RELAÇÕES ENTRE ÉTICA ORGANIZACIONAL, INOVAÇÕES AMBIENTAIS E SUSTENTABILIDADE
RELAÇÕES ENTRE ÉTICA ORGANIZACIONAL, INOVAÇÕES AMBIENTAIS E SUSTENTABILIDADE
Revista de Administração FACES Journal, vol. 16, núm. 2, pp. 78-95, 2017
Universidade FUMEC
Recepção: 11 Julho 2016
Aprovação: 15 Abril 2017
Resumo: O objetivo deste artigo é analisar quais são os parâmetros éticos das organizações em relação à sustentabilidade e às inovações ambientais. Para isso, foi efetuada uma revisão da literatura, analisando-se a possível convergência entre as ideias de Kant, Georgescu-Roegen e Jonas e os estudos organizacionais recentes sobre esses temas. Parte-se, assim, da apresentação das principais características das inovações sustentáveis e do modo como se comportam as organizações ante as decisões sobre essa modalidade de inovação. Dentre os resultados encontrados, estão a compatibilidade entre ética e inovação e o estabelecimento de crenças e valores que objetivam melhorar a reputação das empresas por meio da inovação e da ética. Além disso, percebe-se que a influência da cultura organizacional e a falta de sensibilidade ética dos empresários sobre a capacidade de inovar são entraves que a lógica produtivista do capital impõe às práticas de gestão ambientalmente responsáveis.
Palavras-chave: Ética Organizacional, Inovações Ambientais, Inovação Ética, Inovação Responsável, Sustentabilidade.
Abstract: This academic paper aims to analyze ethical parameters of organizations in relation to sustainability and environmental innovations. Literature review has been applied, starting with the analysis of the possible convergence of Kant’s, Georgescu-Roegen’s and Jonas’ ideas with current organizational studies on this subject. This research presents the main characteristics of sustainable innovations and how organizations behave in face of decisions concerning this type of innovation. Among the results, it should be highlighted compatibility between ethics and innovation and the establishment of beliefs and values that aim to improve the reputation of companies by innovation and ethics. Moreover, it has been noticed that the influence of the organizational culture and the lack of ethical sensitivity by entrepreneurs regarding innovation capacity are obstacles that the productivist logic of capital imposes to environmentally responsible management practices.
Keywords: Organizational Ethics, Environmental Innovation, Ethical Innovation, Responsible Innovation, Sustainability.
INTRODUÇÃO
A importância das inovações para o desenvolvimento econômico e a perenização das atividades empresariais teve como marco referencial as ideias propostas pelo economista austríaco Joseph Alois Schumpeter em suas principais obras: “Teoria do Desenvolvimento Econômico” (1997) e “Capitalismo, Socialismo e Democracia” (1961), originalmente publicadas em 1911 e 1942, respectivamente. Nessas obras, o autor propôs a revitalização do capitalismo e a promoção do desenvolvimento econômico e dos ciclos de negócios por meio do que denominou “destruição criadora”. Considerou, ainda, a figura do empresário e os empreendimentos como “o fenômeno fundamental da atividade econômica” (SCHUMPETER, 1961, p. 79).
Já a relação entre inovação e meio ambiente tem início no final dos anos 1980 com a publicação do documento “Nosso Futuro Comum”, pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, sob a coordenação de Gro Harlem Brundtland. Nesse documento, um dos caminhos propostos para atingir o uso racional dos recursos naturais em prol do desenvolvimento humano seria por intermédio de inovações.
O Relatório Brundtland consagrou o conceito de “desenvolvimento sustentável” como sendo aquele que “atenda as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as gerações futuras também atenderem às suas” (BRUNDTLAND, 1991, p. 9). Alguns autores apresentam, contudo, restrições de ordem prática quanto a esse conceito. Vollenbroek (2002) considera contestável o conceito de “necessidades”, pois estas são construções sociais e não se conhece quais serão as construções das gerações futuras; além disso, avanços tecnológicos geram novas necessidades. Já Gmelin e Seuring (2014), Petala, Wever e Dutilh et al. (2010) e Pujari (2006) afirmam que a falta de clareza do Relatório Brundtland não fornece informações seguras para as empresas. Shrivastava (1995), por sua vez, alerta que o Relatório se concentra unicamente no foco ambiental, excluindo a dimensão social da sustentabilidade.
Segundo Gmelin e Seuring (2014), a definição de sustentabilidade ou a interpretação de desenvolvimento sustentável mais aceita no mundo empresarial baseia-se no tripé da sustentabilidade ou triple-bottom-line, que foi criado por Elkington (1997) e que congrega aspectos econômicos, ambientais e sociais. Para que haja desenvolvimento sustentável, devem ser satisfeitas as seguintes condições: rentabilidade econômica, respeito ao meio ambiente e responsabilidade social (ELKINGTON, 1997; GÓNCZ; SKIRKE; KLEIZEN et al., 2007). Nos estudos organizacionais, tanto a sustentabilidade quanto as inovações são vistas como fontes de vantagem competitiva (PORTER; VAN DER LINDE, 1995; NIDUMOLU; PRAHALAD; RANGASWAMI, 2009), de modo que a ética empresarial assume importante papel nesse novo paradigma.
Estando o status e a legitimidade da ética fundamentados na razão, “a ética expressa uma dimensão racional ampla e forte que lhe permite estruturar juízos de valor”, e estes, por sua vez, “dizem respeito ao destino que o homem deseja dar a sua vida, na medida em que tratam das possibilidades e perspectivas de vida, respeitando as diversas formas de vida” (BACK, 2011, p. 22-23). Nesse sentido, a proposta deste artigo é analisar o comportamento ético das organizações quanto à sustentabilidade e às inovações sustentáveis por meio de um levantamento bibliográfico sobre esses temas. Diante disso, emergem algumas questões acerca do posicionamento das organizações em relação ao meio ambiente: por meio das inovações sustentáveis, as organizações adotam uma atitude ética ante os problemas ambientais, promovendo o uso racional dos recursos naturais? Ou apresentam um engajamento meramente cosmético, a fim de assegurar certificações e prestígio, apenas porque o mercado exige, sem um comprometimento efetivo?
No intuito de refletir sobre tais questionamentos, na próxima seção deste artigo, apresentam-se os referenciais teóricos e a maneira pela qual a ética permeia ou não as estratégias de produção das organizações contemporâneas. Em seguida, são expostos os procedimentos metodológicos e os mecanismos de abordagem utilizados na presente pesquisa. Por fim, discute-se a análise dos resultados obtidos e realizam-se as considerações finais sobre as principais questões abordadas no texto, apresentando, ainda, as limitações desta pesquisa.
REFERENCIAL TEÓRICO
Nesta seção, são apresentados os fundamentos teóricos deste estudo, abordando os seguintes temas: ética organizacional, inovações sustentáveis e comportamento organizacional.
Ética: a visão filosófica sob a perspectiva das organizações
De acordo com Coronel, Silva e Leonardi (2010), o conceito de ética diz respeito ao exame das ações humanas, de suas regras, de seus princípios ou de seus ideais, com o fim de determinar quais são as melhores ações individuais ou sociais. Ou seja, “ética é a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade. É a ciência da atitude específica do comportamento humano” (VASQUEZ, 1984, p. 25).
Já no século XVIII, Immanuel Kant, nos seus estudos sobre a moral, preceitua em seu conceito de imperativo categórico, um comportamento ético do ser, em que o agir e o motivo do agir possam se tornar leis universais (KANT, 2015). A partir desse conceito, Coronel, Silva e Leonardi (2010) afirmam que é possível identificar elementos que ligam o pensamento de Kant às preocupações sobre a sustentabilidade, as quais poderiam se tornar leis universais por meio da sustentabilidade ambiental. Esses autores observam também que, mesmo sem ter feito qualquer referência a Kant, o matemático e economista Georgescu-Roegen, na segunda metade do século XX, propôs uma nova ordem econômica a que chamou de “programa mínimo de bioeconomia” (minimum bioeconomy program), para onde deveriam convergir pontos de vista comuns entre diferentes áreas do conhecimento, tais como Ética, Ecologia, Física e Economia. Esse programa conteria o espírito do imperativo de Kant.
Alencastro (2009), em sua apreciação a respeito do pensamento de Hans Jonas na obra “O Princípio Responsabilidade”, que busca uma fundamentação ética para a civilização tecnológica e suas consequências quanto às questões ambientais, defende que:
[...] a atual crise ambiental que assola a humanidade é fruto de uma lógica de ação - um ethos - e tem caracterizado as modernas sociedades industriais capitalistas, que veem o ambiente natural apenas como fonte de matéria prima para a produção de mercadorias, e a natureza como algo aberto e disponível para todo tipo de manipulação e exploração técnico-científica com fins econômicos (ALENCASTRO, 2009, p. 14).
Nesse sentido, o autor questiona por que ainda existe impasse na construção de uma ética de responsabilidade e cuidado para com o meio ambiente, ao partir do pressuposto de que a ética auxilia na busca do que é bom e desejável para todos. Uma possível resposta a essa questão foi apresentada por Jonas ao propor “uma ética de responsabilidade para com as gerações futuras e que nortearia o agir humano com vistas à sobrevivência planetária” (ALENCASTRO, 2009, p. 14).
A proposição de Jonas vai ao encontro da visão de desenvolvimento sustentável da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (BRUNDTLAND, 1991). A preocupação e o cuidado com a humanidade futura e com o planeta objetivam garantir a “existência da humanidade em um ambiente satisfatório”, já que o “futuro da humanidade inclui, obviamente, o futuro da natureza, como sua condição sine qua non” (JONAS, 2006, p. 229). O foco dessa preocupação está, assim, na constatação de que “o domínio da natureza pelas ciências e pela tecnologia se transforma no objeto central das sociedades modernas” (ALENCASTRO, 2009, p. 17).
As bases filosóficas do pensamento de Jonas estão fundamentadas na “heurística do temor” e em um “novo imperativo ético”. A heurística do temor baseia-se na ética da responsabilidade, ante a incerteza sobre a condição futura do ser humano e da natureza, com o intuito de evitar o pior, instaurando “um temor que desperta para o pensamento e para a ação responsável” (NODARI; PACHECO, 2014, p. 81). Em suma, trata-se de um princípio de precaução, tema desenvolvido por Ignacy Sachs (2011) em seus estudos sobre sustentabilidade.
Essa nova ética, por sua vez, baseia-se na responsabilidade coletiva devido à vulnerabilidade da natureza perante a intervenção humana, de forma que seu agir e seus efeitos não sejam destrutivos para as possibilidades futuras de vida nem coloquem em perigo “as condições para a conservação indefinida da humanidade sobre a Terra” (JONAS, 2006, p. 47-48). Essas ponderações remetem a importantes questões no âmbito das organizações, de modo que “a prudência e a responsabilidade assumem papel importantíssimo nas tomadas de decisão e na orientação das ações tecnológicas” (ALENCASTRO, 2009, p. 24). Nesse contexto, as chamadas inovações ambientais, ecológicas, verdes ou sustentáveis, de produtos e de processos, que apresentam viés tecnológico, podem ser enquadradas nessas reflexões filosóficas.
Nesse sentido, supõe-se que a responsabilidade das organizações está fundamentada nas quatro formulações do imperativo ético de Jonas: os efeitos do agir compatíveis com a permanência da vida humana na Terra; os efeitos do agir não destrutivos para a possibilidade futura da vida; a não colocação em perigo das condições para a conservação indefinida da humanidade sobre a Terra; e a inclusão na escolha presente, como objeto do querer, da futura integralidade do homem. Tais formulações levam a considerar que:
Uma instituição é condenada ao fracasso se não integrar de modo radical em seus planos estratégicos a noção de pertença ao contexto e de responsabilidade diante deste e do humano que lhe sustenta. As instituições devem se converter em sujeitos atuantes, não em um simples aglomerado de pessoas desvinculadas de senso de pertença. Os efeitos das nossas ações estão sendo compatíveis com a permanência da vida autêntica? Nossos planos de ação contemplam a complexidade de exigências que se impõem frente ao sucesso empresarial? O que significa ser competitivo em um contexto cujo centro é a vida? (FARINON, 2011, p. 38-39).
Nessa linha de pensamento, a observância de questões éticas deveria incentivar as inovações a serem sustentáveis e a produzirem “bens sociais”, mediante emprego de tecnologias adequadas pelas organizações (BRUNDTLAND, 1991, p. 65).
Inovações sustentáveis
As inovações que produzem efeitos positivos sobre o meio ambiente passaram a ter variadas denominações: inovações sustentáveis (sustainable innovations), ecoinovações (eco-innovations), inovações ambientais (environmental innovations) e inovações “verdes” (green innovations). Boons e Lüdeke-Freund (2013) atribuem essa multiplicidade de termos ao fato de serem utilizados por pesquisadores de diferentes áreas. Schiederig, Tietze e Herstatt (2012) concluem que o desenvolvimento de inovações sustentáveis contempla aspectos econômicos, ecológicos e sociais e propõe que as quatro qualificações sejam utilizadas como sinônimas.
No Quadro 1, exposto a seguir, apresentam-se algumas definições de inovações ambientais identificadas na literatura.
| SUSTAINABLE DEVELOPMENT/INNOVATION | Referência |
| “[...] is development that meets the needs of the present without compromising the ability of future generations to meet their own needs. It contains within it two key concepts: · the concept of ‘needs’, in particular the essential needs of the world’s poor, to which overriding priority should be given; and · the idea of limitations imposed by the state of technology and social organization on the environment's ability to meet present and future needs”. “...the ‘common interest’ did not necessarily impede growth and expansion though it may have limited the acceptance and diffusion of technical innovations”. “[...] the capacity for technological innovation needs to be greatly enhanced in developing countries so that they can respond more effectively to the challenges of sustainable development...the orientation of technology development must be changed to pay greater attention to environmental factors”. “[...] Hence the procedures and policies that influence these exchanges must stimulate innovation and ensure ready and widespread access to environmentally sound Technologies”. “[...] Product redesign and technological innovations leading to safer products, more efficient processes, and recycling of raw materials can also be promoted by a more effective, integrated use of economic incentives and disincentives”. “[...] Environmental laws have induced innovation and the development of new control technologies, processes, and products in most industries, reducing the resource content of growth”. | Brundtland (1987) |
| ECO-INNOVATIONS | Referência |
| “[...] new products and processes which provide customer and business value but significantly decrease environmental impacts”. | Fussler e James (1996) |
| “[...] the additional attribute of innovations toward sustainability is that they reduce environmental burdens [...]”. | Rennings (2000). |
| “[...] the production, assimilation or exploitation of a product, production process, service or management or business method that is novel to the organization (developing or adopting it) and which results, throughout its life cycle, in a reduction of environmental risk, pollution and other negative impacts of resources use (including energy use) compared to relevant alternatives”. | Kemp e Pearson (2008) |
| “[...] means the creation of novel and competitively priced goods, processes, systems, services, and procedures that can satisfy human needs and bring quality of life to all people with a life-cycle-wide minimal use of natural resources (material including energy carriers, and surface area) per unit output, and a minimal release of toxic”. | Reid e Miedzinsk (2008) |
| “[...] as innovations which are able to attract green rents on the market”. “[...] the concept is closely related to competitiveness and makes no claim on the greenness of various innovations. The focus of eco-innovation research should be on the degree to which environmental issues are becoming integrated into the economic process”. | Andersen (2008) |
| “[...] the creation or implementation of new, or Significantly improved, products (goods and services), processes, marketing methods, organizational structures and institutional arrangements which - with or without intent - lead to environmental improvements compared to relevant alternatives”. | Organisation for Economic Co-operation and Development (2009) |
| “[...] a new concept of great importance to business and policy makers. It is about innovations with lower environmental impact than relevant alternatives. The innovations may be technological or non-technological (organizational, institutional or marketing-based). Eco-innovations can be motivated by economic or environmental considerations. The former includes objectives to reduce resource, pollution control, or waste management costs, or to sell into the world market for eco-products”. | Arundel e Kemp (2009) |
| “Eco-innovations are all measures of relevant actors (firms, politicians, unions, associations, churches, private households) which: · develop new ideas, behavior, products and processes, apply or introduce them and · which contribute to a reduction of environmental burdens or to ecologically specified sustainability targets”. | Klemmer, Lehr e Löbbe (1999) |
| ENVIRONMENTAL INNOVATIONS | Referência |
| “[...] as innovations that consist of new or modified processes, practices, systems and products which benefit the environment and so contribute to environmental sustainability” | Oltra e Saint Jean (2009) |
| GREEN INNOVATIONS | Referência |
| “[...] a rather pragmatic definition’, stating that it ‘does not have to be developed with the goal of reducing the environmental burden. […] It does however, yield significant environmental benefits” | Driessen e Hillebrand (2002) |
| “[...] as hardware or software innovation that is related to green products or processes, including the innovation in technologies that are involved in energy-saving, pollution-prevention, waste recycling, green product designs, or corporate environmental management”. | Chen, Lai e Wen (2006) |
As questões centrais acerca das inovações sustentáveis dizem respeito, basicamente: ao desenvolvimento de novos produtos e processos mais eficientes; a novas práticas de marketing; à utilização de materiais mais adequados; à reciclagem e redução do consumo de energia e água; e a estratégias e/ou ações que minimizem os impactos ambientais da poluição e da emissão de gases e resíduos e que promovam a sustentabilidade. Nesse contexto, a responsabilidade sobre problemas ambientais é coletiva: empresas desenvolvem produtos e métodos de produção ambientalmente amigáveis, com melhores condições de trabalho; consumidores desenvolvem uma nova consciência sobre a sustentabilidade do planeta por meio do consumo responsável; e governos estabelecem marcos regulatórios que promovam melhorias no meio ambiente. Ou seja, todos os atores sociais passam a adotar novos comportamentos que mitiguem riscos ao meio ambiente e busquem o uso mais racional e eficiente dos recursos naturais.
Comportamento organizacional nas decisões sobre as inovações sustentáveis
Payne e Raiborn (2001), ao analisarem o comportamento ético das organizações, relacionando as questões econômicas com o desenvolvimento sustentável, afirmam que as empresas estão se tornando mais conscientes quanto às questões ambientais e seus impactos no ambiente empresarial. Esse comportamento que denominam “ambientalismo dos negócios” (business environmentalism) deverá ir além do cumprimento das leis, refletindo na missão, nas políticas e nas ações organizacionais.
Em tese, políticas empresariais sustentáveis ajudam a promover a redução dos custos, incrementar vendas e melhorar a reputação das organizações, além de limitar a poluição e o esgotamento dos recursos. Dessa maneira, ações sustentáveis tornam-se importante valor, inclusive ético, a ser adotado em todos os negócios.
Para Payne e Raiborn (2001), a liderança na busca dos objetivos do desenvolvimento sustentável não compete às empresas multinacionais nem às instituições causadoras dos grandes problemas ambientais, mas às organizações que procuram agir eticamente e cujos stakeholders reconhecem o desenvolvimento sustentável como parte de suas necessidades. Portanto, a responsabilidade ambiental e, consequentemente, o desenvolvimento sustentável integram a ética nos negócios em organizações que possuem práticas ambientalmente corretas.
Ao relacionarem a moral cristã com inovação, Miles, Munilla e Covin (2004) afirmam que a filosofia moral cristã tem muito a dizer em apoio à liberdade de mercado para a inovação. De acordo com Shane (1996), a ética protestante está positivamente relacionada ao empreendedorismo nos Estados Unidos ao longo do tempo. A relação entre empreendedorismo e ética protestante foi reexaminada por Carr (2003), que concluiu que a empresa ética, em sociedades livres, deveria resultar em inovação e que esta inovação tenderia a estar associada à melhoria do bem-estar social.
Quanto à ética católica, Miles, Munilla e Covin (2004) destacam a afirmação de Novak (1993) de que o capitalismo tem origem na capacidade humana de criar e inovar. Miles, Munilla e Covin (2004) também fazem referência ao posicionamento de dois Papas católicos sobre o tema, em trabalhos de McCann (1996) e Cathrein (1911). De acordo com McCann (1996), o papa João Paulo II apoiava a ideia de que aqueles que assumem riscos para inovar devem ser economicamente compensados por seus riscos. Já Cathrein (1911) faz menção ao posicionamento de Pio X, que reconhecia os direitos de uso e propriedade daqueles que detêm o direito de propriedade intelectual.
Nesse sentido, Cambra-Fierro, Hart e Polo-Redondo (2008) constataram que a crescente preocupação com os danos ambientais tem levado algumas companhias a focarem sistemas de fornecimento, produção e distribuição ambientalmente adequados. Essa preocupação advém tanto de crenças e valores da gestão da companhia quanto de pressões exercidas por clientes ou instituições, o que levou os autores a concluírem que nem sempre a ética e as regras de mercado são suficientes para lidar com essa situação, sendo necessária a implantação de leis específicas sobre a questão. Em outras palavras, os marcos regulatórios induzem as organizações ao cuidado com o meio ambiente.
A imagem organizacional no que concerne à busca por reputação corporativa, tanto gerencial quanto social, é outro fator que se tornou estratégico para as organizações (CASTRO; LÓPEZ; SÁEZ, 2006). Assim, em muitos casos, independentemente das pressões de mercado, um crescente número de empresas estabelece um regime de crenças e valores, acreditando que tal comportamento transmite uma imagem positiva para o mercado, aumentando e/ou mantendo sua reputação. Dessa forma, certo grau de interesse próprio estará sempre presente na implantação de um sistema de responsabilidade social corporativa (MOON, 2001).
Ao analisarem o comportamento de duas empresas espanholas de pequeno e médio porte, Cambra-Fierro, Hart e Polo-Redondo (2008) constataram também que, em ambos os casos, o comportamento organizacional é direta ou indiretamente influenciado pela ideologia e pelos objetivos e valores pessoais da gestão. Assim, o comportamento dos gestores responde a estímulos econômicos e ético-morais, associados a outros fatores como: estrutura da gestão e do controle societário, ideologia da gestão, contexto sociocultural, aspectos relacionados ao setor de atividade e sistema legal, conforme demonstrado na Figura 1.

Partindo do pressuposto que, a partir de 1990, a inovação e as preocupações com a sustentabilidade são necessárias para manter um negócio próspero, Schumaker e Wasieleski (2013) afirmam que as empresas que não inovam e não se adaptam rapidamente às mudanças no ambiente dos negócios têm menos probabilidade de serem sustentáveis. Assim, consideram falsa a crença de que inovação e ética sejam incompatíveis, já que os dois fenômenos podem coexistir. Considerando os efeitos positivos dessa combinação, os autores propõem a institucionalização da “inovação ética” (ethical innovation) nas organizações. Partindo da condição de que as empresas são movidas pelo desejo de sobreviver no seu segmento de atuação, o que exige desempenho financeiro positivo, a condução dos negócios deve considerar a necessidade de tais empresas estarem constantemente se adaptando e inovando para garantirem essa sobrevivência em longo prazo. Tal objetivo é atingido mediante a coexistência de inovação e ética, possibilitando uma combinação positiva entre os processos éticos institucionalizados e os planos de inovação.
Schumaker e Wasieleski (2013) afirmam, ainda, haver uma falta de entendimento sobre como as organizações tratam as questões éticas quando tentam encorajar a criatividade entre seus colaboradores. Há uma carência de conhecimento acerca da forma de conceber e implantar processos de inovação levando princípios éticos em consideração. Diante disso, os autores desenvolveram um modelo teórico para a dualidade entre ética e inovação, apresentando, com base em quatro proposições, os resultados de diferentes combinações entre esses construtos, os quais estão demonstrados no Quadro 2.
| Proposição | Características |
| 1 | Regras de conduta ética rigorosas impostas aos processos organizacionais são mais propensas a inibir a inovação do que valores éticos mais flexíveis. |
| 2 | Tomadores de decisão que seguem uma orientação de longo prazo em relação à sua organização são mais propensos a levar outros valores em consideração que os tomadores de decisão que não têm essa orientação. |
| 3 | Tomadores de decisão que implementam mecanismos éticos com uma preocupação explícita de longo prazo permitem a inovação organizacional. |
| 4 | Tomadores de decisão que tentam implementar processos de inovação em organizações que não possuem qualquer preocupação ética imediata são menos propensos a terem uma orientação de longo prazo. |
Stilgoe, Owen e Macnaghten (2013) desenvolveram uma proposta de modelo teórico relacionando responsabilidade e inovação, denominada “inovação responsável”, que significa cuidar do futuro por meio de uma gestão coletiva de ciência e inovação no presente. Esses autores consideram que uma inovação responsável tem como base quatro dimensões que caracterizam as inovações com respeito à sua governança: (i) antecipação (anticipation) – envolve pensamento sistemático que visa aumentar a resiliência, na procura por novas oportunidades de inovação e na formação de agendas de pesquisa de risco socialmente consistentes; (ii) reflexividade (reflexivity) – diz respeito à autorreflexão ou avaliação de suas próprias atividades, de seus compromissos e de suas suposições, tendo consciência dos seus limites sobre conhecimento e de que posições pessoais podem não ser aceitas pela maioria; (iii) inclusão (inclusion) – participação de stakeholders visando à legitimidade na governança da ciência, assim como à inovação e ao engajamento, por intermédio de mecanismos consensuais, deliberações e votações, por exemplo; e (iv) capacidade de resposta ou reatividade (responsiveness) – capacidade de mudança na forma ou na direção, em resposta às necessidades das partes interessadas ou a mudanças nas circunstâncias. Os autores concluem que sua proposta para a inovação responsável pode provocar novamente o debate sobre a autonomia da ciência em oferecer novas oportunidades para a criação de valor, de forma participativa, reflexiva e deliberativa, assim como pressupõe o modelo.
Riivari e Lämsä (2014), por sua vez, examinaram a associação entre cultura ética das organizações e inovatividade organizacional. Segundo os autores, tomando por referência o resultado de trabalhos anteriores de outros pesquisadores como Carroll (1991), Paine (1997), Solomon (2004) e Crane e Matten (2007), nota-se que é crescente o número de organizações que reconhece por si mesmo a importância que a ética representa para o seu desempenho sustentável. Estes últimos pesquisadores destacam a assertiva de que a dinâmica do mundo dos negócios impõe desafios às empresas para a superação de conflitos de interesse e valores, de maneira que as organizações estabelecem para si padrões legais, declarações de valor e códigos de conduta a fim de apresentarem uma estrutura organizacional e institucional que proporcione um padrão de comportamento adequado. Assim, pode-se afirmar que a cultura organizacional influencia a busca de resultados e que a inovatividade é tratada como um resultado organizacional.
Já Baumgartner (2009), ao analisar a evolução do conceito de cultura organizacional, concluiu que este tende a mudar lentamente ao longo do tempo e que tais mudanças se devem a fatores relacionados ao ambiente dos negócios, à liderança, às práticas de gestão e aos processos formais e informais de socialização. Emergem daí duas abordagens antagônicas sobre a possibilidade ou não de gerenciar as mudanças na cultura corporativa: a positivista e a construtivista. Na perspectiva positivista, a cultura é uma variável e, como tal, pode ser gerenciada, enquanto que, na visão construtivista, a realidade é subjetiva, pois é construída por indivíduos via interações sociais, e estas, por sua vez, constroem a cultura organizacional, a qual não pode ser gerenciada (BAUMGARTNER, 2009).
Com base nas pesquisas anteriores de Brown (1992), Martins e Terblanche (2003) e Erdogan, Liden e Kraimer (2006), Riivari e Lämsä (2014) concordam que a cultura organizacional impacta consideravelmente o comportamento das organizações. A inovatividade organizacional, por sua vez, desempenha um papel crítico para o sucesso e a sobrevivência de muitas empresas, conforme entendem Calantone, Cavusgil e Zhao (2002) e Salavou (2004). Com base em Van de Ven (1986), Nonaka e Takeushi (1995), Quinn (2000) e Riivari e Lämsä (2014) afirmam que a inovatividade e as novas ideias são necessárias para que as organizações se tornem competitivas.
Nesse sentido, Riivari e Lämsä (2014) realizaram uma pesquisa de natureza quantitativa junto a três empresas finlandesas (uma do setor público e as demais do setor industrial privado) para validar as seguintes hipóteses: que a cultura ética de uma organização está positivamente relacionada à inovatividade organizacional; e que diferentes dimensões da cultura ética de uma organização estão relacionadas a diferentes dimensões da inovatividade organizacional. Como ambas as hipóteses foram suportadas, os autores concluíram que a cultura ética está associada à realização de inovatividade organizacional como um recurso organizacional. Embora confirmem o resultado de pesquisas anteriores, Riivari e Lämsä (2014) reconhecem que os achados se limitam ao contexto empresarial da Finlândia e que não foram analisados outros impactos nos resultados organizacionais, como comprometimento dos recursos humanos, resultados financeiros, produtividade e eficiência.
Mesmo diante de custos mais elevados, efeitos negativos sobre a saúde e de uma fiscalização mais rigorosa do governo, Bendell (2015) afirma que muitas empresas resistem em adotar inovações tecnológicas ambientalmente adequadas e práticas de negócio sustentáveis. Estas formas de inovação proporcionam outros benefícios além daqueles oferecidos pelas inovações convencionais – ganhos de eficiência e de efetividade, melhoria no desempenho e ganhos econômicos –, incluindo mitigação de danos ao meio ambiente, redução de emissões de gases e controle da poluição, fatores que implicam melhoria da imagem da empresa perante a sociedade e evitam punições legais. Como esses benefícios se tornam públicos, o resultado da adoção de inovações ambientais impacta positivamente a empresa e a sociedade como um todo. Assim, a sociedade espera que os empresários apresentem um comportamento ético quanto à sua responsabilidade ambiental e tomem decisões neste sentido. Todavia, tais decisões dependem de uma sensibilidade ética do empresário, pois ele pondera as vantagens e desvantagens econômicas, considerando, ainda, as motivações pelos retornos sociais. Portanto, a adoção de inovações sustentáveis está subordinada às motivações, aos valores individuais e à ética de cada empresário, de modo que suas percepções sobre as características das inovações podem mitigar danos ambientais e reduzir a supervisão dos órgãos reguladores.
Apesar de resultarem em benefícios para o público, seja reduzindo os danos ou melhorando a qualidade do meio ambiente, as inovações, como concluem Kemp e Pearson (2008) e Belin, Horbach e Oltra (2009), são subvalorizadas no mercado. De acordo com Bendell (2015), os preços não refletem os benefícios públicos, e as ecoinovações, geralmente, não são realizadas simplesmente por ideais.
Bendell (2015) argumenta, também, que fatores como valores pessoais preexistentes, ética, motivações, hábitos, noções sobre impacto ambiental e sobre desregulações governamentais e compatibilidade com a demanda dos consumidores impactam a criação e/ou adoção de inovações nas empresas. Nesse sentido, a motivação pelo social (prosocial motivation) poderia ser uma alternativa para reverter resistências às mudanças de comportamento. Diante disso, Bendell (2015) promoveu uma pesquisa baseada na hipótese de que as decisões dos empresários quanto à adoção de inovações ambientais são positivamente associadas às suas motivações pelo social e à possibilidade de as inovações satisfazerem as demandas e os valores a elas atribuídos pelos consumidores. As motivações pelo social só têm impacto positivo sobre a adoção de inovações quando existe uma elevada compatibilidade com as expectativas dos consumidores em razão de um grande número de objetivos e prioridades sociais demandadas pelas organizações. Por outro lado, a capacidade da inovação em satisfazer as demandas dos clientes tem maior impacto sobre as decisões de adoção de inovação ambiental pelos empresários (BENDELL, 2015).
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para atingir aos propósitos deste estudo, realizou-se um levantamento do referencial bibliográfico em duas partes. Primeiramente, efetuou-se a busca dos principais referenciais teóricos, prioritariamente, nas bases de dados Scopus e ScienceDirect, aplicando-se filtro de pesquisa nas áreas de Business, Management and Accounting, bem como no buscador Web of Science. Em uma primeira rodada, foi feita uma pesquisa avançada por meio das palavras-chave “green innovation”, “eco-innovation”, “environmental innovation” e “sustainable innovation”, a fim de conceituar e caracterizar essas modalidades de inovação. Como na literatura esses termos são empregados como sinônimos, nas buscas avançadas foram utilizados os operadores booleanos and e or, com o intuito de capturar o maior número de artigos disponíveis no acervo das bases de dados consultadas. Em cada uma das buscas, foram analisados os abstracts das publicações, a fim de verificar se o conteúdo dos artigos apresentava relação com os objetivos do presente estudo. Na fase de leitura dos artigos selecionados, foram identificados, também, outros artigos publicados em journals de importância para a pesquisa, capturados em outras bases de dados como Emerald e Springer.
A segunda parte do levantamento bibliográfico foi realizada via uma pesquisa avançada no Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) utilizando os parâmetros “assunto” e “contém” por meio das seguintes combinações com o operador booleano and:
a) “ética” and “inovação” – dois resultados que não atenderam aos objetivos do trabalho;
b) “ética” and “eco-inovações” – nenhum resultado;
c) “ética” and “inovações sustentáveis” – nenhum resultado;
d) “ética” and “inovações ambientais” – nenhum resultado;
e) “ethics” and “innovation” – 315 resultados (artigos entre 2000 e 2015).
Uma nova filtragem dos resultados dessa etapa (item “e”) refinou a busca nas coleções das seguintes bases: Scopus (Elsevier), Springer Link, Emerald Journals, SciVerse Science Direct (Elsevier), Wiley online Library e SAGE Journals. Dessa filtragem, restaram 171 artigos, dos quais foram desconsiderados os journals de outras áreas que não a de business (Cambridge Quarterly of Heathcare Ethics, Critical Arts, Ethics and Information Technology, International Journal of Educational Management, Journal of Law, Medicine and Ethics, Journal of Nano particle Research, Kybernetes, Pharmaco genomics e Science and Engineering Ethics). Após esse refinamento, restaram a serem pesquisados os journals: Business Information Review, Journal of Business Ethics, Journal of Management Development, Qualitative Inquiry, Qualitative Research, Research Policy e Strategic Direction.
Do último refinamento, retornaram 30 artigos, de forma que, após a leitura dos abstracts, identificaram-se oito publicações que apresentam relação com o tema central deste estudo, dos quais sete foram publicadas pelo Journal of Business Ethics (PAYNE; RAIBORN, 2001; MILES; MUNILLA; COVIN, 2004; CASTRO; LÓPEZ; SÁEZ, 2006; CHEN; LAI; WEN, 2006; CAMBRA-FIERRO; HART; POLO-REDONDO, 2008; RIIVARI; LÄMSÄ, 2014; BENDELL, 2015) e um artigo pelo Reserch Policy (STILGOE; OWEN; MACNAGHTEN, 2013). Esses artigos foram utilizados na fundamentação teórica deste estudo.
O interesse dos autores desta pesquisa pelo tema foi motivado pela leitura dos textos de Brundtland (1987, 1991), Alencastro (2009), Baumgartner (2009), Coronel, Silva e Leonardi (2010), Back (2011), Farinon (2011) e Nodari e Pacheco (2014), os quais precederam os procedimentos metodológicos descritos.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
As preocupações sobre impactos ambientais e sustentabilidade começaram a influenciar fortemente as decisões das empresas, notadamente, a partir das proposições do Relatório Brundtland de 1987, que chamava a atenção quanto aos danos causados ao meio ambiente oriundos das atividades econômicas desenfreadas promovidas pelos países mais desenvolvidos e quanto ao elevado desnível de padrão de vida entre nações desenvolvidas e pobres. Um caminho proposto para mitigar esses danos ambientais seria o desenvolvimento e a adoção de inovações que incorporassem a preocupação com o meio ambiente e a sustentabilidade. Tal mudança exigiria uma revisão nas atitudes e nos comportamentos relativos às práticas de negócio, passando-se a considerar os valores éticos na tomada de decisões.
Assim, a partir de 1990, as decisões organizacionais direcionadas à responsabilidade ambiental e ao desenvolvimento sustentável passaram a fazer parte da ética nos negócios (PAYNE; RAIBORN, 2001), de modo que a preocupação com danos ambientais tem intensificado o envolvimento das organizações com seus stakeholders de fornecimento, produção e distribuição. Tal preocupação advém de crenças e valores da gestão organizacional ou de pressões externas feitas pela sociedade ou por instituições por meio de marcos regulatórios que induzem ao cuidado com o meio ambiente (CAMBRA-FIERRO; HART; POLO-REDONDO, 2008). A imagem e a reputação corporativa tornam-se, nesse contexto, valores estratégicos (MARTIN; NAVAS; LÓPEZ, 2006), já que o interesse próprio está presente nos sistemas de responsabilidade social corporativa (MOON, 2001).
Em suma, O comportamento ético das organizações é influenciado, assim, por diversos fatores como o ambiente legal, os princípios e valores dos gestores, o contexto social e cultural, as forças de mercado, a estrutura da gestão e do controle societário e particularidades do setor de atividade (CAMBRA-FIERRO; HART; POLO-REDONDO, 2008).
Outro importante achado resulta da pesquisa de Schumaker e Wasieleski (2013): não existe incompatibilidade entre ética e inovação. A busca contínua e incessante das empresas por se manterem no mercado é possível graças a uma combinação de processos éticos instituídos nas organizações e em seus planos de inovação. A esse relacionamento positivo entre ética e inovação os autores denominam “inovação ética”. Na mesma direção, Stilgoe, Owen e Macnaghten (2013) propõem o conceito de “inovação responsável”, que define a preocupação com o futuro por meio da gestão coletiva da ciência e da inovação no momento presente. A inovação responsável deve levar em consideração a autonomia da ciência em oferecer novas oportunidades de criação de valor, de forma participativa, reflexiva e deliberativa (ver Quadro 2). Tais premissas vão ao encontro da ideia central do Relatório Brundtland sobre desenvolvimento sustentável – atender às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras suprirem suas necessidades (BRUNDTLAND, 1987, 1991).
Nesse cenário, é crescente o número de organizações que reconhece a importância da ética para o desempenho sustentável (RIIVARI; LÄMSÄ, 2014). Ao mesmo tempo, a cultura organizacional exerce forte influência sobre o comportamento das organizações (BROWN, 1992; MARTINS; TERBLANCHE, 2003; ERDOGAN; LIDEN; KRAIMER, 2006; RIIVARI; LÄMSÄ, 2014).
Embora os estudos analisados relacionem positivamente ética e comportamento organizacional com inovações e sustentabilidade, Bendell (2015) identificou em seu trabalho uma resistência de muitas empresas em adotar inovações e práticas de negócios sustentáveis. Isso ocorre em devido à falta de sensibilidade ética do empresário, que impacta negativamente seu comportamento ético ante as questões ambientais (BENDELL, 2015). Nesse sentido, uma motivação pelo social (prosocial motivation) poderia reverter a percepção negativa sobre inovações, compatibilizando expectativas dos consumidores, prioridades sociais e objetivos organizacionais (BENDELL, 2015).
Em síntese, as relações entre o pensamento de Kant e Georgescu-Roegen, verificadas por Coronel, Silva e Leonardi (2010), alinham-se ao pensamento de Hans Jonas, analisado por Alencastro (2009) e Farinon (2011), assim como o Relatório Brundtland (1987) propõe um comportamento ético para o desenvolvimento sustentável. Essa convergência pode ser verificada mediante as proposições da “inovação ética” de Schumaker e Wasieleski (2013), da “inovação responsável” de Stilgoe, Owen e Macnaghten (2013) e da motivação pelo social de Bendell (2015). Embora vista de forma positiva, a adoção do comportamento ético de responsabilidade e cuidado ambiental pelas organizações pode encontrar resistências decorrentes da cultura organizacional, conforme apontado por Brown (1992), Martins e Terblanche (2003), Erdogan, Liden e Kraimer (2006) e Riivari e Lämsä (2014), e da falta de sensibilidade ética dos empresários (BENDELL, 2015).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As contribuições deste trabalho consistem na verificação da importância crescente das preocupações das organizações com o meio ambiente, voltadas ao desenvolvimento sustentável por meio de inovações éticas e responsáveis. Pelos resultados, pode-se considerar que os fatores limitantes a essa nova postura estão na cultura organizacional, na lógica puramente mercantil que os mercados exigem e na falta de sensibilidade ética dos empresários.
Nas análises identificadas na literatura, uma das possíveis limitações para que os processos inovativos sejam conduzidos para uma postura de cunho “ético ambiental” está relacionada a uma concepção de que a ética das organizações deve estar necessariamente ligada a ganhos puramente econômico-financeiros. O comportamento organizacional precisaria ser configurado por uma nova concepção de percepção empresarial, em que as instituições, mesmo que tenham como principal marco para existência o lucro, também passassem a serem responsáveis pela manutenção dos recursos naturais e do futuro da humanidade.
Se decisões empresariais forem computadas meramente por cifras financeiras, corre-se o risco de inviabilizar qualquer outra forma de refletir sobre a possibilidade da existência humana no futuro. Nesse contexto, o comportamento ético das organizações, a responsabilidade com o meio ambiente e a adoção de práticas de desenvolvimento sustentável por meio de inovações coadunam-se ao pensamento proposto por pensadores como Kant, Hans Jonas e Georgescu-Roegen e deveriam se tornar preceitos universais (CORONEL; SILVA; LEONARDI, 2010).
Assim, uma proposição para estudos futuros seria analisar a ética organizacional ante o desenvolvimento sustentável e as inovações sob a ótica utilitarista de Jeremy Bentham e John Stuart Mill, temas que não foram desenvolvidos nesta pesquisa, constituindo, portanto, uma limitação do presente trabalho. Estudos futuros sobre comportamento organizacional também podem ser aprofundados e estendidos a partir dos aspectos apresentados neste trabalho, levando em conta a forma como as empresas promovem a difusão das inovações sustentáveis e as adequações de conduta ética a serem implementadas nos seus negócios – desafios em aberto para todos os pesquisadores que se dedicam a buscar soluções de sustentabilidade agora e para as gerações futuras.
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