Resumo: As Itacoatiaras do Ingá, conhecidas como Pedra do Ingá, são um conjunto rochoso com complexas inscrições rupestres que ainda suscitam mistério quanto à sua origem, gerando diversas interpretações e turismo local. Entretanto, ações antrópicas e naturais vêm causando impactos negativos na conservação desse patrimônio. O objetivo desse estudo foi analisar o turismo praticado e o ecoturismo como alternativa de conservação ambiental e sociocultural do sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá, Paraíba, Brasil. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, com pesquisa documental e de campo, com levantamento dos atrativos locais e uso de entrevistas semiestruturadas com atores envolvidos com o sítio (gestores, guias, condutores turísticos, turistas e população local). Os dados coletados foram analisados por meio da análise de conteúdo categorial-temática em busca de avaliar os potenciais não explorados, os impactos das ações antrópicas negativas e as percepções e imagens que os ingaenses têm sobre o sítio. Foi observada a ausência de infraestrutura do município para receber os turistas, problemas referentes à preservação do monumento e de todo o sítio arqueológico e uma incipiente participação da população local na atividade desenvolvida. Assim, o ecoturismo e a aplicação de seus princípios pode ser uma alternativa sustentável para a cidade, o sítio arqueológico e para os moradores.
Palavras-chave: Patrimônio cultural, Turismo, Desenvolvimento.
Abstract: The Itacoatiaras of Ingá, known as Pedra do Ingá, are a rocky set with complex primitive inscriptions that still raise mystery as to their origin, generating several interpretations and local tourism. However, anthropic and natural actions have been causing negative impacts on the conservation of this heritage. The aim of this study was to analyze tourism practiced and ecotourism as an alternative for environmental and sociocultural conservation at the Itacoatiaras do Ingá archeological site, Paraíba, Brazil. It is a qualitative research, with documental and field research, with a survey of local attractions and the use of semi-structured interviews with actors involved with the site (managers, guides, tourist conductors, tourists and local population). The collected data were analyzed through categorical-thematic content analysis in order to assess the unexplored potentials, the impacts of negative anthropic actions and the perceptions and images that the people of Inga have about the site. It was observed the lack of infrastructure in the municipality to receive tourists, problems related to the preservation of the monument and the entire archaeological site and an incipient participation of the local population in the activity developed. Thus, ecotourism and the application of its principles can be a sustainable alternative for the city, the archaeological site and for the residentsKeywords: Cultural heritage. Tourism. Development.
Keywords: Cultural heritage, Tourism, Development.
Resumen: : Las Itacoatiaras de Ingá, conocidas como Pedra do Ingá, son un conjunto rocoso con complejas inscripciones primitivas que aún suscitan misterio en cuanto a su origen, generando diversas interpretaciones y turismo local. Sin embargo, las acciones antrópicas y naturales han causado impactos negativos en la conservación de este patrimonio. El artículo tiene como objetivo analizar el turismo practicado y el ecoturismo como alternativa para la conservación ambiental y sociocultural del sitio arqueológico Itacoatiaras do Ingá, Paraíba, Brasil. El objetivo principal fue analizar el modelo turístico existente y proponer el ecoturismo como una alternativa para la conservación del sitio arqueológico de Itacoatiara do Ingá. Se trata de una investigación cualitativa, con investigación documental y de campo, con una encuesta sobre las atracciones locales y el uso de entrevistas semiestructuradas con los actores relacionados con el lugar (gestores, guías, conductores turísticos, turistas y población local). Los datos recogidos se analizaron mediante un análisis de contenido categórico-temático para evaluar los potenciales inexplorados, los impactos de las acciones antrópicas negativas y las percepciones e imágenes que los lugareños tienen sobre el sitio. Se la falta de infraestructura en el municipio para recibir turistas, problemas relacionados con la preservación del monumento y de todo el sitio arqueológico y una incipiente participación de la población local en la actividad desarrollada. Concluye, por tanto, que el ecoturismo y la aplicación de sus principios pueden ser una alternativa sostenible para la ciudad, el sitio arqueológico y para los habitantes.
Palabras clave: Palabras- Clave: Patrimonio Cultural, Turismo, Desarrollo.
Sítio Arqueológico Itacoatiaras do Ingá: do turismo praticado ao Ecoturismo como alternativa de conservação
Itacoatiaras of Inga archaeological site: from tourism to ecotourism as a conservation alternative
Sitio arqueológico Itacoatiaras do Ingá: del turismo practicado al ecoturismo como alternativa de conservación
Recepción: 24 Abril 2021
Aprobación: 03 Octubre 2021
O turismo é a atividade terciária que mais cresce no Brasil. Em 2017 movimentou cerca de US$ 163 bilhões, equivalente a 7,9% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, segundo dados do Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC). A Organização Mundial de Turismo (OMT) tenta promover a atividade turística visando alcançar as metas da agenda global de Desenvolvimento sustentável. A atividade turística é uma importante aliada na busca pelos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) propostos durante a Cúpula das Nações Unidas em 2015 (Brasil, 2010).
O Ministério do Turismo Brasileiro, seguindo o direcionamento da OMT, tem desenvolvido uma estratégia de expansão do turismo no Brasil através do Programa de Regionalização do Turismo, uma política focada no desenvolvimento regional que atribui maior protagonismo às entidades da federação (Brasil, 2010). Os municípios formam consórcios e apoiam-se mutuamente, criando fóruns onde procuram trabalhar o potencial de cada lugar e os segmentos turísticos que podem ser desenvolvidos.
As propostas visando alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável levantaram questões importantes sobre o planejamento e a execução da atividade turística. Se a proposta para o desenvolvimento é a prática do turismo sustentável, é necessário trazer para a discussão o turismo de massa, representado, em sua maior parte, pelo segmento “sol e mar”, hegemônico no mercado turístico brasileiro, e seu papel como um dos principais vilões do meio ambiente natural e cultural (Braga & Selva, 2016; Souza Junior & Pereira, 2020).
A atividade turística convencional tem seguido a proposta do capital hegemônico, que compreende que as localidades não passam de mero atrativo capaz de gerar riquezas para uma parcela da sociedade, em detrimento do patrimônio natural, cultural e da força de trabalho local. Dessa maneira, verifica-se uma privatização de recursos naturais públicos em benefício de um modelo de desenvolvimento global que ignora as particularidades locais (Braga & Selva, 2016; Castro-Garzón & Montealegre-Torres, 2020).
Braga e Selva (2016), refletindo sobre o turismo convencional em países periféricos, identificam uma naturalização da desigualdade social que se manifesta, entre outros efeitos, na criação de “subcidadãos”. Um exemplo dessa dinâmica social é a atuação dos donos de hotéis de luxo, bares, restaurantes e empresas de turismo que se beneficiam da atividade turística deixando de fora o pequeno comerciante, a economia extrativa, a população local e, principalmente, o cuidado com a conservação da natureza e com a cultura local.
A mentalidade média dos gestores e dos envolvidos no turismo em cidades interioranas do Brasil é de que, para oferecer um produto adequado ao turista, devem seguir um padrão de qualidade orientado pela lógica do consumo de massa global. Esse padrão pode ser, por exemplo, oferecer lanchonetes da linha McDonald's ou Bob’s e restaurantes com comidas típicas de outros países, ou – mais comumente – criar espaços mercantilizados onde as relações interpessoais são anuladas e onde se desvaloriza o que as cidades têm de melhor: suas especificidades, sua história e suas referências culturais (Zanini, 2017; Lee & Syah, 2018). Augé (1994) vai nomear de “não-lugares” esses espaços e equipamentos públicos que não têm laços históricos, identitários e relacionais com os locais onde se instalam. Isso é o que acontece com as cadeias de hotéis, os aeroportos, os shopping centers e as redes de lanchonete globais, entre outras estruturas padronizadas e desenraizadas da vida e das culturas locais.
Seguindo a dinâmica do desenvolvimento global, tem-se o turismo como atividade que gera lucro, mesmo produzindo impactos negativos para a natureza e para a população local envolvida. Um desenvolvimento, portanto, movido pela efemeridade e pelo nomadismo, visto que tende a degradar suas próprias bases de sustentação, a sugar sua vitalidade até se transferir para a nova fronteira de acumulação. Assim, torna-se mais lucrativo vender áreas verdes, incluindo locais que possuem sítios arqueológicos para construção de resorts, do que conservá-las. Quanto às populações locais do entorno, elas tendem a se tornar invisíveis em detrimento das culturas estrangeiras importadas (Braga & Selva, 2016; Castro-Garzón & Montealegre-Torres, 2020; Beretić, Talu & Cecchini, 2021).
A crise ambiental tem levado a sociedade a buscar outras saídas, entre as quais a proposta do Desenvolvimento sustentável e, dentro dessa perspectiva, tem-se o turismo sustentável. A Organização Mundial de Turismo (OMT) define o Turismo sustentável como aquele que é “ecologicamente suportável em longo prazo, economicamente viável, assim como ética e socialmente equitativo para locais e comunidades” [...] (Brasil, 2007, p.25).
Buscando essa proposta de uma atividade sustentável, vários segmentos turísticos procuram seguir os princípios da sustentabilidade, como é o caso do ecoturismo, visto que o Brasil é um país com uma grande biodiversidade ecológica e sociodiversidade cultural, paisagens diferenciadas e significativos sítios arqueológicos, o que torna o destino ecoturístico uma preferência para aqueles que procuram experiências singulares (Irving, Lima, & Moraes; Lee & Syah, 2018; Rao & Saksena, 2020).
Pensar uma atividade ecoturística em um ambiente natural e cultural, como é o caso dos sítios arqueológicos sob análise, traz a necessidade de compreender que o desenvolvimento das sociedades produz impactos múltiplos que afetam os ambientes físico e sociocultural.
O ecoturismo surgiu no Brasil como uma proposta de conservação e contemplação da natureza e cultura. Inicialmente o segmento era conhecido como “turismo ecológico” e difundia um discurso voltado apenas à conservação e/ou preservação do meio ambiente natural, dando pouca atenção ao ambiente cultural e à troca de saberes entre a população e o turista. A publicação das Diretrizes da Política Nacional de Ecoturismo em 1994, pela Empresa Brasileira de Turismo (Embratur) e pelo Ministério do Meio Ambiente, passou a trabalhar com um conceito amplo de ecoturismo que integra a natureza e a cultura como dimensões essenciais para o desenvolvimento dessa atividade em qualquer localidade. O conceito mais usual na atualidade define o ecoturismo como um segmento turístico que promove o uso sustentável do patrimônio natural e cultural, a qualidade de vida das populações envolvidas e estimula a transformação de consciência dos visitantes por meio do contato com as comunidades locais, da interpretação do meio ambiente mediada por um agente turístico e da educação ambiental (Augé, 1994; Brasil, 2010).
Para Mtapuri e Giampiccoli (2019), o ecoturismo sustenta-se seguindo três grandes eixos temáticos que são a sustentabilidade, a educação ambiental do turista e os benefícios às comunidades locais, podendo ser acrescentada a educação patrimonial. A sustentabilidade refere-se à preservação e conservação do ambiente natural e cultural através de uma atividade ecoturística planejada e à sua relação com a viabilidade econômica.
A educação ambiental e patrimonial decorre de uma articulação participativa entre a comunidade local, os turistas e os agentes mediadores do turismo onde acontece a troca de saberes. O contato com o ecossistema possibilita entender a necessidade de conservá-lo e, por último, essa atividade precisa trazer benefícios para a comunidade local num sentido mais amplo, através de ações voltadas à saúde, à educação e ao emprego que possa promover a qualidade de vida da população local (Irving, Lima, & Moraes; Andrade, Lima & Gonçalves 2017).
No Brasil o ecoturismo é desenvolvido em algumas localidades que possuem sítios arqueológicos com intuito de, por um lado, manter e preservar o patrimônio cultural, e, por outro lado, proporcionar emprego e renda às comunidades locais. A maior parte desses sítios estão localizados em Unidades de Conservação, como o Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, em Minas Gerais, que possui em torno de 80 sítios arqueológicos, e o Parque Nacional Serra da Capivara, inscrito pela Unesco como Patrimônio da Humanidade e localizado no estado do Piauí (Icmbio, 2020).
Quando se evoca o patrimônio cultural e o ecoturismo, percebe-se que espaços que possuem atrativos naturais e culturais têm ganhado destaque no desenvolvimento do turismo, confirmando a relação indissociável entre sociedade e natureza. Ao abordarmos a atividade ecoturística, importa compreender que não existe uma separação ontológica entre natureza e cultura (Andrade, Lima, & Gonçalves 2017). As novas antropologias têm compreendido que “não há espaços naturais puros, uma natureza prístina intocada pelos humanos, mas ambientes e paisagens híbridas, construídas pela interação dinâmica e histórica entre seres e elementos humanos e não humanos” (Andrade, Lima, & Gonçalves, p.111). Para tais autores, a ideia de uma separação entre natureza e cultura é uma construção social do pensamento ocidental que se naturalizou e universalizou ao longo do tempo. Nesse sentido, surge a necessidade de articular a biodiversidade à sociodiversidade e a natureza à cultura, como dimensões interdependentes da experiência humana (Latour, 1994; Ingold, 2000; Descola, 2015).
Geertz (2008, p. 4) define cultura como uma “teia de significados” que o homem tece, sendo essa teia analisada pela ciência interpretativa à procura de significados. Capra (1996, p. 39), por sua vez, considera que “a natureza é vista como uma teia interconexa de relações, na qual a identificação de padrões específicos como sendo “objetos” depende do observador humano e do processo do conhecimento”.
Essa visão dicotômica, em especial o caráter hierárquico que define o antropocentrismo, vem contribuindo para a degradação e agravamento dos problemas socioambientais. A pretensão de superioridade humana em relação ao mundo natural resulta, necessariamente, no uso indiscriminado do meio ambiente (Icmbio, 2020). As sociedades humanas, desde o advento da modernidade, vêm dissolvendo seus laços de integração com a natureza, como testemunha Weber (2004) em suas formulações sobre a formação da modernidade ocidental e a noção de desencantamento do mundo daí resultante.
Guardia (2018) afirma que os patrimônios cultural e natural guardam entre si uma relação de interdependência. O humano é justamente essa fusão de natureza e cultura, que cria significados sobre sua experiência de mundo. A natureza, por sua vez, proporciona todas as fontes materiais e imateriais para as narrativas das comunidades e ainda é fonte de conhecimento para os turistas, acontecendo a troca de saberes. Essa interpretação da natureza, por sua vez, ressignifica-se através das manifestações culturais da população local (Hubert, 2015; Pinto & Irving, 2017).
Por conseguinte, o ecoturismo consegue proporcionar à sociedade o contato direto com a natureza e a cultura. Essa possibilidade oferece ao ecoturista experiências singulares no ambiente, principalmente na troca de conhecimento com a população, o que, por consequência, resgata sentimentos que foram esquecidos no processo de desenvolvimento da nossa sociedade (Holtorf, 2020; Aziz, Ariffin, Ismail, & Alias, 2020).
A área de estudo delimita-se ao sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá, no município de Ingá, no estado da Paraíba, região Nordeste do Brasil. Nos textos históricos, há o registro de que, em 1840, o atual município de Ingá foi elevado à categoria de vila do Imperador e, logo após, em 1846, passou a se chamar vila do Ingá, até a emancipação política, que ocorreu em 3 de novembro de 1904. O patrimônio arqueológico Pedra do Ingá, além de marca central da identidade local, tem sido o principal atrativo turístico e centro de interesse econômico para o município (Cavalcante, Gonçalves & Souza, 1993).
O sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá localiza-se na fazenda Pedra Lavrada, na zona rural do município, a uma distância de cinco quilômetros da zona urbana de Ingá. Ele passou ao domínio do poder público a partir do seu tombamento, no ano de 1944. O município de Ingá localiza-se na microrregião de Itabaiana e mesorregião do agreste paraibano, a 36 km de Campina Grande e 98 km da capital, João Pessoa (Mapa 1). Atualmente limita-se com os municípios de Serra Redonda e Juarez Távora, ao norte; Fagundes e Itatuba, ao sul; Mogeiro, a leste; Campina Grande e Riachão do Bacamarte, a oeste. Possui uma área de 288.000 km² e uma população de 8. 234 habitantes (Cézar, 2013).
A pesquisa se orientou por uma abordagem qualitativa que é definida pela busca de significados, motivações, percepções e representações que os atores locais e demais sujeitos envolvidos na pesquisa têm sobre o objeto estudado (Denzin & Lincoln, 2000; Shah & Corley, 2006; Mozzato & Grzybyski, 2011).
Como instrumentos de coleta de dados, a pesquisa conjugou a revisão bibliográfica da literatura da área, a pesquisa documental de dados secundários, a observação sistemática das relações sociais envolvidas com o objeto de estudo nas visitas a campo e um conjunto de entrevistas semiestruturadas com sujeitos significativos para a atividade turística na região.
A revisão bibliográfica explorou Importar imagen artigos científicos, livros, teses, sites da internet, relatórios e fontes históricas para desenvolver o marco teórico-conceitual da pesquisa e para acompanhar o debate sobre turismo, ecoturismo e patrimônio natural e cultural do município em perspectiva histórica.
Os primeiros contatos de campo com informantes como guias, gestores, especialistas, moradores e turistas permitiram traçar um primeiro perfil do problema investigado. Essas primeiras informações de campo permitiram a elaboração dos roteiros das entrevistas semiestruturadas e dos questionários. Com essa estratégia, pretendeu-se captar as impressões e os significados que o conjunto de atores sociais envolvidos com o objeto de estudo tem sobre o sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá, sobre o turismo que é desenvolvido na localidade, sobre as relações sociais entre os atores considerados e sobre as condições de preservação do patrimônio natural e cultural da Pedra do Ingá (Demo, 1995; Minayo, 1996; Richardson, 1999).
Nas entrevistas semiestruturadas com os gestores públicos, foram colocadas questões sobre a relevância do turismo para a cidade de Ingá e a importância das Itacoatiaras no contexto do turismo local e sobre a disponibilidade de recursos humanos, técnicos e financeiros e as principais dificuldades na gestão turística local. Com os especialistas, foram levantadas hipóteses da autoria e cogitados possíveis significados para as inscrições rupestres. Além disso, junto a eles também foram levantadas informações sobre o estado de conservação do monumento e sobre os eventuais impactos danosos do turismo de massa convencional. Com os guias e condutores turísticos, explorou-se o trabalho que é realizado para recepção dos turistas, os segmentos turísticos existentes na localidade e as dificuldades que experimentam para se manter na atividade, mas também para a boa conservação do patrimônio. Os turistas foram consultados, através de questionários on-line, sobre as sensações, as perspectivas e o que buscam ao escolher a Pedra como destino turístico. Além disso, foram perguntados acerca de suas percepções sobre a conservação do monumento e sobre a infraestrutura local e municipal. Em relação à população local, foram realizadas entrevistas sobre a sua relação de pertencimento com a Pedra do Ingá, sobre a visão que ela tem em relação ao turismo desenvolvido no local e sobre os mitos e as lendas referentes ao monumento de Ingá.
Destarte, foram realizadas duas entrevistas com os gestores públicos, no caso o prefeito e o secretário de turismo, três com os condutores e guias, três com especialistas – entre os quais, historiadores, arqueólogos e pesquisadores do tema. Além disso, foram aplicados vinte questionários com os turistas.
A etapa das entrevistas com a população local foi direcionada para os detentores dos saberes e fazeres culturais e envolvidos com a atividade turística, como foi o caso dos artesãos da técnica do labirinto e da gastronomia nordestina, representada pelo cuscuz cabeça amarrada encontrado no Memorial do Cuscuz. Foram realizadas vinte e cinco entrevistas, seguindo uma ordem decrescente em relação à idade, pois procurou-se resgatar a cultura oral da comunidade através das histórias sobre a Pedra do Ingá com os moradores mais antigos coletando relatos de infância, narrados pelos seus familiares, como pais, avôs, bisavôs, entre outros, e seguimos com os mais jovens maiores de 18 anos. Ao todo, portanto, o universo amostral da pesquisa foi composto de 53 indivíduos.
Através da técnica de observação sistemática, procurou-se uma interação com o contexto estudado e com os atores sociais que participam do turismo local visando complementar os dados coletados nas entrevistas e questionários. Na observação sistemática, o pesquisador vai a campo com algumas questões planejadas sobre o objeto da pesquisa e tem a oportunidade de se aproximar do fenômeno observado para investigar as relações sociais in loco, checar dúvidas de pesquisa e levantar dados auxiliares na verificação de hipóteses (Chizzotti, 2003; Mozzato & Grzybyski, 2011).
A pesquisa de campo ainda levantou os atrativos turísticos que formam todo o complexo, os impactos negativos resultantes da atividade turística sem planejamento, os potenciais ainda inexplorados e os significados e as imagens que os ingaenses têm sobre o turismo realizado e sobre a Pedra do Ingá.
Os dados coletados foram submetidos à análise de conteúdo categorial-temática de Bardin (2011) seguindo as três fases do processo sugerido pela autora, a saber: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento e interpretação dos resultados. A pré-análise se dedica à escolha dos documentos e formação do corpo de dados que serão analisados; à leitura flutuante, para identificar sinais e impressões significativas para os objetivos da pesquisa; à definição de hipóteses provisórias e de objetivos da análise; e à formulação de indicadores preliminares que auxiliarão na constituição posterior das subcategorias e categorias temáticas.
A fase de exploração do material se desenvolve através de um processo gradual que parte da identificação e escolha das unidades de registro e de contexto, avança na definição de subcategorias intermediárias que levarão, ao final, à formação das categorias temáticas de análise. No caso considerado, o estudo definiu seis subcategorias intermediárias, a saber: a) os impactos negativos das ações antrópica e natural na conservação do patrimônio; b) o turismo praticado na região; c) a ausência de infraestrutura no sítio arqueológico e no município; d) as percepções e os significados das Itacoatiaras para os turistas e a população local; e) o ecoturismo como alternativa de conservação natural e sociocultural; e f) a integração da população local ao turismo existente. Foram definidas, ainda, três categorias temáticas de análise, a saber: I. A conservação do sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá; II. A percepção dos visitantes e o papel da população na atividade turística; e III. O ecoturismo como possibilidade para o turismo em Ingá.
A terceira, e última, fase da análise foi dedicada ao tratamento dos resultados obtidos através da formulação de inferências e da interpretação geral do corpus de dados da pesquisa com a ajuda do referencial teórico adotado e em diálogo com os objetivos e as hipóteses definidas anteriormente. Foi nessa última fase que, finalmente, foram cruzados, de forma conclusiva, os dados teóricos e os dados empíricos mediados pela análise de conteúdo (Minayo, 1996; Bardin, 2011; Mozzato & Grzybyski, 2011).
Tendo como base as categorias temáticas supracitadas, a análise avançou para o tratamento dos resultados, para a produção de inferências e interpretação, gerando a discussão a seguir.
A inferência e interpretação parte de categorias e subcategorias formadas durante a pesquisa de campo, a partir do corpus de dados formado pelo referencial teórico, pela observação sistemática e pelo material levantado pela pesquisa documental. As categorias e subcategorias são apresentadas no Quadro 1, que se segue.
Nessa primeira seção, serão problematizadas e interpretadas três subcategorias intermediárias definidas na análise: a que diz respeito aos a) impactos negativos das ações antrópica e natural na conservação do patrimônio, b) ao turismo praticado na região e c) a ausência de infraestrutura no sítio arqueológico e no município.
A Pedra do Ingá passou a ser importante para o município como principal atrativo turístico, com evidentes reflexos na economia e na cultura locais. O desenvolvimento do turismo na região tem gerado debates sobre os impactos positivos e negativos em relação à conservação do patrimônio cultural e natural. Alguns estudos realizados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) apontaram que o turismo, enquanto atividade econômica, é um dos condicionantes antrópicos que mais produziu a degradação do sítio arqueológico, seguidamente da própria população (Martin, 2005; Azevedo Netto, Machado, Moraes & Lima, 2018). No entanto, essa realidade tem se modificado ao longo dos anos, como será explicitado ao longo do texto.
O turista que deseja visitar o sítio arqueológico deve ter acesso ao local pela BR 230, no sentido João Pessoa-Campina Grande, entrando à esquerda no km 115 e, também, pelo estado de Pernambuco, passando por Goiana, Itabaiana e, por fim, Mogeiro, que faz divisa com o município de Ingá (Cézar, 2013; Azevedo Netto, Machado, Moraes & Lima, 2018). O sítio arqueológico dista 15 quilômetros do centro do município de Ingá; o trajeto conta com estrada asfaltada e sinalizada.
O prédio de apoio do sítio arqueológico de 375 m² (15 m x 25 m) possui um terraço para os turistas, a cafeteria, com lanches e souvenires, banheiros, o museu de História Natural, onde encontram-se fósseis de animais da megafauna pleistocênica, materiais líticos e outros objetos que contam a história dos grupos humanos que habitaram a região. O prédio tem ainda uma loja de artesanato que, segundo o secretário de turismo, é uma forma de valorizar o trabalho dos artesãos locais e ainda gerar renda para estes. Os produtos expostos à venda são o artesanato representado pela técnica do labirinto dos Chã dos Pereiras e Pontina, distritos do município de Ingá, patchwork, crochê, vasos e pequenos objetos com os símbolos das Itacoatiaras do Ingá.
Foi verificado que o monumento arqueológico se encontra a céu aberto e com degradação do suporte rochoso. Nos meses de muita chuva (maio a julho), geralmente ocorrem inundações deixando o monumento quase encoberto pelas águas do Rio Ingá do Bacamarte, que também arrasta pedras, troncos de árvores, entre outros materiais, causando arranhões, quebra e abrasão nas inscrições (Lage & Farias Filho, 2018).
A pedra do Ingá, com suas peculiaridades e problemas, coloca em questão as ações referentes a sua conservação. O tombamento do sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá, cujo registro pode ser visto no processo n° 330T-43, inscrição n° 234, do Livro de Tombo Histórico, e no Livro de Tombo de Belas Artes, inscrição 301 de 29/05/1944, não tem garantido a proteção deste patrimônio. Atualmente o Iphan, o Inapas e outras instituições ligadas à conservação do patrimônio cultural realizam estudos motivados pela promoção das Itacoatiaras do Ingá à lista indicativa de Patrimônio Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Figura 1) (Inapas, 2018).
O estudo reportado por Lage e Farias Filho (2018) apontou os fatores químicos, físicos, biológicos e antrópicos que têm causado a degradação do conjunto rochoso onde encontram-se as principais inscrições arqueológicas.
Entre os fatores antrópicos, a visita de campo evidenciou sinais de vandalismo, pichações, lixo urbano e danos ao monumento causados por caçadores de tesouros lendários que nunca se confirmaram. Essa atmosfera mítica que envolve a Pedra do Ingá é fonte de inúmeras lendas que povoam o imaginário regional. Por isso, sugere-se que essa degradação antrópica também inclui suposta caça a esses tesouros escondidos. Nesse caso, uma ação contínua de educação ambiental e patrimonial tem sido capaz de trabalhar essas lendas em favor da preservação do patrimônio.
No passado, o sítio arqueológico era utilizado como local de lazer da população, que usava o espaço para piqueniques, banho de rio e pescarias. O turismo convencional foi apontado, nas entrevistas realizadas e em alguns relatos bibliográficos e artigos como os de Santos (2014) e Tahan (2020) como causa da degradação local.
Os gestores e guias entrevistados, contudo, defendem que não são os turistas que causam danos ao sítio arqueológico. Segundo eles, a maioria dos turistas são pessoas que vêm em busca de conhecimento, pessoas educadas, que não jogam lixo no chão, não tocam nos fósseis e seguem as orientações dos guias. Para eles, os danos antrópicos ainda são causados pela própria população, que não valoriza o patrimônio cultural.
As visitas a campo identificaram a presença de vegetação em torno do monumento, com o crescimento de raízes e caules que penetram na rocha. Os compostos químicos presentes nessas raízes favorecem a degradação do petróglifo, além de fomentar um ambiente propício para a proliferação de fungos, algas, bactérias e líquens, que também são agressivos ao monumento. Essa ocorrência também foi verificada por pesquisas arqueológicas anteriores (Lage & Farias Filho, 2018; Inapas, 2018).
Outra causa de degradação do suporte rochoso é a variação de temperatura, que tem causado a contração e dilatação do monumento, produzindo o desplacamento ou a perda do conjunto rochoso. Essa oscilação de temperatura é intensa e varia de algo próximo a 50 °C durante o dia a 25 ºC durante a noite (Santos, 2014; Lage & Farias Filho, 2018; Inapas, 2018).
A estrutura turística do município de Ingá ainda é precária em relação a outras cidades no interior da Paraíba que têm atividades turísticas, mesmo possuindo um dos mais importantes monumentos arqueológicos do Brasil e do mundo.
No momento da pesquisa, a cidade de Ingá não possuía bancos. Há somente duas pousadas, que não seguem padrões de qualidade desejáveis pelos turistas, e muitos moradores relataram, nas entrevistas, terem vergonha de convidar pessoas de outros lugares por não haver uma hospedagem adequada na cidade. Outras questões preocupantes para os moradores entrevistados são: o município possuir apenas um hospital de pequeno porte, e com atendimento precário; a carência no saneamento básico; problemas com a falta-d´água; haver apenas dois restaurantes self-service e alguns bares com pouca estrutura funcional.
Nesta categoria temática, são exploradas duas subcategorias que compreendem: d) as percepções e os significados das Itacoatiaras para os turistas e a população local e; e) a integração da população local ao turismo existente.
O sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá recebe turistas de variadas localidades. A maior parte deles vem de João Pessoa, capital da Paraíba, além dos moradores locais que deixaram o município e retornam em períodos de férias. Apesar do turismo de “sol e mar” ainda ser a modalidade mais procurada na Paraíba, atualmente cresce a procura por outros segmentos, como é o caso do ecoturismo e do turismo rural, apontados como tipos de atividades que proporcionam conhecimento e contato com a natureza.
Os aspectos históricos, culturais e ambientais foram apontados pelos turistas, demonstrando que cada vez mais as pessoas têm interesse em conhecer o patrimônio cultural e natural. Os sentimentos externados pelos turistas demonstraram o encantamento em relação às Itacoatiaras do Ingá, às belezas naturais e à história do local, que oportunizavam o acesso à cultura e ao conhecimento. Os depoimentos também destacaram a precariedade da estrutura física, o pouco tempo de permanência por falta de atividades dentro do sítio arqueológico e, principalmente, os problemas visíveis sobre ações referentes ao estado de conservação do monumento (Lage & Farias Filho, 2018; Inapas, 2018).
Os moradores entrevistados tinham as Itacoatiaras como algo importante para a cidade, no entanto uma pequena parte não tinha uma relação de pertencimento com a Pedra. Nas entrevistas realizadas, a questão do reconhecimento do monumento ou sua ausência foi abordada. Para um dos entrevistados, o reconhecimento é “uma questão de cultura, porque eu mesmo passei por isso, eu me criei ali dentro, dando tiro nas pedras” (Entrevista com Gestor 1). Em outro relato, confirma-se a afirmação anterior, quando o entrevistado diz que “as pessoas davam tiros na Pedra, as pessoas colocavam fogo na pedra, as pessoas batiam a própria pedra com pedras do local” (Entrevista com Especialista 1).
A participação da população era resumida à produção do artesanato vendido no salão de artesanato, os guias eram moradores de Ingá, a secretaria de turismo funcionava no sítio arqueológico, o morador que cuidava da outra loja de artesanato (fora do sítio) e que também vigiava o local, além de dois ex-servidores da prefeitura que atuavam como cuidadores do monumento, possuíam uma pequena lanchonete no sítio arqueológico.
No centro de Ingá, encontravam-se o serviço de moto-táxi que conduzia os visitantes até a Pedra, algumas lanchonetes na praça principal, padarias, mercados, lojas de roupas e eletrodomésticos, entre outros serviços que podiam atender ao turista. Nesse sentido, o contato dos turistas com a população local se resumia a essa interação esporádica, pois, mais frequentemente, o turista passava direto para a Pedra e retornava ao seu local de origem sem conhecer a cidade.
A maior reclamação da população se referia à falta de comunicação entre os guias da Pedra e os demais setores e serviços do município. Ou seja, o turista conhecia o sítio arqueológico, mas não era informado da existência de outros lugares e atrativos dentro da cidade. Segundo o relato de uma das entrevistadas, “as pessoas vão para a Pedra e depois passam direto para a casa, não vêm visitar outros locais” (Entrevista com a população 1).
O ecoturismo tem sido uma atividade responsável pela manutenção e conservação de muitos sítios arqueológicos no Brasil. Da mesma forma, o ecoturismo poderá ter um papel importante para a conservação do sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá, como uma alternativa promissora ao turismo convencional de massa, apontado pela literatura da área como uma das principais causas de impactos negativos nessas localidades (Aziz, Ariffin, Ismail, & Alias, 2020; Maldonado Oré, 2020; Reher, 2020).
Essa categoria temática, a partir da análise dos impactos do turismo convencional de massa, explora o ecoturismo como uma alternativa de conservação natural e sociocultural do patrimônio e do ambiente onde ele se insere.
O ecoturismo tem como proposta a conservação do patrimônio natural e cultural, uma postura que se compromete com as mudanças sociais. No Brasil, as localidades que possuem sítios arqueológicos têm recebido maior atenção por parte do trade turístico visando desenvolver empreendimentos que proporcionem alta lucratividade, já as comunidades do entorno têm se organizado com intuito de, por um lado, manter e preservar o patrimônio cultural e, por outro lado, proporcionar a geração de emprego e renda na região (Latour, 1994; Brasil, 2010).
No caso do estado da Paraíba, verifica-se um consumo turístico mais voltado para as praias, restando à cultura local um espaço muito menor, e o turismo de massa ainda é predominante. Além disso, seja na sua capital, seja em todos os seus limites geográficos, a Paraíba é palco das mais diferentes expressões culturais e de paisagens pouco conhecidas, como são os casos de outras formações rochosas, trilhas, sítios arqueológicos e mitos encontrados no universo cultural da população local. Esta tem sua história transmitida oralmente e apenas entre os moradores do lugar, pessoas simples cujas narrativas são passadas entre gerações (Souza Junior & Pereira, 2020).
Entretanto o ecoturismo é um segmento promissor e em expansão. Vê-se que algumas localidades no estado vêm desenvolvendo esse segmento, como é o caso do Parque estadual Pedra da Boca, com suas formações geológicas que já são utilizadas na prática do rapel e de trilhas interpretativas (Cardoso, 2020). A atividade ecoturística pode ser uma alternativa positiva para algumas cidades paraibanas, visando a um planejamento que contemple as dimensões do desenvolvimento sustentável, que traga qualidade de vida à população, proteção ao meio ambiente natural, cultural e dos saberes-fazeres locais. Quanto mais conhecimento e debates se produzirem sobre a temática, menor a possibilidade de erros e maiores as chances de desenvolver uma atividade ecoturística mais justa e equitativa (Tisca, Istrata, Dumitrescub & Cornu , 2016) Em relação aos sítios arqueológicos de arte rupestre do estado paraibano, pode-se constatar que grande parte desses sítios ainda não foi catalogada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) ou pelo Instituto Histórico e Artístico do Estado da Paraíba (Iphaep) e, dessa forma, não é conhecida, não recebe a proteção necessária e nem ao menos torna-se parte de um roteiro ecoturístico (Inapas, 2018).
No caso do sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá, que é o principal atrativo turístico do município de Ingá, o segmento turístico que tem se destacado no quesito quantidade é o turismo pedagógico. É frequente no local a presença de excursões de “turistas estudantes” provenientes de escolas, universidades e cursos técnicos. A atividade ecoturística é quase inexistente no Ingá, mesmo a localidade demonstrando potencial diverso em trilhas, na paisagem natural e em referências históricas que apontam também para outras áreas exploráveis, como a Serra Velha, Pontina, Chã dos Pereiras e Serra Verde.
O Decreto do Governo da Paraíba nº 35.643/2014 criou o Grupo de Trabalho referente à criação do Parque Estadual Itacoatiaras do Ingá, na categoria de unidade de conservação de proteção integral, que pode se constituir como um embrião de um projeto futuro de conservação ambiental e cultural do patrimônio do Ingá baseado no ecoturismo e capaz de conciliar a conservação, a pesquisa e o turismo local. Esse foi um passo institucional e legal importante para o patrimônio cultural e para o desenvolvimento local que, contudo, segue carente de recursos humanos, financeiros e técnicos que permitam sua consolidação.
Assim, o desenvolvimento planejado do ecoturismo no sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá poderá proporcionar uma atividade econômica sustentável, capaz de trazer benefícios à população local ao aproximá-la da atividade. De acordo com Mtapuri e Giampiccoli (2019), o ecoturismo fundamenta-se na sustentabilidade, na educação ambiental do turista e em benefícios às comunidades locais, podendo ser acrescentada a educação patrimonial dialógica. A sustentabilidade refere-se à preservação e/ou conservação do ambiente natural e cultural, e a viabilidade econômica está implicada em uma atividade ecoturística planejada.
A educação ambiental e patrimonial é resultado de uma prática crítica e dialógica, sendo a articulação participativa resultante da interação da comunidade com os turistas, a partir da qual acontece a troca de saberes. O contato com o ecossistema possibilita entender a necessidade de conservá-lo. Além disso, e por último, essa atividade precisa ser um processo em que a comunidade local participe e contribua com todas as ações que serão desenvolvidas no sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá (Tolentino, 2016; Dupeyron, 2019; Reher, 2020).
O turismo tem sido uma atividade importante no Brasil porque tem possibilitado emprego e renda e, muitas vezes, melhorado a qualidade de vida das populações inseridas neste contexto.
Em relação aos problemas com a conservação do local, a literatura tem apontado o turismo de massa como uma modalidade que tende a gerar impactos sociais, culturais e ambientais negativos às localidades onde se instala. Essa constatação tem motivado o estabelecimento do ecoturismo como uma alternativa capaz de sanar esses problemas em benefício da comunidade local e de seu patrimônio ambiental e cultural.
A atividade turística realizada no sítio arqueológico Itacoatiaras do Ingá apresenta uma estrutura que precisa de ajustes e dinamização para que se torne capaz de atender aos visitantes, conservar o patrimônio cultural e ambiental e proporcionar benefícios à população local. Isso porque, sem uma estrutura de recepção adequada, os turistas permanecem no local apenas durante o tempo de visitação do sítio arqueológico e procuram hospedagem e serviços essenciais nos municípios vizinhos, quando não retornam no mesmo dia à capital.
As possíveis mudanças na estrutura do local podem ocorrer com a implantação do Parque Estadual Arqueológico Itacoatiaras do Ingá, com propostas para desenvolver o ecoturismo através de trilhas interpretativas previstas no projeto e promover a integração da comunidade no desenvolvimento do turismo e de um programa contínuo de educação ambiental e patrimonial. A pesquisa demonstrou a existência de relevante potencial ecoturístico, cultural e científico que, contudo, está na dependência de vontade política e governamental e de uma articulação que reúna esforços da sociedade civil, da iniciativa privada e dos gestores locais.
Ainda que a pesquisa tenha realizado entrevistas com os gestores municipais sobre o turismo desenvolvido localmente, alguns aspectos da gestão do parque arqueológico que dependem da intervenção integrada dos governos municipal, estadual e federal não foram suficientemente exploradas e merecem aprofundamentos futuros. Outros aspectos da pesquisa referentes aos mitos e lendas narrados pela população e por outros relatos pseudocientíficos não foram objeto deste artigo.
Gustavo Ferreira da Costa Lima: Orientador da autora durante o seu mestrado no Prodema/UFPB. Nessa condição ajudei-a a construir o projeto, a fundamentação teórica e a metodologia. No artigo discutimos a concepção, estrutura e recorte principal. Do ponto de vista da redação trabalhamos em conjunto a partir de um esboço proposto pela autora em todas as fases da composição. Discutimos a teoria, a metodologia, os resultados e as discussões dos dados.
Edevaldo Silva: Contribui na interpretação e escrita dos dados; geração do mapa da área de estudo; escrita e revisão do texto final.