Resumo: Este estudo teve como objetivo avaliar a influência de variáveis biofísicas, sociais e de gestão na visitação turística em unidades de conservação do estado de Minas Gerais, entre 2015 e 2019, buscando por possíveis correlações entre as que mais influenciaram o número de visitantes. Os resultados mostraram que a reputação foi a única variável que apresentou relação significativa, indicando a importância desse atributo intangível na escolha dos destinos de ecoturismo pelos turistas. Com base nesse achado, sugerimos que as unidades de conservação adotem estratégias para fortalecer sua reputação, a partir de uma comunicação mais eficiente e compreensão do mercado turístico. Essa abordagem pode aumentar a atratividade das unidades de conservação para os ecoturistas e contribuir para o desenvolvimento sustentável da região. Desse modo, a pesquisa contribui para uma melhor compreensão dos fatores que influenciam a visitação turística em unidades de conservação do estado de Minas Gerais, fornecendo subsídios valiosos para a gestão do ecoturismo nessas áreas.
Palavras-chave: unidade de conservação, turismo, mercado turístico, competitividade.
Abstract: This study aimed to evaluate the influence of biophysical, social and management variables on tourist visitation in protected areas in the state of Minas Gerais, Brasil, between 2015 and 2019, looking for possible correlations between those that most influenced the number of visitors. The results showed that reputation was the only variable that showed a significant relationship, indicating the importance of this intangible attribute in the choice of ecotourism destinations by tourists. Based on this finding, we suggest that protected areas adopt strategies to strengthen their reputation based on more efficient communication and understanding of the tourist market. This approach can increase the attractiveness of protected areas for ecotourists and contribute to the sustainable development of the region. In this way, the research contributes to a better understanding of the factors that influence tourist visitation in protected areas in the state of Minas Gerais, providing valuable subsidies for the management of ecotourism in these areas.
Keywords: protected areas, tourism, tourist market, competitiveness.
Resumen: Este estudio tuvo como objetivo evaluar la influencia de variables biofísicas, sociales y de gestión en la visitación turística en áreas naturales protegidas en el estado de Minas Gerais, Brasil, entre 2015 y 2019, buscando posibles correlaciones entre aquellas que más influyeron en el número de visitantes. Los resultados mostraron que la reputación fue la única variable que mostró una relación significativa, indicando la importancia de este atributo intangible en la elección de destinos ecoturísticos por parte de los turistas. Con base en este hallazgo, sugerimos que las áreas naturales protegidas adopten estrategias para fortalecer su reputación basadas en una comunicación y comprensión más eficientes del mercado turístico. Este enfoque puede aumentar el atractivo de las áreas naturales protegidas para los ecoturistas y contribuir al desarrollo sostenible de la región. De esta forma, la investigación contribuye a una mejor comprensión de los factores que influyen en la visita turística en áreas naturales protegidas en el estado de Minas Gerais, proporcionando valiosos subsidios para la gestión del ecoturismo en estas áreas.
Palabras clave: áreas naturales protegidas, turismo, mercado turístico, competitividad.
Artigos
EXPLORANDO OS FATORES CRÍTICOS DE SUCESSO QUE AFETAM A VISITAÇÃO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ESTADUAIS EM MINAS GERAIS
Exploring the Critical Success Factors Affecting Visitation in State Protected Areas in Minas Gerais
Explorando los Factores Críticos de Éxito que Afectan las Visitas en Áreas Naturales Protegidas Estatales en Minas Gerais
Recepción: 11 Mayo 2023
Aprobación: 03 Agosto 2023
A exploração econômica por meio do turismo nas Unidades de Conservação (UC) vem se desenvolvendo nas últimas décadas, sendo um significativo mecanismo para o financiamento da conservação, também um propulsor econômico para as regiões onde a maioria dessas áreas se encontra (Semeia, 2014; Buckely et al., 2021).
Porém, para que a viabilidade da atividade turística se perpetue, o planejamento deve ser baseado nos princípios do turismo sustentável: autenticidade cultural, inclusão social, proteção dos recursos naturais, qualidade dos serviços prestados e capacidade de operacionalização local (Candiotto, 2011; Goodwin, 2011; Ministério do Turismo [MTUR], 2007;).
No contexto das UCs, é complexa a atividade de gerir o uso público, mantendo-se a integridade ambiental, sendo imperioso fornecer experiências relevantes aos visitantes com geração de receitas e, ao mesmo tempo, manejar as pressões provenientes dessas atividades. Conciliar os interesses dos visitantes, os objetivos das áreas protegidas com baixos impactos e gastos públicos otimizados (FUNDAÇÃO FLORESTAL, 2010), exige políticas públicas e planejamento para que se associe apropriadamente o tipo de turismo aos locais disponibilizados à visitação (Leung et al., 2019).
Apesar do aumento do interesse em visitar áreas protegidas, o fluxo de frequentadores ainda se mantém concentrado (75%) em apenas 10 das 137 UC federalizadas (Fundação Grupo Boticário, 2021). Fenômeno observado também em Minas Gerais, onde cinco das 32 áreas administradas pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF) recebem cerca de 60% de todas as visitações registradas (IEF, 2020).
São muitas as questões que podem explicar essa pouca variação na escolha dos destinos. Características dos seus ambientes internos, do entorno onde as UC se localizam, bem como atributos como a reputação, acessibilidade, variedade de atratividades e infraestrutura são frequentemente citados como impulsionadores do turismo (Castro et al., 2015; Deng et al., 2002; Lee et al., 2010; Neuvonen, 2010), desde que oportunizem as experiências desejadas pelos visitantes (Minciotti et al., 2008).
Muitos estudos em turismo de natureza focam sua análise na demanda, havendo poucos sobre os aspectos do gerenciamento desses destinos (Deng et al., 2002; Neuvonen, 2010). Abordagens que identificam os fatores críticos de sucesso trazem luz sobre essa lacuna, esclarecendo as potencialidades e ameaças das UC, tornando possível aperfeiçoar seu desempenho como empreendimento turístico (Flores et al., 2022). Porém, apesar do reconhecimento das potencialidades desses fatores na obtenção de uma vantagem competitiva, nenhum estudo investigou a relação entre esses e o número de visitas recebidas pelas UC públicas em Minas Gerais.
Assim, visando a ampliar o entendimento sobre o fluxo turístico nos destinos de natureza em Minas Gerais, o presente trabalho buscou correlacionar as variáveis socioeconômicas, gerenciais e biofísicas, com o número de visitantes nas UC estaduais, entre 2015 e 2019. Contribuindo, desse modo, para a elaboração de estratégias que amparem o aumento da visitação e melhor alocação dos investimentos conciliados ao desenvolvimento sustentável nas diferentes regiões do estado.
O Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) – criado pela Lei 9.985 (2000) – define UC como espaços territoriais que possuem características relevantes, com limites definidos e instituídos pelo poder público, que visam à conservação dos recursos naturais.
Segundo o Cadastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC), existem 2.598 UC que são mantidas pela Federação (38,65%), pelos Estados (43,38%) ou por Municípios (17,38%) (Ministério do Meio Ambiente [MMA], 2022). Atualmente, Minas Gerais possui 94 UCs administradas pelo IEF, sendo 75 de proteção integral e 19 de uso sustentável, que corresponde a 4,05% do território estadual (IEF, 2022). Estas, além do SNUC, estão subordinadas à regulamentação das diretrizes da Lei Estadual 20.922 (2013) que estabelece a Política Florestal e de Proteção à Biodiversidade do Estado, na qual aspectos importantes são tratados.
Além de enfatizar a criação e integração das UCs na estrutura da política ambiental, de incluir os planos de manejo como um ponto focal, detalhar as metodologias e estratégias para gerenciar, proteger e fazer uso dessas áreas, quando apropriado, a legislação reconhece o papel do turismo e da recreação sustentáveis, ressaltando que tais atividades devem harmonizar-se com os objetivos de conservação. Por fim, a Lei Estadual 20.922 (2013) promove a colaboração entre diferentes entidades, sejam outras camadas governamentais, Organizações Não Governamentais (ONGs), ou setor privado, fortalecendo uma abordagem abrangente para uma conservação efetiva.
As áreas protegidas são de fundamental importância para a proteção das espécies e dos ecossistemas em que estão inseridos, sendo ainda reconhecidas por seus serviços ecossistêmicos, valores culturais e econômicos fornecidos (Un Environment Pogramme [UNEP], 2021; Worboys & Trzyna, 2015).
Apesar disso, são constantemente ameaçadas pela pressão antrópica, tornando premente o agenciamento da visitação, acompanhado de fiscalizações e monitoramentos (Banzato, 2014; International Union For Conservation of Nature [IUCN], 2020; Worboys & Trzyna, 2015), de modo que o delicado equilíbrio dos ecossistemas permaneça intacto, garantindo que as gerações futuras possam se beneficiar da rica diversidade da vida em sua forma primitiva e que os processos ecológicos vitais que sustentam a saúde do planeta continuem sem impedimentos.
A maioria dessas áreas encontra-se em situação precária, colocando em risco sua integridade. Existem déficits de pessoal, de infraestrutura, de regularização fundiária e de instrumentos de gestão essenciais, tornando urgente a necessidade de investimentos, sendo de responsabilidade dos governos assegurar a disponibilização de recursos suficientes (Fonseca et al., 2010; UNEP, 2021) ou promoverem parcerias com a cessão dos direitos para que outros setores possam explorar economicamente as potencialidades turísticas das UCs.
Entende-se como turismo o deslocamento de indivíduos para lugares diferentes de suas residências habituais, por tempo inferior a um ano consecutivo, com motivação ao lazer, negócios e outros interesses que não tenham relação com o exercício de uma atividade remunerada (Organização Mundial do Turismo [OMT], 1995). Além dessa definição, outras se assemelham quanto aos aspectos relacionados ao tempo, ao físico e ao indivíduo (Santos, 2010).
Por conseguinte, o ecoturismo visa à sustentabilidade com a interação e ao respeito pela natureza (Ministério do turismo [MTUR], 2010a; Stronza et al., 2019). Atualmente, o Brasil ocupa uma posição de destaque no setor do turismo por suas belezas cênicas, sendo o 2º no ranking de atrativos naturais e o 32º no de Turismo e Viagens, conforme os índices de competitividade do Fórum Econômico Mundial de 2019. No entanto, quando se tratam de Serviços de Turismo cai para o 59º lugar (Calderwood & Soshkin, 2019).
De acordo com a OMT (2019), o país recebeu R$ 6,4 milhões de turistas estrangeiros, gerando uma receita de US$ 6 milhões em 2019. Esse valor é ainda muito pequeno quando confrontado com os fluxos de visitantes nacionais. Como exemplo, Minas Gerais recebeu nesse mesmo ano, 30,4 milhões de pessoas que geraram uma receita de R$ 20,6 bilhões, sendo o Turismo de Natureza, o segundo mais procurado pelos visitantes no estado (Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais [SECULT], 2022).
A atividade turística vem de uma busca das pessoas pelo desconhecido e para sair do cotidiano das ocupações diárias, sendo que o tempo dedicado ao lazer está cada vez mais valorizado. Com isso, vários lugares naturais viram alvos do desejo do turista, necessitando, muitas vezes, de certas adequações para que seus espaços possam atender à demanda por lazer desses visitantes (Bezerra, 2009).
Nos arranjos da cadeia produtiva do turismo constam diferentes elos que se integram ao local, como as características de deslocamento, de transporte, a hospedagem, a alimentação e o lazer, propriamente dito (Lacay et al., 2010). E, quando se trata do ecoturismo nas UCs, as ligações alcançam agentes dos setores privado e público (MTUR, 2010a).
O mercado turístico, por sua parte, se constrói da relação entre a oferta (experiência disponibilizada) e a demanda (consumidor da experiência), contendo certas segmentações, à medida que cada turista busca determinado destino baseado em seus interesses particulares (MTUR, 2010a). E, diante de tais especificidades, o planejamento e a inovação aumentam os fluxos de pessoas fazendo com que o conhecimento dos fatores críticos de sucesso venha a ser utilizado no negócio (Flores et al., 2022; Minciotti et al., 2008), aumentando a competitividade frente à concorrência pelos visitantes (Streimikiene et al., 2020).
Para o desenvolvimento do turismo de natureza, os fatores críticos de sucesso podem ser considerados como análises do progresso de um negócio, constituídos por elementos essenciais que consolidam determinado empreendimento (Sydle, 2022). Nesse contexto, a qualidade dos serviços e equipamentos turísticos que atendam às necessidades das populações locais e visitantes vem sendo uma das táticas mais importantes como influenciador da demanda e para o sucesso de um destino turístico (MTUR, 2016; OMT, 2019).
De igual modo, a reputação dos destinos relacionada aos atributos, como qualidade dos produtos e serviços, inovação, meio ambiente, sociedade e políticas públicas, influencia grandemente o interesse dos turistas (Widjaja et al., 2019). Quando apresentada pelas plataformas digitais, tende a ser determinante na competitividade dos destinos, devido ao uso cada vez mais comum dessas vias para obtenção de informação e de comunicação entre os consumidores (Perles-Ribes et al., 2019).
O turismo nas UCs Federais cresceu quase 7% nos últimos três anos, chegando a 15 milhões de visitantes em 2019 (Fundação Grupo Boticário, 2021; Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade [ICMBIO], 2020). Minas Gerais demonstrou aumento maior (11,3%) que a média nacional no período, quando avaliado em suas 32 unidades (IEF, 2022). Apesar disso, estudo recente demonstra haver diversos desafios na manutenção desse avanço, sendo a falta de infraestrutura (47%), o que mais desagrada o público que visita as UCs mineiras (Semeia, 2020).
A Convenção sobre Diversidade Biológica reconhece que o turismo pode ser um importante aliado da biodiversidade e um propulsor para a conservação (Secretariat of the Convention on Biological Diversity, 2015). A compreensão quanto à importância de um meio ambiente saudável, por meio das vivências, educação e interpretação ambiental é fator primordial para a proteção dos recursos naturais. O turismo, desse modo, representa um elemento estratégico para a aproximação da sociedade às UCs, provocando uma relação de respeito e valorização (Leung et al., 2019).
Porém, para a operacionalização do turismo sustentável é essencial identificar os impactos negativos e positivos provenientes da atividade nas UCs (MTUR, 2007). Sem planejamento adequado, a visitação pode trazer sérios problemas, às vezes irreversíveis, afetando a qualidade ambiental dessas áreas, como exemplo: a depredação; a dispersão da fauna; a poluição dos recursos hídricos; a redução da vegetação; entre outros (Leung et al., 2019; Lobo & Simão, 2011; MTUR, 2007). Além dos comprometimentos sociais, acarretando a desestabilização das comunidades; descaracterização cultural; marginalização desses povos; interferência na distribuição de água e luz, dentre outros (Filetto & Macedo, 2015; Leung et al., 2019; Lobo & Simão, 2011).
Por outro lado, as visitações podem contribuir para o fortalecimento da cultura local, o que instiga a sua valorização e estimula a inter-relação com outros povos e culturas (Leung et al., 2019; Ruschmann, 1997). Da mesma forma, o impacto econômico do turismo pode ser bastante significativo, pois incrementa a economia local com a geração de empregos, aumenta a produção de bens e serviços, aumenta a coleta de impostos, dentre outros (Oliveira, 2009).
A contribuição da visitação nas UCs (e seu entorno) para a economia nacional é de cerca de 90 mil empregos, R$ 2,7 bilhões em renda, R$ 3,8 bilhões em valor agregado ao PIB e R$ 10,4 bilhões em vendas (Souza & Simões, 2019). No entanto, o mercado deve considerar ainda, a sazonalidade turística e a possibilidade de crescimento da atividade acarretar aumento da inflação e o aumento dos subempregos, especialmente para os moradores locais (Oliveira, 2009).
Os impactos negativos em decorrência da visitação são inevitáveis. Contudo, é legítimo que haja recreação nas UCs, sendo indispensável para a gestão identificar quais interferências são aceitáveis (Leung & Marion, 2000) e estabelecer planos e estratégias conforme o contexto local, a fim de minimizá-los (Vallejo, 2013). Reconhece-se a importância do turismo na conservação e no desenvolvimento sustentável. Porém, sem gestão, planejamento e políticas públicas efetivas, a visitação nessas áreas pode virar um transtorno e comprometer os objetivos de criação das UCs.
O estudo trata de uma pesquisa exploratória e quantitativa que visa a compreender os fatores que influenciam a visitação das UCs do estado de Minas Gerais, tendo como base a metodologia aplicada por Castro, Souza e Thapa (2015).
Minas Gerais administra 94 UCs, sendo que, em apenas 32 destas, há algum controle sobre o número de visitantes. A presença desses registros foi um dos critérios de inclusão, sendo ainda filtradas as áreas por categorias de manejo, abrangendo apenas aquelas que possibilitam a visitação com o objetivo de lazer e recreação; e as que realizam, além do controle de visitantes, a cobrança de uma taxa de ingresso, permitindo comparar a receita com o volume de visitantes, aumentando a fidedignidade dos dados.
Dessa forma, foram consideradas para a pesquisa dez UCs, sendo oito Parques Estaduais e dois Monumentos Naturais (Quadro 1).
O projeto envolveu, ainda, uma pesquisa bibliográfica com levantamento e apreciação crítica da literatura em artigos científicos, publicações oficiais e livros, possibilitando conhecer as diversas opiniões de autores renomados sobre o tema proposto. O levantamento de dados se deu a partir de documentos de arquivos internos do IEF não publicados; relatórios de campo das UCs; arquivos de instituições, como as ONGs, abrangendo publicações ocorridas entre 2015 a 2019. Foram também utilizados dados secundários, disponibilizados pelo IEF, com apoio dos gestores das UCs para a complementação das informações que não se encontravam disponíveis na rede mundial de computadores (internet, em sites como TripAdvisor e Google Maps).
A fim de identificar os fatores críticos de sucesso que influenciam a visitação (variável dependente), foram utilizadas como variáveis independentes atributos sociais, biofísicos e gerenciais, conforme análise interna e externa das áreas protegidas. A partir dos estudos de Castro et al. (2015), Souza (2016) e Souza et al. (2017), foram selecionadas as 11 variáveis que mais se adequaram à realidade estadual, dentre as quais a reputação constou como elemento constituinte dos atributos biofísicos da UC. Como variável dependente, considerou-se a média de visitação entre 2015 e 2019. O intervalo permite mitigar situações pontuais, como períodos extensos de chuvas, incêndios florestais ou surto de febre amarela, por exemplo, que podem reduzir a demanda. Além disso, pelo fato de as UCs terem permanecido fechadas em 2020 e 2021, devido à pandemia de covid-19, estes dois últimos anos não compuseram o estudo.
A delimitação de um buffer de 100 km foi definida a partir da coordenada da portaria principal da Unidade de Conservação ou de outra estrutura de referência, por meio da ferramenta QGIS. Os dados de IDH e população dos municípios abrangidos foram extraídos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Censo 2010.
Para contabilização do número de atrativos naturais, as trilhas foram consideradas naqueles locais em que o percurso consiste apenas na sua experiência e vivência, sem que o objetivo seja alcançar determinado atrativo principal. Como muitas áreas possuem caminhos que direcionam a determinado atrativo ou a vários ao mesmo tempo, acredita-se que a inclusão das trilhas, apesar de também serem contemplativas, poderiam gerar conflitos nos dados por duplicação de informação.
Para garantir a precisão dos resultados, foi realizado o teste de Correlação de Pearson, que analisa dados que seguem uma distribuição normal evitando contradições no processo de análise e interpretação dos dados por meio do software Minitab. Correlações com valor-p menores que 0,10 (nível de significância α = 10%) foram consideradas significativas, ou seja, há uma interferência entre determinada variável e a visitação das dez Unidades de Conservação analisadas.
A partir da avaliação que examinou 11 variáveis como determinantes para o número de visitantes nas UCs em Minas Gerais, foi elucidado que apenas a variável do ambiente interno – reputação, das 11 variáveis independentes, foi considerada significativa, evidenciando relação com a variável dependente – número de visitantes das UCs mineiras (Tabela 1).
A relação entre a reputação e o número de visitantes também foi encontrada por Castro et al. (2015), ao avaliar a visitação nas UCs federais. Porém, a influência exclusiva, como aspecto biofísico dentre as características internas das UCs mineiras é uma ocorrência que merece destaque.
Define-se reputação como “conceito obtido por uma pessoa a partir do público ou da sociedade em que vive”, ou “possuir renome e prestígio" (Dicionário Online de Português, 2022). Assim, no contexto deste estudo, a reputação se relaciona à fama, imagem, atratividade cênica, visibilidade e nível de informação da Unidade de Conservação disponível na internet.
O primeiro acesso que um visitante possui com determinado destino turístico é por meio da imagem e do conhecimento sobre o local que, segundo Roseta e Sousa (2020), é quando se estimula a imaginação e o desejo. Pode-se instigar a visitação a partir das informações sobre o local e essa abordagem procura adequá-las ao perfil do consumidor, sendo a internet imprescindível, como alimentador das pesquisas (Balarine, 2002; Biz & Ceretta, 2007). Nossos resultados corroboram esses pensamentos, por exemplo, no caso do Parque Estadual do Ibitipoca, localizado nos municípios de Lima Duarte e Santa Rita do Ibitipoca, que é o mais visitado (38%) e também aquele com maior número de informações disponibilizadas na internet.
Acredita-se que múltiplas indicações podem ser essenciais para garantir a lealdade de um visitante a um local, atualmente reforçadas por meio das redes sociais, blogues e influenciadores digitais (Andrade et al., 2018; Roseta & Sousa, 2020). Com a popularização da internet e o avanço das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) houve uma transformação na comunicação interpessoal, de forma que o mercado se atualiza constantemente visando a satisfazer às necessidades da sociedade, e quando os usuários compartilham suas experiências, promovem as viagens de outros que consultam as redes sociais (Andrade et al., 2018; Souza & Machado 2017). Assim, uma boa reputação digital torna o local mais confiável para os turistas, define a classificação do empreendimento e, até mesmo, determina a valorização final do produto ofertado (Aghadadashi et al., 2021; Albach et al., 2022).
Além disso, a qualidade ambiental de um destino de natureza permanece como um dos principais elementos utilizados pelos visitantes para justificar as suas opiniões (Deng, 2002), sendo as paisagens e belezas ali presentes, um diferencial para a escolha (Lee et al., 2010). Estudo do Semeia (2022) demonstra que 20% dos frequentadores de áreas naturais foram ao parque, devido a um atrativo famoso. Por isso, é fundamental compreender os processos de comunicação do mercado e da concorrência, a fim de estabelecer estratégias que ampliem a competitividade (Balarine, 2002; Tineu & Fragoso, 2009) das UCs mineiras — que, apesar de possuírem grande potencial, são ainda pouco exploradas.
Assim, frente aos desafios identificados e reconhecendo a importância da reputação, Darwish (2021) sugere estratégias para o desenvolvimento e manutenção da reputação de um destino turístico. Algumas dessas estratégias incluem a identificação e priorização de stakeholders, uma análise SWOT para definir objetivos claros, manutenção de uma comunicação atualizada e eficaz sobre o destino, e um monitoramento contínuo das percepções do público para ajustar as estratégias conforme necessário. No ambiente digital atual, ferramentas como o TripAdvisor(R) não apenas facilitam a jornada do turista, fornecendo informações detalhadas, mas também servem como repositórios ricos de dados para gestores. Estes podem, como evidenciado por Silva et al. (2019), explorar essas plataformas para entender nuances do comportamento dos visitantes e avaliar seus interesses e expectativas, otimizando, assim, suas estratégias de promoção e melhoria de destinos.
A experiência é outro importante aspecto na qualificação do conhecimento construído para a realização de uma viagem (Semeia, 2022) e os demais atributos internos contribuem para essa vivência. Contudo, divergindo de autores como Lucchesi (2020), nossos resultados revelaram que nem a variabilidade natural e cultural, ou mesmo a diversidade de atividades influenciaram significativamente a visitação. Em Minas, o Monumento Natural Estadual Peter Lund, em Cordisburgo, e o Monumento Natural Estadual Gruta Rei do Mato, em Sete Lagoas, apesar de terem uma visitação relativamente expressiva, possuem uma baixa variedade de atrativos e, consequentemente, de atividades, concentrando as visitas em suas grutas, ícones das áreas. Ademais, o Parque Estadual do Rio Preto, em São Gonçalo do Rio Preto possui a maior diversidade de atrativos e atividades dentre os demais e recebe poucos visitantes. O tipo de turismo e recreação pode variar de acordo com a área, ou mudar ao longo do tempo, sendo um desafio para os gestores. Nos processos de decisão há que separar as condições existentes das condições desejadas, planejando tanto as atividades quanto a implantação das estruturas de forma a garantir a integridade dos recursos naturais existentes (Leung et al., 2019).
A relação entre a idade de criação das UCs e a atração turística que estas detêm tem demonstrado não ser linear. Tomemos, por exemplo, o Parque Estadual do Rio Doce, situado na região do Vale do Rio Doce, que ostenta o título da primeira Unidade de Conservação estabelecida em Minas Gerais, em 1944. Apesar dos consideráveis investimentos destinados à sua consolidação, ele atrai apenas 4,9% do fluxo total de visitantes no estado. Em contraste, o Parque Estadual do Sumidouro, em Lagoa Santa e Pedro Leopoldo, fundado em 1980 e efetivamente implantado em 2010, concentra quase 13% da visitação total.
Tal discrepância na atração turística entre as UCs pode ser parcialmente explicada pelo conceito de “parques de papel”, conforme descrito por Pimentel (2008). Estes parques, embora formalmente estabelecidos, frequentemente carecem de planejamento apropriado e de provisões orçamentárias para sua gestão efetiva. Essa preocupação é corroborada por uma pesquisa do Semeia (2021) indicando que, dos parques brasileiros analisados, 60% possuem um Plano de Manejo. Entretanto, apenas 18% dos planos estão plenamente implementados.
O Plano de Manejo é um instrumento fundamental no contexto das UCs. Conforme a Lei 9.985, de 2000, é um documento técnico que estabelece diretrizes abrangentes para a implantação e administração das UCs, e sua elaboração não é apenas recomendada, mas sim mandatória. A ausência desse documento restringe as atividades nas UCs exclusivamente à preservação da integridade dos recursos naturais. Isso significa que, até que o plano seja desenvolvido e aprovado, quaisquer atividades turísticas são limitadas, o que pode comprometer significativamente o potencial turístico de uma região. Por conseguinte, para que as UCs alcancem plenamente seus objetivos conservacionistas e turísticos, a elaboração e efetivação do Plano de Manejo torna-se crucial.
A consolidação adequada das Unidades de Conservação é fundamental para garantir uma infraestrutura interna robusta e a oferta de serviços para os visitantes. Santos et al. (2011) destacam que o fornecimento eficaz de serviços e infraestrutura é vital para apoiar o funcionamento geral das UCs, contribuindo significativamente para a experiência do visitante. Uma infraestrutura deficitária pode, em teoria, desmotivar os potenciais visitantes.
No entanto, uma recente pesquisa do Semeia (2022) apresenta uma perspectiva intrigante. De acordo com o estudo, somente 1% dos entrevistados que nunca visitaram Parques Naturais mencionaram a infraestrutura e serviços inadequados como barreiras à visitação. Isso sugere que, embora a infraestrutura seja importante, ela não é a principal consideração para todos os turistas potenciais. Ao explorar o turismo em áreas naturais, Iatu & Bulai (2011) observam que nem todos os destinos precisam de investimentos significativos em infraestrutura para atrair visitantes, já que a essência desses locais está em sua primitividade. Clark (2022) ecoa esse sentimento, salientando que muitos entusiastas do ecoturismo sentem que a verdadeira conexão com a natureza é, muitas vezes, obscurecida por desenvolvimentos turísticos excessivos em áreas protegidas.
No contexto de Minas Gerais, todas as dez UCs analisadas possuem infraestrutura adequada para atender ao público. Mesmo entre UCs com infraestruturas semelhantes, como os Parques Estaduais do Ibitipoca e do Rio Preto, observa-se variação na visitação. Esse fato ilustra que a correlação entre infraestrutura e número de visitantes não é direta. Dada essa complexidade, o ICMBIO (2018) sugere que as UCs diversifiquem as experiências oferecidas, identificando e ampliando potenciais recreativos e oportunidades de negócios relacionadas à visitação. É vital que cada UC tenha planos que estejam alinhados com sua vocação específica, atendendo a uma variedade de públicos.
Em meio aos desafios da gestão do uso público nas UCs, as Parcerias Público-Privadas (PPP) emergem como uma solução viável. A Fundação Grupo Boticário (2021) ressalta que tais parcerias, promovidas tanto pelo Governo Federal quanto por governos estaduais e municipais, têm o potencial de aperfeiçoar a prestação de serviços relacionados ao turismo e apoiar a gestão da visitação, elevando a experiência turística a novos patamares.
Em um cenário turístico em constante crescimento, a capacidade de um destino de atrair visitantes determina sua posição no mercado. A análise da variável “atrativos regionais” destaca que estar próximo de destinos renomados não assegura uma visitação maciça. Por exemplo, o Parque do Itacolomi, localizado entre as cidades históricas de Ouro Preto e Mariana, não aproveita plenamente seu potencial de visitação. Em contraste, o Ibitipoca emerge como um atrativo por si só, mesmo sem a proximidade de destinos turísticos de grande reconhecimento.
Tal observação reforça o argumento de Hassan (2000) de que a mera existência de recursos não é suficiente; a posição de mercado do destino é crucial. No mundo competitivo do turismo, no qual destinos competem não apenas entre si, mas também com atrações culturais, históricas e naturais circundantes, é vital uma abordagem estratégica. Lacay et al. (2010) postulam que, sem uma visão coletiva e estratégica, é difícil introduzir novos atrativos competitivos.
Nesse sentido, a prática de roteirização, conforme elaborado pelo MTUR (2010b), oferece uma solução ao diversificar a oferta turística, otimizando a experiência do visitante. O estado de Minas Gerais exemplifica isso por meio de iniciativas como os Circuitos Turísticos e o “Passaporte do Parque Estadual Mata do Limoeiro e as Sete Maravilhas do Entorno” (Prefeitura de Itabira, 2022).
No entanto, o acesso a esses destinos também é uma consideração importante. A proximidade a aeroportos comerciais pode sugerir um maior potencial de visitação, tanto de turistas regionais quanto internacionais. Todavia, apesar de o estudo do Semeia (2022) sugerir a distância como um dos principais motivos de uma pessoa nunca ter visitado um Parque Natural, em Minas Gerais esse não é o fator decisório. Pode-se levar em conta, por exemplo, o Parque Estadual da Lapa Grande, localizado a menos de 15 km do aeroporto de Montes Claros, no qual ainda possui uma visitação muito incipiente. Por outro lado, a qualidade das rodovias, como destacado pelo estudo da Confederação Nacional do Transporte (CNT) (Costa, 2021), influencia o custo e a acessibilidade, impactando a decisão de visitar certos destinos.
Dessa forma, mesmo que Minas Gerais não apresente o deslocamento como influência direta na escolha do visitante, o investimento para melhoria dos acessos e infraestrutura do entorno dessas áreas é imprescindível para o desenvolvimento do turismo (Agnes, 2015).
Adicionalmente, a diversidade de estabelecimentos no entorno, como hospedagem e alimentação, é comumente vista como um fator determinante para atrair visitantes. No entanto, destinos bem estabelecidos em Minas Gerais, como os Parques do Itacolomi e da Lapa Grande, demonstram que essa infraestrutura por si só não garante alta visitação. Iatu e Bulai (2011) concordam, argumentando que a oferta turística isoladamente não é suficiente.
O contexto socioeconômico e a densidade populacional também têm sido considerados como possíveis influenciadores. Entretanto, as Unidades de Conservação Estaduais em Minas Gerais não mostram uma correlação clara nesse sentido. Figueiredo (2021) observa que os municípios próximos de Belo Horizonte oferecem uma melhor qualidade de vida, mas isso não se traduz necessariamente em visitação.
Os recentes desafios apresentados pela pandemia global ressaltaram o desejo das pessoas por espaços abertos e experiências ao ar livre. Apesar disso, muitos parques urbanos, mais acessíveis à população, são menos conhecidos do que seus equivalentes naturais, como destacado pelo Semeia (2022). Além disso, o custo associado a viagens é um impedimento notável para muitos potenciais visitantes.
Em suma, a complexidade da indústria do turismo em Minas Gerais é influenciada por uma miríade de fatores, desde a proximidade de atrativos até aspectos socioeconômicos. Como Kotler et al. (2011) e Santos et al. (2011) ressaltam, é imperativo uma compreensão holística desses fatores e uma gestão integrada da cadeia produtiva do turismo para alcançar o sucesso sustentável. A singularidade de cada destino deve ser reconhecida e otimizada para garantir sua viabilidade em longo prazo no mercado competitivo de hoje.
O ecoturismo, com seu foco na sustentabilidade e preservação, demanda uma análise meticulosa dos fatores críticos de sucesso que guiam as escolhas dos visitantes. Neste estudo, uma clara correlação emergiu entre a visitação e a reputação das Unidades de Conservação em Minas Gerais. A reputação, um ativo intangível, destaca-se como um pilar fundamental na atratividade dos destinos de ecoturismo. Assim, é imprescindível que as unidades de conservação fortaleçam e consolidem sua imagem positiva através de comunicações mais assertivas e um entendimento profundo do mercado turístico.
A integração e a interconexão dos diversos fatores que impactam o turismo nas áreas naturais protegidas demonstram a necessidade de um planejamento holístico. Com uma compreensão mais clara da demanda e das características do destino, é possível refinar a gestão do uso público, realçando a experiência do visitante e promovendo o turismo sustentável.
Engajar e integrar as comunidades locais no processo é fundamental para enriquecer a oferta turística, garantindo que os investimentos estejam alinhados à verdadeira vocação da área. Isso maximiza o potencial recreativo através da oferta de produtos e serviços de alta qualidade, otimizando a visitação.
Reconhecemos a complexidade de analisar o turismo sob a perspectiva das Unidades de Conservação, dada a intrincada teia de fatores subjetivos, como as aspirações e desejos individuais. Apesar das limitações do tamanho da amostra, este estudo serve como um ponto de partida fundamental para investigações futuras. Recomenda-se expandir esta pesquisa, utilizando amostras maiores e uma faixa de significância mais rigorosa. A abordagem mais abrangente fornecerá insights mais precisos, fundamentais para o planejamento eficaz das áreas de conservação, alinhando-as ao crescimento sustentável do turismo.
Simone Magela Moreira: