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A percepção dos auditados em relação às competências comportamentais dos auditores Independentes: um estudo empírico na Região da Grande Florianópolis/SC
A percepção dos auditados em relação às competências comportamentais dos auditores Independentes: um estudo empírico na Região da Grande Florianópolis/SC
Revista de Contabilidade e Organizações, vol. 7, núm. 18, pp. 37-47, 2013
Universidade de São Paulo
Recepção: 05 Fevereiro 2013
Aprovação: 07 Outubro 2013
Resumo: A presente pesquisa objetivou investigar a percepção dos auditados em relação às competências comportamentais dos auditores independentes. De natureza exploratória, o estudo foi realizado através da aplicação de questionário. Os resultados indicaram que a percepção dos auditados, para as vinte e uma competências investigadas variou entre média (mediana 3) e alta (mediana 4), com destaque para as competências “ambição” e “flexibilidade”, que obtiveram a mais alta e a mais baixa classificação, respectivamente. Além disso, foi observado que as competências “liderança”, “relacionamento interpessoal” e “lidar com pressão e situações tensas”, obtiveram alta classificação pelo grupo de respondentes cujo contato foi com o Auditor Sócio e, em um outro extremo, baixa classificação, pelo grupo cujo contato foi com o Trainee/Assistente. Em geral, os resultados sugerem que, na percepção dos inquiridos, algumas competências podem obter alta ou baixa classificação, de acordo com a experiência dos auditores de contato.
Palavras chave: Auditoria: Competências comportamentais Competências do auditor Auditor independente Percepção dos auditados.
1. INTRODUÇÃO
O objetivo central de uma auditoria independente das demonstrações contábeis é o de expressar uma opinião relativa à adequação das informações contábeis, considerando para tal, em todos os aspectos relevantes, a situação econômico-financeira e patrimonial da entidade auditada, tendo como parâmetro para direcionar a formação de seu julgamento as normas e práticas contábeis adotadas. Muito embora este sentido maior de sua existência possa denotar tratar-se de uma atividade eminentemente de natureza técnica, as competências exigidas do profissional da auditoria independente vão além dos conhecimentos técnico-operacionais (DAVIES; ASTON, 2010).
Nesse sentido, para que esse objetivo seja atingido, uma gama de competências é exigida dos profissionais que integram os quadros funcionais das firmas de auditoria. Essas características não se restringem ao conhecimento e às habilidades técnicas nas áreas contábil e afins, uma vez que atitudes, habilidades e comportamentos do auditor, como comunicação, liderança, relacionamento interpessoal e trabalho em equipe, têm se demonstrado cada vez mais relevantes (TAN, 1999; ABDOLMOHAMMADI; SEARFOSS; SHANTEAU, 2004; HELLIAR; MONK; STEVENSON, 2009; MCKNIGHT; WRIGHT, 2011).
Abdolmohammadi, Shanteau e Searfoss (2004) explicitam que, além de experiência, conhecimento e capacidade técnica, características como confiança, liderança e habilidades de comunicação são, também, fundamentais nas atividades desenvolvidas pelo auditor, tendo em vista a relação interpessoal que este estabelece com outras pessoas, tanto no que se refere aos profissionais das empresas auditadas, quanto ao que diz respeito aos seus superiores e subordinados dentro de sua equipe de trabalho.
Tal é a importância das competências comportamentais para o auditor independente que, de acordo com Alberton (2002), as firmas de auditoria, além de observarem no processo de seleção de novos profissionais alguns aspectos comportamentais, fornecem, ainda, cursos que auxiliam em sua formação comportamental. Nesse contexto, as competências comportamentais inerentes à função do auditor independente envolvem, além de outras, capacidades como as de se relacionar com a pessoa do auditado, trabalhar em equipe, ter criatividade, liderança e comportamento ético e moral adequado.
Contudo, mesmo diante do grau de relevância que reveste o tema, existe ainda carência de estudos sobre as competências comportamentais do auditor (PALMER; ZIEGENFUSS; PINSKER, 2004). A própria formação base exigida para o exercício da auditoria independente (isto é, contador) também carece de pesquisas desta natureza (CARDOSO, 2006).
Observa-se esta carência não somente em termos de quantidade, mas principalmente em profundidade e abrangência, conforme enfatizam Cardoso, Riccio e Albuquerque (2009), que sugerem que as pesquisas realizadas nessa linha não se limitem a uma abordagem isolada do perfil técnico considerado como o ideal na área contábil, mas desenvolvam paralelamente, aspectos considerados por outras áreas, como a Psicologia, dando ênfase na relação com a atuação prática-profissional (abordagem empírica).
Nessesentido,esteestudotemcomoobjetivoinvestigar a percepção dos auditados em relação às competências comportamentais dos auditores independentes. O problema de pesquisa se estabelece da seguinte forma: Como os auditados percebem as competências comportamentais dos auditores independentes?
Considerando se tratar de um assunto incipiente no meio acadêmico, a realização de pesquisas exploratórias se justifica pela contribuição que pode ser oferecida ao tema, ponderando-se a respeito, conforme Palmer, Ziegenfuss e Pinsker (2004), que a tendência parece indicar que a formação que inclui competências comportamentais tem se sobressaído a uma formação fundamentada exclusivamente por conhecimentos técnicos.
Para atingir o objetivo proposto, o restante deste trabalho está organizado da seguinte forma: a próxima seção apresenta o referencial teórico; os procedimentos metodológicos e a descrição e análise dos dados são apresentados nas seções seguintes; e, a conclusão e as recomendações são apresentadas nas seções finais.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
Dentre os estudos ligados às competências de profissionais, White (1959) foi um dos pioneiros ao utilizar o termo “competência” para descrição de características relativas à personalidade, associadas à alta motivação e desempenho superior dos indivíduos (MUNCK; MUNCK; SOUZA, 2011).
Posteriormente, estudos como os de McClelland (1973), Boyatzis (1982) e Spencer Jr. e Spencer (1993), também se dedicaram a esse assunto, sendo que este último apresentou um dicionário de competências de diversas profissões (CARDOSO; RICCIO; ALBUQUERQUE, 2009). Nos últimos anos, essa corrente de pesquisa tem evoluído, passando por estudos que relacionam a ela, entre outras, questões como autogestão, inteligência emocional e cognitiva; todavia, persistindo o entendimento de que “competência” é ainda um constructo em formação (CARDOSO; MENDONÇA NETO; OYADOMARI, 2010).
Segundo Dutra, Hipólito e Silva (2000), embora não exista consenso sobre uma definição para “competência”, torna-se importante trabalhar com uma opção conceitual, para que se possa nortear e fundamentar as interpretações que derivam de sua utilização, mesmo sabendo-se que se assume um alto risco de contestação, considerando a não existência de um constructo único e definitivamente aceito no âmbito acadêmico.
Cardoso, Mendonça Neto e Oyadomari (2010, p. 93) explicam que o termo competência “tem como origem a palavra competentia, do latim, significando a qualidade de quem é capaz de apreciar e resolver certo assunto, de fazer determinada coisa, com capacidade, habilidade, aptidão e idoneidade”.
Fleury e Fleury (2001) argumentam que a competência pode ser utilizada para designar uma pessoa qualificada para realizar determinadas coisas, podendo-se, assim, defini-la como um conjunto integrado de conhecimentos, habilidades e atitudes, que agreguem valor econômico à organização, garantindo um melhor desempenho do indivíduo.
Nessa mesma linha, Parry (1996) define competência como um agrupamento de conhecimentos, habilidades e atitudes correlacionados, que afeta parte importante do trabalho de alguém. O autor complementa que a competência está relacionada com o desempenho, podendo ser medida através de padrões preestabelecidos, e também melhorada através de treinamento e desenvolvimento.
Nesse contexto, a competência pode ser vista como uma capacidade do profissional, a qual, através da utilização de um conjunto integrado de conhecimentos, habilidades, atributos pessoais e atitudes, possibilita a este o exercício de suas funções e tarefas de forma a obter um melhor ou pior desempenho.
De acordo com Leme (2005), a “competência” pode ser dividida em técnica e comportamental. As competências técnicas englobam tudo o que o profissional precisa saber para desempenhar sua função, tais como: idiomas, sistemas de informação, ferramentas de gestão, entre outras. As competências comportamentais referem-se a tudo que o profissional precisa demonstrar como diferencial competitivo e que tem impacto em seus resultados, por exemplo: criatividade, flexibilidade, foco em resultados e no cliente, organização, planejamento, liderança, etc.
Observa-se, dentro desse contexto, que, por vezes, as exigências de determinadas profissões podem requerer uma maior formação baseada em competências comportamentais do que em competências técnicas, mormente em situações que envolvam trabalhos em equipe, em que o nível necessário de competências técnicas para execução das funções ou tarefas pode ser alcançado pela soma das competências dos membros da equipe (como, por exemplo, um dos membros detém conhecimentos de direito, outro de informática, outro de contabilidade, e assim sucessivamente); no entanto, as competências comportamentais são individuais e podem ser determinantes para o sucesso dessa mesma equipe.
Citando Remedio e Engelman (2009), as competências individuais são manifestadas por meio de traços comportamentais reflexivos da personalidade de cada indivíduo, os quais potencializam os efeitos de suas ações em um contexto de trabalho. Esses traços comportamentais podem ser avaliados e desenvolvidos em termos de desempenho e constituem as competências comportamentais.
Nesse sentido, a formação comportamental precisa ser considerada em relevo na profissão de auditoria independente, pois é necessário que o auditor se desenvolva não apenas com base em aspectos técnicos, mas, também, em aspectos comportamentais, principalmente ligados à relação humana entre profissionais.
Assim, é imperativo o desenvolvimento de investigações que trabalhem as especificidades desses aspectos, tanto do ponto de vista teórico quanto pela abordagem empírica, sobretudo, esta última, pois, conforme enfatiza Zarifian (2001, p. 67), “a competência só se manifesta na atividade prática, e é dessa atividade que poderá decorrer a avaliação das competências nela utilizadas”.
2.1 Estudos sobre competências em auditoraia
A literatura em auditoria aponta para a necessidade de formação das competências técnicas e comportamentais dos profissionais dessa área. Dentro dessa concepção, alguns estudos nacionais e internacionais procuraram investigar o tema sob distintos enfoques.
Por exemplo, Abdolmohammadi e Shanteau (1992) verificaram a percepção de três grupos (sócios/gerentes, supervisores/seniores e estudantes) sobre a importância de alguns atributos para os auditores especialistas. Entre os resultados da pesquisa, os sócios/gerentes atribuíram mais importância para a forma como pensa um especialista do que como ele se comporta, os seniores/supervisores consideram atributos estratégicos de decisão mais importantes, e os estudantes apontaram maior importância para atributos identificáveis externamente, tais como agir com objetividade e enxergar alternativas existentes.
Alguns anos mais tarde, Tan (1999) investigou atributos considerados importantes para vários níveis da carreira do auditor. Os gerentes e sócios atribuíram maior importância ao tino comercial do que os assistentes e seniores; apenas os sócios consideraram a visibilidade como um atributo importante; a liderança foi considerada menos importante para o nível de assistente do que para outros níveis; e, o trabalho em equipe, mais importante para o sênior e o assistente que para sócio. O autor concluiu que os atributos associados ao desempenho superior de um auditor não são estáticos e mudam de acordo com os níveis organizacionais.
Em 2002, um estudo realizado no Brasil propôs um modelo de referência de formação comportamental para os auditores. A pesquisa foi baseada em um levantamento junto a firmas de auditoria nacionais e multinacionais instaladas na região sul e sudeste do Brasil. Segundo Alberton (2002), dentre as habilidades e competências comportamentais apontadas pelas firmas pesquisadas como importantes para um bom desempenho do auditor podem-se citar: criação e inovação; comunicação; trabalho em equipe; e, maturidade e responsabilidade.
Alberton e Beuren (2003) objetivaram apresentar uma proposta de modelo de formação comportamental de auditores independentes. Para tal, realizaram uma pesquisa junto aos setores de Gestão de Pessoas de firmas de auditoria com atuação no Brasil, dentre as quais, as quatro maiores firmas multinacionais (Big Four) e uma brasileira. O modelo proposto pelos autores foi constituído por elementos como liderança, motivação, comunicação, criatividade, trabalho em equipe, ética e independência, entre outros, e demonstra a contribuição de cada elemento do modelo para a formação e o trabalho do auditor.
Abdolmohammadi, Shanteau e Searfoss (2004) verificaram quais eram os atributos considerados mais importantes pelos auditores especialistas de diferentes setoresparaexercerasuafunção.Osatributosconsiderados de maior expressividade foram: conhecimento; comunicação; competências técnicas; experiência; liderança conhecimento atual; solução de problemas; experiência; e percepção. Os autores não encontraram diferenças significativas para a importância dos atributos dada pelos auditores de diferentes setores de atuação.
Já Palmer, Ziegenfuss e Pinsker (2004) compararam os estudos internacionais sobre competências, publicados por institutos ligados a Contadores e Auditores. Em geral, os conhecimentos, aptidões e habilidades consideradas importantes por estes institutos foram: habilidades de comunicação, habilidades interpessoais, conhecimento do negócio em geral, conhecimento de contabilidade, habilidades na resolução de problemas, tecnologia da informação, atitudes e capacidades pessoais e conhecimentos de informática.
Cardoso (2006) propôs uma estrutura genérica de competências para o contador, compreendida em: (i) competências específicas - contabilidade e finanças, aspectos legais e ferramentas de controle; (ii) competências de conduta e administração - comunicação, empreendedora, estratégica e integridade e confiança; (iii) competências de gerenciamento da informação - gestão da informação, negociação e técnicas de gestão; e, (iv) competências de comunicação - ouvir eficazmente, atendimento e trabalho em equipe. Embora focado em contadores, suas verificações e proposições podem também ser extensíveis aos auditores.
No ano de 2010, Carmona, Pereira e Santos (2010) analisaram as competências requeridas do auditor interno no âmbito do mercado segurador, após as mudanças decorrentes da Lei Sarbanes-Oxley (SOX). Foram identificadas, como mais expressivas, as seguintes competências: conhecimento da SOX e domínio dos conceitos das metodologias de auditoria, em especial, conhecimentos relacionados ao modelo de estrutura integrada de controles internos do COSO (Committee of Sponsoring Organizations), sugerindo a prevalência de competências técnicas sobre as comportamentais.
Frecka e Reckers (2010) trouxeram os resultados da primeira fase de uma pesquisa lançada pelo Comitê de Educação da Associação Americana de Contadores, em 2008, realizada com 500 auditores iniciantes de cinco das mais renomadas firmas de auditoria do mundo. Eles foram inquiridos a respeito de suas percepções sobre as conformidades e inconformidades dos programas de mestrado em contabilidade, a partir de suas perspectivas de formação. Os auditores atribuíram grande importância para as seguintes competências no currículo dos programas de mestrado: pensamento crítico e análise de problemas; relatórios e comunicações escritas; apresentações orais; projetos de trabalho em equipe; e, habilidades de gerenciamento de projetos.
Conforme se depreende das pesquisas referendadas, não se verifica nenhum estudo empírico que demonstre evidências sobre a aplicação prática do que estes profissionais supostamente aprendem na sua formação, de modo a verificar se os conhecimentos a eles repassados são postos em prática na sua atuação cotidiana. Portanto, denota-se a necessidade de uma pesquisa exploratória nesse sentido, que é a lógica empreendida neste trabalho.
3. METODOLOGIA DA PESQUISA
Esta pesquisa tem natureza exploratória, pois buscou investigar a percepção dos auditados em relação à aplicação prática das competências comportamentais dos auditores independentes, tema ainda não abordado em estudos nacionais e internacionais, conforme verificado na revisão da literatura. A este respeito, cabe frisar que pesquisas exploratórias englobam uma abordagem adotada para a busca de maiores informações, com o objetivo de conhecer com maior profundidade o assunto ou tema pesquisado (RAUPP; BEUREN, 2006), sendo este o intento central deste trabalho.
Quanto aos procedimentos, o estudo caracteriza- se como um levantamento, que segundo Martins e Theóphilo (2009) são próprios para os casos em que o pesquisador deseja conhecer as características de pessoas ou grupos. Nesse caso, buscou-se conhecer a percepção dos auditados sobre competências comportamentais dos auditores. O instrumento de pesquisa utilizado para o levantamento foi um questionário.
3.1 Amostra e coleta de dados
A amostra utilizada foi determinada por acessibilidade e de maneira não probabilística. O primeiro procedimento foi o de contatar as firmas de auditoria estabelecidas na região da Grande Florianópolis/SC. Obteve-se deste contato a indicação de aproximadamente 30 empresas auditadas nessa região. Em contato com a área de contabilidade/controladoria dessas empresas, obteve-se a indicação de profissionais que realizam o atendimento dos auditores, os quais optou-se por denominar neste estudo de “auditados”, para efeitos de facilitar sua descrição, muito embora seja conhecido que quem é auditada é a empresa, e não os colaboradores desta.
A estes profissionais (cerca de 100 no total) foi enviado um e-mail, convidando-os a participar da pesquisa, que continha uma carta de apresentação e o endereço da homepage no qual estava disponibilizado o questionário. Esse questionário foi construído a partir do formulário on line do Google™ Docs.
Deste procedimento, obteve-se retorno de 52 questionários, sendo que 1 destes foi descartado em razão de o respondente afirmar nunca ter acompanhado a realização de uma auditoria independente, restando, assim, 51 questionários válidos para a averiguação proposta neste trabalho. Os dados foram coletados entre os meses de julho e agosto do ano de 2010.
3.2 Sobre o questionário utilizado na pesquisa
O questionário, além de perguntas sobre o per- fil dos respondentes, foi estruturado com 21 questões fechadas, a fim de averiguar como as competências comportamentais dos auditores independentes eram percebidas pelos respondentes. Cada questão reali- zada continha a descrição detalhada da competência comportamental em análise, baseada na perspectiva de Alberton (2002) e Leme (2005), para que se ate- nuasse a divergência de entendimentos em relação aos conceitos utilizados em cada item. As competências utilizadas no estudo são apresentadas no Quadro 1.
| Competências | ||
|---|---|---|
| Ambição | Criação e inovação | Maturidade e responsabilidade |
| Argumentação | Empreendedorismo | Motivação |
| Autoconfiança | Flexibilidade | Pensamento crítico |
| Capacitação e desenvolvimento profissional | Foco no cliente | Pró-atividade e dinamismo |
| Comportamento ético | Lealdade | Relacionamento interpessoal |
| Comprometimento | Lidar com pressão e situações tensas | Resolução de problemas, conflitos e negociação |
| Comunicação | Liderança | Trabalho em equipe |
A partir da estruturação de cada item/competência em forma de questão, com possibilidades de respostas fechadas, solicitou-se aos respondentes que indicassem em uma escala ordinal, do tipo likert de 5 (cinco) pontos, qual a sua percepção em relação à competência comportamental analisada. As opções permitiam assinalar: (1) para nenhuma percepção da competência, (2) para baixa percepção, (3) para média percepção, (4) para alta percepção e (5) para muito alta percepção da competência.
O envio definitivo do questionário foi precedido de um pré-teste, realizado com 3 (três) dos respondentes da pesquisa, com o intuito de verificar, principalmente, o nível de compreensão e absorção das questões.
Estes respondentes foram entrevistados para verificação da necessidade de ajustes/modificações, que quando pertinentes foram realizados.
3.3 Tratamento e análise dos dados
Osdadoscoletadosforamtratadosdeformaquantitativa para facilitar a análise, mediante a utilização de estatística descritiva, com a indicação de medianas, médias e desvio padrão, calculados com auxílio do Microsoft Excel®.
A regra geral estabelecida foi de quanto mais próximo do número cinco (5) fosse a indicação da competência comportamental analisada, mais alta seria a percepção dos respondentes a respeito desta, e, por consequência, quanto mais próximo estivesse do número um (1) menor seria a percepção da competência em questão.
A análise dos dados foi dividida de duas formas: a primeira para verificar a percepção dos respondentes de forma contextual, sem a consideração de nenhuma característica específica; e, a segunda, para verificar se existia variação na percepção dos respondentes quando divididos em grupos em função do enquadramento funcional do auditor que tiveram contato profissional (conforme Quadro 2). Esta última segregação foi feita por se acreditar - em conformidade com os achados de Tan (1999) de que as competências do auditor não são estáticas e mudam de acordo com seu enquadramento funcional - que a percepção das competências poderia variar em razão do nível de maturidade do profissional que o respondente teve contato.
| Enquadramento Funcional | Descrição das Características Gerais |
|---|---|
| Trainee/ Assistente | profissional iniciante nas atividades de auditoria, que participa dos trabalhos da equipe de auditoria em campo. |
| Pleno/ Semissênior | profissional que participa dos trabalhos da equipe de auditoria em campo, com razoável experiência, mas que não exerce nem funções de coordenação/liderança da equipe, tampouco se trata de um iniciante na atividade de auditoria (nível intermediário). |
| Sênior/ Supervisor | profissional destinado a coordenar, acompanhar, executar e revisar os trabalhos de auditoria e que, geralmente, lidera a equipe de trabalho em campo. |
| Gerente | profissional de alto nível de experiência cujas funções principais compreendem planejar, coordenar e controlar os trabalhos de auditoria. Tem dentre suas atribuições, reunir-se com clientes para discutir o relatório final e dirigir e treinar funcionários da firma de auditoria. Por vezes, pode ser um profissional já habilitado como auditor independente, podendo, assim, assinar o Parecer da Auditoria. |
| Sócio | profissional habilitado como auditor independente (em geral, aquele que assina o Parecer da Auditoria). Dedicam boa parte de seu tempo às relações comerciais e aos contatos profissionais. |
Nesse caso, para fins de padronização, dividiu-se o enquadramento funcional dos auditores em cinco categorias, conforme é possível visualizar no Quadro 2. Cada enquadramento funcional foi considerado um agrupamento de “auditor de contato”. A respeito dessa questão, cabe frisar que foi solicitado aos respondentes que as questões fossem respondidas tendo em mente a referência do último profissional que teve contato.
Como o objetivo não foi estabelecer uma relação dessas questões, mas apenas verificar se existe de fato essa tendência, adotou-se um procedimento geral para simplificar a análise, ou seja, o de segregar como competências com alta classificação aquelas com média igual ou superior a 4 (quatro) e como competências com baixa classificação aquelas com média igual ou inferior a 3 (três). Essa divisão possibilitou verificar se as competências de maior percepção e de menor percepção seriam diferentes, comparando tais grupos com o resultado geral (Tabelas 1, 2 e 3).
| Características Comportamentais do auditor | Percepção | Características Comportamentais do auditor | Percepção | ||||||
|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
| N | M | MD | DP | N | M | MD | DP | ||
| Ambição | 51 | 5 | 4,33 | 0,77 | Resolução de problemas, conflitos e negociação | 51 | 4 | 3,55 | 0,67 |
| Comportamento ético | 51 | 4 | 4,12 | 0,86 | Liderança | 51 | 4 | 3,39 | 1,08 |
| Capacitação e desenvolvimento profissional | 51 | 4 | 4,02 | 1,03 | Relacionamento interpessoal | 51 | 4 | 3,39 | 1,06 |
| Comprometimento | 51 | 4 | 3,98 | 0,79 | Argumentação | 51 | 4 | 3,31 | 0,97 |
| Motivação | 51 | 4 | 3,90 | 0,70 | Lidar com pressão e situações tensas | 51 | 3 | 3,39 | 0,85 |
| Maturidade e responsabilidade | 51 | 4 | 3,86 | 0,94 | Foco no cliente | 51 | 3 | 3,29 | 0,86 |
| Autoconfiança | 51 | 4 | 3,76 | 1,07 | Criação e inovação | 51 | 3 | 3,27 | 0,85 |
| Trabalho em equipe | 51 | 4 | 3,76 | 1,05 | Empreendedorismo | 51 | 3 | 3,16 | 1,05 |
| Lealdade | 51 | 4 | 3,76 | 0,76 | Pensamento crítico | 51 | 3 | 3,10 | 1,10 |
| Comunicação | 51 | 4 | 3,61 | 0,78 | Flexibilidade | 51 | 3 | 3,02 | 0,73 |
| Pró-atividade e dinamismo | 51 | 4 | 3,59 | 0,83 | |||||
| Competências Comportamentais | Auditor de contato | |||||
|---|---|---|---|---|---|---|
| Sócio | Gerente | Sênior/ Supervisor | Pleno/ Semissênior | Trainee/ Assistente | Média Geral1 | |
| Ambição | 4 | 4,44 | 4,75 | 4,19 | 4,1 | 4,33 |
| Argumentação | 4 | - | - | - | - | - |
| Autoconfiança | 4,25 | 4,33 | - | - | - | - |
| Capacitação e desenvolvimento profissional | - | 4,11 | 4,67 | - | - | 4,02 |
| Comportamento ético | 4,5 | 4,33 | 4,08 | 4,13 | - | 4,12 |
| Comprometimento | 4 | 4 | 4,08 | 4 | - | - |
| Comunicação | 4 | - | - | - | - | - |
| Foco no cliente | 4 | - | - | - | - | - |
| Lealdade | 4 | 4 | - | - | - | - |
| Lidar com pressão e situações tensas | 4 | - | - | - | - | - |
| Liderança | 4 | - | - | - | - | - |
| Maturidade e responsabilidade | 4,75 | 4,11 | - | - | - | - |
| Motivação | 4 | 4 | - | 4,06 | - | - |
| Relacionamento interpessoal | 4 | - | - | - | - | - |
| Resolução de problemas, conflitos e negociação | 4,25 | - | - | - | - | - |
| Trabalho em equipe | 4,25 | 4,11 | - | - | - | - |
| Competências Comportamentais | Auditor de contato | |||||
|---|---|---|---|---|---|---|
| Sócio | Gerente | Sênior/ Supervisor | Pleno/ Semissênior | Trainee/ Assistente | Média Geral1 | |
| Ambição | 4 | 4,44 | 4,75 | 4,19 | 4,1 | 4,33 |
| Argumentação | 4 | - | - | - | - | - |
| Autoconfiança | 4,25 | 4,33 | - | - | - | - |
| Capacitação e desenvolvimento profissional | - | 4,11 | 4,67 | - | - | 4,02 |
| Comportamento ético | 4,5 | 4,33 | 4,08 | 4,13 | - | 4,12 |
| Comprometimento | 4 | 4 | 4,08 | 4 | - | - |
| Comunicação | 4 | - | - | - | - | - |
| Foco no cliente | 4 | - | - | - | - | - |
| Lealdade | 4 | 4 | - | - | - | - |
| Lidar com pressão e situações tensas | 4 | - | - | - | - | - |
| Liderança | 4 | - | - | - | - | - |
| Maturidade e responsabilidade | 4,75 | 4,11 | - | - | - | - |
| Motivação | 4 | 4 | - | 4,06 | - | - |
| Relacionamento interpessoal | 4 | - | - | - | - | - |
| Resolução de problemas, conflitos e negociação | 4,25 | - | - | - | - | - |
| Trabalho em equipe | 4,25 | 4,11 | - | - | - | - |
4. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
O perfil dos respondentes constitui-se de aspectos que podem influenciar nas suas respostas, principalmente no que se refere à sua experiência com auditorias. Observou- se que 41,2% dos respondentes possuíam especialização, 21,6% mestrado, 2% doutorado, 23,5% somente graduação e 11,7% formação técnica e/ou ensino médio.
Quanto à formação dos respondentes, a área contábil representou a maior fatia (39,2%), seguida de administração (17,6%), economia (15,7%) e demais áreas, tais como direito, engenharia, entre outras (27,5%). Com esses dados, observou-se que a formação dos respondentes concentrou-se na área de contabilidade e finanças, o que pode influenciar positivamente no nível de conhecimento das funções exercidas pelo auditor independente e de suas competências comportamentais.
Uma parte expressiva dos respondentes da amostra possuía mais de 21 anos de experiência profissional (33,3%), o que demonstra um maior amadurecimento profissional dos participantes. Os demais estão distribuídos entre: 1 ano (7,8%); 2 a 5 anos (21,6%); 6 a 10 anos (27,5%); e, 11 a 20 anos (9,8%).
Quanto à experiência dos respondentes em relação ao acompanhamento da realização de auditorias independentes, uma parcela significativa (25,5%) já teve contato com auditores por mais de 11 vezes, indicando, experiência relativamente sólida no acompanhamento da atividade. Observou-se, ainda, que os respondentes que já acompanharam de 3 a 5 auditorias totalizam 39,2%; outros 11,8% já passaram por 6 a 10 auditorias; e, por fim, aqueles que apresentam menor experiência de contato com a auditoria independente representam 23,5% dos respondentes. Isto demonstra que a amostra é, também, composta por indivíduos com razoável envolvimento com auditorias independentes.
As ocupações funcionais dos respondentes estão distribuídas entre os seguintes setores: contábil (41,3%); econômico-financeiro e recursos humanos (ambos com 13,7%); engenharia (9,8%); auditoria interna (7,8%); jurídico, planejamento e orçamento e tributário (ambos com 3,9%); e, diretoria (2,0%). Quanto às funções exercidas pelos respondentes, a maioria constitui-se de analistas (35,2%), seguido de gerentes/diretores (19,5%), contadores (11,8%), chefes de seção, auxiliares administrativos e engenheiros (ambos com 5,9%), técnicos em contabilidade e auditores internos (ambos com 3,9%) e economistas, advogados, técnicos em eletrônica e assessores vinculados à diretoria (ambos com 2%).
Cabe enfatizar que, em geral, os ocupantes de funções gerenciais e de diretoria, pela sua natureza tática e/ou estratégica, tendem a estabelecer maior relação com Auditores Sócios ou Auditores Gerentes (funções estas que constituem, em geral, o topo das carreiras de auditoria), o que, em outras palavras, pode conduzir a uma percepção mais elevada das competências comportamentais dos auditores.
A forma de contato estabelecida primordialmente entre auditado e auditor permite inferir sobre a pessoalidade nas relações profissionais. O tipo de contato mais frequente entre auditor e auditado indicado pelos respondentes foi pessoal (64,8%). Outros 23,5% indicaram que ocorre por meio de relatórios, e o restante através de contato eletrônico (7,8%) ou telefônico (3,9%). Isso denota que, delimitado às empresas pesquisadas, existe uma maior relação profissional direta com o auditor, de modo a tornar mais consistente a percepção dos respondentes sobre o comportamento desses agentes.
Quanto à função exercida pelo auditor com o qual os respondentes tiveram maior contato, a distribuição das respostas está concentrada em Pleno/Semissênior e Sênior/Supervisor, com respectivamente 31,4% e 23,5%; seguida de Trainee/Assistente com 19,6%; e, finalmente, Gerente com 17,7% e Sócio com 7,8%. Nota-se, com estas informações, a predominância na amostra utilizada na pesquisa, de respondentes que tiveram contato com auditores de média experiência.
4.2 Percepções das competências comportamentais do auditor
As percepções dos respondentes em relação às competências comportamentais dos auditores independentes foram classificadas em ordem crescente, utilizando como primeiro critério para a ordenação a mediana, e como segundo a média, conforme Tabela 1.
Ressalta-se que foram realizados Testes T (Student) de diferença de médias entre respondentes que tiveram contato apenas com gerentes e sócios e aqueles que tiveram contato com Trainees/Assistentes, Plenos/ Semisseniores e Seniores/Supervisores. Como nesses testes não foram constadas diferenças significativas entre os grupos, exceto no que tange às competências “empreendedorismo”, “pró-atividade e dinamismo”, “pensamento crítico”, “autoconfiança” e “maturidade e responsabilidade”, optou-se pela apresentação de uma análise geral na Tabela 1 e uma análise separada em função do enquadramento funcional do auditor de contato nas Tabelas 2 e 3.
Observa-se que a média das competências variou entre 3,02 para “flexibilidade” a 4,33 para “ambição”.Considerando que a escala utilizada na pesquisa varia entre 1-5, os resultados indicaram que as competências avaliadas no estudo foram classificadas pelos respondentes entre média percepção (mediana 3) e alta percepção (mediana 4), com exceção da competência “ambição” (mediana 5). O desvio padrão das respostas coletadas apenas em 7 itens foi superior a 1, apontando uma variação pequena entre a percepção dos respondentes, o que denota baixa discrepância entre as respostas no conjunto da pesquisa.
A competência comportamental de mais alta percepção, quando considerada a média, foi a “ambição” (4,33), apontando que os auditores demonstram determinação na realização de seus trabalhos e foco em seus objetivos, contudo, dentro dos limites da ética, conforme outra competência verificada, “comportamento ético” (4,12), reafirma. A este respeito, a percepção dos respondentes, indica que os auditores que tiveram contato demonstram atitudes íntegras, senso de justiça e impessoalidade em suas ações.
Ainda entre as competências classificadas na parte superior da Tabela 1, destacam-se “capacitação e desenvolvimento profissional” (4,02) e “comprometimento” (3,98), o que pode sugerir, na opinião dos respondentes, que o auditor demonstra buscar ativamente qualificação e aprimoramento pessoal e profissional, em sua área de atuação, além de se dedicar e empenhar-se no cumprimento de metas e objetivos na realização de sua atividade.
Em sentido contrário, a competência que obteve a mais baixa percepção dos respondentes foi a “flexibilidade” (3,02), sugerindo na opinião dos inquiridos que os auditores demonstram por vezes dificuldade de adaptação às novas situações de trabalho, inerentes à sua área de atuação, como também na adaptação à utilização de novos métodos, procedimentos e estratégias.
As ponderações apresentadas até aqui se tratam de observações gerais, isto é, da percepção dos respondentes de forma contextual, sem a consideração de nenhuma característica específica.
Todavia, recorrendo-se à divisão dos respondentes em grupos em função do enquadramento funcional do auditor que estes tiveram o último contato profissional, os resultados apresentam-se de maneira distinta. As percepções com alta classificação (igual ou superior a 4) estão listadas na Tabela 2.
A competência “ambição” obteve alta classificação em todos os grupos de respondentes.
No caso do grupo em que o contato foi o Gerente, tal percepção pode estar relacionada ao fato de esse estágio da carreira ser precedente ao ingresso (ou não) no quadro societário da firma de auditoria, quando o profissional atinge seu nível máximo na carreira.
Quanto aos casos em que o grupo teve contato com o Trainee/Assistente, Pleno/Semissênior e Sênior/ Supervisor, esses fatores podem ser motivados, sobretudo, eladisposição/entusiasmodeesseprofissionaldemonstrar sua capacidade e vontade de prosseguir na carreira.
Por outro lado, as competências “comportamento ético” e “comprometimento” obtiveram alta classificação em todos os grupos, exceto pelo que teve contato com o Trainee/Assistente. Uma possível explicação para esse resultado se deve ao fato de que, profissionais mais experientes tendem a demonstrar maior nível de consciência de suas ações, maior responsabilidade e, consequentemente, maior integridade e impessoalidade.
A competência “comprometimento” não aparece com alta classificação na Tabela 1 (em que foi considerada a percepção dos respondentes sem a consideração de nenhuma característica específica), o que sugere maior percepção desta em conformidade com a ascensão funcional do auditor de contato do respondente.
A “capacitação e desenvolvimento profissional” obteve alta classificação apenas pelos que tiveram contato com o Gerente ou Sênior/Supervisor. Para Tan (1999), nesse estágio da carreira, o profissional tem como uma das funções essenciais a supervisão de toda auditoria, com intuito de buscar padrões de qualidade e gestão do trabalho, podendo, assim, guardar relação com o interesse pela busca ativa de qualificação e aprimoramento profissional.
Além disto, nota-se, comparativamente à Tabela 1, que algumas competências que não alcançaram alta classificação anteriormente, obtiveram classificações superiores quando desta divisão. Esse é o caso das competências: “argumentação”; “lidar com pressão e situações tensas”; “liderança”; “resolução de problemas, conflitos e negociação”; “comunicação”; “foco no cliente”; e, “relacionamento interpessoal”; em que a alta classificação ocorreu, exclusivamente, pelos respondentes cujo contato foi o Sócio.
Estas três últimas competências foram evidenciadas no estudo de Tan (1999) como essenciais para o profissional que ocupa a função de Sócio que, segundo o autor, tem nesse estágio da carreira como uma das responsabilidades fundamentais a busca e atendimento da clientela da firma de auditoria. Assim, para o cumprimento dessa tarefa são características importantes para o auditor, entre outras, comunicar-se com efetividade, relacionar-se bem com as pessoas de contato profissional e ter conhecimento amplo dos negócios dos clientes, de modo que possa garantir a qualidade dos serviços de auditoria oferecidos a estes.
Outras competências que obtiveram alta classificação na Tabela 2, relativamente aos grupos cujo contato foi o Sócio ou Gerente, como “autoconfiança”, “lealdade”, “maturidade e responsabilidade” e “trabalho em equipe”, denotam que, na percepção desses indivíduos, auditores em estágios mais altos da carreira transparecem convicção da capacidade de realizar suas tarefas e aparentam postura sincera, honesta e leal à firma de auditoria para a qual prestam serviço.
No estudo de Abdolmohammadi e Shanteau (1992), a competência “autoconfiança” também é indicada como relevante para o auditor. Por outro lado, ao contrário do encontrado nesta pesquisa, “trabalho em equipe”, foi identificado no trabalho de Tan (1999) como mais importante para o Trainee/ Assistente e Sênior/Supervisor, do que para os Sócios.
Em sentido oposto ao da Tabela 2, na Tabela 3 pode-se verificar as competências que obtiveram baixa classificação (ou seja, média igual ou inferior a 3).
Observa-se que quando analisada a percepção do grupo em conjunto, isto é, sem a divisão em função do auditor de contato, nenhuma competência obteve baixa classificação (ver Tabela 1).
Entre as competências que obtiveram baixa classificação foram: “empreendedorismo”; “criação e inovação”; e, “pró-atividade e dinamismo”. A primeira obteve essa classificação dos grupos cujo contato foi o Sócio e Gerente, e, as outras duas, exclusivamente pelo grupo que o contato foi o Sócio.
A baixa percepção dessas competências pode indicar que, na opinião dos respondentes, o auditor nesse estágio, não demonstra preocupação em buscar soluções para problemas apresentados pela empresa auditada antes que estes se estabeleçam. Além disso, não se dispõe a colocar em prática soluções que possam ser utilizadas no desenvolvimento do serviço de auditoria e que contribuam para melhorias na empresa auditada. Esse comportamento pode resultar, por vezes, em uma atuação excessivamente conservadora e conformista diante dos problemas apresentados pela entidade auditada.
A competência “flexibilidade”, que obteve a menor classificação pelo grupo em conjunto (Tabela 1), contudo acima da média 3, nesta segregação (Tabela 3), obteve baixa classificação, apenas pelos grupos que tiveram contato com o Sênior/Supervisor e Pleno/Semissênior. Uma das explicações que podem auxiliar na compreensão desse resultado é a natureza do contato estabelecido entre auditado/auditor. O Trainee/Assistente, por exemplo, comumente não trata de assuntos que necessite de tomada de decisão de revisão/modificação de procedimentos/ processos, não existindo, assim, um contato que coloque à prova sua capacidade de flexibilidade.
Três competências foram classificadas com baixa percepção apenas pelo grupo de respondentes cujo contato foi o Trainee/Assistente: “relacionamento interpessoal”; “lidar com pressão e situações tensas”; e, “liderança”, sugerindo que, em sua opinião, esses profissionais possuem baixa capacidade de interagir com as pessoas de forma empática e respeitosa em situações adversas (de conflito), de modo a manter o ambiente cordial na realização da auditoria.
É possível indicar ainda que, na percepção dos respondentes, esses profissionais demonstram dificuldade em compreender e responder às situações de tensão durante a realização da auditoria e, ainda, de rever sua postura mediante situações e fatos que venham de encontro a sua opinião (revisão e análise de opiniões contrárias às suas). Além disso, a baixa percepção da competência “liderança” sugere que, para os respondentes, o Trainee/Assistente demonstra baixa capacidade para orientar os auditados e/ou auditores da sua equipe de trabalho na condução dos trabalhos de auditoria.
Abaixapercepçãodessascompetênciaspelogrupocujo contato foi o Trainee/Assistente pode ser explicado pela afirmação feita por Tan e Libby (1997), que argumentam que o principal determinante de um bom desempenho do auditor no estágio inicial da carreira é o conhecimento técnico, visto que os trabalhos desenvolvidos nessa fase são mais estruturados, não necessitando prioritariamente da utilização de competências como a comunicação e o relacionamento interpessoal, por exemplo.
A competência “pensamento crítico” obteve baixa classificação pelos grupos cujo contato foi o Sênior/ Supervisor e Trainee/Assistente, sugerindo que para os auditados, nesse estágio, estes não possuem muita habilidade para interpretação e avaliação das observações, comunicações, informações e argumentações relacionadas aos serviços de auditoria.
Observa-se que os respondentes cujo contato foi o Sênior/Supervisor classificaram também como baixa a percepção da competência “foco no cliente”, sugerindo que o auditor nessa fase não demonstra compreender as necessidades dos auditados, não realizando atendimento personalizado à empresa auditada, e nem apresentando propostas de soluções de forma tempestiva. Similarmente a esse resultado, Tan (1999) apontou que competências relacionadas ao conhecimento do cliente, seriam mais relevantes para os Sócios, do que em qualquer outra posição na carreira do auditor.
Cabe salientar que algumas competências que obtiveram alta classificação pelo grupo de respondentes cujo contato foi o Sócio (Tabela 2) obtiveram baixa classificação pelo grupo que teve contato com o Trainee/ Assistente (Tabela 3). Fazem parte dessas competências a “liderança”, o “relacionamento interpessoal” e “lidar com pressão e situações tensas”, sugerindo que profissionais mais experientes, como é o caso do Sócio, possuem algumas competências comportamentais mais desenvolvidas que profissionais que possuem menor experiência, como é o caso do Trainee/Assistente.
A diferença entre a percepção dessas competências é passível de compreensão. No primeiro caso, o profissional em início de carreira, Trainee/Assistente, está na fase de exercer o papel de liderado e não de líder, não sendo esta, uma competência de alta expressividade nessa fase. Todavia, há que se perceber que essa competência lhe será requisitada no desenvolvimento/andamento de sua carreira.
Já no segundo e no terceiro caso, a maior classificação atribuída pelo grupo que o contato foi o Sócio pode derivar potencialmente de sua experiência profissional em estabelecer um relacionamento interpessoal harmonioso e sua maior habilidade para lidar com situações adversas, como a resolução de conflitos durante a realização da auditoria, demonstrando, assim, capacidade de manter o ambiente de trabalho mais cordial para auditores e auditados.
Para uma melhor visualização da evolução de algumas competências estudadas nesta pesquisa de acordo com as funções exercidas pelo auditor, estas foram demonstradas no Gráfico 1.

É necessário esclarecer que as competências constantes no Gráfico 1 foram selecionadas devido a sua relação positiva com o enquadramento funcional do auditor de contato dos respondentes, ou seja, à medida que este aumenta, a percepção dos respondentes sobre a competência também aumenta. Entre elas estão: “comunicação”; “lidar com pressão e situações tensas”; “liderança”; “maturidade e responsabilidade”; e, “trabalho em equipe”.
Similarmente a este estudo, a pesquisa de Tan (1999) também aponta as competências “comunicação” e “liderança” como mais expressivas, quando os auditores exercem a função de Sênior/Supervisor, Gerente ou Sócio, por exemplo. Observou-se também para algumas competências uma maior percepção quando o auditor de contato foi o Sócio, sugerindo que profissionais com grau mais elevado de experiência, possuem competências comportamentais mais desenvolvidas, na visão dos respondentes. Além disso, através dos resultados apresentados na pesquisa, tornou-se evidente que a percepção dos respondentes variou conforme o enquadramentofuncionaldoauditorquetiveramcontato.
Em geral, os resultados encontrados na pesquisa confirmam a afirmação de Tan (1999) de que as competências associadas ao bom desempenho do auditor não são estáticas e variam entre os níveis organizacionais. Como efeito, outra ponderação do autor também pode ser aplicada a este trabalho, com a verificação de que as competências consideradas importantes para profissionais iniciantes podem ser menos importantes para os que estão em níveis mais altos.
5. CONCLUSÕES
Esta pesquisa foi norteada pela investigação das competências comportamentais previstas na literatura como necessárias à maximização da eficiência e eficácia dos trabalhos realizados pelas firmas de auditoria independente. O que difere este trabalho dos estudos revisados é que se abordou a investigação da percepção dos auditados em relação às competências comportamentais do auditor independente.
Em relação ao problema de pesquisa, torna-se possível concluir que a percepção dos auditados em relação às competências comportamentais dos auditores contábeis independentes analisadas no estudo produziu uma classificação acima da média (considerando a escala utilizada 1-5). Todas as competências pesquisadas foram classificadas pelos respondentes com média superior a 3 (escala 1-5), com escore entre média (mediana 3) e alta percepção (mediana 4), exceto para “ambição” (mediana 5). Quanto aos extremos, a percepção variou entre 4,33, para “ambição”, e 3,02, para a “flexibilidade”, considerando-se a média.
Para algumas competências, quanto maior o enquadramento funcional do auditor, mais alta foi a sua classificação e, portanto, maior a percepção dos auditados em relação a estas. Essa variação confirmou as expectativas da pesquisa, de que profissionais mais experientes (Sócios e Gerentes) teriam competências comportamentais mais desenvolvidas (uma percepção próxima a 5, dentro da escala proposta) que profissionais menos experientes (Trainee/Assistentes e Plenos/Semissênior), uma vez que estão iniciando a carreira de auditoria e se encontram em processo de desenvolvimento e aprimoramento dessas competências (uma percepção próxima a 3, dentro da escala proposta).
Observou-se que as competências “liderança”, “relacionamento interpessoal” e “lidar com pressão e situações tensas” obtiveram alta classificação pelo grupo de respondentes que teve contato com profissionais mais experientes, e baixa classificação pelo grupo que teve contato com profissionais menos experientes, sugerindo que os auditores mais experientes têm algumas competências comportamentais mais desenvolvidas que aqueles com menor experiência.
Reforçando esse fato, a pesquisa ainda revelou que, no caso das competências “comunicação”, “lidar com pressão e situações tensas”, “liderança”, “maturidade e responsabilidade” e “trabalho em equipe”, os escores de percepção dos grupos aumentavam de acordo com o enquadramento funcional do auditor (Trainee/Assistente menor que Pleno/Semissênior, por sua vez, menor que Sênior/Supervisor, e, assim, sucessivamente), o que se alinha à afirmação de Tan (1999), o qual sugere que as competências do auditor não são estáticas e mudam de acordo com a função exercida por este.
Assim, é possível visualizar que a percepção dos auditados relativamente às competências do auditor pode variar de acordo com seu estágio na carreira, o que denota que estas não são estáticas e que possivelmente as competências que são importantes no início da carreira do auditor podem ser substituídas por outras conforme esse profissional adquire mais experiência.
Outro ponto a considerar sobre o tema é que geralmente as firmas de auditoria efetuam a avaliação da evolução das competências dos seus auditores, na maioria das vezes por profissionais superiores das equipes de trabalho, que são consideradas tanto para promoção, como para aconselhamento,treinamentoouatémesmoparademissões (ALBERTON, 2002; ALBERTON; BEUREN, 2003).
Dessa forma, é fundamental para as firmas de auditoria mecanismos que ofereçam possibilidade de gerenciar individual e coletivamente a evolução dos seus auditores, de maneira tempestiva (no tempo em que ocorrem os problemas ou desvios) e pontual (sobre as competências que estão insuficientes), proporcionando um feedback ao auditor e possibilitando melhorias em seu desempenho. Através de uma abordagem mais focada na melhoria do desempenho dos profissionais, em substituição a uma abordagem meramente disciplinar, é possível potencializar a condução de melhores resultados.
Através da realização da presente pesquisa, uma sugestão que surge para as firmas de auditoria seria a implantação da avaliação de desempenho 360º, no sentido que estas possam verificar se as competências comportamentais exigidas no processo de seleção dos auditores e aperfeiçoadas nos cursos de capacitação são percebidas por seus clientes (auditados). Assim, além de contratarem auditores que apresentem o perfil por elas desejado, continuariam a trabalhar em sua capacitação, não só avaliando os profissionais internamente, de maneira direta por seus superiores, mas, também externamente, em uma perspectiva independente de vieses da relação rotineira de trabalho, ou seja, relação auditor/auditado, focando na relação da qualidade do serviço prestado aos seus clientes.
Por fim, embora outras possam existir, cabe destacar, dentre as limitações do estudo, que se trata de uma pesquisa com amostra por acessibilidade e não probabilística e, dessa forma, os resultados obtidos não devem ser estendidos a outros respondentes. Ressalta- se, também, que as evidências obtidas neste estudo tratam-se da percepção dos respondentes no momento do preenchimento do questionário, os quais podem ter sido influenciados por seu estado emocional ou mesmo pela memória do último contato estabelecido com o auditor independente, fatores estes que podem ter enviesado as respostas/dados da pesquisa.
É recomendável que novas pesquisas aprofundem e avancem o que foi trabalhado, para que se busque a legitimação e/ou comparação dos resultados aqui apresentados, seja através da investigação de outras amostras, ou até mesmo pela exploração de outras competências não investigadas neste estudo.
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