Autor Convidado

Ser Professor de História em tempos difíceis: início de um processo formativo

Being History Teacher: the beginning of a formative-educational process

Marília Gago
Universidade do Minho, UM, Portugal

Ser Professor de História em tempos difíceis: início de um processo formativo

Antíteses, vol. 11, núm. 22, pp. 505-515, 2018

Universidade Estadual de Londrina

Resumo: A realidade presente partilha uma narrativa histórica que parece estar muito centrada no que nos distingue. A humanidade parece ser definida mais pelo que a separa do que pelo que a une, pelo que existe em comum. Partilhando-se a necessidade de um novo olhar acerca do ser humano e da concepção que a História é transformativa e permite a complexificação da compreensão do mundo considerou-se relevante compreender como um processo de formação pode contribuir para o desenvolvimento profissional e pensamento histórico de futuros professores de História, alunos de mestrado de formação profissionalizante. Propõem-se a análise das ideias que emergiram de uma tarefa inicial proposta e realizada por vinte alunos, futuros professores de História, tendo-se em vista o desafio destas ideias ao longo do processo de formação, e numa lógica longitudinal, acompanhar o desenvolvimento profissional e do pensamento histórico destes alunos. Emergiram ideias que se pautam por uma lógica de profissionalismo gerencialista e de perspetivar a História como o campo que forma cidadãos. Estas ideias sugerem estar em rota com demandas externas veiculadas por entidades e agendas políticas.

Palavras-chave: Humanismo, Educação histórica, Formação de professores, Profissionalismo gerencialista, Profissionalismo democrático.

Abstract: The present reality shares a historical narrative that seems to be very focused on what distinguishes us. Humanity seems to be defined more by what separates it than by what unites it, by what exists in common. Sharing the need for a new look at the human being and the conception that history is transformative and allows the complexity of understanding the world it was considered relevant to understand how a process of formation can contribute to the professional development and historical thinking of future History teachers, masters students on training. It is proposed to analyze the ideas that emerged from an initial task proposed and carried out by twenty students - future teachers of History, to then challenge these ideas throughout the formation process and in a longitudinal logic accompany the professional development and historical thinking of these students. The emerged ideas seem being guided by a logic of managerial professionalism and of prospecting History as the field that forms citizens. These ideas suggest being on the road with external demands conveyed by political entities and agendas.

Keywords: Humanism, History education, Teacher education, Management professionalism, Democratic professionalism.

Ser Professor de História: início de um processo formativo

Num momento em que o mundo tanto vinca o que nos distingue, o que nos diferencia, o que nos separa partilha-se a preocupação de Rüsen (2016) relativamente à necessidade de ser repensado o Humanismo num quadro que reflita mais acerca do que nos une. A multiperspectiva, legítima e natural em História, baseia-se em ideias de diferença e pluralidade. Estas ideias acentuam o que nos distingue, ou seja, apontam para a definição do eu atendendo ao “não eu” e ao “não nós”. Urge pensar acerca do que nos une como membros de uma sociedade, ou seja, pensar num novo conceito de organização que vá para lá de ideias de exclusivismo e discriminação. Torna-se necessário repensar como se pode ensinar e aprender a ser-se um ser humano. E neste sentido, a aprendizagem, a educação histórica amplia e aprofunda a experiência histórica em linha com a dignidade humana. Como é apontado por Nechi e Schmidt (2015, p. 391):

[…] à luz do novo humanismo […] a valorização e o reconhecimento da humanidade e dignidade do outro, de outras culturas, etnias, identidades de género e condições sociais, implica na compreensão das diferentes narrativas advindas de diferentes experiências históricas.

Nesta linha, considera-se que a educação histórica pode desenvolver a forma de ver Mundo, ou seja, pode contribuir para que o mundo seja visto de forma(s) mais complexa(s). Assim, a História é pensada como transformativa e que tem impacto no modo como se tomam decisões e se age. Neste sentido, considera-se que a educação histórica é uma compreensão em desenvolvimento que impulsiona o conhecimento da realidade (LEE, 2011).

Mas, como pautar o processo de ensino-aprendizagem em sintonia com demandas tão complexas? As propostas de cognição situada baseadas no construtivismo social parecem oferecer um terreno fértil para que com base nas ideias prévias e nas carências de orientação dos aprendentes sejam criadas tarefas desafiadoras que articulem quer conhecimento substantivo quer metaconceptual tendo em vista o desenvolvimento de um pensamento histórico mais sofisticado e mais refletido.

Assim, é com base no dialogismo da “voz do professor e da voz do aluno” (SCHMIDT, 2016, p. 125) que os processos de educação-formação deverão ser pensados numa lógica de envolver quem aprende e fomentar a compreensão de si mesmos como sujeitos de mudança e de transformação.

Formação de Professores e Profissionalismo docente

O processo de ensino-aprendizagem tem dois agentes principais: alunos e professores. A formação de professores tem de ser pensada de forma a conseguir contribuir que os futuros professores de História compreendam que a sua ação docente é altamente complexa e deve estar comprometida com estas demandas tão exigentes. Assim, os formadores de professores têm de pensar como desenhar a sua ação de forma a desafiar os alunos, futuros professores, mas a também a suportá-los na árdua tarefa de educar historicamente. Parece existir convergência entre vários autores que a universidade e a formação que esta promove, deve, por um lado, fomentar o espírito crítico e de investigação e, por outro, ampliar o seu papel como consultora de investigação e de desenvolvimento de professores. Para este desafio, no entender de Day (2003) é necessário um envolvimento apaixonado de todos os elementos, tentando-se um compromisso contínuo em fazer sempre melhor e que a profissionalidade seja orientada por e para valores, entendendo-se a formação de professores como uma empresa moral. Estas situações parecem ser criadas por pequenos núcleos de profissionais empenhados que poderão apontar caminhos a adotar por comunidades mais vastas. Contudo, alimentar a ilusão de uma comunidade educativa global “apaixonada” para o desenvolvimento de determinados projetos, parece não ser um caminho produtivo.

Korthagen (2003) parece ter em consideração estas preocupações quando apresenta uma nova abordagem face à formação que pode ser designada por abordagem realista. Entende-se que o ponto de partida do processo educacional deve centrar-se nas próprias preocupações dos formandos, havendo a comutação contínua entre teoria e prática. Assim, apontam-se como características desta abordagem, que:

· o trabalho seja baseado em situações reais encontradas durante o ensino e que causam preocupação ao formando;

· a reflexão deva ser realizada em interação com os colegas;

· a reinvenção orientada seja fomentada;

· o conceito de teoria como matéria criada por investigadores de forma extrínseca aos formandos seja substituído por um conceito de teoria em que as explicações sejam criadas pelos próprios.

Analisando o desenvolvimento do processo reflexivo de professores estagiários, McKenney et al. (2006) concluem que este desenvolvimento ocorre de forma predominantemente linear, numa trajetória que parte de crenças iniciais não questionadas até um desenvolvimento reflexivo de prática na sala de aula. Contudo, alertam que podem haver algumas regressões entre os diferentes ciclos de reflexão. Assim, propõem o seguinte modelo de reflexão que emergiu dos seus dados empíricos.

 Modelo do
processo reflexivo de professores estagiários
Figura 1
Modelo do processo reflexivo de professores estagiários

Os professores estagiários constroem no primeiro ciclo de reflexão uma narrativa muito geral sem qualquer tipo de introspeção. Ao nível de revisão, consideram que existe um sem número de questões que não têm solução. É de realçar que no processo reflexivo, a passagem deste primeiro ciclo para o ciclo de reflexão seguinte ocorre com bastante celeridade. Tal situação parece não se verificar no que diz respeito ao segundo ciclo, onde se constata que há um grande período de permanência. Deste modo, o professor estagiário está preocupado essencialmente com as questões de estratégias e do trabalho em sala de aula. No terceiro ciclo de reflexão, os estagiários conseguem já ver os seus alunos como seres particulares e estes encontram-se no centro das suas preocupações. Neste sentido, McKenney et al. (2006) com base em evidência de formação consideram que os professores estagiários imitam o seu orientador/supervisor, em termos de trabalho em sala de aula. Torna-se, portanto, importante ter em atenção a seleção destes educadores, selecionando-se supervisores/orientadores que encorajem e se comprometam no desenvolvimento de reflexão ativa, de modo a facilitar mudanças nas atitudes dos professores estagiários. Deste modo, consideram que uma das implicações para a formação de professores deve ser a colocação dos estagiários com supervisores/orientadores que demonstrem uma reflexão cuidada, sincera e fundamentada na sua ação de ensino.

As atuais propostas e abordagens ao saber profissional dos professores apontam para uma nova conceptualização de profissionalismo. A noção clássica de profissionalismo, que se caracterizava por os professores possuírem uma base de conhecimentos especializada e/ou uma cultura técnica partilhada com um espírito de vocação e regulada de forma colegial, está posta em causa. Novos caminhos são desenhados, como se pode deslindar por todas as preocupações de promoção de reflexão.

O desenvolvimento da profissionalidade do professor deve ser no sentido de:

· incrementar oportunidades e responsabilidades para o exercício de um juízo discricionário acerca do ensino, do currículo, da ação educativa;

· fomentar o compromisso do professor com propósitos morais e sociais;

· estimular o compromisso do trabalho com colegas, dentro de uma cultura de colaboração;

· promover a heteronomia, em vez da autonomia autoprotetora entre os professores;

· visar o compromisso com o cuidar ativo e não encarar o ensino como um serviço a alunos;

· procurar a aprendizagem de forma contínua e autodirecionada, em vez de “mudar” devido a demandas externas;

· criar e reconhecer a complexidade das tarefas de professores.

A pedra basilar destas novas abordagens da profissionalidade continua a ser a necessidade de se fomentar a reflexividade, no sentido de promover o espírito discricionário do professor.

Nestes quadros de desenvolvimento profissional parecem estar presentes duas formas de crescimento profissional: um crescimento aditivo – desenvolvem-se mais conhecimentos, destrezas; ou um crescimento transformativo – foco colocado nas mudanças significativas de crenças, conhecimentos e destrezas (DAY, 2003). O primeiro tipo de crescimento parece reforçar a noção que os professores só precisam de saber gerir o seu ensino e de forma implícita parece afirmar-se que a compreensão dos pressupostos e contextos mais vastos é de menor importância. O desenvolvimento profissional quando se faz numa lógica de adição é restrito e fragmentado, enquanto que quando ocorre de forma transformadora é amplo, coerente e encontra-se associado ao uso sistemático de juízo discricionário.

Para Zeichner (2005), na formação de práticos reflexivos é necessário alterar a educação de professores de modo a que estes não sejam unicamente aprendizes que correspondem de forma adequada a um profissionalismo pedagógico. É também necessário proporcionar aos professores em formação uma grande variedade e diversidade de oportunidades pedagógicas, bem como iniciá-los e familiarizá-los com os modos de refletir acerca da sua prática, de forma a que desenvolvam o seu próprio projeto cultural e pedagógico a ser implementado na sua prática. Zeichner (2005) aponta para a necessidade de “pedagogy teacher education” na perspetiva de “help them to learn about experience and help them to learn by the experience.”1

A profissionalidade docente, na atualidade, parece balançar entre uma lógica de profissionalismo/identidade gerencialista, mais frequente segundo vários estudos (SACHS; MOCKLER, 2012; FLORES, 2011, 2012), e de profissionalismo/identidade democrática, defendido como desejável por autores como Sachs (2012).

O profissionalismo gerencialista tem como origem um discurso e uma cultura em rota com o empreendedorismo, tendo-se importado a ideia que o professor tem de gerir de forma eficiente, demonstrando a sua performance numa lógica de prestação de contas. As suas práticas são estandardizadas, definidas centralmente e devem estar em conformidade com as metas pré-especificadas externamente. Quanto mais conforme estiver a sua prática com o que foi definido pelo sistema de controlo mais recompensa terá e melhor será o ranking. Assim, existe um currículo e metas definidas externamente que pretendem a definição monocultural da comunidade legitimando determinados valores e identidade. Esta forma de desenvolver a profissão docente está em linha com uma identidade empresarial que se pauta pela obediência aos imperativos políticos impostos, assenta na burocracia, fomenta um clima de individualismo, de isolamento e de competição. Já o profissionalismo democrático pauta-se por uma identidade ativista partilhando-se valores e uma cultura de equidade e justiça social numa lógica de desenvolvimento. Os professores constroem alianças entre si e agem de forma colaborativa e recíproca, em que as comunidades da prática dão forma à identidade profissional coletiva. Assim, várias narrativas são partilhadas, discutidas e contestadas promovendo o debate da política e da prática. A responsabilidade do professor é entendida de forma ampla e sente-se como um catalisador de uma sociedade mais justa. Assim, este professor tem uma atitude transformativa para o futuro, envolvendo-se em investigação e promovendo salas de aula colaborativas que permitem experiências democráticas.

De forma global considera-se que a formação de professores deve pautar-se pelo desenvolvimento do

· conhecimento para a prática – proposto por investigadores que não estão na escola (novas teorias de ensino-aprendizagem e avaliação, por exemplo);

· conhecimento da prática – construído por professores que criticamente analisam as suas aulas e escolas, e que sozinhos ou com outros, atendendo a questões mais alargadas como equidade, desenvolvimento do desempenho dos alunos e justiça social;

· conhecimento na prática – conhecimento prático gerado pela sua investigação sistemática estimulada pelas questões que surgem das suas aulas (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999);

· conhecimento de si próprio – gerado por professores que se envolvem regularmente na reflexão de e sobre valores, propósitos, emoções e relações (DAY; SACHS, 2004).

Processo de ser professor – o início de um processo

Partilhando-se o quadro teórico-conceitual apresentado, no âmbito do mestrado de ensino da História de 3º ciclo e ensino secundário de uma Universidade Pública de Portugal, propôs-se uma primeira tarefa no início deste processo de se ser professor de História. Na primeira aula das unidades curriculares da área de metodologia do Ensino da História propôs-se que os vinte alunos respondessem por escrito e individualmente às seguintes questões:

“No início deste percurso é importante refletir acerca de algumas dimensões no âmbito do seu crescimento profissional.

1. Descreva-me a sua ideia de como deve ser uma aula de História, uma “coisa” que espera que os seus alunos aprendam com as suas aulas de História.

2. O que é que fazemos quando pensamos historicamente?

3. Qual o seu propósito como professor de História?”

Estas questões serviam como uma forma de compreender as ideias destes alunos, futuros professores de História, relativamente a questões relacionadas com a prática letiva, bem como as suas ideias acerca do pensamento histórico, da educação histórica e do seu propósito enquanto professores de História. Estas ideias irão ser desafiadas ao longo das aulas seguintes e em momentos específicos irá promover-se a reflexão acerca destas primeiras ideias partilhadas. Assim, esta será a primeira tarefa de um estudo que se perspetiva desenvolver de forma longitudinal.

Aqui iremos apresentar e analisar as ideias que surgiram relativamente à questão 3, em linha com o modo de análise proposto pela GroundedTheory.

As respostas da maioria dos futuros professores de História oscilaram entre um propósito muito focalizado em “Motivar e Gerir” e “Formar cidadãos ou profissionais de várias áreas”.

Assim, existe uma forte preocupação em captar o interesse e motivar os alunos para o estudo da História. Emergem, também, destas ideias uma visão mais tradicional em termos de trabalho em sala de aula, como podemos percepcionar nos seguintes exemplos de três dos futuros professores de História em que o seu enfoque é “Motivar e Gerir”.

Captar e interessar os meus alunos na disciplina e tentar acabar com aquela ideia de que são uma “seca” e desinteressantes (BERNARDA).

Transmitir os conhecimentos aos seus alunos despertando a curiosidade destes mesmos, pois embora, existam alunos que pensam que história é uma “seca” de certeza que há algum acontecimento que lhes desperta a atenção (BRUNO).

Os alunos aprendam o programa da disciplina de História, mas que aprendam com gosto. Espero que os meus alunos ganhem gosto e motivação em assistir às minhas aulas e que não seja apenas uma obrigação estar lá (AMANDA).

Já outros futuros professores de História consideram que o seu principal propósito como professor de História é “Formar cidadãos ou profissionais de várias áreas”. Neste sentido, consideram que o conhecimento do passado dá ferramentas para que os alunos sejam cidadãos críticos, criativos, com um referencial útil e que consigam compreender que o presente é uma consequência do passado. Estas ideias surgem, por exemplo, das respostas destes três futuros professores de História,

Formar uma nova geração, que conheça o passado, dando-lhes as ferramentas para serem cidadãos críticos e criativos (BERTA).

Formar cidadãos capazes de conhecerem o passado e verem nele a causa e consequências do Presente (BERNARDO).

Acicatar o gosto pelo conhecimento. O de orientar os alunos no sentido da prossecução do seu percurso profissional com sucesso, visando ser um referencial para os alunos, pela multiplicidade de saberes e áreas temáticas que estão intrinsecamente ligados à História (ANDRÉ).

De entre as respostas destes futuros professores de História, surgiu a resposta da Ana que se pauta por parecer ser um caso particular. Assim, para a Ana o seu propósito enquanto professora passa por desenvolver o espírito crítico e o raciocínio dos seus alunos que lhes servirá ao longo de toda a sua vida. Por outro lado, aponta que a História tem de ser compreendida como um processo de reflexão, onde existem várias questões e que todos temos responsabilidade na procura de um melhor futuro. Assim, Ana refere

É uma forma de mostrar a este Homem “a fibra de que é feito”, podendo utilizá-la para mudar o mundo sempre que necessário, colocando-se sobre os ombros de Homens com vivências anteriores, procurando o melhor futuro. […] Tenho ainda assim como objetivo encontrar uma nova forma de “olhar sobre a História”: tentando incutir nos alunos uma forma diferente de a estudar, desenvolvendo o seu espírito crítico, de modo que levassem este raciocínio para a vida a fim de compreenderem as informações históricas que irão recolher. Gostaria, ainda, de estreitar a História com as suas relações familiares, as memórias que reúnem em casa, nas conversas com os avós… Exemplificando como falamos de uma construção do dia-a-dia, e da responsabilidade todos, e não de um sem fim de homens mortos que escreveram tratados, leis, declararam guerras…

Compreendam a História como um processo de reflexão, onde se apresentam questões (e nada seria mais natural se, num primeiro ou segundo momento, ou…, estas não obtivessem respostas concretas…) (ANA).

Algumas Considerações

Partilharam-se as ideias dos futuros professores de História acerca do seu propósito como professores História no que podemos considerar como um Momento Zero do processo de se ser professor. Sendo o início deste longo e complexo processo tecemos algumas considerações. Assim, as ideias que emergiram das respostas escritas da maioria dos futuros professores parecem apontar para propósitos em linha com demandas externas – a motivação e a gestão dos seus alunos ou a formação de cidadãos/profissionais, numa lógica de profissionalismo gerencialista. Face a esta situação é necessário que no âmbito da formação de professores sejam criadas situações de aprendizagem que lhes permita

a. compreender a História como uma forma de ver o Mundo;

b. desenvolver a História de forma a que os seus alunos se orientem a si próprios no tempo;

c. conceber o valor da História per si que fomenta o pensamento independente e o respeito pelo ser humano, em linha com uma sociedade que se pauta pela democracia, mas não necessariamente ao serviço de uma cidadania…

d. desenvolver a sua identidade profissional em linha com um profissionalismo democrático, concretizando uma escola

· aberta ao fluir de ideias, à promoção da informação para todos, a várias possibilidades de resolução de problemas usando a análise e reflexão crítica da(s) evidência(s), problema(s), política(s);

· onde a democracia não seja um “ideal” a ser perseguido, mas sim um guia para a vida;

· preocupada e palco do respeito pela dignidade humana, os direitos individuais e de todos – incluindo das minorias.

A formação de professores tem de pensar a aprendizagem e o desenvolvimento dos futuros professores e/ou dos professores em exercício como uma ação que partilha e que produza um “senso de compromisso histórico com a própria humanidade.” (SCHMIDT; CAINELLI, 2015, p. 125).

Atendendo ao quadro teórico-conceptual partilhado e estando a ser desenhada a formação inicial destes professores em linha com as preocupações de um novo humanismo, a educação histórica e profissionalidade docente numa lógica de profissionalismo democrático, este processo de ser professor será desafiado, experienciado e interpretado numa linha longitudinal acompanhando-se estes futuros professores de História ao longo do tempo. Como possível horizonte de expectativa espera-se que as ideias agora conhecidas e apresentadas se complexifiquem ao longo do processo de formação, tendo em vista contribuir para a formação de docentes comprometidos com o seu papel docente potenciador da mudança e que se comprometam com a aprendizagem histórica dos seus alunos em linha com a concepção da História transformadora e promotora de um novo Humanismo.

Referências

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Notas

1 “ajudá-los a aprender acerca da experiência e ajudá-los a aprender através da experiência” (tradução da autora).
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