RESUMO
Objetivo: Mapear e identificar padrões de referenciação bibliográfica nos programas das unidades curriculares dos cursos de Mestrado e Doutoramento em Estudos sobre as Mulheres, de Gênero e Feministas (EMGF) oferecidos por Universidades Públicas Portuguesas.
Método: Análise bibliométrica das 448 referências indicadas nas 84 unidades curriculares que compõem os três cursos de doutoramento e quatro de mestrado, em EMGF, em funcionamento no ano letivo de 2021-22.
Resultado: As referências mais comumente mobilizadas nos cursos analisados são livros publicados a partir da década de 1990, com preponderância da autoria individual. A produção bibliográfica nacional é prevalecente, embora se verifique um peso significativo de referências publicadas em outros países da Europa e América do Norte, sobretudo em países e por autores/as anglófonos/as. O perfil de referências é diverso, em termos de procedência disciplinar das autorias, embora essencialmente circunscrita às Ciências Sociais e Humanas. Similarmente, são diversificadas as temáticas abordadas, com particular destaque atribuído à problemática das Identidades e das Sexualidades, na qual o diálogo com as áreas das Ciências Naturais se faz mais presente.
Conclusões: O estudo permite delinear um perfil de oferta formativa em EMGF atualmente disponível em Portugal, eminentemente teórico, marcadamente pós-estruturalista, interdisciplinar, com notável abertura aos debates conduzidos em outros países, mas com parca representação de obras e autores/as dos países do Sul Global, refletindo o angloeurocentrismo das bibliografias atualmente recomendadas.
PALAVRAS-CHAVE: Estudos de Gênero, conteúdos programáticos, ensino Superior, bibliometria.
ABSTRACT
Objective: To map and identify bibliographic referencing patterns in the syllabi of master’s and Ph.D. courses in Women's, Gender, and Feminist Studies (WGFS) offered by Portuguese Public Universities.
Methods: Bibliometric analysis of the 448 references listed in the 84 course units that make up the three doctoral and four master's degree programs in WGFS, running in the 2021-22 academic year.
Results: The most commonly used references in the analyzed courses are books published from the 1990s onwards, with a preponderance of individual authorship. The national bibliographic production is prevalent, although there is a significant weight of references published in other countries of Europe and North America, especially in English-speaking countries and by anglophone authors. The profile of references is diverse, in terms of the disciplinary origin of the authors, although essentially limited to the social sciences and humanities. Similarly, the themes addressed are diversified, with particular emphasis given to the problems of Identities and Sexualities, in which the dialogue with the areas of natural sciences is more present.
Conclusions: The study allows us to delineate a profile of the WGFS training offer currently available in Portugal eminently theoretical, markedly post-structuralist, interdisciplinary, with remarkable opines to the debates conducted in other countries, but with scarce representation of works and authors from the Global South, reflecting the Anglo-Eurocentrism of the currently recommended bibliographies.
KEYWORDS: Gender Studies, programmatic contents, higher Education, bibliometrics.
Artigo Original
O QUE SE ENSINA NOS ESTUDOS DE GÊNERO EM PORTUGAL: UMA ANÁLISE BIBLIOMÉTRICA DOS PLANOS CURRICULARES
WHAT IS TAUGHT IN GENDER STUDIES IN PORTUGAL: A BIBLIOMETRIC ANALYSIS OF THE SYLLABI
Recepção: 12 Maio 2022
Aprovação: 05 Novembro 2022
Publicado: 30 Novembro 2022
O processo de institucionalização e integração dos Estudos sobre as Mulheres, de Gênero e Feministas (EMGF)1 no ensino superior se desenvolve de maneira variável em diferentes contextos nacionais, estando condicionado por um amplo leque de fatores, que se estendem de dinâmicas políticas e econômicas às particularidades das estruturas educativas de cada país. Estudos anteriores demonstraram, por exemplo, que cursos e programas conferentes de grau em EMGF têm sido criados mais rapidamente e em maior número em países onde há maior autonomia universitária na elaboração dos currículos, as estruturas da Academia são menos rigidamente disciplinares e o Estado apoia as discussões sobre estas temáticas (SILIUS, 2002; ZIMMERMANN, 2007).
Em Portugal, os EMGF emergiram como campo de investigação na década de 1980, um surgimento relativamente tardio em comparação a outros países no contexto europeu (PEREIRA, 2013). Um importante marco no seu processo de institucionalização na Academia portuguesa ocorreu em 1995, aquando da criação do primeiro programa conferente de grau acadêmico em Estudos sobre as Mulheres, um Mestrado oferecido pela Universidade Aberta, sediada em Lisboa.
Volvidas quase três décadas desde o surgimento do primeiro programa de estudos na área, será pertinente analisar criticamente a atual configuração dos EMGF nas universidades portuguesas. Com esse propósito, desenvolvemos uma análise bibliométrica dos planos das unidades curriculares que compõem os sete cursos de pós-graduação em EMGF oferecidos em 2021-22 por universidades públicas portuguesas. A análise incidiu, especificamente, sobre as referências bibliográficas indicadas nas 84 unidades curriculares que compõem os planos de estudos dos três cursos de doutoramento e quatro de mestrado em funcionamento no ano letivo considerado.
Os primeiros estudos bibliométricos da produção científica em EMGF remontam a meados da década de 1990. Destaca-se, neste sentido, o estudo pioneiro de Cronin, Martinson e Davenport (1997), que elegeu como foco a produção publicada entre 1970 e 1994 em três importantes periódicos da área (Feminist Studies, Signs - Journal of Women in Culture and Society e Frontiers: A Journal of Women’s Studies), debruçando-se sobre as características de autoria, padrões editoriais e suas transformações no decorrer do tempo. O estudo inclui também uma análise de conteúdo dos agradecimentos presentes nos artigos, avaliando dimensões como o tom (afetivo ou factual) dominante nos mesmos.
Desde então, diversos estudos lançaram mão de indicadores bibliométricos, como padrões de citação, práticas de colaboração e palavras-chave mais usadas, para mapear a produção científica vinculada aos estudos de gênero e às dinâmicas próprias ao desenvolvimento do campo, a nível global e em contextos nacionais particulares (ABRAMO; D’ANGELO; CAPRASECCA, 2009; YUN; LEE; AHN, 2020; FERREIRA et al., 2020).
Estudos dedicados especificamente à análise bibliométrica das referências que estruturam os conteúdos programáticos de cursos conferentes de grau em EMGF, todavia, ainda não foram realizados, contrastando com a presença de esforços análogos voltados à oferta formativa em outras áreas, como a Biblioteconomia (BRAMBILLA; STUMPF, 2006), as Relações Internacionais (COLGAN, 2017) e a Antropologia (PASSOS, 2017).
Neste trabalho, entendemos que os conteúdos ensinados nas diversas ofertas formativas são resultantes das opções, ênfases e omissões de quem participa no seu processo de elaboração, a que não são alheios fatores sociais, culturais, políticos, entre outros (SILVA, 1999; GOODSON, 2001). À luz desta ênfase no caráter politicamente investido e disputado dos currículos - que se expressa, em particular, na seleção das bibliografias indicadas que os estruturam -, propomos uma análise que não se restringe a um mero esforço descritivo. Com efeito, o mapeamento de padrões no conjunto das obras estudadas nas unidades curriculares que compõem os cursos em EMGF, permitirá discutir e aprofundar a compreensão da própria “identidade científica” deste campo de estudos na Academia portuguesa, refletindo criticamente sobre aspectos como o seu nível de atualização, o seu caráter interdisciplinar, o seu grau de articulação com produções nacionais e internacionais e a sua abertura e vinculação a diferentes posicionamentos político-teóricos e temáticos.
Começamos por uma breve apresentação do processo de integração dos EMGF no ensino superior público português desde meados da década de 1990, enfatizando, em especial, o surgimento dos cursos de mestrado e doutoramento na área no decorrer das últimas quase três décadas. Procuramos, a propósito dessa apresentação, discutir brevemente a confluência de fatores políticos, econômicos e educativos, que contribuiu para a ocorrência do chamado “boom dos EMGF”, em Portugal, na década de 2000 (PEREIRA, 2017, p. 29). Em seguida, detalhamos os procedimentos metodológicos que pautaram o estudo realizado. Posteriormente, apresentamos os resultados das análises empreendidas e exploramos algumas possibilidades interpretativas suscitadas pela informação produzida. Por fim, tecemos diversas considerações sobre o perfil da atual oferta formativa em EMGF em Portugal.
No relatório nacional sobre o estatuto dos Estudos sobre Mulheres em 19 países europeus, de 1995, Maria Irene Ramalho desenhava um quadro pouco animador da posição deste campo de estudos em Portugal:
Uma área institucionalizada de Estudos sobre as Mulheres ainda não existe como tal em universidades e instituições de ensino superior portuguesas. Não existem departamentos de Estudos sobre as Mulheres, não são atribuídos graus acadêmicos em Estudos sobre as Mulheres, não é oferecido nenhum curso oficial e conferente de créditos de Estudos sobre as Mulheres em nenhuma das grandes escolas portuguesas (RAMALHO, 1995/2009, p. 129, tradução nossa).
No mesmo ano, o diagnóstico de Grünell e Kas (1995) apontava que os Estudos sobre as Mulheres em Portugal viviam uma espécie de vida oculta, permanecendo clandestinos, acolhidos nas mais variadas atividades acadêmicas. Na opinião das acadêmicas entrevistadas pelas autoras, esta área de estudos continuaria a ser essencialmente “um campo complementar”. Desde então, diversas transformações ocorreram no que toca à posição ocupada pelos EMGF na Academia portuguesa.
A criação do primeiro programa conferente de grau em “Estudos sobre as Mulheres” - o mestrado oferecido pela Universidade Aberta -, teve lugar ainda em 1995, e mantémse em funcionamento, figurando como o mais duradouro curso em EMGF em Portugal. Foi também nesse ano que se iniciou, de modo mais consistente e sistemático, o processo de introdução de unidades letivas (optativas) específicas dos EMGF em estruturas curriculares existentes de programas de graduação e pós-graduação (mestrado), essencialmente nas áreas das humanidades e da educação.
O surgimento, no final da década, em 1999, de duas revistas dedicadas a este campo de estudos - a ex ӕquo - Revista da Associação Portuguesa de Estudos sobre as Mulheres e a Faces de Eva. Estudos sobre a Mulher - é precisamente resultado da dinâmica impulsionada por estas iniciativas. As expectativas de desenvolvimento justificavam até a elaboração de estados da arte sobre o impacto das teorias feministas e da conceptualização do gênero nas diversas áreas disciplinares (FERREIRA, 2001).2
Na primeira década do século XXI observamos um forte crescimento na oferta formativa em EMGF, com a abertura dos primeiros programas de doutoramento (um na primeira metade da década e outro na segunda) e de mais cinco programas de mestrado. Os anos 2000 também caracterizaram um momento de extensão do enquadramento da oferta de programas e unidades curriculares em EMGF a unidades de ensino e cursos na área das Ciências Sociais.
Este período marcadamente profícuo em termos de ampliação da oferta educativa em EMGF em Portugal, principalmente no que toca ao ensino pós-graduado, converge com o momento em que se lançaram, a nível nacional e europeu, processos políticos de grande alcance, e que produziram profundas transformações no ensino superior.
A década de 2000 marcou, no país, a transição de um modelo de financiamento das instituições públicas de ensino superior essencialmente estatal para um novo regime, caracterizado pela diminuição da participação do Estado nos orçamentos das universidades. No ano 2000, 92,5% das receitas das instituições de ensino superior público provinham do Orçamento do Estado; em 2008, esta participação tinha sido reduzida para 65% (CABRITO, 2011) e, em 2011, para 60,6% (CABRITO et al., 2020). Por conseguinte, as universidades foram obrigadas a recorrer a outras fontes de financiamento para compensarem a diminuição da participação pública, como o contributo direto dos estudantes via pagamento de taxas de frequência, chamadas em Portugal de propinas. Este processo se desenrolou concomitantemente à introdução de importantes transformações na estrutura do ensino superior como parte da implementação, a nível europeu, do Processo de Bolonha. Estabelecido em 1999, este consiste em um processo transnacional de reforma educacional que visa concretizar o Espaço Europeu de Ensino Superior, mediante a promoção de alterações pautadas na ampliação da compatibilidade entre os sistemas de ensino dos países aderentes à Declaração de Bolonha. Das medidas espoletadas pelo processo, destaca-se a reorganização do ensino superior em três ciclos de estudos, correspondentes à licenciatura (1º ciclo), mestrado (2º ciclo) e doutoramento (3º ciclo). A adequação do ensino superior português ao Processo de Bolonha levou à divisão dos anteriores cursos de licenciatura de quatro ou cinco anos, subsidiados pelo Estado e cujos valores máximos das propinas eram estabelecidos pelo governo, em cursos de 1º ciclo de três anos (ainda subsidiados e com propinas máximas fixadas) e cursos de 2º ciclo de dois anos, geralmente oferecidos com propinas mais elevadas e sem restrições governamentais quanto a valores máximos (PEREIRA, 2017, p. 76). Desta forma, as instituições viram na criação de novos programas de estudos pós-graduados valiosas oportunidades de ampliação das suas receitas, em especial “programas de Mestrado interdisciplinares, assim como programas em áreas emergentes das ciências e do saber” (REICHERT; TAUCH, 2005, p. 15). É possível afirmar, portanto, que a confluência de transformações políticas, econômicas e educativas esteve na base do chamado “boom dos EMGF” a nível de cursos de pós-graduação em Portugal, na década de 2000.
No Quadro 1, elencamos os cursos conferentes de grau em EMGF em funcionamento em Portugal no ano letivo de 2021-2022.

A presente investigação é de natureza exploratória e valeu-se da bibliometria para realização de uma análise das referências presentes nos programas dos cursos de EMGF referidos. De maneira sucinta, podemos afirmar que a bibliometria tem como princípio norteador mapear a atividade científica ou técnica mediante o estudo quantitativo de publicações (CAFÉ; BRASCHER, 2008). Os procedimentos de investigação conduzidos foram divididos em três etapas, a saber: (i) identificação de todas as referências bibliográficas indicadas nos programas das disciplinas (obrigatórias e optativas) que compõem os planos curriculares dos doutoramentos e mestrados em EMGF oferecidos por universidades públicas portuguesas; (ii) sistematização da informação, que implicou a produção, utilizando o software Microsoft Excel, de uma base de metadados das obras e respectiva autoria; (iii) análise quantitativa das referências em termos de frequências relativas e absolutas das variáveis mobilizadas.
A identificação das referências bibliográficas foi realizada a partir dos websites das instituições responsáveis pelos programas e dizem respeito, com uma exceção, ao ano letivo 2021-22.3 Ao todo, foram contabilizadas 448 obras, indicadas nas 84 unidades curriculares que compõem os três cursos de doutoramento e os quatro de mestrado em funcionamento, o que se traduz numa média de 5,3 referências por unidade curricular.
As informações sobre as obras e respectiva autoria foram sistematizadas segundo as seguintes dimensões: idioma da publicação; tipologia do documento; ano de publicação; país de publicação; número de autoras/es; sexo da/do autor/a; nacionalidade da/do autor/a; área disciplinar de procedência da/o autor/a e temática central da obra.
A seguir, apresentamos e propomos algumas interpretações dos resultados obtidos, evidenciando características e padrões das referências mobilizadas nos programas dos cursos de EMGF em Portugal.
Das 448 obras referenciadas, 355 são livros, 41 artigos (sendo 17 publicados em periódicos portugueses e 24 em estrangeiros), 37 capítulos de livros, 3 teses de doutoramento, 2 trabalhos publicados em atas de eventos e 10 publicações categorizadas como “Outras”, que incluem working papers, relatórios governamentais, documentos derivados de Provas de Agregação, entre outros. As informações quanto aos tipos de documentos são apresentadas na Tabela 1.

O fato de livros e capítulos de livros representarem 88% das referências pode ser interpretado como relacionado ao que Figueiredo (1990) identifica como uma maior compatibilidade das Ciências Sociais e das Humanidades com o formato mais extenso do livro do que do artigo. Apesar de tratar-se de um campo fundamentalmente interdisciplinar, os EMGF têm habitualmente encontrado nas Ciências Sociais e nas Humanidades terrenos particularmente férteis para o seu desenvolvimento. No caso português, por exemplo, dos sete cursos em EMGF, seis são categorizados pela Direção Geral de Ensino Superior como pertencentes à área da Sociologia e um à área da Psicologia. As dinâmicas próprias ao desenvolvimento destas áreas do saber tendem a ser mais “morosas” (são, por exemplo, pouco comuns “descobertas” disruptivas a serem divulgadas imediatamente), o que “justifica o uso de fontes de informação com valor mais duradouro, enquanto os artigos podem ser efêmeros” (BRAMBILLA; STUMPF, 2006, p. 42). Por outro lado, este tipo de recurso bibliográfico reveste-se de particular relevância em contexto pedagógico, já que tende a ser mais abrangente em termos de conteúdos temáticos, permitindo uma visão geral e uma análise aprofundada, frequentemente com uma perspectiva histórica, de um determinado tópico. É também possível que a história relativamente recente da investigação em EMGF, sobretudo em Portugal, leve as/os docentes a optarem por indicar nas suas unidades curriculares obras com conteúdo teóricos mais extensos e sistematizados (fontes secundárias), como é o caso dos livros, relegando para segundo plano artigos resultantes de investigações individuais ou de equipe (fontes primárias), que tendem a evidenciar conhecimentos mais parcelares e sujeitos a validações empíricas posteriores.
Outro elemento a ser sublinhado diz respeito ao fato de cerca de 1 em cada 3 artigos de periódicos portugueses presentes nas bibliografias ter sido publicado na Revista ex æquo, da Associação Portuguesa de Estudos sobre as Mulheres (APEM). A revista, criada em 1999, como já referido anteriormente, figura como um importante espaço de divulgação da produção científica nos EMGF em Portugal, ao qual docentes recorrem com frequência para atualização das fontes científicas recomendadas no âmbito das diversas unidades curriculares.
Os dados obtidos evidenciam a predominância da língua inglesa (48,4%), seguida do Português (45,5%), do Francês (4,5%) e do Espanhol (1,6%). Por um lado, estes resultados expressam o fato de os EMGF se terem desenvolvido de modo mais precoce e acelerado, e alcançado maior grau de institucionalização, nos países centrais, “com destaque para os países de tradição anglo-saxônica” (RAMALHO, 2001, p. 109), razão pela qual uma grande parcela da produção na área continua devedora dos contributos norteamericanos e britânicos e a língua inglesa continua a ocupar a posição de “língua franca” entre investigadoras/es do campo (TSAY; LI, 2017; HOPPEN; VANZ, 2020). Por outro lado, tal predominância do inglês também revela algumas características específicas do desenvolvimento dos EMGF em Portugal, nomeadamente, o fato de estes terem se beneficiado no país, nos seus momentos iniciais, de uma relação estreita com os estudos Anglo-Americanos. Maria Irene Ramalho, ela própria uma especialista em estudos americanos, sublinhou esta ideia no início do século (2001) e Macedo e Pereira, igualmente especialistas dessa área de estudos, reafirmaram-na década e meia mais tarde:
Há, sem dúvida, uma relação frutífera entre os Estudos Anglísticos (na sua variante inglesa e americana) e os estudos de gênero na academia portuguesa, que se “contaminaram” positivamente ao longo dos anos, pelo menos nas últimas duas décadas e meia […] (MACEDO; PEREIRA, 2015, p. 45, tradução nossa).
Os resultados obtidos mostram que o grau de predominância do inglês varia entre instituições, o que parece ter como um de seus fatores condicionantes o grau de vinculação dos EMGF aos estudos anglo-americanos em cada contexto institucional. Por exemplo, o Doutoramento em Estudos Feministas na Universidade de Coimbra, proposto inicialmente por investigadoras associadas ao Grupo de Estudos Anglo-Americanos (MACEDO; PEREIRA, 2015, p. 43), conta com 67% das referências em língua inglesa. Similarmente, o programa de Mestrado oferecido na Universidade do Minho - instituição na qual as primeiras discussões sobre as temáticas do gênero e dos estudos feministas surgiram no Departamento de Estudos Ingleses e Norte-Americanos (MACEDO; PEREIRA, 2015) - apresenta 55% das obras indicadas em inglês. Por sua vez, o Mestrado na Universidade Aberta, que não foi idealizado por investigadoras diretamente associadas aos estudos das literaturas e das culturas de países anglófonos, tem 23% de participação da língua inglesa nas suas referências, situação próxima àquela observada no Mestrado na Universidade Nova de Lisboa, instituição na qual “o desenvolvimento dos estudos de gênero não é predominantemente associado ao Inglês” (MACEDO; PEREIRA, 2015, p. 44) e que conta com 31% das referências no idioma.
Foram identificadas obras publicadas em 13 países, sendo Portugal o país com maior número de contribuições (193 publicações), seguido pelos Estados Unidos (103) e Reino Unido (94). A distribuição das referências por país de publicação é apresentada na Figura 1.

Estes resultados mostram que as referências bibliográficas dos cursos em EMGF são marcadas por uma considerável abertura à literatura internacional, em especial norteamericana e britânica. Tal constatação reflete, conforme mencionado anteriormente, a posição de centralidade ocupada pelas contribuições anglo-americanas no âmbito dos EMGF a nível global. De fato, uma análise bibliométrica anterior indicou que cerca de 80% da produção em estudos sobre as mulheres e feministas publicada entre 1900 e 2013 e indexada na Web of Science tinha a sua origem nos Estados Unidos ou no Reino Unido (TSAY; LI, 2017). A valorização da produção nacional, no entanto, é também uma característica importante da oferta formativa atualmente disponível em Portugal.
Em paralelo, é digno de nota que, com exceção do Brasil, todos os demais países de publicação são localizados no Norte Global. Este dado pode advir da atual configuração do mercado editorial acadêmico mundial, marcadamente dominado por empresas da América do Norte e da Europa, ou por multinacionais cujas sedes estão nestas regiões. Conforme sublinha Collyer (2018, p. 61), 40 das 57 maiores editoras acadêmicas estão sediadas no Reino Unido, na América do Norte ou na Europa continental. Podemos, desta forma, afirmar que o padrão de incidência de países de publicação nos planos curriculares estudados é produto não apenas de opções individuais, mas expressa também o caráter desigual das estruturas que moldam as dinâmicas globais de produção e circulação do saber científico.
Conforme mostra a Tabela 2, das 448 obras referenciadas, 259 são assinadas por apenas uma autora ou um autor (58%) e 189 são produto de coautoria entre duas ou mais pessoas (42%). A prevalência de autoria individual é uma tendência extensamente documentada nas Ciências Sociais e nas Humanidades, assim como em campos de maior inclinação teórica, como a matemática, em oposição a áreas de cariz aplicado ou experimental, nas quais são mais frequentes coautorias (MEADOWS, 1999). Desta forma, o fato de as referências serem dominadas por autoria individual é indicativo de que os cursos em EMGF enfatizam a reflexão teórica como pilar da formação das/os estudantes da área. Apesar de tratarmos de documentos selecionados com finalidades pedagógicas e formativas - contexto no qual uma maior ênfase teórica pode justificar-se, como mencionado anteriormente -, cabe sublinhar que este pendor teórico das leituras recomendadas ao corpo estudantil dos EMGF, em detrimento de trabalhos baseados em investigações empíricas, também tem sido documentado por estudos bibliométricos voltados para a produção científica em geral na área (DINIZ; FOLTRAN, 2004; HOPPEN; VANZ, 2020).

Das referências analisadas, observamos que 264 (58,9%) têm como autoras apenas mulheres (individualmente ou em coautoria), 127 (28,3%) têm apenas autores homens e 52 (11,6%) são assinadas por pelo menos um representante de cada sexo.4 Ao todo, e considerando obras referenciadas mais de uma vez, contabilizamos 661 autoras/es, havendo clara predominância feminina (426 mulheres, ou 64,4%, e 233 homens, ou 35,2%).5 A título de breve comparação com cursos de outras áreas, um estudo sobre a participação feminina nas referências indicadas em programas de pós-graduação em Relações Internacionais, em universidades norte-americanas, identificou que mais de 70% das obras tinham autoria unicamente masculina (COLGAN, 2017). No contexto português, um estudo realizado na Universidade de Coimbra, ao analisar a composição sexual da autoria das referências indicadas em disciplinas de diversas áreas do saber, constatou a existência de considerável diferencial de gênero. A maior presença feminina foi observada nas bibliografias de unidades curriculares de cursos das Ciências Sociais, nas quais mulheres respondiam por 38% do número total de pessoas autoras, ao passo que, em disciplinas das áreas de Tecnologias da Comunicação e da Informação, esta proporção era de apenas 5% (LOPES et al., 2019).
Por fim, um determinado “cosmopolitismo” das referências bibliográficas analisadas se expressa na variedade de nacionalidades no que toca à autoria - foram identificadas 24 diferentes nacionalidades. Importa, no entanto, qualificar e relativizar este dado, uma vez que 92,6% das referências indicadas (415 obras) são assinadas unicamente por autoras/es da América do Norte ou da Europa.
Diversos são os elementos que concorrem para a produção deste quadro, e que apontam para a persistência de hierarquias epistêmicas que historicamente marcam as relações entre Norte e Sul globais (SANTOS, 2014). Como tem afirmado Boaventura de Sousa Santos, um dos legados do colonialismo é a invisibilização e subalternização de saberes e interpretações do mundo que partem de outras posições que não o Norte Global e seus preceitos epistêmicos pretensamente universais (SANTOS, 2014). Com base neste cenário teórico, poderíamos identificar nas referências bibliográficas analisadas um dos momentos deste esforço amplo de ocultação e produção de ausências, aproximando tais documentos educativos da noção foucaultiana de dispositivos de poder (FOUCAULT, 2000), cujo funcionamento teria por objetivo produzir como inexistentes estas vozes e epistemologias “outras”. Neste sentido, e evocando brevemente a célebre indagação da pensadora feminista indiana Gayatri Spivak (1988) no seu seminal ensaio “Can the Subaltern Speak?”, é possível afirmar que, no âmbito do conjunto de referências que estrutura a oferta formativa em EMGF em Portugal, a/o subalterna/o ainda não tem voz.
Esta ausência, tal como sublinhado por Janice Monk e Maria Dolors Garcia-Ramon (2013), não deixa de ser incongruente com o predomínio das perspectivas pós-modernas mais focadas nas questões da exclusão, marginalidade, conhecimento situado e as políticas de identidade. Incongruência só compreensível pela força da armadilha que estabelece, mesmo nos países periféricos, como critério de avaliação de desempenho a produção bibliográfica presente nas chamadas publicações internacionais, que alguns estudos têm mostrado serem pouco internacionais, limitando o seu universo à língua inglesa praticada no Reino Unido e nos Estados Unidos da América (GARCIA-RAMON, 2011).
A maior parte das referências foi publicada nas duas últimas décadas (quase 70% do total), o que parece evidenciar, prima facie, um considerável grau de atualização das leituras científicas recomendadas. É preciso ponderar, entretanto, que devido ao tipo de publicação mais recorrente no nosso corpus ser o livro, pode-se supor que algumas datas recentes representem reedições ou reimpressões de obras mais antigas. A distribuição conforme os períodos de publicação das referências é apresentada na Tabela 3.

Temos que, em média, as referências indicadas nos planos das unidades curriculares foram publicadas há cerca de 17 anos. Mesmo se desconsiderarmos as três obras mais antigas, publicadas entre 1941 e 1970, a média de antiguidade das obras é de 16,7 anos. Valendo-se de uma abordagem bibliométrica, Yun, Lee e Ahn (2020) identificaram que cinco das dez referências mais citadas em artigos na área de estudos sobre as mulheres foram publicadas a partir de 1990, altura a partir da qual estes campos do saber “começam a formar a sua estrutura intelectual” (YUN; LEE; AHN, 2020, p. 13). Os resultados de nossa análise demonstram que as referências bibliográficas dos cursos em EMGF oferecidos em Portugal seguem a mesma tendência observada naquele estudo, com forte destaque das obras surgidas no decorrer das últimas três décadas.
Outra variável aqui analisada consiste na área disciplinar da/o primeira/o autor/a das referências bibliográficas. A partir dos dados apresentados na Figura 2, podemos identificar a acentuada prevalência das Ciências Sociais e das Humanidades, com especial participação da Sociologia, área que tem contribuído decisivamente para os debates sobre gênero em Portugal (BARROSO et al., 2011). A criação, em 2021, do “Mestrado em Sociologia do Género e da Sexualidade” na Universidade do Minho é, por seu turno, expressão evidente de que esta disciplina continua a ter um papel central no trabalho científico desenvolvido nos EMGF no país.
É importante sublinhar que a interdisciplinaridade, traço crucial dos EMGF, mostrase, nas referências bibliográficas analisadas, restrita essencialmente ao domínio das Ciências Sociais e Humanidades. A extensão às áreas das Ciências, Tecnologias, Engenharias e Matemática é ainda residual. Tratando especificamente de áreas do saber que não são habitualmente entendidas como associadas aos estudos de gênero, destacase a presença da Medicina/Biologia Humana, que conta com nove referências - oito delas indicadas em unidades curriculares do Programa Doutoral em Sexualidade Humana da Universidade do Porto. Desta forma, os estudos das sexualidades parecem figurar enquanto uma importante “porta de entrada” de outras áreas nos EMGF.

Podemos afirmar que a oferta formativa portuguesa atual em EMGF assenta no diálogo entre disciplinas acadêmicas solidamente estabelecidas, em especial a Sociologia e a Psicologia. A heterogeneidade que se observa nos programas, todavia, mantém o campo alheio à possibilidade de “captura” por qualquer uma dessas disciplinas isoladamente, contribuindo para que o mesmo permaneça fiel a um dos movimentos fundantes dos estudos de gênero e feministas, que diz respeito à desestabilização das fronteiras rígidas que informam os processos de produção e circulação do conhecimento científico, mediante o fomento de uma radical “desidentificação compósita” (RAMALHO, 2001, p. 109) em relação às disciplinas, própria da interdisciplinaridade.
Procedemos também à identificação dos principais assuntos abordados nas referências, organizando-as em grandes áreas temáticas, conforme apresentado no Figura 3.6

A prevalência de obras que se debruçam prioritariamente sobre as Epistemologias Feministas indica que os cursos almejam oferecer às/aos estudantes uma sólida formação nos debates teóricos de grande alcance que animam os EMGF, enfatizando temas como as transformações promovidas nos variados domínios do saber pela crítica feminista e as complexidades inerentes ao “ferramental” teórico-conceptual que sustenta o campo (por exemplo, debates sobre o caráter disputado e polissêmico de categorias como “gênero”, “sexo”, “mulheres”, “homens”, etc.).
A grande presença de obras que abordam as temáticas das Identidades e das Sexualidades pode ser interpretada como retrato da crescente importância atribuída a estas questões nos EMGF, a nível nacional e internacional. Os resultados apontam, ainda, que não apenas estas temáticas parecem ter sido incorporadas nos programas dos cursos, mas também o foi a vertente teórica que, nas últimas três décadas, se consolidou como perspectiva dominante no debate crítico feminista sobre as sexualidades e as identidades: o pós-estruturalismo. Observemos, por exemplo, que as duas obras mais frequentemente referenciadas no nosso corpus de análise são “História da Sexualidade I - A vontade de saber”, de Michel Foucault, e “Gender Trouble”, de Judith Butler (com, respectivamente, sete menções em unidades curriculares de cinco diferentes programas de formação e seis menções em unidades de quatro programas), livros comumente identificados como “canônicos” no âmbito das teorizações pós-estruturalistas sobre as identidades, as sexualidades e o gênero e que foram basilares para o estabelecimento de importantes vertentes do chamado pensamento feminista “pós-moderno”, como as teorias queer (SALIH, 2012). Neste sentido, podemos afirmar que as contribuições pós-estruturalistas, caracterizadas pela sua ênfase na instabilidade das posições de sujeito, na pervasividade das relações de poder que tomam parte na contemporaneidade e no caráter sócio historicamente construído das identidades sexuais e de gênero, exercem importante influência sobre a atual oferta formativa em EMGF, em Portugal.
Por fim, é digna de nota a considerável presença de livros sobre métodos qualitativos e quantitativos de investigação científica. Devemos reconhecer que este dado não será alheio à forte influência exercida pela Sociologia sobre os programas analisados, bem como ao esforço evidente e permanente das áreas e temáticas abrangidas pelos EMGF evidenciarem a sua cientificidade, contrariando acusações veladas e explícitas de que estariam mais no domínio das ideologias ou do senso comum. Efetivamente, podemos aqui aludir aos conturbados processos de negociação do “estatuto epistêmico” (PEREIRA, 2017) dos EMGF na Academia e, em especial, às estratégias mobilizadas por investigadoras/es para navegar em ambientes acadêmicos que, muitas vezes, subestimam e desvalorizam o conhecimento produzido pela área. Como forma de responder às críticas da falta de rigor científico e perfil “demasiadamente ideológico” (PEREIRA, 2017) dos EMGF e ampliar a credibilidade e reconhecimento acadêmico da área, investigadoras/es recorrem a “estratégias de cientifização” [strategies of scientization] (MESSER-DAVIDOW, 2002), que englobam, por exemplo, a organização do campo segundo práticas de objetividade científica convencionadas.
Transpondo este quadro para o âmbito do processo de construção dos planos curriculares analisados, podemos argumentar que a aposta em obras sobre metodologia de investigação científica figura como uma das estratégias utilizadas por docentes para sublinhar a cientificidade dos EMGF, em meio às negociações do estatuto epistêmico do campo em ambientes institucionais que insistem em caracterizá-lo enquanto ideologia pseudocientífica. Há ainda a sublinhar que os cursos analisados são de 2º e de 3º ciclo de formação universitária e, por isso, voltados também para uma consolidação de competências de investigação dos/as estudantes, bem como da sua literacia científica.
O presente trabalho procurou realizar um mapeamento das referências bibliográficas mobilizadas nas unidades curriculares dos planos de estudo de Mestrado e Doutoramento em EMGF oferecidos por Universidades Públicas Portuguesas. Longe de um esforço que se pretendeu exaustivo, o objetivo principal foi evidenciar alguns padrões e explorar, em linhas gerais, diversas possibilidades interpretativas suscitadas pelos dados.
Os resultados obtidos permitem-nos tecer breves considerações sobre o perfil da oferta formativa em EMGF disponível em Portugal no ano letivo de 2021-22. Inicialmente, cabe sublinhar que as referências mais comumente mobilizadas nos cursos estudados são livros publicados a partir de 1990. A prevalência de autoria individual é um indicativo da vocação teórica dos cursos analisados, resultado que pode alimentar os efervescentes debates sobre o papel desempenhado por processos de institucionalização enquanto potenciais promotores de um afastamento dos EMGF das questões político-práticas que marcam o campo desde as suas origens enraizadas nos movimentos de mulheres.
A considerável presença, nos planos curriculares analisados, de referências publicadas no estrangeiro indica um alto nível de abertura dos EMGF portugueses ao trabalho científico desenvolvido em outros países, o que não implica a subvalorização da produção nacional, uma vez que esta responde pela maioria das obras indicadas nas bibliografias. Todavia, a presença internacional na oferta formativa é, em grande medida, sustentada por referências europeias ou norte-americanas, com rarefeita participação de obras publicadas em outras regiões do mundo ou escritas por autoras/es advindas/os de outros espaços, em especial, dos países do Sul Global. A ampliação do horizonte de referências e autorias, para além da Europa e da América do Norte, poderá contribuir decisivamente para o enriquecimento destes cursos em termos teóricos, políticos e temáticos, atenuando o relativo anglo-eurocentrismo que ainda perpassa as recomendações feitas a estudantes, em termos de leituras científicas em EMGF.
A composição marcadamente diversificada das referências indicadas no que toca à procedência disciplinar de quem as escreve parece fazer jus à posição dos EMGF enquanto campo interdisciplinar por excelência, embora as áreas representadas nas obras recomendadas estejam, essencialmente, circunscritas às Ciências Socias e Humanas. Esta diversidade também se expressa nas temáticas abordadas. A este nível, sobressai a importância atribuída à problemática das Identidades e das Sexualidades, na qual o diálogo com as Ciências Naturais se faz mais presente. Salienta-se também o protagonismo alcançado pelas obras associadas ao pós-estruturalismo, tanto na sua formulação francesa quanto na sua recepção norte-americana.
Em termos de limitações do presente estudo, o nosso esforço procurou analisar as referências bibliográficas das unidades curriculares integrantes dos cursos em EMGF em vigor em 2021-22, abordagem esta que não permite captar as vicissitudes próprias ao desenvolvimento dos planos curriculares no decorrer do tempo. Investigações futuras poderão interpelar tais planos a partir de um corte temporal mais alargado, o que evidenciará as modificações periódicas às quais são sujeitos e o dinamismo que marca tais documentos educativos. Adicionalmente, restringimos nosso foco à Academia portuguesa, de modo que futuras análises bibliométricas de referências de cursos em EMGF em outros contextos nacionais poderão oferecer importantes recursos para estudos comparativos.
Coleta de dados: C. C. Santos.
Análise de dados: C. C. Santos, M. A. Lopes, C. C. Vieira, V. Ferreira.
Discussão dos resultados: C. C. Santos, M. A. Lopes, C. C. Vieira, V. Ferreira.
Revisão e aprovação: M. A. Lopes, C. C. Vieira, V. Ferreira.
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