Investigaciones
Ingressantes nos cursos de biblioteconomia no brasil: quem são?*
Newcomers in library courses in brazil: who are they?
Entrenadores en los cursos de biblioteconomía en Brasil: ¿quiénes son?
Ingressantes nos cursos de biblioteconomia no brasil: quem são?*
Revista Interamericana de Bibliotecología, vol. 46, núm. 3, e348101, 2023
Escuela Interamericana de Bibliotecología
Recepción: 03 Diciembre 2021
Aprobación: 31 Mayo 2023
Resumo: Objetiva-se traçar o perfil dos ingressantes nos cursos de Biblioteconomia no Brasil, priorizando-se as seguintes variáveis: região geográfica, raça, sexo, faixa etária, moda-lidade de ensino, interrupção do curso, tipo de instituição de procedência do ensino médio (escola pública ou privada) e de vinculação na graduação. O perfil foi traçado a partir dos Microdados do Censo do Ensino Superior, publicado em 2020 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Foram considerados os alunos ingressantes nos cursos de biblioteconomia ofertados por instituições públicas e privadas de ensino superior no período de 2015 a 2019 - último ano coberto pelo censo. Os principais resultados apontaram que o quadro de ingressantes nos cursos de Biblioteconomia do Brasil é composto em sua maioria por brancos, do sexo feminino, com idade entre 20 e 29 anos. Esses ingressantes concluíram o ensino médio em escolas públicas. Em relação à cor-raça, há variações entre as regiões geográficas. A taxa de interrupção do curso é maior entre discentes das cores-raças brancas e indígenas e na modalidade EaD. As mulheres ingressantes no EaD apresentam maior percentual de interrupção do curso. Na modalidade presencial, os homens são mais propensos a interromperem seus estudos. As instituições públicas de ensino superior congregam boa parte desses ingressantes, com preponderância do ensino na modalidade presencial.
Palavras-chave: Ensino superior, Etnia, Gênero, Biblioteconomia.
Abstract: The objective was to trace the profile of the participants in the Library Economy courses in Brazil, prioritizing the following variables: geographical region, race, sex, age group, modality of teaching, interruption of the course, type of institution of secondary education (public or private school) and linkage in graduation. The profile was traced from the Microdata of the Census of Higher Education, published in 2020 by the National Institute of Educational Studies and Research Anísio Teixeira. Students enrolled in the library economics courses offered by public and private higher education institutions were considered in the period 2015 to 2019 - the last year covered by the census. The main results pointed out that the board of enrollers in the Library Economy courses of Brazil is composed mostly of white, female, between the ages of 20 and 29. These students have completed their secondary education in public schools. In terms of color, there are variations between geographical regions. The rate of interruption of the course is higher among students of the white and indigenous colours and in the EaD mode. Women enrolled in the EaD have a higher percentage of interruption of the course. In the presencial mode, men are more likely to interrupt their studies. The public institutions of higher education gather a good part of these members, with the preponderance of teaching in the presencial mode.
Keywords: University education, Ethnicity, Gender, Librarianship.
Resumen: Se pretende trazar el perfil de los participantes en los cursos de Biblioteconomía en Brasil, y se priorizan las siguientes variables: región geográfica, raza, sexo, grupo de edad, modalidad de enseñanza, interrupción del curso, tipo de institución de procedencia de la escuela secundaria (escuela pública o privada) y de vinculación en la graduación. El perfil fue trazado a partir de los Microdatos del Censo de la Educación Superior, publicado en el 2020 por el Instituto Nacional de Estudios e Investigaciones Educacionales Anísio Teixeira. Se consideraron los estudiantes que ingresaron a los cursos de biblioteconomía ofrecidos por instituciones públicas y privadas de educación superior (IES) en el período de 2015 a 2019, último año cubierto por el censo. Los principales resultados señalaron que el cuadro de ingresantes en los cursos de Biblioteconomía de Brasil está compuesto en su mayoría por blancos, del sexo femenino, con edades entre 20 y 29 años. Estos ingresantes terminaron la educación secundaria en escuelas públicas. En cuanto al color-raza, hay variaciones entre las regiones geográficas. La tasa de interrupción del curso es mayor entre alumnos de los colores-razas blancas e indígenas y en la modalidad EaD. Las mujeres que ingresan en el EaD presentan un mayor porcentaje de interrupción del curso. En la modalidad presencial, los hombres son más propensos a interrumpir sus estudios. Las instituciones públicas de educación superior congregan buena parte de estos ingresantes, con preponderancia de la enseñanza en la modalidad presencial.
Palabras clave: Educación superior, etnia, género, biblioteconomía.
1. Introdução
Os últimos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Ibge, 2020a), apontam para uma realidade já há muito conhecida: o Brasil é um país profundamente desigual e discriminatório (Ibge, 2019c). A Pnad ainda não reflete o aprofundamento da desigualdade frente à pandemia da Covid-19, que assolou o mundo em 2020. No entanto, o índice de desemprego, a falta de acesso à moradia saúde e saneamento básico, dentre outros, levam a concluir que a pandemia atingirá de forma mais contundente a população preta e parda, uma vez que “no Brasil as desigualdades têm raça, cor e etnia, pois é um país estruturado pelo racismo, que permanece com as suas raízes fincadas no sistema escravocrata” (Goes, et al. 2020, p. 2). Oliveira et al. (2020), ao estudarem a evolução de óbitos a partir do primeiro boletim sobre a pandemia em que houve a estratificação por raça, ao último boletim, constataram que o índice de mortalidade para brancos caiu de 62,9% para 41%, enquanto, entre negros, passou de 34,3% para 57%. A maior letalidade de negros, segundo os autores, reflete a chegada da Covid às populações menos favorecidas e expõe “uma grande diferenciação nas chances de morte segundo raça/cor - um paciente negro analfabeto tem 3,8 vezes mais chances de morrer em relação ao branco com nível superior” (Oliveira et al., 2020, p. 10). No campo da educação, o processo seletivo Enem 2020, cujas provas foram realizadas em janeiro de 2021, teve recorde de abstenção, com 51,5% de faltas, conforme informações de Oliveira (2021).
Entre 143 países, o país ocupava a 10ª posição no ranking mundial da desigualdade em 2016 - situação que se agravou em 2020, quando o país passa a ocupar a 7ª. posição, apesar de apresentar um índice de desenvolvimento humano considerado alto1 - 0,765 (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento [Pnud], 2020). Quando o índice de desigualdade é computado, o Brasil registra uma queda de 24,5% no seu IDH - Índice de Desenvolvimento Humano. O que isso indica? Indica uma alta concentração de renda. No país, 10% da população concentra cerca de 42% do total da riqueza gerada.
Região geográfica e os marcadores de gênero e raça são variáveis preponderantes na dinâmica da desigualdade social no Brasil. Segundo pesquisa “A distância que nos une: um retrato das desigualdades brasileiras”, “os negros são menos numerosos em todas as faixas de renda superior a 1,5 salário-mínimo, e para cada negro com rendimentos acima de 10 salários-mínimos, há quatro brancos” (Oxford Committee for Famine Reliefe/Comitê de Oxford para o Alívio da Fome [Oxfam], 2017, p. 26). A combinação dos dois marcadores (de gênero e raça) mostra que as mulheres pretas são o segmento da população mais afetado. Essas mulheres representam 28,7% da população brasileira, sendo que 39,8% delas se encontram em condição de extrema pobreza e 38,1%, em condição de pobreza (Ibge, 2020a). O mesmo documento retrata a discrepância no acesso à educação entre brancos e negros no Brasil. A probabilidade de acesso de um jovem branco ao ensino fundamental é de 100%, enquanto esse percentual diminui para 80% quando se trata de jovens afrodescendentes (Oxfam, 2017, p. 20).
A democratização de um ensino de qualidade - desde o fundamental ao superior - é apontado como o caminho a ser perseguido para se enfrentar as desigualdades de gênero e raça que assolam o país. Tem-se ciência de que, sob a tutela da meritocracia, “o acesso à educação e as possibilidades de ocupação de carreiras daí resultantes ilustram o processo de criação de desigualdades” (Souza, Ferreira & Santos, 2021, p. 41).
Algumas conquistas, fruto do fortalecimento do movimento negro no país em sua luta pela superação do racismo estrutural, conforme registrado por Ciconello (2008), foram alcançadas na esfera da política pública, como, por exemplo, a Lei nº 12.711 de agosto de 2012 (Presidência da República, 2012). Essa lei reserva 50% das matrículas por curso e turno nas universidades e institutos federais de ensino superior públicos para candidatos autodeclarados pretos, pardos e indígenas ou pessoas com deficiência (Ciconello, 2008). A proporcionalidade desses grupos na população das unidades federativas de funcionamento da instituição deve ser levada em consideração na efetivação da lei. As vagas remanescentes devem, obrigatoriamente, ser destinadas a estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
A referida lei procura romper com a lógica do mérito para se ter acesso à educação. A meritocracia “tem um longo histórico de exclusão, restringindo as possibilidades de maioria da população brasileira, negra, a favor de sua minoria branca” (Souza et al., 2021, p. 41).
A partir dessa breve contextualização, a presente pesquisa procura responder a seguinte problemática: Qual o perfil dos ingressantes nos cursos de Biblioteconomia no Brasil? Interessa-nos, caracterizar o quadro de ingressantes (período de 2015 a 2019) na Biblioteconomia do Brasil em termos de região geográfica, raça, sexo, faixa etária, modalidade de ensino e natureza da instituição (pública ou privada) no Brasil; taxa de interrupção (transferência, desvinculação) do curso. Os dados foram extraídos dos Microdados do Censo do Ensino Superior de 2019, disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep, 2020a).
2 O ensino superior no Brasil: panorama em 2019
A Rede de Educação Superior no Brasil (Resb) é constituída por 2.608 instituições, sendo 302 públicas (11,6%) e 2306 privadas (88,4%). Quanto ao tipo de organização acadêmica,2 a maioria das universidades brasileiras é pública, situação que se inverte para os centros universitários (283 privados e 11 públicos) e faculdades (1933 privadas e 142 públicas). As instituições públicas de ensino superior são responsáveis por 24,2% dos matriculados em cursos de graduação, frente aos 75,8% do setor privado. Isso mostra o espaço que a educação privada ocupa no país (Inep, 2020b).A Resb oferta 40.427 cursos de graduação e 36 cursos sequenciais. A maioria dos cursos vinculados às universidades é na modalidade presencial (87,6%). Os cursos à distância são predominantemente ofertados por instituições privadas e se voltam, majoritariamente, para a licenciatura - no presencial há predominância de bacharelados. Cabe ressaltar que o ensino a distância, no período de 10 anos (2009 a 2019), registrou um aumento de 192,4% no número de matrículas, enquanto na modalidade presencial o crescimento foi de 20,3% nesse mesmo período (Inep, 2020c). Dados estatísticos mostram um crescimento de 5,4% no número de ingressantes em 2019 quando comparado a 2018. Porém, de 2018 para 2019, houve uma queda no número de ingressantes na rede pública (-3,7%) e uma expansão na rede privada de 8,7%. Ao longo de dez anos (2009-2019), a participação da rede privada cresce 87,1%, enquanto a rede pública aumentou 32,4% no mesmo período (Inep, 2020c, p. 13). Parte do crescimento do número de ingressantes na rede privada deve-se à expansão do EaD e o crescimento da rede pública deve-se ao REUNI - Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, criado pelo decreto 6.096, de 24 de abril de 2007 (Presidência da República, 2007). 3
As regiões sul e centro-oeste, ambas com 76,8%, tiveram a maior variação positiva no número de matrículas presenciais na rede federal de educação do ensino superior no período analisado. Além disso, “a matrícula na rede federal está presente em 893 municípios brasileiros, por meio de campi com cursos presenciais ou de polos EAD” (Inep, 2020c, p. 24). Mas, mesmo assim, as IES privadas ainda oferecem mais vagas que as públicas, sendo responsáveis por 94,9% (15.587.493) das 16.425.302 vagas geradas pela rede brasileira de ensino superior (Inep, 2020b) no ano de 2019. Constata-se, no entanto, que nem todas as vagas geradas pelo Rbes foram preenchidas (Inep, 2020c). Das vagas provenientes de instituições privadas, somente 26,7% foram ocupadas. A maior taxa de preenchimento de novas vagas (um pouco mais de 90%) ocorreu nas universidades públicas federais, onde predominam os cursos presenciais. “É o maior índice de ocupação de vagas entre as diferentes categorias administrativas”, diz o relatório do Inep (2020b, p. 10). Chama a atenção o crescimento do EaD, cuja “participação no total de ingressantes, saltou de 16,1% em 2009, para 43,8% em 2019” (Inep, 2020c, p. 16, grifo nosso). Por modalidade de ensino, tem-se que 44,2% das vagas oferecidas para ingresso em cursos presenciais foram preenchidas, enquanto os cursos à distância preenchem 1 a cada 5 vagas ofertadas, ou seja, a taxa de “ocupação na modalidade presencial é maior que na modalidade a distância” (Inep, 2020c, p. 11).O panorama que se forma é que a participação das IES privadas no total de matrículas no ensino superior, no ano de 2019, (75,8%) foi bem superior a do setor público (24,2%). “Em relação a 2018, o número de matrículas na rede pública é 0,1% maior, enquanto a rede privada no mesmo período registrou um crescimento de 2,4%” (Inep, 2020c, p. 16). Ao longo de 10 anos, o setor privado aumentou o número de matrículas em 47,3%; a rede pública, por sua vez, registrou incremento de 36,5%. Olhando para a rede de ensino pública, o segmento das IES federais foi o que registrou maior avanço no número de matrículas entre 2009 e 2019 (59,1%). Isso significa que “quase 2/3 das matrículas em cursos de graduação da rede pública estão em instituições federais” (Inep, 2020c, p. 17). O turno no-turno é responsável por 57,6% dessas matrículas nos cursos de graduação presencial (Inep, 2020c).
A rede privada de ensino superior, além de ofertar mais vagas, tem apresentado também maior taxa de concluintes. Enquanto 20,1% dos estudantes que concluíram os cursos de graduação em 2019 são da rede pública, na rede privada esse percentual chega a 32,7%. Quando comparado ao ano anterior (2018), constatase que “o número de concluintes na rede pública apresentou uma queda de -3,1%; na rede privada a variação é de -0,6%” (Inep, 2020c, p. 24). O censo de 2019 registra ainda aumento de concluintes no ensino superior na modalidade à distância; “Após queda ocorrida em 2016, o número de concluintes da modalidade a distância teve uma oscilação nos anos subsequentes até 2019, aumentando a sua participação de 19,7% em 2016 para 25,3% em 2019” (Inep, 2020c, p. 25).Os números do período de 2012 a 2019 revelam um discreto e gradual avanço em direção à expansão do ensino superior no Brasil. Porém, ainda se está longe de atingir a meta 12 estabelecida pelo Plano Nacional de Educação - PNE, que se propõe até 2024: aumentar a taxa bruta de matrículas (TBM) de jovens entre 18 e 24 anos para 50%; a taxa líquida de escolarização na educação (TLE) para 33% e; expandir para 40% a participação do segmento público do ensino superior nas novas matrículas na graduação (Ministério da Educação, 2014). O Relatório do 3º. Ciclo de monitoramento das metas do PNBE conclui que, apesar do crescimento da TBM em 6.2 p.p. no período de 2012 e 2019, para se atingir a meta estabelecida “será necessário um crescimento de 12,6 p.p. (2,5 p.p. ao ano)” (Inep, 2020d, p. 275). A taxa ajustada de frequência líquida no ensino superior (TLE) para as pessoas na faixa etária dos 18 a 24 anos - intervalo em que os jovens já podem a pleitear uma vaga nos cursos de graduação ou concluí-lo, foi de 25,5, em 2019 - crescimento de 5.4 p.p. Esse índice revela que boa parte dos jovens interrompem seus estudos quando concluem o ensino médio. 4 Provavelmente esses jovens ou são conduzidos para o mercado de trabalho, ou passam a fazer parte dos “nem nem” - termo utilizado para se referir aqueles jovens que nem estudam nem trabalham. “Para o alcance da meta de 33%, será necessário um crescimento de 7.2 p.p. (1,5 p.p ao ano)” (Inep, 2020d, p. 276).Em termos raciais, tem-se que a taxa de brancos na faixa etária dos 18 aos 24 anos que estavam no ensino superior é quase o dobro daquela para pretos e pardos (35,9 e 18,9 respectivamente), ou seja, pessoas da cor/raça branca nesse intervalo de idade “tem, aproximadamente, duas vezes mais chances de frequentar ou já ter concluído o ensino superior que um jovem de cor ou raça preta ou parda” (Ibge, 2020a, p. 90). Fica evidente que as desigualdades de raçascor per-sistem, sendo que “a razão entre escolaridade de negros e não negros era de 89,9%, em 2019, ou seja, 10.2 p.p. distantes de uma situação de igualdade”(Inep, 2020d, p. 204).O percentual de alunos pretos e pardos na rede privada é de 47,0% e 49,9% na rede pública (Inep, 2020e, tabela 1.10). As mulheres são maioria tanto no ensino superior da rede privada (58,1%) quanto pública (53,1%). Em termos populacionais, tem-se que 24,5% das mulheres brasileiras nessa faixa etária “eram estudantes de graduação e 5,1% tinham este grau concluído” (Ibge, 2020b, p.9). Entre os homens, a realidade é menos favorável, uma vez que esses percentuais chegam a 18,4% e 3,1%., respectivamente. Além disso, os dados revelam que “66,3% dos homens de 18 a 24 anos não frequentavam escola, apesar de não terem concluído o ensino obrigatório” (Ibge, 2019c, p. 9).As discrepâncias regionais também não foram superadas. As regiões centro-oeste e sul brasileiras apresentaram em 2019 as maiores taxas ajustadas de jovens de 18 a 24 anos no ensino superior (43,3% e 43,0% respectivamente). No centro-oeste, Brasília é a cidade que se destaca com uma taxa de matrículas na graduação de 57,2% dos jovens. Seguida por outras duas capitais de estados da região sul do país: Florianópolis (52,0%) e Porto Alegre (47,0) (Ibge, 2020b). O Distrito Federal apresenta também o maior percentual de jovens acima de 25 anos que possuíam diploma de ensino superior (33,8%), 11 pontos percentuais acima do segundo colocado que é São Paulo (22,8%) (Ibge, 2020b). Dentre os jovens acima de 25 anos com diploma de ensino superior, um pouco mais que o dobro era da cor-raça branca; apenas 11,1% eram negros, ou seja, menos da metade daquele percentual verificado para a cor-raça branca.Os desafios para inclusão de mais jovens na educação superior passam também pelo cumprimento da meta 8 do PNE (Ministério da Educação, 2014), que estipula elevar para, no mínimo, 12 anos a escolaridade da população de 18 a 29 anos até 2024, para “as populações do campo, da região de menor escolaridade no País e dos 25% (vinte e cinco por cento) mais pobres, e igualar a escolaridade média entre negros e não negros declarados à Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)” (Ministério da Educação, 2014, p. 33). Os dados mostram que os avanços na concretização desta meta também foram lentos. Assim, a escolarização para pessoas do campo passou de 8,6 em 2012 para 10,0 anos de estudos em 2019. Para a população negra, foram acrescidos 2,1 anos de escolarização no mesmo período: em 2012, essa taxa era de 9,0 e passou para 11,1 anos de estudo. Para os 25% da população mais pobre, a escolarização passou de 7,9 para 10,2 anos. As médias de escolarização para os 25% da população mais rica e para a população branca são de 13,2 e 12,3 anos, respectivamente (Ibge, 2020b). Novamente as regiões norte e nordeste figuravam, em 2019, como regiões de menor escolaridade, ambas apresentando média de 10,9 anos de estudo (Inep, 2020d, p. 48). Por cor ou raça, a taxa de alfabetização é de 79 para pessoas brancas e 66,7 para pessoas pretas ou pardas, uma diferença de 12,9 pontos. Em termos gerais, em 2019, brancos estudavam, em média, 12,3 anos contra 11,1 anos para a raça preta ou parda (Ibge, 2020b, tabela 3.8). “O resultado mais desfavorável para as pessoas pretas ou pardas foi identificado na Região Sul, onde a proporção de jovens de 18 a 24 anos com menos de 11 anos de estudo e que não frequentavam escola alcançou 37,2%” (Ibge, 2020a, p. 8). “Vale lembrar que o Brasil é um país em que a escolaridade implica em altos retornos salariais, em comparação a outros países do mundo, como reflete Menezes-Filho (2001)” (Ibge, 2019b, p. 8).
Os dados estatísticos confirmam essa realidade: “42,8% dos jovens que não estudavam nem estavam ocupados em 2019 estavam no quinto da população com os menores rendimentos domiciliares per capita e apenas 4,7% no quinto com os maiores rendimentos” (Ibge, 2020a, p. 108). Entretanto a situação das mulheres foge à regra: segundo a agência de notícias do IBGE, a “Mulher estuda mais, trabalha mais e ganha menos do que o homem” (Ibge, 2019a, p. 1). A taxa de mulheres que estavam frequentando o ensino médio em 2019 é de 76,4, entre os homens, a taxa foi de 66,7. Em média, elas estudam 3 horas semanais a mais que os homens (Ibge, 2020b), mas isso não reflete em salários superiores. Os seus rendimentos são, em média, 76,5% daqueles destinados aos homens. “Os resultados desagregados por nível de instrução apontam que o diferencial de rendimentos é mais elevado na categoria ensino superior completo ou mais, em que as mulheres receberam 63,4% do que os homens, em 2016” (Ibge, 2018, p. 5).
A evasão (abandono, desistência do curso) continua a ser um fator preocupante: dos 50 milhões de brasileiros na faixa etária dos 14 aos 29 anos, 20,2% não completaram o ensino médio. Destes que não concluíram essa etapa de ensino, 58,3% eram homens e 41,7% mulheres. Em termos de cor/raça, verificou-se que 27,3% eram brancos e 71,7% pretos ou pardos. Ou seja, os homens tendem a não concluir seus estudos mais que as mulheres. E as chances de pretos ou pardos abandonarem os estudos é extraordinariamente maior que aquelas da população branca (Ibge, 2020b). O abandono precoce (antes de completar o ciclo educativo obrigatório), apesar de já ocorrer desde os 13 anos de idade, tem um aumento significativo a partir dos 15 anos, sendo que é na faixa dos 16 anos e 17 anos que se encontram os maiores percentuais de abandono precoce do ensino. A despeito de ainda não apontarem para a superação da desigualdade de raça e gênero no país, não se pode negar que houve alguns avanços no setor da educação no Brasil, fruto de políticas públicas que priorizam a educação. A partir dos anos 2000, uma série de medidas adotadas para minimização das desigualdades no ensino superior. De forma suscinta, podem ser mencionados a institucionalização do sistema de cotas na rede pública, que prevê reserva vagas a candidatos de determinados grupos populacionais; o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - Reuni; o Sistema de Seleção Unificada - SiSU; Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES) - voltado para estimular a permanência de estudantes de baixa renda matriculados em cursos de graduação presencial das universidades federais; Programa Nacional de Assistência Estudantil para as Instituições de ensino superior Públicas Estaduais (PNAEST); Programa de Apoio à Extensão Universitária (Proext); Programa de Educação Tutorial (PET) e o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (PROIES). Na rede privada, tem-se a expansão dos financiamentos estudantis, como o Fundo de Financiamento Estudantil - FIES e o Programa Universidade para Todos - PROUNI.Esse conjunto de medidas, apesar de minimizar as desigualdades, não as erradica de forma definitiva, sendo necessário combiná-lo com outras ações que garantam condições de permanência desses grupos no ensino superior, como, por exemplo o PNAES, o que aponta para a complexidade da questão no nosso país (Presidência da República, 2010). No entanto, “ainda é expressivo o grupo que não estuda, mesmo sem ter concluído o ensino superior. Em 2019, 23,8 milhões de jovens, de 15 a 29 anos de idade, sem ensino superior completo, não frequentavam escola, pré-vestibular ou curso da educação profissional” (Ibge, 2020a, p. 101).
3. Cursos de biblioteconomia no Brasil
As iniciativas para criação do primeiro curso de Biblioteconomia no Brasil, vinculado à Biblioteca Nacional (BN), sediada no Rio de Janeiro, datam de 1911. Essas iniciativas foram motivadas pela mudança de sede da BN e da demanda por uma reforma administrativa, constantes pela Lei nº 2.356, de 31 de dezembro, que contemplava a criação de um curso de formação para atender as demandas na instituição. Os anos de 1930 a 1950 foram marcados pela expansão do ensino bibliotecário e avanços em termos de carreira. Em 1958 a Biblioteconomia é reconhecida como profissão liberal de nível superior (Portaria nº 162/58). Em termos de formação, houve a aprovação do primeiro currículo mínimo de graduação em Biblioteconomia no país (Dec. 550/62 do CFE) (Tanus, 2018).No presente momento, segundo dados do Inep (2020a), são contabilizados no Brasil 38 cursos superiores em Biblioteconomia, sendo 29 em instituições públicas e 9 em instituições privadas, que são oferecidos em 22 Estados mais o Distrito Federal. Apenas quatro Estados da região norte não oferecem o curso de Biblioteconomia, são eles: Acre, Amapá, Roraima e Tocantins. Importa ressaltar que, até os últimos microdados disponibilizados, o Inep não relacionou em suas pesquisas nenhuma Instituição Federal de Ensino Superior pública que ofertasse o curso de graduação em Biblioteconomia na modalidade de Ensino a Distância (EAD). AS IFES passaram a ofertar o curso nessa modalidade a partir do ano de 2021, via adesão ao edital que lançou o Curso Nacional de Biblioteconomia a Distância, financiado pela Universidade Aberta do Brasil (UAB), subordinada à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino superior - CA-PES. As estatísticas do INEP ainda não refletem a adesão das IFES públicas ao curso na modalidade EAD
4. Metodologia
A pesquisa conduzida é de abordagem quantitativa e seus objetivos são descritivos exploratórios. Do ponto de vista técnico, a pesquisa classifica-se como documental pois faz suas análises a partir dos microdados do Censo da educação Superior publicado em 2020 (Ministério da Educação, 2020) que refletem os números do ano de 2019. A partir desses microdados, considerou-se apenas os alunos ingressantes nos anos 2015 a 2019. 5 Os microdados do Censo da Educação Superior 2019 do INEP possibilitam que se trace o perfil dos discentes dos cursos de Biblioteconomia no Brasil segundo cor, sexo, idade e região geográfica.
As tabelas dos microdados vêm em formato csv, com delimitação por vírgulas e foram extraídos, tratados e normalizados através de linguagem Python. Python é um software de código aberto que permite automatizar tarefas e adicionar novas funcionalidades (Borges, 2014). Após a extração dos registros no formato de planilhas Excel, eles foram filtrados utilizando-se o código da área do curso classificado e informado pelo Censo (0322B01) e logo após, as suas variáveis foram cruzadas, usando-se o recurso “tabela dinâmica” do Excel. As variáveis consideradas para a análise foram: tipo de instituição (pública ou privada), região geográfica, raça, sexo, ano de ingresso, modalidade do ensino (presencial ou EAD, idade, situação no curso (desistência, não concluinte).
5. Resultados e análise dos dados
A distribuição de ingressantes por raça e região geográfica revela que dos 8.015 graduandos do curso de Biblioteconomia - modalidade presencial,6 69,60% deles estão nas regiões geográficas nordeste e sudeste do país. Em relação à etnia-raça, tem-se que 39,03% dos ingressantes nos cursos de biblioteconomia - modalidade presencial se autodeclaram da cor/raça branca; 12,76% se dizem preta; 36,01% parda, 1,83% amarela, 0,44% indígena e 9,93% não declararam raça/cor, mas há diferenças regionais nessa composição étnico-racial. O Gráfico 1 mostra claramente que nas regiões norte e nordeste do país, a maioria dos ingressantes na modalidade presencial (64,39% e 47,35% respectivamente) se autodeclaram da cor/raça parda. Nessas duas regiões, pretos correspondem a 14,33% e 15,12% de seus ingressantes, respectivamente - essas foram as maiores proporções de pretos entre os ingressantes em termos geográficos. Os ingressantes brancos equivalem, respectivamente, a 14,75% e 24,03% dos ingressantes no curso nessas regiões.Essa situação se inverte nas regiões sul e sudeste do país, onde predominam discentes que se autodeclaram da cor/raça branca: no Sul, 71,72% e no Sudeste, 44,7% estão nesse grupo. Os percentuais de pretos são de 12,80 no Sudeste e 9,05% no sul. Esses dados por região não destoam do mapa racial do país, onde, notadamente, a região nordeste concentra maior percentual de negros e pardos e a região sul de brancos. A representatividade de outras raças (indígenas e amarelos) nos cursos é muito pequena. Diante desta realidade, podemos afirmar que, enquanto nas regiões sul e sudeste a Biblioteconomia é branca, nas regiões norte e nordeste e centro-oeste do país ela é parda. Porém, quando agregados nacionalmente, vê-se uma leva preponderância da cor/raça branca (39,02%) em relação à parda (36,01%) na modalidade de ensino presencial. Essa tendência é puxada pelas regiões sul e sudeste do país que agregam 50,91% do total dos alunos de biblioteconomia no Brasil e 26,88% do total de ingressantes brancos (modalidade presencial).
Os dados mostram ainda uma expansão do quadro discente do curso. Em 2019, o número de ingressantes foi 3,84 vezes maior quando comparado a 2015. Essa taxa de crescimento foi puxada pelas instituições privadas cujo número de ingressantes mais que quadriplicou (4,79), enquanto nas públicas a taxa o crescimento foi de 3,37 vezes quando comparada ao ano de 2015. Neste ano, o setor privado tinha 1 a cada 1,85 ingressantes em instituições públicas; em 2019, essa relação passa para 1 a cada 1,33 ingressantes no curso de biblioteconomia. Mesmo diante da crescente participação do setor privado na formação de bibliotecários no país, as instituições públicas acolheram no período analisado 61,55% do total de ingressantes no curso. No ano de 2019, do total de 3.700 ingressantes no curso no Brasil, 57,14% foram para instituições públicas (Tabela 1). Há de pontuar que esse crescimento de ingressantes na Biblioteconomia já refletem as políticas públicas de expansão e democratização do ensino superior - REUNI. Somados os números das instituições públicas e privadas, verifica-se que o total de ingressantes em 2019 é 3,43 vezes maior que aquele registrado no ano de 2015.Em termos etino-raciais, a maior taxa de crescimento no número de ingressantes no período de 2015 a 2019, desconsiderando-se aqueles que não declararam cor-raça (crescimento de 4,38), ficou no grupo de cor-raça branca (3.54), seguida de pardos (3,21), pretos (3,15), amarelos (2,41) e indígenas (1,13) (Tabela 2). A taxa de crescimento de ingressantes pardos (2,72) é maior que aquela verificada entre os brancos (2,48) de 2015 a 2017, quando começa a perder força. Entre os pretos, observa-se a menor taxa de desaceleração no número de ingressantes: de 2015 a 2017, o crescimento era de 2,28 e passa para 1,32 em 2018-2019, e queda de 0,96 no ritmo de crescimento. Observa-se que a maioria dos declarantes da cor-raça preta (74,01%), indígena (73,68%) e amarela (61,40%) ingressantes na Biblioteconomia está em instituições públicas. Nessas instituições, em 2019, o número de ingressantes pretos e pardos no curso mais que duplicou em relação à 2015, com taxas de crescimento de 2,74 e 2,92, respectivamente. Mas essas ainda são inferiores àquela verificada para os autodeclarados brancos que experimentaram um aumento de 4,07 vezes no número de ingressantes em instituições públicas: em 2015 contabilizavam-se 244 alunos brancos nessas institui ções, em 2019, esse número pula para 834. Em relação às instituições privadas, constata-se que a maior taxa de crescimento está no grupo de ingressantes pretos (5,35), seguida de pardos (4,98) e brancos (4,33). Observa-se também que no período analisado houve um aumento considerável de ingressantes que não declararam sua raça-cor: nas instituições públicas, esse número cresceu 5,67 vezes, enquanto nas privadas esse aumento foi de 4,72 (Tabela 1).Quanto à modalidade de ensino (presencial x EaD), esta congrega 30,3% do total de ingressantes, ou seja, tem-se 1 ingressante EaD para cada 3,3 presenciais. Em relação à cor-raça, para cada 3,81 pretos que ingressam no ensino superior na modalidade presencial tem-se um (1) no ensino a distância. Para a raça/cor branca, essa relação é de um (1) EaD para cada 1,83 presencial. Entre os indígenas, tem-se um discente EaD para cada 4,5 alunos na modalidade presencial. Observa-se que a maioria dos ingressantes negros e indígenas no ensino superior está vinculada às instituições públicas na modalidade presencial. Cabe esclarecer que os cursos à distância são ofertados majoritariamente pela rede privada de ensino superior (Tabela 2).7
A análise do perfil dos ingressantes segundo as variáveis raça e sexo no período analisado (2015-2019)(Gráfico 2) mostra que as mulheres são maioria (70,4%). Dessas, 30,0% são brancas; 7,6%, pretas; 23,4% pardas; 1,22% amarelas; 0,21% são indígenas e 8,1% não declararam raça ou cor. Os homens brancos representam 12% do quadro de ingressantes dos últimos 5 anos; já os pretos correspondem a 3,54% dos matriculados no curso; pardos, 9,9%; amarelos, 0,54%; indígenas, 0,16 e; não declarados, 2,93%. Somando-se o número de homens e mulheres que se autodeclaram da cor-raça branca, constatamos que esses são predominantes no curso, com 42,55% de ingressantes, seguidos por homens e mulheres pardos - 33.29%. Vale lembrar, conforme visto anteriormente, que os cursos presenciais concentram a maioria desses ingressantes.
Em termos de idade, 7,71% dos ingressantes estão na faixa etária dos 15 aos 19 anos, enquanto 48,91% estão no intervalo dos 20 aos 29 anos (Tabela 3). Esses dois intervalos de idades congregam 56,62% dos ingressantes no curso no período de 2015 a 2019. A faixa etária dos 30-39 anos corresponde a 23,65%; dos 40-39 são 13,09%, e 6,63% são ingressantes com idade igual ou superior aos 50 anos. Interessante observar que o sistema registrou o ingresso de 4 alunos com idade no intervalo dos 70-74 anos. Vê-se que o curso tem atraído pessoas com idade um pouco acima da média nacional que é de 19 anos. Desses jovens que ingressaram no curso com idades entre 15 e 29 anos, temos que 41,13% são brancos, 11,90% são pretos, 34,49% são pardos, 0,44% são indígenas, 1,93% são amarelos e 10,11% não declararam a raça-cor. O maior percentual de pessoas que ingressam no curso com 50 anos ou mais também corresponde à raça-cor branca (7,72%), seguida da raça-corparda (5,81%).A maior parte dos ingressantes no curso nos anos de 2015 a 2019 concluiu o ensino médio em escolas públicas (61,55%). Dos pretos que ingressaram no curso, 74,1% vieram das escolas públicas - sendo esse o maior percentual considerando a raça e a cor. Logo em seguida, tem-se os indígenas - 73,68% são oriundos do ensino público. O menor percentual corresponde aos ingressantes pardos e brancos. Nesses grupos 45,89% e 54,7%, respectivamente, completaram o ciclo de ensino médio em escolas públicas. Chama a atenção o fato de, em 2019, o número de ingressantes pretos provenientes do ensino médio privado ser 5,25 vezes maior quando comparado àquele do ano de 2015. Apesar desse incremento, o percentual de pretos ingressantes no curso que estudaram em rede privada de ensino é de apenas 3,15% do total de ingressantes no período de 5 anos, enquanto esses percentuais para brancos e pardos são de 18,69% e 12,10%, respectivamente (Tabela 4) A interrupção do curso, seja por trancamento de matrícula ou desvinculação de qualquer natureza, é um fenômeno que preocupa. O número de discentes nessa situação corresponde à 20,81% do total dos 12.146 ingressantes no curso (modalidade presencial e EaD) no período analisado (Tabela 5). Como era de se esperar, conforme noções levantadas pelo Censo EAD (Associação Brasileira de Educação a Distância [Abed], 2021), a taxa de interrupção de curso na modalidade EaD (25,35%) é 6,51 p.p maior que aquela do presencial (18,83%).






Segundo o Censo EaD 2020, do total de 55 instituições públicas que oferecem curso de graduação na modalidade EaD e participaram da pesquisa conduzida pela ABED, 31 sinalizaram que a evasão do aluno Ead em suas instituições estava acima de 21%. Na graduação presencial, das 98 instituições participantes, 63 afirmaram que o percentual de evasão estava abaixo de 15%. Nas privadas, 21 das 38 IES participantes, o percentual de evasão estava acima dos 25% na EaD e abaixo de 15% no presencial. É importante salientar que esses percentuais são frutos da percepção dos participantes em decorrência das suas vivências.
Na modalidade EaD, o maior percentual de interrupção do curso está entre os indígenas (62,5%), seguidos da cor-raça amarela (27,12%); preta (26,88%). Os das cores-raças branca e parda apresentam percentuais de interrupção do curso muitos próximos: 25,49 e 25,41%, respectivamente. Dos que não declararam cor-raça na modalidade, 22,99%, deixaram de frequentar o curso. Na modalidade presencial, esta ordem é alterada: a cor-raça branca é que apresenta o maior percentual de interrupção do curso (21,65%), seguida das cores-raças indígena (19,44%), não declarados (18,24%), parda, (17,72%), amarela (15,03%) e preta (14,12%).
Em termos somente de raça-cor, sem levar em consideração a modalidade de ensino, verifica-se que 23,00% dos brancos e 25,0% dos indígenas, considerando-se o total de inscritos em cada categoria étino-racial, trancaram ou se desvincularam do curso (Tabela 5). Os que se autodeclaram pardos, amarelos e aqueles que omitiram essa informação apresentam percentuais de interrupção muito próximos: em média, 19,33% de alunos desses grupos deixaram de frequentar o curso. Dos alunos ingressantes da cor-raça preta, 16,33% compõem esse cenário. Dentre os alunos, portanto, observa-se que os maiores índices de interrupção do curso correspondem àqueles que se autodeclaram indígenas e brancos, enquanto os pretos apresentam menor percentual de trancamento ou desvinculação do curso.
Quanto às regiões geográficas - lembrando que para a análise não consideramos o EaD conforme justificado na metodologia, o número relacionado ao sudeste corresponde a 42,47% do total de trancamentos e desvinculação do curso. A participação das demais regiões nesse quadro são: 5,65% de desistentes são da região norte; 25,72%, da região nordeste; 10,10%, da região centro-oeste e; 16,06%, da região sul. Porém, se considerarmos número de desistências e dividirmos pelo número de ingressantes de cada região (ver Gráfico 1), temos que os menores índices de interrupção do curso estão nas regiões nordeste e norte, onde, em média, 1,59 alunos a cada 10 ingressantes desistem do curso. Nas regiões centro-oeste, sudeste e sul do país, esse índice é o dobro: em média, 2,26 a cada 10 alunos encontram-se nessa situação.
A análise, pela variável sexo, evidencia que 23,42% dos homens e 19,70% das mulheres que ingressaram na Biblioteconomia interromperam o curso, enquanto 19,70% (Gráfico 3). Os dados apontam diferenças consideráveis quando agregarmos à análise a variável modalidade de ensino. No ensino presencial, mais da metade das mulheres (58,1%) interromperam o curso; o percentual de homens no EaD nessa situação é de 30,46%. Para o presencial a situação se inverte, mas não com uma diferença tão acentuada nos percentuais como a verificada no EaD. Na modalidade presencial, 21,27% dos homens e 17,50% das mulheres deixaram, mesmo que temporariamente, de frequentar o curso


6. Considerações finais
Os microdados do Censo de ensino superior de 2019 disponibilizado pelo Inep (2020a) revelou que o quadro de ingressantes do curso de Biblioteconomia no Brasil é formado majoritariamente por mulheres brancas, com significantes variações regionais. Se nos cursos ofertados no sul e sudeste há concentração de discentes brancos, nas regiões norte e nordeste predominam ingressantes pretos e pardos. Essa situação não é estranha porque reflete a distribuição racial no Brasil.
Os ingressantes no curso estão na faixa-etária dos 20-29anos, faixa etária um pouco acima da média de idade nacional que é de 19 anos. Esses ingressantes são oriundos de escolas públicas e a maioria está vinculada às instituições públicas do ensino superior. A relação de ingressantes na EaD é de 1 a cada 3,3 alunos na modalidade presencial. Certamente a oferta, a partir de 2021, do Curso Nacional de Biblioteconomia na modalidade EaD por 11 instituições públicas federais de ensino superior alterará essa relação. Também se espera que a pandemia que assolou o mundo no ano de 2020 amplie a representatividade de pessoas da cor-raça branca no curso, uma vez que há fortes indícios que a população preta do país foi a mais afetada pela crise sanitária.
Sobre a interrupção do curso, conclui-se que os maiores percentuais estão no EaD e nos ingressantes que se autodeclaram das cores-raças indígena e branca. Esses são os dois grupos mais propensos a interromperem o curso
Referências
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Notas