Artigo original

CONCEPÇÃO, DIMENSÃO E ESTRUTURA DA BIBLIOTHECA UNIVERSALIS (1545) GESNERIANA: GLOSAS BIBLIOGRÁFICAS A PARTIR DE SUA EPISTOLA NUNCUPATORIA1

Conception, dimension and structure of the Gesnerian Bibliotheca Universalis (1545): bibliographical glosses from its Epistola Nuncupatoria

Andre Vieira de Freitas Araujo
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brazil

CONCEPÇÃO, DIMENSÃO E ESTRUTURA DA BIBLIOTHECA UNIVERSALIS (1545) GESNERIANA: GLOSAS BIBLIOGRÁFICAS A PARTIR DE SUA EPISTOLA NUNCUPATORIA1

Encontros Bibli, vol. 25, Esp, e76345, 2020

Universidade Federal de Santa Catarina

Recepção: 11 Agosto 2020

Aprovação: 04 Setembro 2020

Publicado: 30 Novembro 2020

RESUMO

Objetivo: Mapear, apresentar e discutir a concepção, dimensão e estrutura documentária de Bibliotheca Universalis

(1545), de Conrad Gesner (1516-1565), a partir de seu prefácio denominado Epistola Nuncupatoria.

Método: Sob o horizonte histórico-bibliográfico, o estudo se desenvolve por meio: 1) da leitura e tradução integral de Epistola Nuncupatoria, que ocupa o intervalo entre os fólios 2r e [7r] de Bibliotheca Universalis ; 2) da relação do texto latino da Epistola com os estudos bibliográficos gesnerianos, notadamente Serrai (1990) e Sabba (2012).

Resultado: Em Epistola Nuncupatoria, Conrad Gesner expõe a concepção, dimensão e estrutura documentária de Bibliotheca Universalis (1545), uma vez que sobreleva: 1) seu alcance e objetivos; 2) seu uso por parte dos leitores; 3) perdas e destruições bibliográficas; 4) dinâmicas de produção e circulação de impressos; 5) abrangência autoral; 6) ordenação de suas fontes; 7) notícias sobre as bibliotecas pesquisadas; 8) tipologia e cobertura das fontes adotadas para sua composição. O repertório bibliográfico resulta de um longo esforço e dedicação individual, mas Gesner enfatiza que abriu caminho para que outros estudiosos pudessem transmitir os livros para a posteridade - desejo este que consolida-se nos Epitomi de Bibliotheca Universalis.

Conclusões: Compreendida e lida como um conjunto de argumentos mediadores e memorialísticos, Epistola Nuncupatoria forma um rico corpus que manifesta e sintetiza a reflexão e a autoconsciência de Conrad Gesner sobre seus métodos de trabalho que, a rigor, formam o substrato do gesto e do método bibliográfico.

PALAVRAS-CHAVE: Bibliotheca Universalis (1545)+ Epistola Nuncupatoria [f. 2r - [7r]]+ Bibliografia - História e Teoria+ Organização do Conhecimento - Séc. XVI.

ABSTRACT

Objective: Map, present and discuss the conception, dimension and documentary structure of Bibliotheca Universalis

(1545), by Conrad Gesner (1516-1565), from its preface called Epistola Nuncupatoria.

Methods: Under the historical-bibliographic horizon, the study is developed through: 1) reading and full translation of Epistola Nuncupatoria, which occupies the interval between the folios 2r and [7r] of Bibliotheca Universalis; 2) the relationship between the Latin text of the Epistola and the gesnerian bibliographical studies, notably Serrai (1990) and Sabba (2012).

Results: In Epistola Nuncupatoria, Conrad Gesner exposes the conception, dimension and documentary structure of Bibliotheca Universalis (1545), since it surpasses: 1) its scope and objectives; 2) its use by readers; 3) bibliographical losses and destruction; 4) dynamics of production and circulation of printed books; 5) authorial scope; 6) ordering sources; 7) news about the researched libraries; 8) typology and coverage of the sources adopted for its composition. The bibliographical repertoire results from a long effort and individual dedication, but Gesner emphasizes that it paved the way for other scholars to transmit the books to posterity - a desire that is consolidated in the Epitomi of Bibliotheca Universalis.

Conclusions: Understood and read as a set of mediating and memorialistic arguments, Epistola Nuncupatoria forms a rich corpus that manifests and synthesizes Conrad Gesner's reflection and self-awareness about his work methods, which, strictly speaking, form the substrate of the gesture and the bibliographical method.

KEYWORDS: Bibliotheca Universalis (1545), Epistola Nuncupatoria [f. 2r - [7r]], Bibliography - History and Theory, Organization of Knowledge - 16th Century.

1 INTRODUÇÃO



Outra viagem pra me colorir pra gostar de alguém. E o fundo das coisas pra me enganar pra não existir mais. Os bares fechados pra nós. As horas correndo.
Os cursos mudando pra nós. Pessoas mudando.
As portas fechando pra nós.
Os olhos abertos

Fonte: (Giovani Cidreira, “Última Vida Submarina”)

Conrad Gesner (1516-1565) é conhecido por seu interesse multifacetado nos campos da Medicina, Teologia, Botânica, Zoologia, Linguística, Paleontologia, Mineralogia e, claro, Bibliografia.

Sua Bibliotheca Universalis (1545), amplamente referenciada, porém pouco estudada, possui característica descritivo-repertorial e está fundamentada na seleção bibliográfica e na ordenação alfabético-nominal. Enquanto a obra se ocupa da perspectiva descritiva dos documentos, tendo como referência de organização a ordem2 alfabética do primeiro nome do autor (e sobrenome, para seu índice), a segunda parte da obra, denominada as Pandectae3 (1548, 1549), se ocupa da perspectiva semântica dos documentos.

O prefácio de Bibliotheca, denominado Epistola Nuncupatoria, apresenta o programa bibliográfico de Conrad Gesner e sintetiza os elementos fundacionais da teoria, do método e da disciplina bibliográfica.

Como afirma Ann Blair (2016), a Epistola Nuncupatoria constitui um tipo de paratexto comumente encontrado nos trabalhos acadêmicos da Europa Moderna, tais como as dedicatórias, notas aos leitores, tabelas de conteúdos, listas de autoridade, poemas elogiosos, índices e listas. Esses paratextos serviam a vários propósitos previsíveis, como agradecer e apelar aos patrocinadores e colaboradores de edições produzidas e publicadas, discorrer sobre as circunstâncias de publicação e suas relações com correspondentes e impressores e fornecer ajuda aos leitores, correções e dispositivos de localização textual.

Este estudo tem como objetivo mapear, apresentar e discutir a concepção, dimensão e estrutura documentária de Bibliotheca Universalis, a partir de sua Epistola Nuncupatoria. Sob o horizonte histórico-bibliográfico, se desenvolve por meio: 1) da leitura e tradução integral4 de Epistola Nuncupatoria, que ocupa o intervalo entre os fólios5 2r6 e [7r] de Bibliotheca Universalis ; 2) da relação do texto latino da Epistola com os estudos bibliográficos gesnerianos, notadamente Serrai (1990) e Sabba (2012).

Deste modo, a análise e discussão aqui empregadas estão fundamentadas, sobretudo, na apresentação de extratos, por vezes extensos, da Epistola Nuncupatoria - o que representa uma contribuição inédita aos estudos bibliográficos no contexto ibero- americano. Como veremos adiante, Epistola é um tipo de tratado de natureza não só bibliográfica, mas também biblioteconômica.

2 CONCEPÇÃO, DIMENSÃO E ESTRUTURA DOCUMENTÁRIA DE BIBLIOTHECA UNIVERSALIS (1545)

Em uma concepção contemporânea, Bibliotheca Universalis (1545) associa-se à ideia de um catálogo alfabético-nominal, composto por 5031 autores de cerca de 15.000 obras escritas em latim, grego e hebraico. Além da indicação dos autores (ordenados alfabeticamente pelo seu primeiro nome), a obra também apresenta o extrato dos documentos listados.

Gesner expõe o escopo de sua obra já no título de partida, impresso em destaque no frontispício, conforme Figura 1.

Título de partida de Bibliotheca Universalis (1545)
Figura 1
Título de partida de Bibliotheca Universalis (1545)
Fonte: Gesner (1545, f. [1r]). Disponível em: http://www.e-rara.ch/zuz/content/pageview/5079514

Conforme o título de partida, Bibliotheca é uma:

Biblioteca universal ou catálogo muito completo de todos os escritores em três idiomas, latim, grego e hebraico, existentes e não mais existentes, antigos e mais recentes até esta data, eruditos e não eruditos, publicados e conservados nas bibliotecas. Uma obra inovadora e não apenas necessária para o estabelecimento de bibliotecas públicas e privadas, mas também muito útil para uma melhor formação de todos os estudiosos de qualquer arte e ciência. Autor: Conrado Gesner, zuriquense, médico/doutor de medicina (GESNER, 1545, f. [1r], tradução nossa).

O título de Bibliotheca revela pontos inovadores da bibliografia gesneriana em relação ao seu alcance e objetivos, além do senso de universalidade que contorna a obra. Acerca deste aspecto, Alfredo Serrai apresenta as premissas sobre a universalidade de Bibliotheca:

  1. 1. O repertório, universal, visa se reportar a todos os autores que compuseram obras nas três línguas, latim, grego e hebraico.
  2. 2. O princípio da universalidade, portanto, e não o de respeito pelas línguas da tradição e dos estudos, como foi afirmado, se torna o motivo que determina sua escolha; as línguas nacionais, sem a exigência de universalidade, não poderiam se tornar patrimônio comum, e sua adoção, portanto, teria tido como consequência a interrupção da continuidade e da comunicabilidade da ciência. Gesner assume, assim, uma tarefa de suprema importância, mas também de dificuldade sobrehumana: a de fazer uma avaliação de todo o passado literário, científico e histórico da civilização ocidental, e de fazer um inventário geral do que, na primeira metade do Séc. XVI, apresentou-se como o património cultural da Europa. A antiguidade clássica, a tradição medieval e humanística, as descobertas renascentistas e as elaborações e desenvolvimentos contemporâneos deste patrimônio cultural encontram na Bibliotheca de Gesner um resumo e uma documentação tão abrangente e capilar que ainda constitui hoje uma fonte primária e inesgotável de informação e estímulos intelectuais.
  3. 3. A universalidade não possui limites cronológicos, mas varia desde a antiguidade até a contemporaneidade gesneriana.
  4. 4. A universalidade não se limita a trabalhos eruditos, cultos ou de nível científico, mas também abrange as composições de menor valor, aquelas dos "indocti".
  5. 5. A universalidade não encontra fronteiras, mesmo no fato de que as obras tenham sido impressas, porque também é dada referência daqueles manuscritos permanentes, isto é, "escondidos nas bibliotecas".
  6. 6. A universalidade da Bibliotheca Universalis passa resolutamente a extensão das bibliografias anteriores, a mais ampla das quais foi o Catálogo de Tritemio (que Gesner reportará integralmente em Bibliotheca) e, assim, se propõe não apenas como um guia bibliográfico para a criação de novas coleções de bibliotecas, sejam públicas e privadas, mas também como vademecum7 e instrumento de consulta para estudiosos de qualquer disciplina ou ciência; a bibliografia universal, de fato, não pôde deixar de incluir todas as disciplinas particulares, para as quais as Pandectae forneceriam itinerários bibliográficos especializados com base nos mesmos esquemas e caminhos que regulavam a matéria, métodos e acessos das mesmas disciplinas (SERRAI, 1990, p. 70-71, tradução nossa).

O senso de universalidade de Gesner conduz a percepções inter-relacionadas, das quais destacamos: 1) Bibliotheca torna-se uma espécie de enciclopédia da cultura trilíngue; 2) Bibliotheca torna-se o primeiro cânone bibliográfico universal resultante do Humanismo; 3) Bibliotheca passa a ser uma das principais ferramentas de compilação, gestão, disponibilização e mediação da informação da Europa Moderna.

No verso do frontispício Bibliotheca, Gesner registra uma nota aos leitores em que sintetiza o papel e conteúdo da obra:

Aos leitores. Sede favoráveis, ótimos leitores, a este imenso trabalho, ao qual, por muito tempo, com incrível cuidado, tendo sido feitas muitas viagens por conta dele, dei continuidade para vosso proveito e [proveito] de toda posteridade. Estão contidos, porém, nesta obra não apenas muitos catálogos de outros [autores] editados anteriormente acerca de vários escritores, mas além disso infinitos volumes publicados por outros, tanto de eruditos de uma época recente quanto de autores antigos, e é indicado em qual dos locais eles estariam [conservados]. Aqueles que ou muitos homens doutos também julgavam até este momento ter perecido, ou [dos quais] nem ao mesmo tinham conhecimento. Todos são lembrados sem qualquer discriminação de profissão, religião ou de doutrina, simplesmente de acordo com a ordem das letras. Grande parte deles foi adicionada, e também argumentos e comentários sobre alguns livros. E que ninguém seja desencorajado pela extensão da obra. [...] Eu apresentarei, porém, em seguida, se Deus for favorável, uma segunda e também terceira parte desta Biblioteca, ambas em um único volume muito menor. Acerca do método inovador e da extraordinária utilidade delas para todo gênero de estudos, será dito um pouco na dedicatória desta obra. Não para mim, mas para os estudos gerais, eu preparei esta obra. Assim vós, abelhas, produzis mel não para vós (GESNER, 1545, f. [1v], tradução nossa).

O conceito presente em Bibliotheca não é de edição, mas sim de obra, portanto abarca trabalhos prestes a impressão e em vias de publicação. Por considerar a obra, Gesner inclui apenas aquilo que se tem menção em catálogos, em correspondências, em conversas com editores, tipógrafos e estudiosos.

A abrangência autoral de Bibliotheca inclui homens doutos e não doutos. Portanto, para Gesner, todos deveriam ser lembrados; aí reside um aspecto relevante de seu projeto que é a possibilidade de dar voz a autores não conhecidos, o que torna Bibliotheca um dispositivo de ampla difusão.

Interessante observarmos a indistinção autoral que Gesner faz, pois ela vai ao encontro de sua postura humanista, cabendo ao leitor a avaliação e mesmo julgamento das fontes. Como Gesner afirma, “Eu desejei relatar tanto, mas deixei a seleção e o julgamento dos livros para os outros” (GESNER, 1545, f. [3v], tradução nossa).

Já na Epistola Nuncupatoria (Figuras 2, 3 e 4) de Bibliotheca, Gesner relembra as inúmeras perdas bibliográficas sofridas pela humanidade e admite o seu sofrimento, perguntando-se sobre o destino de importantes e imponentes coleções bibliográficas, a exemplo da Biblioteca de Ptolomeu Filadelfo, Alexandria e Pérgamo.

Trecho inicial do primeiro fólio da Epistola Nuncupatoria (1545)
Figura 2
Trecho inicial do primeiro fólio da Epistola Nuncupatoria (1545)
Fonte: Gesner (1545, f. [2r]). Disponível em: http://www.e-rara.ch/zuz/content/pageview/5079516

Trecho inicial do segundo fólio da Epistola Nuncupatoria (1545)
Figura 3
Trecho inicial do segundo fólio da Epistola Nuncupatoria (1545)
Fonte: Gesner (1545, f. [2v]). Disponível em: http://www.e-rara.ch/zuz/content/pageview/5079517

Trecho inicial do terceiro fólio da Epistola Nuncupatoria (1545),
Figura 4
Trecho inicial do terceiro fólio da Epistola Nuncupatoria (1545),
Fonte: Gesner (1545, f. [3r]). Disponível em: http://www.e-rara.ch/zuz/content/pageview/5079518

Gesner tem consciência da história da destruição dos livros e das bibliotecas e do risco constante que as coleções podem sofrer:

O que de fato restou agora de todas aquelas tão gloriosas bibliotecas além da fama vazia? Onde estão hoje aqueles dois mil volumes de tão cuidadosamente escolhidos autores latinos e os cem [volumes] escritos por autores estrangeiros, acerca dos quais os estudiosos entravam em contato com muito pouco por conta do mistério da matéria, de onde Plínio Segundo coletou seus tesouros da natureza? Em sua época, Tarquínio Prisco comprou para si os livros sibilinos por trezentos filipes [moedas de ouro], Platão os livros do pitagórico Filolau por dez mil denários. Aristóteles, no entanto, adquiriu os poucos [livros] do [filósofo] platônico Espeusipo por três talentos áticos. Mas por que lamentamos essas coisas antigas? Desaparece também da memória de nossos pais, por conta do terrível ataque dos turcos, a famosa Biblioteca de Buda, que é capital do império da Panônia. Por ordem do rei Matias, o qual nunca vai ser elogiado o bastante, ela foi provida com todo gênero de escritores e com inúmeros volumes em grego e hebraico, os quais de fato ele comprara, após Constantinopla ter sido tomada, por uma inestimável soma da Grécia continental, visto que muitas outras enormes cidades da Grécia tinham sido saqueadas. Desde então, portanto, tantos livros e livros tão preciosos em toda sua sabedoria foram sendo paulatinamente perdidos, em parte consumidos pelas chamas ou pelos tumultos das guerras, em parte corroídos pela própria velhice, pelas traças e pelo mofo, muitos certamente dissipados pela negligência e pelo ódio contra os escritos dos bárbaros. Alguns deles outrora invadiram a Itália, turcos e certamente outros mais bárbaros de igual religião [invadiram] a Grécia: até hoje eles dominam o inteiro globo até seus limites além de uma parte da Europa. É apropriado que todos os homens realmente bons, os quais se deleitam com a república literária, esforcem-se com todas suas forças para que também aqueles poucos ótimos livros, aqueles únicos que até então sobreviveram para nós, conservados, aparentemente, por razão divina através de muitos séculos, sejam preservados incólumes e que eles não sejam perdidos por nossa incúria, já que certamente, se isso tivesse acontecido, nossos descendentes (que Deus previna isso) seriam privados não somente de todas aquelas famosas obras das disciplinas, mas também de todos instrumentos da doutrina. Eu suponho que eles haveriam de ter muito pouco que os diferenciasse de outros animais, como hoje em dia aqueles povos, que habitam terras muito distantes de nós ou ilhas recém- descobertas (GESNER, 1545, f. [2v]-3r, tradução nossa).

As perdas e destruições de livros e de bibliotecas, adjacente à consciência bibliográfica de Gesner, teriam sido a motivação principal para a elaboração de Bibliotheca Universalis.

Como aponta Araujo (2017, p. 78), “[...] podemos afirmar que uma das motivações de Conrad Gesner para a concepção e materialização de seu projeto bibliográfico está no propósito de salvaguardar a memória da humanidade por meio de dispositivos bibliográficos”.

Bibliotheca resulta de um longo esforço e dedicação individual, mas Gesner enfatiza que abriu um caminho e apresentou grande oportunidade para que outros pudessem transmitir os livros para a posteridade. Abre um caminho não somente pelo seu esforço compilatório, mas por propor como se forma uma bibliografia universal, ainda que não tenha consciência da dimensão que sua obra alcançaria do ponto de vista histórico, técnico-documentário, metodológico, disciplinar e memorial.

Gesner acompanha de perto a produção tipográfica e editorial do Séc. XVI e reconhece que nem todas as obras publicadas pelos homens de sua época têm qualidade. Há tipógrafos que negligenciam escritos antigos, por isso considera fundamental a permanência tanto de livros manuscritos quanto de impressos8 nas coleções e bibliotecas.

A dinâmica de circulação de livros impressos impõe desafios de toda ordem, sobretudo de acesso:

Agora certamente muitas coisas são escritas em diversas partes da Europa, as quais permaneceriam completamente desconhecidas, já que [esses escritos] eram transportados com dificuldade de uma parte para outra, a não ser que fossem diligentemente enviadas de algum lugar para bibliotecas. Além disso, livros impressos são logo vendidos e não são mais vistos. E é comum que aqueles que estão sob custódia de homens privados se deteriorem em pouco tempo por falta de cuidado. Somente as bibliotecas públicas não apenas conservam os livros por períodos mais longo, mas também os oferecerem prontamente para uso (GESNER, 1545, f. 3r, tradução nossa).

Afirmando que somente as bibliotecas públicas fornecem as garantias necessárias para a proteção e conservação do patrimônio bibliográfico, Gesner designa um princípio básico para o estabelecimento e a manutenção de uma estrutura bibliográfica: a inseparabilidade da esfera material e intelectual do livro.

Esta inseparabilidade “[...] vincula, de forma indispensável e permanente, as condições de subsistência e usabilidade das obras do espírito, pois estas estão inevitavelmente ligadas às suas hipóstases físicas, isto é, com os registros linguísticos reportados em suportes físicos” (SERRAI, 1990, p. 81, tradução nossa).

Inicialmente, Gesner desejou enumerar em Bibliotheca autores mais antigos e de maior qualidade de seu século, mas percebeu, posteriormente, que todos os autores de quaisquer gênero e áreas poderiam ser reunidos com o mesmo esforço.

Esta amplitude autoral é evidenciada por Gesner:

Nenhum escritor foi desprezado por mim, não tanto porque eu considerei todos aqueles dignos de um catálogo ou da memória, quanto para satisfazer meu propósito, já que eu impusera a mim mesmo simplesmente relacionar, sem distinção, todas as obras que ocorressem. Pois certamente em razão disso mesmo, alguns [escritores] devem ser mencionados, para que os leitores sejam instruídos sobre evitá-los. De fato, eu reuni este índice não somente para os eruditos, mas para qualquer pessoa, de modo que também os [leitores] ignorantes sejam a partir de agora como que instruídos por um preceptor mudo sobre o prestígio e a utilidade de livros em particular. Muitos são, para um [determinado] local, comuns e sem valor, [mas] os mesmos são, para outro local, raríssimos ou completamente desconhecidos, e os que há algum tempo eram muitíssimos comuns, agora não são usados nos estudos. Portanto, após iniciar com uma lista de época e locais, quando eu fui mais prolixo, eu me demoro por um pequeno momento nos autores. De certo era apropriado que alguns tipos [de autores] não fossem ignorados, que aquele que, após prometer para si mesmo as melhores coisas, não as produzisse sem propósito para pagar suas despesas ou dispusesse de forma equivocada o tempo para ler. Muitos autores são hoje em dia muitíssimo conhecidos por todos, os quais após cem anos sem dúvida jazerão nas trevas, conhecidos por pouquíssimas pessoas. Os livros estrangeiros, embora então reunidos por outros monges no século passado, muitos deles são recordados por Jo[hannes] Trithemius, que desejará eliminá-los e poderá marcá-los com um obelisco9, para, ao se deparar muitas vezes com os mesmos, não os desprezar (GESNER, 1545, f. [3v], tradução nossa).

A não omissão deliberada dos autores e o fato de todos serem dignos de memória aponta para um critério adotado por Gesner: a imparcialidade documentária.

Com tal critério, Gesner plantou pilares que apoiam as técnicas e a ética das disciplinas bibliográficas:

o registro, a organização e a preservação das memórias documentárias não podem ser subordinadas a nenhuma preferência ideológica ou crítica. Se a atividade de documentação se baseia em tal imperativo moral absoluto e intransigente, não é certo que a aceitação indiscriminada de qualquer referência, relativa a textos escritos, tenha o direito de se sobrepor e reinar imperturbável sobre outras necessidades, por exemplo nas educacionais, ou nas científicas, ou nas eruditas (SERRAI, 1990, p. 82, tradução nossa).

Para Gesner, a operação bibliográfica não deve estar sujeita a restrições ou censuras, mas considerando que Bibliotheca também poderia ser utilizada por inexperientes, Gesner tece conselhos, orientações e advertências em relação às obras de má qualidade.

É em Virgílio e Plínio que Gesner busca conforto no fato de incluir todos os autores em seu projeto, sejam aqueles que serão esquecidos quanto aqueles considerados bárbaros e inúteis:

Virgílio extraiu ouro do esterco de Ênio e Plínio insistia que não havia nenhum livro tão ruim que não fosse possível proveito de alguma parte [dele]. Há certamente dois tipos de bárbaros: aqueles que são bárbaros somente no modo de falar, mas ensinam coisas boas e úteis, e esses devem ser completamente preservados; outros são também bárbaros tanto nas palavras, quanto em suas percepções e são inúteis, a esses eu, de minha parte, gostaria de eliminar de algum modo (GESNER, 1545, f. [3v], tradução nossa).

O problema informacional que se coloca, a partir dos critérios e escolhas de Gesner, é como lidar com a multidão de livros - problema que remete ao excesso de informação que emerge na Europa Moderna10.

Gesner questiona-se sobre como reduzir esta multidão de livros11, escolhendo somente aqueles que valem e eliminando o plágio, o roubo literário e as intermináveis repetições que assombram a produção contemporânea.

Para ele, tal problema seria parte da agenda e da responsabilidade dos governantes, sendo que o seu papel está claro em Bibliotheca: “Eu próprio, já que eu pude exceder mais pelo meu esforço do que pelo meu engenho, provi uma abundância [de material] para ser selecionado, após tê-lo trazido até a superfície” (GESNER, 1545, f. 4r, tradução nossa).

Gesner além de referenciar os autores e suas respectivas fontes, também insere trecho dos prefácios das obras que pessoalmente teve contato. Reconhece que a extensão e abundância de citações pode causar um efeito de verbosidade, mas justifica a sua presença e consistência, declarando que, desta forma, não só o leitor pode ter uma ideia exata do trabalho, mas também tem elementos para conhecer e avaliar o estilo do autor e os motivos para sua escrita específica.

Sobre os argumentos, capítulos e prefácios, Gesner afirma que:

[...] não nego estar descontente com alguns poucos argumentos ou capítulos de livros, os quais se estendem por muito mais palavras do que eu gostaria, mas isso eu cometi principalmente no início, acostumado aos trabalhos dos escribas; nas outras [partes] eu não desejaria ter sido mais breve. Partes dos prefácios, com frequências transcritas verbatim12, fornecem indicações acerca do estilo do autor, da ocasião [de composição] do livro ou acerca do argumento ou de qualquer outra coisa que diga respeito à instituição da biblioteca. Eu li de fato inteiramente os prefácios de todos os livros que estavam a meu alcance e, dentre esses, selecionei somente as coisas que pareciam extraordinárias, assim como eu omiti todas as coisas supérfluas e ornamentais, muitas das quais estão normalmente nos prefácios para exibir o engenho [do autor] ou para elogiar alguém, em geral pelos seus escritos. Do mesmo modo, o leitor será aliviado de um grande ônus, ao não ter que ler os prólogos completos dos autores em suas obras e muito menos em outras obras de outros [autores], mas apenas as coisas selecionadas por mim. É por isso que eu transcrevi muitas partes desses prefácios, não tanto para o renome da presente obra, quanto porque os títulos e comentários dos outros livros eram então levados em conta, embora isso fosse incomum (GESNER, 1545, f. 4r, tradução nossa).

O prefácio torna-se um recurso metodológico para construção de Bibliotheca, uma vez que fornece dados elementares sobre a estrutura e mesmo o contexto de composição das obras, além de ser a fonte de informação principal em que Gesner seleciona trechos de maior interesse e relevância ao leitor13.

Ainda na Epistola Nuncupatoria, Gesner evidencia que se dedicou a diversas outras tarefas além de Bibliotheca e que, mesmo não tendo sido atingido pelo tédio, acelerou o fim da obra. Desculpa-se, junto ao leitor, por eventuais erros:

[...] eu tive forças para me dedicar a várias, grandiosas e florescentes ocupações, em razão das quais eu era chamado a deliberar sobre mudanças em minha vida e em meus estudos, menos para executar um propósito, como se eu estivesse despreocupado acerca de adquirir uma coberta14. E embora nada estranho tenha acontecido, ainda sem ter sido atingido ao menos uma vez pelo tédio de uma obra longa, eu acelerei o fim [da obra]. Ainda que alguma vicissitude seja permitida aos que repousam em seu longo trajeto, certamente foi duro demais consigo mesmo aquele que postulou para si continuamente e para sempre um progresso uniforme: eu suponho que também devo ser igualmente desculpado, se alguma disparidade aparecer em uma obra tão prolixa, na qual de certo foi exigido não apenas o esforço da mente, mas também do corpo, ora viajando ao exterior, ora encerrando-me em casa diante dos livros que deviam ser adquiridos de toda parte (GESNER, 1545, f. [4v], tradução nossa).

O encolhimento da segunda parte de Bibliotheca Universalis e a aceleração de sua finalização devem-se a outros compromissos de trabalho e à necessidade de Gesner verificar, pessoalmente, um conjunto de informações indispensáveis à caracterização das obras e das edições.

Certamente eu próprio desejei examinar tantos [livros] quanto fosse possível, quando, pelos motivos previstos, [isso ocorria], então eu indicava que eu fora testemunha ocular, em que local do mundo cada uma dessas obras impressas são encontradas, em que formato, por quais tipógrafos [tinham sido impressas], quantos anos depois do nascimento de Cristo e, por fim, por quantas páginas são compostas; inclui-se de onde [o livro foi publicado], quem [o publicou] e outras coisas que seriam apropriadas e o valor aproximado do preço. Há muita diferença entre os tipógrafos. Enquanto alguns imprimem de forma refinada, sem erros, com belos caracteres e em bom papel, outras fazem o oposto. Por essa razão, também nomeei muitos, quando eu encontrava livros impressos por muitos deles. Também não é menos importante a época em que alguns deles surgiram. Muitas coisas foram outrora escritas, [e] dificilmente encontrarias grande parte delas. As [cópias] posteriores são em geral melhores que as anteriores, de modo que a edição seria feita mais de uma vez pelos diligentes calcógrafos; os não diligentes, porém, que são muitos, publicam as mais distorcidas. O conhecimento dos locais também levará a saber de onde são aqueles que devem ser procurados e como podem ser encontrados, se a obra existir, visto que os exemplares estavam outrora separados, mas agora se encontram reunidos. É verossímil, por exemplo, que seja em bibliotecas públicas e privadas, local no qual eles seriam escritos, onde por muito tempo haverá uma abundância supérstite de livros (GESNER, 1545, f. [4v], tradução nossa).

De um balanço sobre as referências necessárias para definição das características de uma obra (tipógrafo, ano de impressão, local de impressão, formato e número de fólio) - que nos remetem à natureza da Bibliografia e ao método bibliográfico - nos aproximamos do final do prefácio de Bibliotheca Universalis em que apresenta-se uma dedicatória.

Gesner dedica a obra para Leonhard Beck von Beckenstein, que foi o seu maior incentivador para que seguisse com seu projeto bibliográfico, mesmo nos momentos de desanimo e exaustão. Beckenstein, conselheiro do imperador Charles V e reconhecido como um homem egrégio, bom, célebre, erudito e amante dos livros, aprovou o modelo bibliográfico gesneriano.

De acordo com Gesner:

A ti, consequentemente, tomei como meu patrono por conta desses muitos e tão justos motivos, a ti, como eu digo, um excelente exemplo para todos daquilo que se refere às letras e aos bons costumes, [costumes esses] que devem ser associados a tua nobreza. Tu és, de fato, celebrado como o mais erudito dos nobres e o mais nobre dos eruditos. Tu és o maior devorador de livros. Por fim, certamente pode ser dito acerca de teu engenho isto, que outro M[arco] Antonino15, de sobrenome Pio, imperador e filósofo, escreveu em suas Meditações com estas palavras: algumas pessoas amam cavalos, outras aves, outras feras, mas eu fui tomado pelo enorme desejo de adquirir livros desde que eu era um garotinho. Por isso, eu escolhi a ti para ser meu mecenas. Minhas musas se refugiam na excelência de teu ânimo, para que elas, já exaustas por conta dos já longos trabalhos, se revigorem com tua benignidade (GESNER, 1545, f. [6r], tradução nossa).

Após a dedicatória, Gesner anuncia a publicação de uma segunda e terceira parte de Bibliotheca Universalis.

A segunda parte de Bibliotheca ordenará “[...] de forma concisa, todos os escritos dos autores que foram copiosamente nomeados no primeiro volume de acordo com [os tipos de] artes e ciências” (GESNER, 1545, f. [6r], tradução nossa). Nesta parte estarão contempladas tanto as obras da primeira parte como as obras que não foram indicadas na primeira parte por não possuírem autoria, ou seja, as obras anônimas.

De acordo com Serrai (1990, p. 92, tradução nossa), “[...] o objetivo principal da segunda parte da Bibliotheca Universalis é permitir a orientação de interesses e pesquisas ao longo das linhas de uma determinada disciplina ou assunto; dentro das partições individuais, todas as obras que pertencem ao campo de estudo incluído na partição estão de fato unidas”. A segunda parte corresponde justamente às Pandectae que efetivamente foram publicadas em 1548 e 1549.

Já a terceira parte compreenderia um conjunto de loci16, que hoje podemos associar a assuntos, e que fariam referência aos argumentos das obras da segunda parte. Ao examinar o prefácio das Pandectae, verifica-se que esta terceira e última parte nunca foi publicada.

Apresentado os esclarecimentos sobre a segunda e terceira parte de Bibliotheca, Gesner dá notícias sobre as bibliotecas que pesquisou, livros que copiou e catálogos que incluiu integralmente em sua obra, oferecendo uma visão geral sobre a natureza das fontes que compõem Bibliotheca Universalis.

3 AS FONTES DE BIBLIOTHECA UNIVERSALIS (1545)

Gesner coletou material para Bibliotheca Universalis em todos os locais possíveis, notadamente em catálogos, cartas e narrativas.

De acordo com Serrai, Bibliotheca é constituída por sete gêneros de fontes:

1) os catálogos dos tipógrafos, de quem Gesner tentara obter uma grande coleção; 2) os catálogos das bibliotecas, ou seus extratos, e as próprias coleções das bibliotecas que ele consultou durante suas viagens na Alemanha e na Itália; 3) as comunicações epistolares de amigos; 4) conversas e trocas com estudiosos; 5) repertórios bibliográficos, dos quais uma lista detalhada será fornecida no final da Nuncupatoria; 6) referências mencionadas em algumas obras de prontualísticas ou eruditas da Antiguidade, do léxico de Suda à Gnomologia de Stobeo; 7) enfim, notas e apontamentos encontradas em todas as ocasiões que normalmente surgem durante o estudo, a pesquisa ou em simples leituras (SERRAI, 1990, p. 81-82, tradução nossa).

Gesner possuía ou examinou pessoalmente os catálogos das seguintes bibliotecas italianas, guarnecidas com livros gregos:

Roma, Biblioteca do Vaticano ou Pontifícia. Florença, Biblioteca dos Médici17. Bolonha, Biblioteca [da Abadia] de San Salvatore. Veneza, Biblioteca de Bessarion18, Biblioteca da Basílica de São João e São Paulo e algumas outras. Biblioteca do muito eminente Diego Hurtado de Mendoza, embaixador imperial em Veneza (GESNER, 1545, f. [6v], tradução nossa).

Reconhecendo a importância científica, literária e filosófica das obras gregas, Gesner noticia os manuscritos inéditos ou não considerados nas edições impressas.

Neste sentido, é legítimo afirmar que Bibliotheca, além de ser o primeiro prontuário bibliográfico universal das obras impressas é também o primeiro repertório de códices gregos, conservados e disponíveis, sobretudo nas bibliotecas italianas (SERRAI, 1990).

Em Bibliotheca, Gesner também copiou esparsamente passagens de alguns livros:

Antropologia, de Raffaele Volaterrano. Vidas dos antigos jurisconsultos, de Bernardino Rutilio. Vida dos jurisconsultos que ficaram famosos após o ano do Senhor 1190, de Jo[hann] Fichard. Acerca dos poetas latinos, de Pietro Critino. Narrativa acerca de dez diálogos muito doutos dos poetas, publicada recentemente em Basel, de Lilio Gregorio Giraldi. Acerca dos escritores de artes médicas e alguns outros [escritos], de Symphorien Champier (GESNER, 1545, f. [6v], tradução nossa).

Gesner menciona os catálogos dos escritores que incluí integralmente em Bibliotheca:

Jerônimo [de Estridão], acerca dos escritores eclesiásticos, e Genádio [de Massília], acerca do mesmo tema. Se, porém, algumas coisas eram ditas de forma mais prolixa nas obras deles e pareciam dizer respeito mais à vida do que aos livros daqueles, [essas coisas] nem sempre adicionei [aqui], mas remeto os leitores para elas. Jo[hann] Fichard, dois índices de todas as coisas escritas tanto sobre direito pontifício quanto direito civil por jurisconsultos antigos e mais recentes até a nossa época, publicados no ano 1535. Jo[hannes] Trithemius, catálogo de escritores eclesiásticos ou de homens ilustres, revisado e ampliado por um terceiro autor, compilado em um total de sete anos até o ano do Senhor 1494 (GESNER, 1545, f. [6v], tradução nossa).

Este grupo de fontes representam as bibliografias inseridas integralmente em Bibliotheca, a exemplo de Liber de scriptoribus ecclesiasticis (Figura 5), de Johannes Trithemius (1462-1516).

Bibliotheca Universalis (1545). Entradas de Liber de scriptoribus ecclesiasticis de Johannes Trithemius (1462-1516)
Figura 5
Bibliotheca Universalis (1545). Entradas de Liber de scriptoribus ecclesiasticis de Johannes Trithemius (1462-1516)
Fonte: Gesner (1545, f. [458v]). Disponível em: http://www.e-rara.ch/zuz/content/pageview/5080445

Trithemius incluiu em Liber de scriptoribus ecclesiasticis uma parte expressiva de fontes de cerca de mil anos de característica prosopográfica19 e literária. Portanto, ao incluir o prontuário trithemiano em Bibliotheca, Gesner acaba por acumular toda tradição prontualística do ocidente europeu.

O estudo sobre as fontes de Bibliotheca Universalis merece abordagem e metodologia específicas. Nesta direção, Fiammetta Sabba (2012), na obra La ‘Bibliotheca Universalis’ di Conrad Gesner: monumento della cultura europea, investiga Bibliotheca por meio das tipologias de fontes utilizadas por Gesner.

Sabba (2012), ao observar a representatividade bibliográfica de Bibliotheca, mede o grau de universalidade da obra entre aquilo que já estava evidenciado ao público e aquilo que ainda deveria se tornar público.

Ao verificar cuidadosamente as fontes de informação utilizadas por Gesner e avaliar a grau de cobertura bibliográfica efetiva do repertório em relação à existência e disponibilidade literária e de livros contemporâneos, Sabba (2012) complementa a caracterização dos gêneros de fontes que já apresentamos a partir de Serrai (1990) e sintetiza o mapa documentário de Gesner:

Em geral, as sinalizações bibliográficas, tanto aquelas somente literárias quanto as editoriais, decorrem de: ? as autópsias realizadas pessoalmente sobre o material impresso de propriedade do próprio Gesner e de seu círculo de amizades e eruditos, especificamente médicos e filólogos, ou guardado em bibliotecas às quais teve acesso durante suas inúmeras viagens; ? a correspondência com os amigos e as conversas com os doutos; ? os catálogos dos tipógrafos e dos livreiros recuperados nas feiras comerciais ou que lhes foram enviados; ? os índices das bibliotecas públicas e particulares, tanto verificados pessoalmente como obtidos em cópia; ? os repertórios bibliográficos que antecederam o dele, entendendo com isso tanto obras de conteúdo bibliográfico, como repertórios bibliográficos propriamente ditos; Gesner usou, de fato, uma ampla variedade de repertórios, desde os dos prosopógrafos que o antecederam - portanto desde São Jerônimo até o abade Johannes Trithemius - até os de especialistas no Direito, Poesia, Medicina e Botânica (Lilio Gregório Giraldi, Pietro Crinito, Symphorien Champier, Otho Brunfels, Leonhard Fuchs, Raffele Maffei dito Volaterranus, Johann Fichard, Bernardino Rutilio, Giovanni Nevizzano…). A parte mais notável dos “recipientes informativos” dos quais Gesner obteve notícias, porém, decorre inegavelmente de suas viagens, em primeiro lugar daquele para a Itália em 1543. Gesner viajou, naquela época, para Ferrara, Verona, Como, Bolonha e Veneza, nessa última a convite do embaixador espanhol Diego Hurtado de Mendoza (SABBA, 2016, p. 81).

As indicações bibliográficas feitas em Bibliotheca e derivadas das análises realizadas pessoalmente por Gesner demostram um aspecto impressionante no gesto bibliográfico gesneriano: o polímata “[...] leu ou ao menos viu todas as obras que documenta, viajando e consultando múltiplas fontes de pesquisa, em meio à uma época de grandes desafios para o acesso e circulação do impresso” (ARAUJO, 2015, p. 134).

4 EPITOMI DE BIBLIOTHECA UNIVERSALIS (1545)

Bibliotheca Universalis foi considerada por Gesner uma obra a ser seguida, continuada e integrada mesmo após a sua publicação em 1545. As edições posteriores suplementares, integradas ou reduzidas de Bibliotheca Universalis referem-se ao primeiro tomo de Bibliotheca, ou seja, ao elenco alfabético por autores.

As bibliografias publicadas a partir de Bibliotheca Universalis são representadas pelos seus Epitomi.

De acordo com Serrai,

Depois da primeira edição de Bibliotheca Universalis, 12 foram as iniciativas editoriais - de 1551 a 1731 - que foram propostas, no todo ou em parte, para fornecer uma contribuição adicional ao corpo bibliográfico e documentário do primeiro tomo de Bibliotheca. Estas 12 continuações, adaptações, ou acréscimos, de Bibliotheca [...] são as seguintes: 1. C. Lycosthenes, Elenchus Scriptorum omnium (1551); 2. J. Simler, Epitome Bibliothecae (1555); 3. J. Simler, Appendix Bibliothecae Conradi Gesneri (1555); 4. R. Constantin, Nomenclator insignium Scriptorum (1555); 5. J. Simler, Bibliotheca (1574); 6. J. J. Frisius, Bibliotheca (1583); 7. A Du Verdier, Supplementum Epitomes Bibliothecae Gesnerianae (1585); 8. T. Spizel, Specimen Novae Bibliothecae Vniuersalis (1668); 9. J. Hallervord, Bibliotheca curiosa (1676); 10. J. Fabricius, Historia Bibliothecae Fabricianae, III (1719); 11. G. H. Welsh, Specimen supplementorum ad Bibliothecam Gesnero-Simlero-Frisianam (1727); 12. A. Chacón, Bibliotheca (1731) (SERRAI, 1990, p. 204, tradução nossa).

A atividade documental de Gesner continuou incansavelmente e assiduamente mesmo após a publicação do repertório, junto aos pedidos repetidos e insistentes que ele dirigiu aos seus amigos visando a obtenção de informações bibliográficas acerca de bibliotecas, catálogos e, obviamente, cópias de edições.

Como exemplo, mencionamos Epitome Bibliothecae Conradi Gesneri, de 1555 (Figura 6), em que Josias Simler (1530-1576) aumentou Bibliotheca em 2000 novos autores, marcados com asterisco na margem junto com outras informações bibliográficas.

Epitome Bibliothecae Conradi Gesneri (1555)
Figura 6
Epitome Bibliothecae Conradi Gesneri (1555)
Fonte: Gesner (1555, f. 1r). Disponível em: http://www.e-rara.ch/zuz/content/pageview/8042129

Na Epistola Nuncupatoria, Simler aponta os benefícios e a utilidade do trabalho, que são expressos em quatro esferas de aplicação:

1. O bibliotecário, uma vez que o manual pode ser usado como um catálogo; 2. O editorial e comercial, porque há notícias dos livros publicados e disponíveis, e dos que serão impressos; 3. O de estudos e erudição em benefício de estudiosos ou especialistas; 4. O documentário- bibliográfico, uma vez que o repertório é um testemunho ordenado dos escritores e da sua produção literária em todos os campos da atividade científica e acadêmica (SERRAI; SABBA, 2005, p. 64, tradução nossa).

Os Epitomi de Bibliotheca Universalis foram publicados até 1731, com Bibliotheca do dominicano Alonso Chacón (1540-1599).

5 SOBRE A EPISTOLA NUNCUPATORIA OU CONSIDERAÇÕES

Na Epistola Nuncupatoria, Conrad Gesner expõe a concepção, dimensão e estrutura documentária de Bibliotheca Universalis (1545), uma vez que sobreleva: 1) seu alcance e objetivos; 2) seu uso por parte dos leitores; 3) perdas e destruições bibliográficas; 4) dinâmicas de produção e circulação de impressos; 5) abrangência autoral; 6) ordenação de suas fontes; 7) notícias sobre as bibliotecas pesquisadas; 8) tipologia e cobertura das fontes adotadas para sua composição.

O repertório bibliográfico resulta de um longo esforço e dedicação individual, mas Gesner enfatiza que abriu caminho para que outros estudiosos pudessem transmitir os livros para a posteridade - desejo este que consolida-se nos Epitomi de Bibliotheca Universalis.

Para Serrai, a Nuncupatoria constituí

[...] um documento fundamental da história da bibliografia: pelo fato que não apenas identifica, e discute, as principais questões teóricas e práticas, filosóficas e técnicas, onde se encontram emaranhadas a projeção e a realização das estruturas bibliográficas, mas, para muitas dessas questões, propõe soluções que ainda são totalmente satisfatórias mesmo em um nível formal e, em alguns aspectos, mesmo definitivo (SERRAI, 1990, p. 96-97, tradução nossa).

Compreendida e lida como um conjunto de argumentos mediadores e memorialísticos, Epistola Nuncupatoria forma um rico corpus que manifesta e sintetiza a reflexão e a autoconsciência de Conrad Gesner sobre seus métodos de trabalho que, a rigor, formam o substrato do gesto e do método bibliográfico.

AGRADECIMENTOS

Agradecimentos especiais e afetivos a João Carlos e Amelinha pela paciência, cuidado e presença diária em tempos pandêmicos.

REFERÊNCIAS

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Notas

1 Este artigo é uma versão revista, adaptada e ampliada das subseções “3.2, 3.3, 3.5 e 3.6” da tese de Araujo (2018), cuja pesquisa foi realizada com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
2 O debate de natureza documentária sobre o sistema de ordenação bibliográfica das fontes arroladas em Bibliotheca Universalis (1545) constituirá estudo específico, razão pela qual a temática não é aprofundada neste artigo.
3 Para estudo das Pandectae, cf. Serrai (2007) e Araujo, Crippa e Sabba (2016).
4 Agradecemos profundamente a Erika Werner (Humboldt-Universität zu Berlin) pela tradução do latim para o português e pelo diálogo terminológico-bibliográfico.
5 Fólio: “[...] folha de papel ou pergaminho numerada apenas no reto. [...] nome atribuído aos grandes livros impressos: livro in-fólio; as duas páginas de uma folha. Livro impresso em formato in-fólio”. (FARIA; PERICÃO, 2008, p. 342). Adotaremos “f.” para indicação dos fólios na citação direta da tradução.
6 r = reto.
7 Manual, guia.
8 Na relação impresso x manuscrito, devemos destacar que, mesmo após a tipografia de Gutenberg, a produção manuscrita se estende até o fins do Séc. XVIII.
9 Marcar uma palavra ou passagem, colocando o sinal gráfico (†) ao lado dela.
10 Sobre o problema do excesso de informação na Europa Moderna, a partir da vasta produção e circulação de livros, cf. Blair (2010), Burke (2002) e Rosenberg (2003).
11 Cf. Araujo e Crippa (2016).
12 Literalmente.
13 A utilização do prefácio para construção de Bibliotheca Universalis está no nível metodológico. De acordo com Sabba (informação oral), Alfredo Serrai (1988-2001) utiliza este mesmo método para elaborar sua Storia della Bibliografia, uma vez que lê os prefácios das obras antigas que referencia para situar o modo como elas foram concebidas, buscando, deste modo, seus fundamentos bibliográficos. Isto significa que é possível reconstruir o posicionamento das obras em uma longa tradição bibliográfica.
14 Juv. Satirae, VII 66.
15 15 Marco Aurélio.
16 No contexto gesneriano, os loci (communes ou particulares) expressam os núcleos semânticos dos documentos, além de servirem como método de leitura e de armazenamento de informações.
17 Biblioteca Medicea Laurenziana.
18 Biblioteca Marciana.
19 Prosopografia pode ser entendida como registro cronológico da história literária. É a exposição sucinta em ordem cronológica de entrada de autores, sem pretensão de ser um instrumento efetivo de recuperação da informação.
CONJUNTO DE DADOS DE PESQUISA Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
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CONSENTIMENTO DE USO DE IMAGEM Não se aplica
APROVAÇÃO DE COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA Não se aplica
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