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"Arribadas maliciosas": redes comerciais no comércio de contrabando no porto de Buenos Aires, inícios do séc. XVII
"Arribadas maliciosas": comercial networks in the contraband trade in port of Buenos Aires, early seventeenth century
"Arribadas maliciosas": redes comerciais no comércio de contrabando no porto de Buenos Aires, inícios do séc. XVII
Antíteses, vol. 11, núm. 22, pp. 749-772, 2018
Universidade Estadual de Londrina

Recepção: 12 Março 2018
Aprovação: 17 Outubro 2018
Resumo: O presente artigo propõe compreender as redes dos comerciantes em Buenos Aires do século XVII a partir de uma nova interpretação. O comércio irregular, que fugia às normas de monopólio defendidas pela legislação espanhola, foi estruturante para a consolidação da atividade econômica no porto platino. A historiografia sobre a temática concentrou-se no debate em torno da legalidade e ilegalidade dessas práticas comerciais e, em consequência, abordou a prática dos governadores, agentes do poder régio, como elementos de repressão e combate do que se nomeou como contrabando. A ideia desse artigo é mapear as relações entre os agentes ligados ao comércio irregular em Buenos Aires em meados do século XVII. Para tanto coletamos as relações compiladas no Proceso Grande, ação jurídica iniciada pelo governador Hernandarias de Saavedra visando denunciar os agentes portenhos ligados ao comércio irregular. Esse processo gerou uma centena de páginas e que descreviam as práticas comerciais e arrolava os comerciantes envolvidos na atividade. A partir dessa rica documentação procuramos estabelecer as conexões da rede comercial, seguindo a divisão das duas facções que disputavam o comércio. Com isso, pudemos espacializar as relações de rede comerciais, romper a ideia de que Hernandarias combatera o contrabando e esmiuçar as dinâmicas das relações comerciais e familiares de ambos os grupos, elementos fundamentais que estruturavam sociedades de Antigo Regime.
Palavras-chave: Contrabando, Comércio, Redes, Conexões, Buenos Aires.
Abstract: The present article proposes to understand the merchant networks in Buenos Aires of seventeenth century from a new interpretation. Irregular trade, which ran away from the monopoly standards defended by Spanish legislation, was structuring for the consolidation of the economic activity in the Buenos Aires’ port. Historiography on the subject focused on the debate about the legality and illegality of these commercial practices and, as a consequence, addressed the practice of the governors, agents of royal power, as elements of repression and combat of what was designated as contraband. The idea of this article is to map the relations between the agents linked to the irregular commerce in Buenos Aires in the middle of the seventeenth century. For this purpose, we collect the relationships compiled in the Proceso Grande, a legal action initiated by the governor Hernandarias de Saavedra aiming to denounce porteño agents involved in irregular commerce. This process generated a hundred pages and described the business practices and the merchants involved in the activity. From this rich documentation, we tried to establish the connections of the commercial network, following the division of the two factions that disputed the commerce. With this, we were able to spatialize the commercial network relations, to break the idea that Hernandarias had fought against smuggling and to smash the dynamics of commercial and family relations of both groups, fundamental elements that structure societies of Ancien Régime.
Keywords: Contraband, Trade, Networks, Connections, Buenos Aires.
"Lo cierto
es que mil hombres y otros
mil arribaron
por un mar que tenía cinco lunas de anchura
y aún estaba poblado de sirenas y endriagos
y de piedras imanes que enloquecen la brújula”
Fonte: Jorge Luis Borges. La fundación
mítica de Buenos Aires (1929)
Pretendemos nesse artigo discutir as redes comerciais e familiares envolvidas no comércio de contrabando no porto de Buenos Aires em meados do século XVII. As arribadas maliciosas, nomenclatura utilizada pelos contemporâneos, correspondiam a um esquema de inserção de escravos africanos em troca da prata de Potosí, apresentando como centro articulador o referido porto1.
A historiografia sobre as relações comerciais em Buenos Aires colonial focou-se no debate entre contrabando e comércio lícito no porto. Propomos, seguindo as reflexões iniciadas por Zacarías Moutoukias em torno das relações comerciais ilícitas, compreender as redes mercantis a partir de suas relações familiares e comerciais. A ideia é romper a visão de que o governador Hernandarias de Saavedra empreendeu uma ação de repressão do contrabando no porto de Buenos Aires. Através do estabelecimento das redes relacionais entre os diversos agentes, procuramos esboçar a formação de duas facções comerciais distintas, que entraram em conflito por conta da disputa em torno do comércio portuário.
O porto de Buenos Aires no século XVII
O porto de Buenos Aires, situado na foz do Rio da Prata, fora fundado em 1538 por Pedro de Mendoza. A ação decorria das explorações que visavam povoar a região meridional da América bem como descobrir minas de prata e ouro. Segundo Eduardo Madero (1892, p. 137), o isolamento da localidade somado aos frequentes ataques de indígenas Querandíes, de família Guarani, resultaram no abandono da localidade em meados de 1541. A presença ibérica nessa região seria consolidada mais acima do rio Paraguai, especificamente na cidade de Assunção, que serviria como ponta de lança para o povoamento na região platina.
A consolidação da presença castelhana na região motivaria Juan de Garay a organizar uma expedição que, saindo de Assunção em 9 de março de 1580, teria como destino o sítio no qual fora fundada anteriormente Buenos Aires. Buscaram, diante das ameaças de ataques de indígenas, um sítio mais defensável, às margens do rio da Prata e na confluência do rio Riachuelo. Assim, no dia 11 de junho de 1580 seria fundada, pela segunda vez, a cidade de Santísima Trinidad junto com o porto (MADERO, 1892, p. 206). Com isso, seria efetivada a ocupação da foz do rio da Prata e permitiria que, anos mais tarde, o porto de Buenos Aires assumisse posição de destaque devido à sua posição estratégica de retaguarda ao acesso das minas de prata do cerro de Potosí.
Anos mais tarde, com a consolidação da produção mineira na cidade de Potosí no Alto Peru inicia-se, na região platina, esforços para construir caminhos que ligassem essa localidade às rotas atlânticas. Inicialmente destacaram-se os esforços da cidade de Assunção, cuja ação de expansão e povoamento teria como objetivo a conexão dessa com o Alto Peru. Intentaram-se caminhos pelo Chaco, inviabilizados pelas sociedades indígenas ali situadas e que tornavam a passagem uma tarefa extremamente perigosa, e posteriormente pelos rios Pilcomayo, Bermejo e Salado, bem como pelo Alto Paraguai. Todos esses rios possuíam o inconveniente de não serem plenamente navegáveis, notadamente quando se aproximavam do altiplano peruano (CANABRAVA, 1984, p. 54).
Na disputa em torno do melhor caminho para atingir as minas de prata, Buenos Aires destacou-se pela sua posição geográfica. Os caminhos por terra que passavam por Santa Fé e Tucumán permitiram uma ligação mais efetiva entre as duas cidades. A localização do porto, junto ao oceano Atlântico fora fator relevante para que Buenos Aires assumisse vantagem em relação à Assunção. Alice Canabrava (1984, p. 58), por sua vez, destaca que a geografia do porto bonaerense levaria ao estabelecimento de rotas de navegações atlânticas, principalmente pelo fato da região meridional da América ter menor presença de corsários do que a região caribenha.
As abordagens que valorizam as conexões entre portugueses e espanhóis são uma temática clássica na historiografia argentina. Ricardo de Lafuente Machaín afirma, em 1931, que “a través de las representaciones y memoriales de los mandatarios españoles, chocará el que se diga que fueron ellos [os portugueses] quienes aseguraran la durabilidad de la ciudad de Garay” (LAFUENTE MACHAÍN, 1931, p. 11).
Alice Canabrava, em tese defendida na Universidade de São Paulo em 1942, representa um trabalho pioneiro no que se refere à temática da História da América no Brasil e suas conexões com as partes meridionais da América portuguesa. Em relação ao comércio do porto de Buenos Aires, a autora defende que, durante o período de União das Coroas ibéricas, o comércio de contrabando se consolidou como principal atividade econômica na região. Afirma que “podemos, portanto, avaliar que por volta de 1584-85, já se iniciara um tráfego regular entre o Brasil e o Rio da Prata e, nessa época, as mercadorias chegadas ao porto de Buenos Aires começavam a penetrar nas províncias de Tucumán” (CANABRAVA, 1984, p. 82).
Em relação às práticas de controle dos descaminhos por parte das autoridades do Império espanhol, Alice Canabrava destaca a atuação de Hernandarias de Saavedra, então governador do Paraguai e Rio da Prata. Sobre ele, aponta que “Hernandarias procurou desligar o porto de seu hinternland, e para isso proibiu o intercâmbio comercial entre as duas cidades [Córdoba e Buenos Aires], reduzindo os meios de transporte para as comunicações entre as ambas, apenas uma carreta para a locomoção de pessoas” (CANABRAVA, 1984, p. 96). No entanto, essas ações de Hernandarias não surgiram efeito, pois todas as iniciativas de restrição do comércio eram ignoradas, seja pelos comerciantes de Buenos Aires como os radicados em Córdoba e Tucumán.
Independente das narrativas dos sucessos e fracassos em reprimir o comércio irregular, o trabalho de Canabrava destaca-se justamente em consolidar a ideia de comércio lícito contra o ilícito e em opor os comerciantes bonaerenses às ações dos governadores, com destaque à figura de Hernandarias. Inclusive justifica a decadência do comércio irregular como fruto das ações dos agentes do Império, seja pelo estabelecimento da alfândega seca de Córdoba em 1623 (CANABRAVA, 1984, p. 167) como pela ruptura dinástica decorrente da Restauração portuguesa em 1640. Sobre esse fenômeno, ignora que o mesmo não teve ação imediata na América como não seguiu a um encerramento dos vínculos comerciais de Buenos Aires.
Zacarías Moutoukias, em meados de 1980, assume uma interpretação distinta em relação às abordagens de Canabrava. O autor aponta que, a partir de 1590, o porto de Buenos Aires adquire posição estratégica em relação ao comércio intercolonial que unia o Rio da Prata com as costas da América portuguesa e com os domínios lusos em África. O contrabando de prata e o tráfico de escravos assumiria posição de destaque na vida econômica e social do porto platino (MOUTOUKIAS, 1988a, p. 214).
A ação de inserção de Buenos Aires no circuito atlântico não seria restrita ao período entre 1580 e 1640, no qual Portugal e Espanha estiveram unidos sob o mesmo monarca. Após a ruptura política de Portugal, em meados de 1650 o comércio atlântico recuperaria seu destaque com a presença massiva de embarcações de bandeira holandesa. Já em 1682, a fundação portuguesa da Colônia de Sacramento, na margem oposta ao porto de Buenos Aires, impulsionaria mais uma vez o comércio inter-regional, seguido de um descenso posterior que marcaria uma crise comercial na região platina (MOUTOUKIAS, 1988a, p. 214).
Rodrigo Ceballos, em tese defendida em 2008, retoma as posições estabelecidas por Moutoukias sobre o comércio regional em Buenos Aires. No tocante às relações comerciais, destaca a importância da presença de portugueses na região, em período que perpassa a união das coroas ibéricas, superando, pois, os referenciais cronológicos estabelecidos por Alice Canabrava. Sobre tal presença afirma que
[...] a multiplicidade de redes de interesses na Buenos Aires seiscentista demonstra que a colonização não partiu unicamente de diretrizes metropolitanas, mas perpassou as próprias práticas locais e extra-locais, confluindo-se aos interesses do Império espanhol e português. Maleabilidade das fronteiras sociais que serve a compreensão da constituição de espaços como Buenos Aires (CEBALLOS, 2008, p. 282).
Retomando à questão comercial do porto, o ponto mais importante desse processo é como a Coroa espanhola lidaria com o comércio ilícito de prata e escravos africanos no porto de Buenos Aires. Moutoukias, por sua vez, assinala que tal relação seria flutuante, pois, ao mesmo tempo que caberia à monarquia controlar a tributação de sua maior riqueza, por outro lado era fundamental que houvesse uma guarnição militar que protegesse o acesso platino às minas de Potosí. Assim, o comércio ilícito acabaria por efetivar o povoamento do Rio da Prata e também financiar a defesa do porto (MOUTOUKIAS, 1988a, p. 215).
A partir dessa observação, para o autor torna-se inócuo o esforço em distinguir o comércio ilegal do legal no porto. A presença de governadores, oficiais reais, funcionários da Audiência de Charcas, de militares, de comerciantes e terratenientes locais no comércio clandestino nos leva a problematizar a natureza dessa prática. Moutoukias (1988a, p. 219) afirma que
[...] en el caso del Río de la Plata durante el siglo XVII la ‘corrupción’ - en tanto fenómeno masivo - consistió fundamentalmente en la infracción regular de un repertorio fijo de normas que limitaban la integración de los representantes de la Corona en la oligarquía local, es decir, en la participación de sus actividades económicas.
Com isso, a utilização do termo corrupção deve ser evitado devido ao fato de estar “cargado de anacrónicas connotaciones delictivas” (MOUTOUKIAS, 1988a, p. 219).
A presença de membros das elites locais de Buenos Aires, bem como de funcionários régios no comércio portuário nos leva a problematizar sua atuação. Como nos disse Moutoukias, a questão não pode ser respondida na chave de legalidade ou ilegalidade, mas na atuação dinâmica desses agentes. Partindo desse contexto, torna-se necessário que realizemos uma discussão em torno de tais conceitos que correspondem às práticas de comércio ilícito.
A partir da interpretação de Moutoukias, se consolidam análises centradas no comércio platino como dinâmica e cujo foco supera o debate entre lícito e ilícito. Destacamos o trabalho de Jorge Gelman, Economía natural–economía monetária: los grupos dirigentes de Buenos Aires a princípios del siglo XVII (1987) e, mais recentemente, o de Rodolfo González Lebrero, La pequeña aldea: sociedad y economía en Buenos Aires (1580-1640) (2002) e Macarena Perusset, com suas obras Élite y comercio en el temprano siglo XVII rio-platense (2005) e Conductas y procedimientos fuera de la ley: comercio ilícito, líderes y prácticas (2007).
E, como desenvolvimento dessa historiografia, apontamos uma interessante produção sobre crédito em Buenos Aires, com destaque a sua estrutura e seus agentes. Trabalhos como de Martín Wasserman, Circuitos sociales, contextos normativos y crédito: Buenos Aires, siglo XVII (2013) e Diseño institucional, prácticas y crédito notarial en Buenos Aires durante la primera mitad del siglo XVII (2014) do mesmo autor.
Para um período posterior à nossa pesquisa, sublinhamos a tese de doutoramento de Fernando Jumar, Le commerce atlantique au Río de la Plata: (1680-1778) (2000) e a tese de Carlos María Birocco, La elite de poder en Buenos Aires colonial, cabildo y cabildantes entre los Habsburgos y los Borbones (1690-1726) (2015).
Comércio ilícito: debate sobre o contrabando
O debate sobre as relações entre Estado moderno espanhol e os descaminhos tem na obra de John Leddy Phelan um marco inicial. Em The Kingdom of Quito in the Seventeenth century: bureaucratic politics in the Spanish Empire, de 1967, destaca que o Império espanhol pode ser caracterizado como carismático, feudal, patrimonial e legal, em uma combinação que torna essa unidade política única no seu tempo (PHELAN, 1967, p. 326). Essa interpretação, modelada a partir das interpretações de categorias estabelecidas por Max Weber, foi concebida na tensão entre estrutura legal e prática cotidiana, marcante não somente no Império espanhol como na Europa ocidental à época.
A corrupção, segundo Phelan (1967, p. 329), decorria dos baixos salários que se pagavam aos funcionários nos vários níveis da administração, o que tornaria impossível qualquer política de combate aos descaminhos. A linha de interpretação do autor foca ainda que essa prática correspondeu não somente às ações pontuais, mas que assumiria no Império espanhol características estruturais na administração colonial.
Jaime Vicens Vives, em oposição às interpretações de Phelan, apresenta os atos ilícitos de forma mais orgânica focando no funcionamento prático das estruturas do Império espanhol. Afirma que “si en España arraigó la corrupción fue porque, pese a la actitud moralizante de la Corona y a sus reiteradas declaraciones contrarias a toda práctica corrupta, la administración tenía que hacer funcionar el mecanismo del comercio americano a pesar de las leyes” (VICENS VIVES, 1968, p. 138).
Horst Pietschmann, em Burocracia y corrupción en hispanoamérica colonial: una aproximación tentativa, de 1982, discute a natureza orgânica do descaminho na construção da burocracia colonial. Destaca a participação da Coroa nas ações, nomeadamente ao vender ofícios, o que teria potencializado a corrupção dos funcionários em meados do século XVII (1982, p. 23). Assim, durante o reinado de Felipe II e, em maior medida, sob Carlos II, iniciaram os beneficios de empleos, que seriam, segundo o autor, “el sistema de conferir cargos, títulos y gracias contra pago previo en efectivo”. Esse pagamento “se consideró como un mérito contraído con la corona y así se justificó el nombramiento” (PIETSCHMANN, 1982, p. 23).
A partir da prática da venalidade (TOMÁS Y VALIENTE, 1972) o benefício dos cargos por parte das elites locais e regionais potencializaram de forma considerável a corrupção, convertendo os ofícios públicos em uma espécie de mercadoria como outra qualquer ou um investimento de tipo comercial. Contudo, para Pietschmann, esse mesmo mecanismo seria responsável pelo aumento de arrecadação por parte da Coroa, justamente com os valores utilizados para a compra desses mesmos cargos (PIETSCHMANN, 1982, p. 25). De forma a complementar a posição defendida por Phelan, Pietschmann (1982, p. 31) destaca que “la corrupción en América ha tenido carácter de sistema y habrá que explicarla en términos de una tensión más o menos permanente entre el estado español, la burocracia colonial y la sociedad colonial”.
No bojo desse debate e refletindo a partir do contexto do comércio de Buenos Aires no século XVII, Zacarías Moutoukias em Contrabando y control colonial en el siglo XVII: Buenos Aires, el Atlántico y el espacio peruano, de 1988, introduz a problemática da participação de grupos comerciais nas práticas ilícitas. Afirma, sobre o comércio platino, que
[...] el gobernador Hernandarias fue particularmente prolífico en las denuncias de que ese contrabando y de la corrupción de los oficiales de la Real Hacienda que lo facilitaban. Pero, por un lado, sus acusaciones estaban vinculadas al partido que tomaba en las luchas por controlar la actividad comercial, y, por el otro, los funcionarios contabilizan cuidadosamente los delitos - la entrada de mercancías - que se les imputava, al menos una parte de éstos (MOUTOUKIAS, 1988b, p. 65).
Esse cenário de disputa é melhor compreendido se tomarmos em conta as cifras que envolviam o comércio em Buenos Aires. A partir dos Registros estadísticos de Buenos Aires, compilados por Ricardo Trelles, Moutoukias (1988b, p. 65) contabiliza a entrada de 12.733 escravos africanos no porto entre 1586 e 1645, sendo que somente 6.000 estavam autorizados pela Coroa.
Assim, a participação dos governadores, e demais funcionários régios que deveriam coibir as práticas ilegais no porto, evidencia uma realidade de conflito entre grupos econômicos. Moutoukias (1988b, p. 71) aponta os conflitos entre Hernandarias, então governador do Rio da Prata e Buenos Aires, por volta do início do século XVII, a partir de duas hipóteses: a defesa da elite local de interesses da produção local ou a luta entre grupos de comerciantes em torno do acesso ao contrabando.
Somemos esses conflitos à autorização dada pela Coroa de que alguns navios aportassem em Buenos Aires e realizassem comércio regional com as partes do Brasil. Seriam esses os denominados navíos de registro, que teriam como objetivo a manutenção da cidade de Buenos Aires, o financiamento de gastos militares e, portanto, a garantia da defesa militar do Rio da Prata, importante rota de acesso às minas de prata do Alto Peru (MOUTOUKIAS, 1988b, p. 74).
A partir desse contexto, Moutoukias problematiza a concepção de contrabando, tão frequente no debate historiográfico sobre as atividades comerciais ilícitas. Afirma que a defesa do Atlântico meridional era preocupação constante da Coroa e tais atividades portuárias seriam uma forma de garanti-la, seja pelo custeio do aparato militar como pela fixação de população espanhola na cidade de Buenos Aires. Dessa forma,
Buenos Aires atraía una corriente de mercaderes españoles y - sobre todo - extranjeros por las posibilidades que ofrecía de ‘morder’, por detrás, una parte de la plata altoperuana. Lo que permitió a la Corona responder a sus necesidades en el Río de la Plata por medio de los Navíos de Registro, cuyas licencias resultaban atractivas a los comerciantes y armadores (MOUTOUKIAS, 1988b, p. 94).
Assim, “el aparato burocrático-militar local - el Estado - sólo podía subsistir estimulando el drenaje hacia el Río de la Plata de una parte de la producción minera” (MOUTOUKIAS, 1988b, p. 94).
Com essa contribuição formulada por Moutoukias podemos compreender de forma mais efetiva as aparentes posturas contraditórias por parte da Coroa, que assumia, dependendo do contexto, medidas de tolerância com o comércio ilícito, seguida de ações de combate e centralização do monopólio régio. Cabe, portanto, apontarmos que o conceito de contrabando se torna, pois, insuficiente para caracterizar toda a complexidade do comércio ilícito na região platina. Seu caráter de normalidade e regularidade, apesar de contrariar normativas legais, denota que o foco para compreender o fenômeno não se encontra no debate em torno do autorizado ou do não autorizado, mas sim das relações conflitivas entre os grupos de mercadores, por um lado, e dos funcionários, por outro.
Atividade portuária de Buenos Aires: comércio legal e as arribadas
Em 1615 Hernando Arias de Saavedra foi eleito governador do Rio da Prata e Paraguai pela quarta vez. Sucedeu a Diego Marín Negrón, quem havia incentivado o comércio platino com o Brasil e a entrada de escravos pelo porto de Buenos Aires (AGN, Época Colonial, t. 1, p. 102).
De acordo com Raúl Molina (1948, p. 180), o “contrabando ejemplar” que realizou o governador Marín Negrón foi combatido de forma enérgica por Hernandarias logo no início de sua administração. Assim, no início de 1615 o novo governador estabeleceu uma investigação com o intento de reprimir a atividade comercial ilegal no porto de Buenos Aires. O procedimento seria finalizado em 1618, logo ao final de seu governo, e teria como resultado condenações pontuais e a reabertura do referido porto ao comércio regional. Diego de Góngora, nomeado governador em 17 de novembro do mesmo ano, protegeria novamente o comércio irregular, associando-se a Simón de Valdez, principal articulador das redes mercantis de Buenos Aires (MOLINA, 1948, p. 221).
Para o período entre 1650 e 1700, Lutgardo García Fuentes (1980, p. 171-172) aponta que aportaram em Buenos Aires 13 navios autorizados para o comércio com a cidade. Esses continham, além dos produtos registrados, escravos africanos não contabilizados. Somam-se a esses 124 navios, entre espanhóis e estrangeiros, que comerciavam com Buenos Aires fora do sistema de autorização. Desses, 62 embarcações (50%) eram holandesas, 30 (24,2%) portuguesas, espanholas 13 (20,5%), 12 (9,64%) inglesas e 7 (5,64%) francesas. Desse total de 124 navios, ao menos 38 eram exclusivamente de comércio negreiro (MOUTOUKIAS, 1988b, 126).
Tal prática comercial recebeu o nome de arribadas maliciosas, designação que consideramos mais apropriada do que o contrabando ejemplar conceituado por Molina. Suas origens remontam a uma interpretação da Real Cédula de 1582, na qual autorizava que portos americanos fossem supridos com produtos regionais visando garantir sua sobrevivência econômica e, consequentemente, efetivar a presença espanhola no território (RECOPILACIÓN DE LEYES DE INDIAS, 1974, libro IX, título XXXVIII, ley V, fol. 91v.).
A partir dessa interpretação consuetudinária da Real Cédula funcionaria o esquema das arribadas. Moutoukias (1988b, p. 102) descreve que
[...] una vez llegada la embarcación y obtenida la autorización de estadía, permitida por las leyes para efectuar reparaciones, vendían de contrabando una pequeña parte de su carga. Lo cual, al ser denunciado, daba lugar al comiso del navío. Vendida en almoneda pública, la carga era comprada por comerciantes asociados al responsable del cargamento en la embarcación (capitán, armador o subcargo) o recuperada por éste.
Mesmo com o pagamento da mercadoria nos pregões públicos e com a divisão de comissões para todos os agentes envolvidos, o esquema comercial continuava lucrativo. A explicação para isso encontra-se nos produtos comercializados no porto. Embora os registros de navios constem couro e gêneros alimentícios, o que movimentava o esquema eram produtos extremamente lucrativos no comércio platino: prata e escravos africanos (MOUTOUKIAS, 1988b, p. 106).
Logo ao início de seu governo, Hernandarias realiza uma investigação sobre o comércio bonaerense que duraria quatro anos e geraria uma documentação volumosa a partir da coleta de depoimentos dos investigados. Gaspar García Viñas, copista da Biblioteca Nacional da Argentina, compilou, junto ao Archivo General de Indias, documentos sobre a questão2. Na sua publicação, no tomo 197, os manuscritos sobre o processo correspondem aos documentos numerados de 4321 ao 4352, datados entre 9 de fevereiro de 1615 e 19 de março de 1618.
Esse processo, composto de 30 documentos, nomeado pelos seus contemporâneos como Proceso Grande, tiveram seus dados organizados por Raúl Molina e seriam parte fundamental do Diccionario biográfico de Buenos Aires: 1580-1720. Através dessa obra pudemos observar as trajetórias dos indivíduos investigados, bem como sua filiação aos grupos econômicos da cidade, sua vinculação pessoal e familiar.
Os bandos: confederados e beneméritos
Ao observamos os participantes do referido Proceso, verificamos a presença de dois grupos distintos: os confederados e os beneméritos. Esses, segundo nomeação que os próprios agentes utilizaram em seus depoimentos, representam os principais bandos nas tensões envolvendo o comércio no porto de Buenos Aires.
A definição de bando foi objeto de reflexão no artigo de Raquel Sánchez Ibáñez sobre os grupos da cidade de Múrcia durante o século XVII. Afirma a autora que
[...] los bandos de época bajomedieval y moderna aún cuando se desenvolvieron en contextos distintos tenían en común una estructura de carácter jerárquico. Una jerarquía que ordenaba las relaciones sociales y de parentesco que vinculaban a los componentes del bando así como la satisfacción de intereses recíprocos (SÁNCHEZ IBÁÑEZ, 2010, p. 172).
Assim, segundo Sánchez Ibáñez (2010, p. 173), a estruturação dos bandos passa por estratégias de controle social em planos locais e regionais, tendo as relações familiares como ponto central de articulação entre os grupos. E, por conta dessas características, o termo “bando” torna-se mais efetivo do que “alianças” ou “grupos de interesses”, justamente por conta dessa vinculação mais estruturada em redes pessoais do que por acordos de ocasião.
No contexto da cidade de Buenos Aires em meados do século XVII, observamos a preponderância de bandos com relações estruturadas a partir de vínculos familiares (HERNÁNDEZ FRANCO; MONTOJO MONTOJO, 1993). O partido dos confederados era composto pelos defensores do comércio através das arribadas maliciosas. Já os beneméritos eram aqueles que, em torno da figura do governador Hernandarias de Saavedra, figuraram no processo como denunciantes das ditas práticas irregulares.
Esse primeiro bando era liderado por Juan de Vergara, Diego de Vega, Simón de Valdez e Diego López de Lisboa. Raúl Molina, em seu Dicionario biográfico de Buenos Aires: 1580-1720 apresenta, a partir dos depoimentos coletados no Proceso Grande, elementos da trajetória da vida das principais personagens da cidade de Buenos Aires.
Afirma que Juan de Vergara, nascido em Sevilha em 1564, passou à América quando jovem, vivendo em Cuzco, Potosí, Tucumán e, finalmente, no porto de Buenos Aires. Em 4 de maio de 1609 foi nomeado pelo então governador, Hernandarias de Saavedra, seu tenente. Juntamente com o tesoureiro Simón de Valdez e Diego de Vega, em tempos do governo de dom Diego Marín Negrón, dedicou-se ao comércio irregular. A tentativa frustrada de punição por parte de Hernandarias explica ao início das tensões entre o governador criollo e o bando de comerciantes bonaerenses (MOLINA, 2000, p. 775).
O governador Diego de Góngora buscou reprimir o comércio irregular em Buenos Aires, porém, logo foi substituído por Francisco de Céspedes, quem assume posição mais tolerante com os referidos comerciantes. O novo mandato de Hernandarias junto à governação, conjuntamente com o desenvolvimento do comércio irregular, é chave para compreendermos as dimensões que o Proceso Grande adquire junto à vida cotidiana de Buenos Aires (MOLINA, 2000, p. 776).
Diego de Vega, português da ilha da Madeira, transfere-se à cidade de Buenos Aires em 12 de dezembro de 15902. Suas relações com demais comerciantes lusos nas partes do Brasil levam-no a atuar no comércio de grosso trato na região do rio da Prata. Em 1610 registra a solicitação de vecino em Buenos Aires, pedido que foi prontamente questionado por Francisco Navarro devido às origens portuguesas de Vega (MOLINA, 2000, p. 760).
Em decorrência das permissões de comércio de 1615, assume posição de principal comerciante na cidade, encontrando oposição de Hernandarias em seus sucessivos mandatos. No processo iniciado em 1615, Diego de Vega declara-se pertencente ao bando confederado e
[...] mercader portugués que favorece, ayuda y apoya a los demás que trajinan, el cual ha venido ha treinta años, que trata y contrata en este puerto y tiene correspondientes en Flandes, Portugal, Brasil y el Perú, que es compadre del dicho justicia mayor, Mateo Leal de Ayala, y amigo íntimo y compañero del dicho tesorero (Simón de Valdez), y reside en este dicho puerto con su mujer y familia (MOLINA, 2000, p. 761).
Simón de Valdez, por sua vez, havia nascido nas ilhas Canárias. Muito jovem havia passado à cidade de Havana e depois ao México. Em 29 de julho de 1605 foi nomeado tesoureiro do governador do Paraguai e Rio da Prata, assumindo seu posto em 13 de fevereiro de 1606.
Quando o novo governador Diego Marín de Negrón assume seu posto, em 1609, estabelece uma sociedade com Juan de Vergara e Diego de Vega para operar o comércio de grosso trato no porto de Buenos Aires. Com a chegada de Hernandarias em 1615 é preso em 29 de maio do mesmo ano. Quando Diego Marín Negrón ocupa o governo, trata de livrar Valdez da prisão, retomando com esse a sociedade comercial.
A partir dessa nova fase comercial, Valdez empreende uma viagem à cidade de Potosí em dezembro de 1618, com o objetivo de comerciar seus produtos no altiplano peruano. Dessa operação consegue atingir o lucro de sessenta mil pesos. Meses mais tarde intenta uma viagem de Tucumán ao Chile, cruzando as cordilheiras. Nesse esforço acaba por falecer em 1619 (MOLINA, 2000, p. 750).
O último membro que coordenou o bando dos confederados foi Diego López de Lisboa. Nascido em Lisboa em 1570, decide emigrar de Portugal ao Novo Mundo em decorrências das perseguições sofridas contra cristãos novos na península ibérica. Ao realizar escala na ilha da Madeira, encontra com seu parente Diego de Vega, e decide, com ele, transferir-se para a cidade de Buenos Aires (MOLINA, 2000, p. 417).
Chega ao rio da Prata em 1594 e estabelece-se com sua família na cidade de Córdoba. Entre 1607 e 1609 realiza uma viagem comercial à Lisboa e à ilha da Madeira. De regresso à Córdoba assume cargos de destaque junto ao cabildo, sendo eleito regidor, tenedor de bienes de difuntos e encarregado de redigir as correspondências do corpo capitular da cidade.
A inserção de López de Lisboa no comércio terrestre entre Buenos Aires e Potosí articula o eixo via cidade de Córdoba. Com essa estrutura, organiza o comércio de escravos africanos, articulando o comércio de África com Potosí, sendo Buenos Aires o porto de entrada desse lucrativo comércio (MOLINA, 2000, p. 418).
Já o bando dos beneméritos foi composto por Hernandarias, Cristóbal de Remón, Cristóbal Naharro Carrasco, Pedro Gutiérrez entre outros. O primeiro, foi repetida vezes governador do Paraguai e Rio da Prata. De acordo com Zacarías Moutoukias, ele foi profícuo em realizar denúncias contra comerciantes que realizavam contrabando no porto do Buenos Aires. Contudo, como mesmo aponta, essas acusações estavam vinculadas “al partido que tomaba en las luchas por controlar la actividad comercial” (MOUTOUKIAS, 1988b, p. 65). No esforço de buscar compreender as motivações que levaram o governador a combater o comércio irregular, Moutoukias (1988b, p. 71) esboça as seguintes hipóteses: defesa da produção econômica local do Paraguai frente ao comércio com Buenos Aires; conflitos entre grupos de comerciantes; preocupação em limitar o contrabando; ou os três fatores de forma conjugada. De qualquer forma, a compreensão do fenômeno comercial do porto de Buenos Aires passa por superarmos as interpretações restritas às ações de líderes e focarmos nas dinâmicas sociais dos agentes envolvidos.
Nessa perspectiva, os três agentes platinos que foram aliados de Hernandarias nos permitem visualizar melhor a questão. Cristóbal de Remón, segundo Raúl Molina, nascido em Alcalá de Henares, passou para Buenos Aires em 1605, realizando uma escala em Lisboa. Na nova cidade, comprou o ofício de escrivão do cabildo em 1606, pagando por esse a soma de dois mil e novecentos pesos correntes.
Em 1609 é desterrado ao Brasil, condenado por prática de concubinato. A sentença de 12 de maio desse ano reporta que Remón vivia com uma mulher negra. Anos depois retorna a Buenos Aires e consegue, através da aliança com o governador Hernandarias, perseguir seus denunciantes e retomar seus cargos (MOLINA, 2000, p. 608).
Cristóbal Naharro Carrasco, nascido em Antequera, na região de Málaga, entre 1562 e 1565, passou a Buenos Aires em 1583. Nessa cidade assumiu os cargos de regidor, alcalde de segundo voto, alcalde de hermandad e mayordomo de propios. Recebeu concessões de terra, otorgadas por Hernandarias, às margens do rio Riachuelo em 21 de abril de 1618.
Associou-se a seu genro, Cristóbal de Remón no esforço desse em retomar seus cargos. Por conta dessa aliança, tornou-se inimigo de Juan de Vergara e, por conseguinte, do bando confederado. Viajou inúmeras vezes ao Alto Peru para, junto à Audiência de Charcas, defender seu parente das denúncias. Por conta dessa viagem, perdeu muitos recursos por ter de abandonar o comércio irregular no porto de Buenos Aires (MOLINA, 2000, p. 511).
Pedro Gutiérrez, de acordo com Molina, nasceu em 1577 em Castilla. Viajou a Buenos Aires em 5 de janeiro de 1599 em companhia do governador Rodríguez de Valdez y de la Banda. Na cidade desempenhou importantes cargos públicos, como oficial real de los oficios de contador interino e de tesoureiro. Foi regidor de cabildo, alférez real, procurador de la ciudad, alcalde ordinario de primer voto e alcalde de hermandad.
Desempenhou a função de tenente do governador Hernandarias entre 17 de julho de 1615 e início de 1618. Durante o Proceso Grande atuou como juiz substituto. Assume, portanto, importante papel de aliado ao governador criollo e destacado membro do bando dos beneméritos (MOLINA, 2000, p. 337).
Tais bandos estruturam redes comerciais e de crédito. De acordo com Martín Wasserman (2013, p. 72), as redes de parentesco e os contratos notariais foram fundamentais para o desenvolvimento mercantil de Buenos Aires. Em uma sociedade sem a presença de moeda metálica, o crédito, pago em prata ou produtos agrícolas, foi decisivo para a construção da economia do circuito platino.
Redes e conexões
Com o objetivo de verificar as dinâmicas de articulação dos referidos bandos, buscamos uma outra interpretação sobre as elites envolvidas no comércio em Buenos Aires. Ao invés de focarmos na descrição das trajetórias dos indivíduos, optamos em destacar as relações entre os agentes, buscando nos eixos uma chave para aprofundarmos a compreensão da questão.
Através das biografias compiladas por Raúl Moreno a partir dos depoimentos dos envolvidos no Proceso Grande, estabelecemos as conexões entre os agentes de ambos os bandos. Focamos, a partir desses eixos, duas redes: uma que denominamos comercial e a outra, familiar. Essa rede compreende as relações entre os agentes no que se refere às atividades mercantis, enquanto que a familiar trata dos vínculos de parentesco, fundamentais nas sociedades de Antigo Regime.
Para compormos as redes de conexões utilizamos o software de manipulação de grafos Giphy (BASTIAN, 2009, p. 361). Através dele estabelecemos 3 gráficos, sendo o primeiro uma visão geral de todas as conexões entre os agentes comerciais de Buenos Aires envolvidos no processo finalizado em 1618, o segundo as relações mercantis de tais personagens e o terceiro as relações de parentesco envolvendo os agentes mencionados.



A partir dos gráficos acima e na análise das relações entre os mercadores de Buenos Aires de forma sistêmica podemos tecer algumas considerações. Inicialmente, no Gráfico 2, representando as redes comerciais, notamos que do bando dos beneméritos compõe 4 eixos, centrados na figura de Hernandarias de Saavedra, os confederados, por sua vez, representam uma rede mais consolidada com 14 eixos. De forma secundária, verificamos um eixo híbrido entre os dois grupos, ligando Sebastián de Orduña y Mondragón e Miguel de Rivadeneyra.
Para os confederados, notamos que o principal polígono de articulação encontra-se ligando Juan de Vergara, Simón de Valdez e Diego de Vega. Esses correspondem aos principais sócios das arribadas de Buenos Aires. Notamos que, em torno da figura de Vergara associam-se 11 vetores de relações profissionais, enquanto de Valdez conectam-se 5 indivíduos. Assim, a centralidade das relações profissionais reside nas duas personagens citadas e o esquema de sociedade do comércio irregular opera-se pelos três agentes cujas relações formam um polígono.
Associado a Juan de Vergara encontramos a presença de Juan Bautista Ángel. Esse, embora não seja tratado pela historiografia com o devido destaque, atuava como álibi para o comércio irregular no porto. Através da licença que recebera para exportar couro, utilizava dessa autorização para, de forma encoberta, operar o esquema de Vergara e seus sócios de comércio de escravos e prata (MOLINA, 2000, p. 101). Sua participação no esquema fora consolidada quando, em 8 de fevereiro de 1619, através de recursos oferecidos por Vergara, adquire o cargo de regidor perpetuo de sexto voto no cabildo de Buenos Aires, atuando, pois, como agente dos comerciantes nos assuntos da municipalidade.
Para o bando dos beneméritos o cenário é bem distinto. A rede é bem menos consistente e, de Hernandarias conectam-se apenas 4 vetores de relações comerciais. Essa situação pode explicar as dificuldades de combate às atividades comerciais no porto, visto que enquanto os confederados estavam articulados em redes mercantis, os beneméritos estavam ligados somente à figura de Hernandarias, que, além de não ter raízes na sociedade bonaerense, encontrava-se na cidade para executar ações enquanto governador, isto é, como um agente externo às redes locais.
No entanto, a compreensão das redes comerciais nos apresenta um cenário parcial das relações entre os bandos citados. Na análise das redes familiares podemos aprofundar as dinâmicas entre as personagens e suas relações. Isso porque nas sociedades da Idade Moderna os casamentos operavam, na maioria das vezes, como consolidação das sociedades de cunho comercial, relacionando, mais uma vez, as redes familiares e as redes profissionais.
No Gráfico 3, que representa as redes familiares, notamos que o bando dos beneméritos apresenta 3 eixos; o dos confederados 14 e um vetor marca a relação entre os distintos grupos.
Para os confederados, verificamos a centralidade em torno da figura de Juan de Vergara, com 3 eixos de parentesco. Destes destacam-se Diego de Trigueros y Caro, sogro de Vergara (MOLINA, 2000, p. 742); Juan Tapia de Vargas, cujo casamento teve Diego de Góngora, don Francés e Beaumont y Navarra e Juan de Vergara como padrinhos (MOLINA, 2000, p. 730), Juan de Brancamonte, cuja mãe casaria em segundas núpcias com Vergara (MOLINA, 2000, p. 119) e Diego López de Lisboa, português que viera a Buenos Aires junto com Juan de Vergara, o qual recebeu proteção desse e mencionou, durante os depoimentos do Proceso Grande, que o mesmo era “su pariente” (MOLINA, 2000, p. 717).
Lisboa, por sua vez, atuou como principal operador dos negócios dos comerciantes de Buenos Aires, sendo o responsável pelas articulações do porto com o interior da América, principalmente a cidade de Potosí (MOLINA, 2000, p. 418). Anos mais tarde, em meados de 1621, seu filho, Antonio de León Pinelo, atuaria como abogado no Superior Consejo de Indias e, em 1627, seria nomeado oidor da Casa de Contratación de Sevilla (MOLINA, 2000, p. 418). Em ambas instituições teria importante atuação na defesa dos interesses dos comerciantes do porto de Buenos Aires.
Para o bando dos beneméritos, as relações de natureza familiares articulam-se em torno de 3 eixos, em nenhum relacionado com Hernandarias. Isso explicita, mais uma vez, a falta de inserção do governador nas articulações locais, seu isolamento e sua dependência de uma rede pouco articulada.
Podemos destacar, para esses grupos, relações próximas de parentesco. Cristóbal de Remón foi genro de Cristóbal de Naharro (MOLINA, 2000, p. 608), Pedro Gutiérrez e Cristóbal de Naharro, genros de Juan Nieto Humanes Molina (MOLINA, 2000, p. 520) e Francisco Bernal y de la Banda, por sua vez, foi sogro de Nicolás de Ocampo y Saavedra (MOLINA, 2000, p. 111).
Em relação à rede dos beneméritos podemos observar alguns padrões recorrentes. Cristóbal Naharro Carrasco ocuparia o cargo de regidor do cabildo de Buenos Aires em 1587, 1588, 1590 (ACBA, I, p. 56), 1591, 1607 (ACBA, I, p. 296) e 1610 (ACBA, II, p. 103); alcalde de segundo voto em 1617 (ACBA, III, p. 274), alcalde de hermandad em 1610 (ACBA, II, p. 103) e mayordomo de propios em 1611 (ACBA, II, p. 194). Pedro Guitiérrez exerceu os cargos de contador interino e tesoureiro, além de atuar como regidor de cabildo em 1606 (ACBA, I, p. 175), 1609 (ACBA, I, p. 296) e 1612 (ACBA, II, p. 257), procurador de la ciudad em 1611 (ACBA, II, p. 194), alcalde ordinario de primer voto em 1629 e 1634 e alcalde de hermandad em 1607 (ACBA, I, p. 296). Juan Nieto de Humanes Molina atuaria como regidor em 1598, 1604, 1606 (ACBA, I, p. 175), 1608 (ACBA, I, p. 462), 1611 (ACBA, II, p. 194) e 1618 (ACBA, III, p. 357) e alcalde segundo voto em 1616 (ACBA, III, p. 169). Francisco Bernal y de la Banda também ocuparia cargos na administração local de Buenos Aires, sendo regidor de primer voto e alférez em 1589 e 1590 (ACBA, I, p. 56) e almotacén em 1607 (ACBA, I, p. 296).
Verificamos, pois, que os beneméritos eram um grupo com inserção no poder local da cidade de Buenos Aires. Com a introdução da venalidade por parte da Coroa, a elite comercial, notadamente ligada aos comerciantes das arribadas, centrados em Juan de Vergara, Simón Valdez e Diego de Vega, começaram a comprar cargos no cabildo bonaerense, entrando em conflito com a tradicional elite capitular.
Cristóbal Jiménez do bando dos beneméritos, casa-se com Justina de Aguilar y Ayala, filha legítima de Mateo Leal de Ayala, do grupo dos confederados. Esse primeiro ocuparia vários cargos no cabildo de Buenos Aires, como alcalde ordinario e regidor em 1619 (ACBA, III, p. 488). Inclusive quando ocupava a função de regidor no cabildo, protesta publicamente contra as indicações de Juan de Vergara, quem compraria vários cargos de regidores perpetuos no referido cabildo (CABILDO DEL 28 DE ENERO DE 1616, liv. III, 1887, p. 506-507).
Tal protesto nos permite compreender melhor as motivações das tensões entre os dois grupos em Buenos Aires e a posição de aliança do bando denominado benemérito com o governador criollo Hernandarias de Saavedra. A manutenção de suas posições como elite capitular estaria ameaçada pela ascensão do setor comercial, com destaque aos agentes das atividades comerciais irregulares.
A fim de evidenciarmos a importância das redes comerciais e familiares na dinâmica da sociedade colonial de Buenos Aires, destacamos o caso de Juan Pérez de Godoy. Esse vecino, ligado ao bando dos confederados, seria o responsável por entregar os nomes dos envolvidos no esquema das arribadas, delação que levaria ao Proceso Grande de 1615 e 1618. Declara que o motivo de romper as redes de seu grupo e entregá-los ao governador Hernandarias de Saavedra seria, nas palavras de Pérez de Goody, conflitos envolvendo “dares y tomares” entre ele, Simón de Valdez e Juan de Vergara. No dia 5 de junho de 1615 declara que soube que Juan Andrés de León e Simón de Valdez estavam na casa de Vergara operando o contrabando e, ao solicitar que participasse, não lhe deixaram entrar, “dandole con la puerta en las narices” (BNA, CGCGGV, 4382).
Declara que “aguardó en la esquina y vio cómo pasaban la plata de una casa a la otra en canastras a cuestas de negros, y que al reclamar su comisión en calidad de corredor de lonja, lo único que recibió fueron insultos y atropellos contra su persona con grande escándalo, en que intervino, hasta el gobernador, pero sin ningún beneficio para él” (BNA, CCGGV, 4382). Como resposta, o governador Hernandarias condena Pérez de Godoy à prisão e, logo após, aplica a punição de desterro perpétuo da cidade e multa de duzentos pesos. Sua esposa, dona María, acaba por casar-se em segundas núpcias com Amador Báez de Alpoin, importante agente comercial de Hernandarias nas atividades de arribadas e destacando membro do grupo dos beneméritos (MOLINA, 2000, p. 570).
Cabe destacar que, segundo as Siete Partidas, traição “es uno de los mayores yerros et denuestos en que los homes pueden caer” (PARTIDA SÉPTIMA, Tít. II). A pena imputada corresponde ao desterro, de acordo com o mesmo corpus jurídico, a punição mais severa que pode ser concedida a alguém, somente abaixo da pena de morte (PARTIDA SÉPTIMA, Tít. XXXI, ley IV).
Essa situação demonstra a importância das redes nas dinâmicas locais e regionais. O indivíduo que rompe essa lógica e entrega ao grupo inimigo seus aliados, acaba por sofrer a punição mais severa de todos os envolvidos no processo de investigação sobre o comércio irregular. Mesmo agindo favoravelmente ao governador criollo, esse pune Pérez Godoy justamente por cometer um crime gravíssimo à época: a traição de suas redes pessoais. A punição foi tão extrema que sua esposa acaba por casar com Amador Báez de Alpoin, ligado justamente ao grupo que ele traíra. Embora estivesse vivo quando tal matrimônio ocorrera, Pérez Godoy estava exilado e representava para a comunidade de Buenos Aires como se estivesse falecido socialmente.
Tal cenário apresentado pelos grifos corrobora com as interpretações de Macarena Perusset sobre as dinâmicas sociais de Buenos Aires no século XVII. Apresenta que, a partir de 1602, iniciou-se um processo de chegada ao porto de indivíduos ligados a atividades comerciais, com destaque a portugueses e cristãos-novos fugindo da Inquisição na península ibérica. Esses, que formariam o bando dos “confederados”, entraram em disputa com o setor já estabelecido na cidade e que detinha o controle do cabildo portenho (PERUSSET, 2014, p. 293).
Os novos indivíduos lograram controlar a atividade mercantil em escala regional, conectando Potosí, Assunção e partes do Brasil e África tendo como eixo o porto de Buenos Aires. Isso porque eram “poseedores de grandes capitales, contactos e influencias, manejaban los segmentos más importantes de las principales rutas comerciales. Tenían la capacidad, la experiencia, el crédito y los contactos necesarios para desempeñarse también como financistas, prestando dinero efectivo u otorgando créditos” (PERUSSET, 2014, p. 293).
Logo, ao consolidarem sua presença em Buenos Aires, os confederados não tardaram em entrar em conflito com os setores tradicionais, isto é, dos beneméritos. Esses, compostos por encomenderos e comerciantes empobrecidos, contraíram dívidas com os confederados, sendo incorporados posteriormente a ao novo bando (PERUSSET, 2014, p. 298). De forma paralela, os confederados lograram o controle político do cabildo através da compra de cargos, situação que levaria ao conflito detalhado pelo Proceso Grande que analisamos.
Considerações finais
Através da compreensão esquemática das relações sociais entre os bandos podemos inferir alguns aspectos sobre as dinâmicas sociais, políticas e econômicas no porto de Buenos Aires em meados do século XVII. A primeira questão é superar a interpretação do comércio portuário na chave do contrabando, ou seja, na separação entre comércio lícito e ilícito. Também procurados aprofundar a compreensão do papel exercido por Hernandarias de Saavedra, visto pela historiografia como representante da legalidade e combatente exemplar do contrabando na região.
Ultrapassando a análise focada na trajetória de indivíduos, buscamos focar nas relações entre as personagens. Assim, os dois bandos, confederados e beneméritos, foram vistos a partir de seus vetores de relação, priorizando as conexões entre os agentes envolvidos na atividade comercial. Com isso, pudemos visualizar que a motivação dos beneméritos, muitas vezes relacionados com a manutenção da legalidade, corresponde à oposição dos grupos mercantis ligados ao comércio das arribadas que pretendiam aceder aos cargos do cabildo de Buenos Aires. A prática da venalidade, isto é, a venda de cargos no Império espanhol, consolidada no século XVII, permitira aos comerciantes, ligados ao bando dos confederados, comprar cargos na municipalidade e, assim, proteger seus interesses econômicos. A aliança dos beneméritos, ligados às famílias que controlavam o cabildo portenho, com o governador Hernandarias de Saavedra, visava não coibir o comércio irregular (visto que alguns dos elementos ligados aos beneméritos praticavam tal atividade), mas uma aliança de interesses.
Tal aliança foi construída a partir do sentimento dos membros tradicionais do cabildo frente aos comerciantes que compravam cargos, e teve o governador como eixo articulador. Os interesses de Hernandarias baseavam-se na necessidade de articular Santa Fé como rota no comércio entre Buenos Aires e Potosí, bem como no esforço de dinamizar a economia do Paraguai.
Apesar dessas motivações, a rede dos beneméritos não estava consolidada por laços familiares. Os confederados, por sua vez, estavam ligados por vários vetores de parentesco, motivo pelo qual permitiu a sua permanência ao longo do tempo e o sucesso do controle da atividade comercial ilícita por parte do bando. Dessa forma, a compreensão das dinâmicas sociais, políticas e econômicas de Buenos Aires, como uma localidade pertencente a sociedade de Antigo Regime, passa necessariamente pelas conexões de seus agentes e de suas articulações dentro e fora dos bandos.
Perusset (2014, p. 300) afirma que, a partir de 1610, a divisão em dois bandos em Buenos Aires seria superada com a consolidação dos confederados como grupo dominante. Os beneméritos seriam incorporados através de sucessivos matrimônios. Assim, na compreensão das relações de poder entre os grupos entre 1615 e 1618, observamos que tal incorporação não foi um processo simples e que setores tradicionais, no esforço em manter suas prerrogativas e privilégios tradicionais, aliaram-se ao governador Hernandarias. Embora essa ação não tenha conseguido impedir a proeminência de grupos mercantis, contribuiu para demonstrar como as disputas políticas são contraditórias e como operavam as práticas políticas e econômicas no porto de Buenos Aires em meados do século XVII.
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Notas