta forma, para analisar os aspectos da cultura organizacional e classificar os servidores quanto à sua avaliação da política de livre acesso às informações, foi feito, nos meses de fevereiro e março de 2017, um levantamento no Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Pará.
A população da pesquisa foi formada por servidores públicos do poder executivo, contratados no regime de estatutários, efetivos e temporários, subordinados ao Ministério da Educação (MEC), lotados na instituição e instituto onde ocorreu o levantamento. A técnica de amostragem foi probabilística aleatória simples, calculada conforme Equação 1, descrita em Fávero e Belfiore (2017), tomando por base o universo de 202 servidores (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ, 2017), 7,70% de erro e 95% de margem de segurança, que resultou em 80 questionários de pesquisa.
[Equação 1 - Cálculo da amostragem]Fonte: Fávero e Belfiore (2017, p.182)
Em que tamanho da amostra; p=proporção da população que contém a característica desejada; ; erro máximo admitido; e abscissa da distribuição normal padrão, fixado um nível de significância . No cálculo, foi adotado critério conservador para a obtenção da amostra, estimando a proporção da população que apresenta a característica em 50% ()
O levantamento utilizou como instrumento de coleta de dados o questionário, organizado em duas seções. A primeira foi adaptada do estudo de Da Matta (2011) e reuniu informações da cultura organizacional e aceitabilidade da política de amplo acesso às informações públicas. Foram 19 variáveis, elaboradas na forma de assertivas, com respostas em escala intervalar de Likert, com sete opções de respostas, sendo 1 para discordo totalmente, até 7 para concordo totalmente. A segunda seção do questionário foi elaborada com respostas de múltipla escolha e se concentrou nos aspectos sociodemográficos e no conhecimento e aplicação da política de acesso às informações públicas do Governo Federal.
O tratamento de dados foi quantitativo, com técnicas descritivas, inferenciais e multivariadas. Com relação às técnicas: as descritivas se mostraram adequadas para caracterizar a amostra, os fatores e os grupos de entrevistados; as inferenciais foram selecionadas para avaliar a probabilidade de a amostra representar a população e identificar se eventuais diferenças observadas entre os grupos de servidores eram significativas, ou se ocorreram ao acaso; as multivariadas foram selecionadas com duas finalidades: a primeira foi sumarizar as variáveis e identificar uma estrutura de dados latentes; a segunda foi criar uma taxonomia que reunisse os entrevistados para formar grupos semelhantes e, com isso, contribuir para a compreensão da cultura organizacional.
Desta forma, o tratamento de dados foi iniciado pela sua análise com estatística descritiva. Esse procedimento resultou na sistematização das características gerais da amostra, inclusive, quanto à sua opinião com relação à política de acesso às informações. Em seguida, foi utilizada a análise fatorial exploratória (AFE).
A análise fatorial exploratória é uma técnica multivariada de análise de dados classificada entre as técnicas de interdependência, que possibilita sumarizar estruturas complexas, reduzindo-as a pequeno número de fatores, ou dimensões latentes, de tal forma a preservar a maior parte de suas variâncias e, com isso, contribuir para sua simplificação (HAIR et al., 2009; FÁVERO; BELFIORI, 2017). Neste estudo, essa técnica foi empregada para analisar aspectos da cultura organizacional e o acesso às informações públicas. A análise fatorial exploratória pode ser expressa conforme a Equação 2, apresentada em Dillon e Goldstein (1984).
[Equação 2 - Expressão da análise fatorial exploratória]Fonte: Dillon e Goldstein (1984, p.86)
Em que X é o p-dimensional, vetor transposto das variáveis observáveis, denotado por X = (x1, x2..., xp)t; F é o q-dimensional, vetor transposto das variáveis não observáveis ou variáveis latentes, denominadas de “fatores comuns”, denotados por F = (f1, f2,..., fq)t, sendo q < p; ε é o p-dimensional, vetor transposto de variáveis aleatórias ou fatores únicos, ε = (e1, e2,..., ep)t ; e α é a matriz (p, q) de constantes desconhecidas, identificadas como “cargas fatoriais”.
Depois de identificados, os fatores foram descritos e tiveram a consistência interna medida pelo coeficiente alpha de Cronbach, expresso pela Equação 3. Na sequência, foi utilizada a análise de agrupamentos (AA) para reunir os entrevistados em grupos e, assim, criar uma taxonomia que possibilitasse diferenciá-los entre si e agrupá-los com base na elevada semelhança interna e dissemelhança entre grupos (HAIR et al., 2009). Essa possibilidade de classificação é uma característica da técnica de análise de agrupamentos, conforme destacado em Fávero e Belfiore (2017).
[Equação 3 - Coeficiente alpha de Cronbach]Fonte: Costa (2011, p.91)
Em que é o número de itens do questionário; é a variância do item ; e . é a variância da escala total somada. A análise de agrupamentos assim como a análise fatorial é uma técnica multivariada de interdependência que, neste estudo, foi feita na forma hierárquica aglomerativa, com a utilização do algoritmo de Ward para reunir os entrevistados e a distância Euclidiana ao quadrado para medir a distância geométrica entre eles. O algoritmo de Ward tem como característica principal minimizar a soma dos quadrados e permitir a formação de grupos semelhantes quanto ao número de integrantes. Quanto à distância Euclidiana ao quadrado, ela pode ser expressa pela Equação 4 (HAIR et al., 2009; FÁVERO; BELFIORI, 2017).
[Equação 4 - Distância Euclidiana]Fonte: Fávero et al. (2009, p.201)
Em que é j-ésima característica do i-ésimo indivíduo; é a j-ésima característica do i-ésimo indivíduo; e é a j-ésima característica do i-ésimo indivíduo.
5 APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS
A apresentação de resultados foi dividida em quatro subseções: a primeira inicia com o perfil dos entrevistados. Já a segunda informa sobre os resultados da análise fatorial e a terceira faz a análise descritiva dos dados. Por fim, a última subseção apresenta a análise de agrupamentos.
5.1 Perfil dos entrevistados
O Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Pará é formado por sete faculdades (Administração, Arquivologia, Biblioteconomia, Ciências Contábeis, Ciências Econômicas, Serviço Social e Turismo), cinco coordenadorias, além da Direção, Secretaria Executiva e Biblioteca Setorial. Todas as unidades participaram do levantamento e obtiveram questionários válidos. A unidade que obteve maior participação contou com 14 (17,5%) entrevistados e a menor, com 4 (5%). Ao final do levantamento, foram obtidos 80 questionários de pesquisa válidos, alcançando, assim, a amostra calculada previamente.
A composição dos cargos entrevistados foi formada por professores (58,8%) e técnicos administrativos (41,2%), sendo que a maioria não exercia cargo de direção (CD) ou função gratificada (FG) por ocasião das entrevistas (73,8%). Equilibrada quanto ao gênero, porém com leve predominância feminina, a amostra foi formada por 41 (51,3%) entrevistados do sexo feminino e 39 (48,8%) do sexo masculino. A maioria era casada (56,3%), mas destacaram-se os solteiros (23,8%) e separados (20%), com participações bem semelhantes entre si. A pesquisa alcançou profissionais jovens e experientes. A faixa etária dos entrevistados distribuiu-se entre: 16 (20%) que tinham até 33 anos, 23 (28,8%), entre 34 e 41 anos, 18 (22,5%), entre 42 e 49 anos e 23 (28,8%) com mais de 50 anos.
Os entrevistados, de maneira geral, declararam conhecer bem a instituição, pois 57 (71,3%) dos participantes tinham mais de 6 anos de trabalho na universidade. Outro aspecto de destaque foi a elevada escolaridade: 78 (97,5%) entrevistados declararam ter curso superior e 48 (60%) formação de mestrado e doutorado. Convictos de que o livre acesso à informação representa um avanço para o Brasil (88,9%) e se considerando bons conhecedores da LAI (58%), uma pequena maioria (54,5%) acredita que as organizações públicas estejam preparadas para atender a legislação que trata do assunto. Contudo, ao deslocar a investigação para a universidade, as opiniões se dividiram, apesar de uma reduzida maioria acreditar que ela disponibilize de forma adequada as informações públicas (51,3%).
5.2 Análise Fatorial
A análise fatorial exploratória foi a técnica de análise de dados selecionada para criar os indicadores e assim captar as variáveis latentes. A técnica foi aplicada pelo método dos componentes principais para a extração dos fatores, o critério do autovalor para determinar a quantidade de fatores e a rotação ortogonal Varimax para melhorar a agregação das variáveis aos fatores. O resultado revelou três fatores, que explicaram 65,87% da variância dos dados com boa comunalidade, visto ter sido superior a 0,542 para todas as variáveis investigadas. O ajustamento dos dados à técnica foi confirmado pelos testes de Kayser-Meyer-Oklin (KMO=0,840) e de esfericidade de Bartlett (χ.=738,37, p-valor=0,000), que apresentaram valores considerados bem satisfatórios (Tabela 1).
Ao primeiro fator, associaram-se as variáveis de V01 a V09 (Tabela 1), tendo essa formação mostrado uma percepção favorável da política de amplo acesso à informação pública. Ela resgata questões relacionadas à legitimidade, ao combate à corrupção, entre outras. Por esse motivo o fator foi denominado “Legitimidade da Administração Pública”. O segundo fator reuniu quatro variáveis (V10 a V13) e captou a possibilidade da utilização indevida da informação pública para interesses pessoais e a preocupação com o excesso de pedidos, aspectos que, de certa forma, impactam diretamente na rotina dos servidores públicos. Nessa perspectiva, o fator foi identificado como “Utilização Indevida da Informação Pública”. O terceiro fator, com três variáveis (V14 a V16), mostrou a preocupação do poder conquistado pela “propriedade” da informação. Esse fator foi denominado de “Perda do controle da informação”.

O primeiro fator, “Legitimidade da Administração Pública”, explicou 34,59% da variância dos dados e captou o papel exercido pelos servidores públicos como agentes de disponibilização de informações. Outro destaque do fator foi a compreensão de que as informações do Estado são reconhecidas como públicas pelos servidores, o que apresenta conformidade com o destacado pela Controladoria Geral da União (2013) e como uma ação de transparência pública que se mostra especialmente necessária para a redução da corrupção, como discutido em Vieira (2013), tendo em vista a transparência ser uma conditio sine qua non para possibilitar que as organizações públicas tenham sua atuação facilmente avaliada pela sociedade (ALMAD, 2016; CRUZ; SILVA; SPINELLI, 2016). Desta forma, o acesso à informação favorece a tempestividade no combate aos eventuais desvios de agentes públicos (VIEIRA, 2013). Nessa perspectiva, uma política de amplo acesso às informações promove maior aproximação entre as organizações públicas e a sociedade em geral (CRUZ; SILVA; SPINELLI, 2016; HONG, 2014; VIEIRA, 2013), acabando por aumentar a satisfação dos servidores públicos.
O segundo fator, “Utilização Indevida da Informação Pública”, explicou 16,29% da variância dos dados e revelou a possibilidade da apropriação de informações públicas por grupos de interesse e a possibilidade de ocorrer uso indevido. Esse fator reuniu a imprensa e grupos políticos e colocou em evidência a finalidade da utilização das informações públicas, seja na perspectiva da utilização indevida ou com interesses políticos. Quanto a esse aspecto vale ressaltar que a Lei 12.527/2011 não exige a explicação de pessoa jurídica ou física sobre o uso que se fará da informação, uma vez que por sua natureza este tipo de informação é considerado bem público (CALADO, 2014). O fator captou a preocupação dos servidores quanto ao volume de solicitações ou à pertinência das solicitações, visto que os pedidos recebidos impactam diretamente no cotidiano do trabalho, pois alteram o volume de tarefas e impõem a necessidade de sistematizar as informações.
O fator “Utilização Indevida da Informação Pública” subordina-se fortemente a uma herança da cultura organizacional do serviço público brasileiro, que remonta ao regime militar. Como destacam Mathias e Andrade (2012), durante esse período, houve grande distanciamento entre o governo e a sociedade, o que fez surgir nas organizações públicas brasileiras a “cultura do segredo” (DA MATTA, 2011), que se justificava pela presença de uma burocracia de viés autoritário e pela necessidade de salvaguardar informações de governo que refletiam: (1) a formação educacional dos militares, que tem como princípio a necessidade de proteger com sigilo as estratégias de seus inimigos; e (2) os interesses de grupos com expressiva influência política e interesses no governo. Destarte, a compreensão do segredo constituiu-se como algo inerente à realidade social desse período da história do Brasil, mas ainda presente no contexto contemporâneo, como destacou Da Matta (2011).
O terceiro fator, “Perda do Controle da Informação”, explicou 14,99% da variância dos dados e captou a preocupação com a propriedade da informação. Nesse sentido, o processo de alienação exprime, essencialmente, uma restrição e uma limitação ao poder dos servidores públicos. Desta forma, a legislação atinge diretamente o desejo, a convicção, ou interesses pessoais de liberar ou não as informações que estão na posse dos servidores públicos. Com isso, o servidor público perde a capacidade de selecionar as informações segundo seu julgamento e vontade pessoal e se subordina a regras legais.
A perspectiva da propriedade da informação evidencia-se ainda mais intensamente quando se considera que, na sociedade do conhecimento, a informação é uma forma privilegiada de poder (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2008), e compreender o poder no âmbito organizacional assume destaque estratégico, pois, como argumenta Morgan (1996, p. 163), o “[…] poder é o meio através do qual conflitos de interesses são, afinal, resolvidos. O poder influencia quem consegue o que, quando e como”. Entre as diversas fontes de poder organizacional, destaca-se o “controle do conhecimento e da informação”, porquanto aqueles que concentram as informações são mais habilitados para influenciar no processo decisório e, com isso, detêm um recurso-chave de poder organizacional (MORGAN, 1996).
Nesse sentido, o fator “Perda do Controle da Informação” expõe a cultura da propriedade da informação como fonte de poder e, como destacam Harrison e Baird (2015), os aspectos culturais devem ser avaliados com atenção nas organizações, pois eles representam forças em constante atuação que limitam e impulsionam as organizações. Complementarmente, o fator captou a possibilidade de aumentar a burocracia pela necessidade de classificar previamente as informações para poder colocá-las sob sigilo. Assim, impõe-se a necessidade de classificar e de normatizar as informações e, mais que isso, de manter atualizados os parâmetros de sigilo, pois as informações são dinâmicas e, conforme a legislação, podem ser solicitadas a qualquer momento.
5.3 Análise Descritiva
Os fatores mostraram níveis adequados de consistência interna (Tabela 2), uma vez que os valores dos coeficientes alpha de Cronbach foram superiores a 0,760. Assim, a análise descritiva mostrou fidedignidade e revelou que, de maneira geral, os entrevistados consideram a política de amplo acesso à informação um avanço para o país, pois acreditam que ela contribui para a maior “Legitimidade da Administração Pública” (5,20±1,19). Outro aspecto positivo é que os servidores que participaram da investigação não acreditam que haja possibilidade de “Utilização Indevida das Informações Públicas” (3,74±1,41) nem que o Estado seja ameaçado pela “Perda do Controle da Informação” (2,57±1,43). Isso pode ser constatado pelas médias das respostas que se posicionaram abaixo da mediana da escala (4,00) e pelo reduzido desvio padrão, que foi baixo para todos os fatores.

5.4 Análise de Agrupamentos
A classificação dos servidores quanto à cultura para divulgar informações públicas utilizou a técnica da análise de agrupamentos na forma hierárquica aglomerativa. O procedimento foi parametrizado pelo algoritmo Ward para a formação dos grupos e a distância Euclidiana ao quadrado para o cálculo das distâncias entre as observações. O número de agrupamentos foi definido pela regra da parada (HAIR et al., 2009). Segundo esse critério, sempre que, durante o processo de agrupamento, ocorre um aumento desproporcional nos coeficientes de proximidade, deve ser selecionada a etapa imediatamente anterior para a formação dos agrupamentos. Nesse estudo, isso ocorreu na etapa 78 do processo aglomerativo e resultou na classificação dos servidores em dois grupos (Tabela 3), o primeiro com 37 (43,25%) entrevistados e o segundo com 43 (53,75%).

Os grupos formados foram testados com o teste T para amostras independentes, (Tabela 4). A finalidade da aplicação do teste foi: (1) verificar se os grupos eram significativamente diferentes entre si e, caso afirmativo, estariam corretamente classificados e: (2) identificar qual dos fatores mais diferenciou os grupos. Os resultados confirmaram que os dois grupos eram significativamente diferentes entre si a 1% de erro (p-valor=0,000) para todos os fatores e que o fator “Utilização Indevida da Informação Pública” foi o que mais diferenciou os grupos.

Na composição dos grupos, o Grupo 1 foi formado por 37 (43,25%) servidores, pouco menor que o Grupo 2, que obteve 43 participantes (53,75%). O Grupo 1 reuniu os entrevistados com uma postura bem aberta e com elevada aceitação da política de amplo acesso às informações públicas. O Grupo 1 mostrou-se convicto dos benefícios da política de acesso às informações para “Melhoria da Legitimidade da Administração” (5,96±0,66), e seus integrantes discordaram fortemente da possibilidade de ocorrer a “Utilização Indevida da Informação Pública” (2,70±1,02), posicionando-se ainda mais fortemente ao discordar da possibilidade de “Perda do Controle da Informação” (1,72±0,68).
Por outro lado, o Grupo 2 foi mais numeroso, pois reuniu 43 (53,75%) servidores. Esse grupo adotou uma posição mais conservadora quanto à divulgação de informações públicas, com média de respostas bem próximas à mediana da escala (4,00). Apesar desse comportamento, não é possível afirmar que haja uma postura pessimista ou negativa com relação ao acesso à informação nesse grupo, da mesma forma como não revela a mesma postura otimista do Grupo 1. Assim, o Grupo 2 mostrou uma avaliação geral reticente quanto ao acesso às informações, tendo em vista que ele acredita pouco que a política possa trazer “Melhoria da Legitimidade da Administração” (4,55±1,16), da mesma forma considera que existe uma possibilidade intermediária de ocorrer “Utilização Indevida da Informação Pública” (4,64±1,04), mas não acredita que a política de acesso às informações públicas promova a possibilidade de “Perda do Controle da Informação” (3,31±1,50).
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa permite concluir que, de maneira geral, os servidores que dela participaram revelaram escolaridade elevada e compuseram uma amostra com expressiva experiência no serviço público. A distribuição equilibrada entre professores e técnicos administrativos contribuiu para uma compreensão ampla da cultura organizacional na universidade, no que diz respeito ao acesso à informação. Isso posto, a análise fatorial exploratória possibilitou captar três fatores que evidenciaram a “Legitimidade da Administração Pública”, a possibilidade de “Utilização Indevida da Informação Pública” e a potencial “Perda do Controle da Informação”. Esses fatores permitem refletir que, apesar de os entrevistados perceberem que a política de amplo acesso às informações públicas representa um avanço na perspectiva social, ainda persiste na cultura organizacional a perspectiva do segredo e da propriedade da informação, que apresenta entraves ao amplo acesso às informações.
Os fatores revelaram elevada consistência interna, aspecto que qualifica os fatores e reforça a compreensão de que eles foram adequados para avaliar a cultura organizacional. A análise com estatística descritiva mostrou que o fator de maior convencimento dos entrevistados foi a ampliação da “Legitimidade da Administração Pública”. Quanto à possibilidade de “Utilização Indevida da Informação Pública”, os servidores se posicionaram próximos à mediana da escala, o que revelou falta de convencimento, seja ou não da utilização indevida. Esse aspecto revela a compreensão do segredo, expressa pela insegurança da utilização das informações públicas contra a organização. Quanto à “Perda do Controle da Informação”, de maneira geral, os servidores não acreditam nessa possibilidade e revelaram respostas de negação.
Quanto à análise de agrupamentos, o procedimento revelou dois grupos. O primeiro grupo é formado pela menor parcela dos entrevistados (43,25%), que veem na política de acesso às informações um grande avanço para o serviço público, ao acreditarem fortemente na maior “Legitimidade da Administração Pública”, discordando da possibilidade da “Utilização Indevida da Informação Pública” e veementemente da possibilidade da “Perda do Controle da Informação”. Esses servidores se revelam bem abertos e dispostos à iniciativa de amplo acesso à informação. O segundo grupo, formado pela maior parte dos servidores (53,75%), se mostrou reticente ao fato de a política possibilitar uma ampliação da “Legitimidade da Administração Pública” por acreditar que haverá uma “Utilização Indevida da Informação Pública” e, apesar de discordar, o grupo considera que não há possibilidade de “Perda do Controle da Informação”. Esses resultados, sob determinada perspectiva, confirmam a persistência de valores culturais que reforçam a necessidade de intervenção na cultura de maneira sistemática e planejada para torná-la mais afeita a uma política de amplo acesso à informação.
REFERÊNCIAS
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Informação adicional
CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA: Concepção e elaboração do manuscrito: M. C. F. Gama e C. A. C. Mattos Coleta de dados: A. L. C. Aguiar Análise de dados: C. A. C. Mattos Discussão dos resultados: M. C. F. Gama, C. A. C. Mattos e A. L. C. Aguiar Revisão e aprovação: M. C. F. Gama e C. A. C. Mattos
CONJUNTO DE DADOS DE PESQUISA: O conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo não está disponível publicamente
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