Como eu faço?

Reconstrução da hélice da orelha sem triângulo de compensação

Marina Zoéga Hayashida
Universidade Federal do Estado de São Paulo, Brazil
Mauro Yoshiaki Enokihara
Universidade Federal do Estado de São Paulo, Brazil
Sérgio Henrique Hirata
Universidade Federal do Estado de São Paulo, Brazil
Ival Peres Rosa
Universidade Federal do Estado de São Paulo, Brazil

Reconstrução da hélice da orelha sem triângulo de compensação

Arquivos Brasileiros de Cardiologia, vol. 10, núm. 3, pp. 260-263, 2018

Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC

Recepção: 03 Outubro 2017

Aprovação: 24 Setembro 2018

RESUMO: Os cânceres da pele na região da cabeça e do pescoço correspondem a 70-75% dos tumores cutâneos malignos, e, destes, 80% são do tipo carcinoma basocelular. O pavilhão auricular é a localização dos tumores cutâneos malignos em percentual que varia de três a 6% dos casos. Relatamos técnica alternativa para reconstrução da hélice após exérese de tumores sem a utilização do triângulo de compensação clássico, de modo a proporcionar cicatriz na dobra da hélice, com melhor resultado estético, sem retrações inestéticas ou cicatrizes transversais à hélice.

Palavras-Chave: Neoplasias da orelha, Orelha externa, Procedimentos cirúrgicos dermatológicos.

INTRODUÇÃO

Os cânceres da pele na região da cabeça e do pescoço correspondem a 70-75% dos tumores cutâneos malignos,1,2 e, destes, 80% são do tipo carcinoma basocelular.1 A radiação ultravioleta é o principal fator de risco,3,4 principalmente no sexo masculino, seguido das características fenotípicas como olhos e pele clara (fototipo 1), radioterapia, imunossupressão iatrogênica, entre outros.

Os tumores cutâneos malignos localizam-se no pavilhão auricular em percentual que varia de três a 6% dos casos.5 Os carcinomas originados nessa região são considerados de maior agressividade e pior prognóstico quando comparados aos localizados no tronco e extremidades.1 O pavilhão auricular é estrutura constituída fundamentalmente por pele e cartilagem, mas possui estrutura anatômica muito complexa. A hélice é a principal estrutura que dá sua forma.5 Assim, conhecer e entender técnicas cirúrgicas de reconstrução da hélice após exéreses de tumores torna-se de suma importância para o dermatologista.

O objetivo deste artigo é descrever técnica diferenciada para reconstrução da hélice após exérese de tumores sem a utilização do triângulo de compensação clássico, proporcionando assim cicatriz ao longo da dobra da hélice com melhor resultado estético.

MÉTODOS

Ilustramos a técnica com 3 pacientes (Figuras 1, 2 e 3), que apresentaram diagnóstico de carcinoma basocelular na hélice da orelha esquerda (Figuras 1A, 2A e 3A).

A - Carcinoma basocelular na hélice da orelha esquerda;
								B - Defeito retangular após exérese; C -
							Retalhos de avanço bilaterais e sua sutura; D - Sobra de
							tecido em formato de meia- -lua a ser retirado; E - Sutura
							ao longo do sulco da hélice. F - Cicatriz longitudinal ao
							longo da hélice
Figura 1
A - Carcinoma basocelular na hélice da orelha esquerda; B - Defeito retangular após exérese; C - Retalhos de avanço bilaterais e sua sutura; D - Sobra de tecido em formato de meia- -lua a ser retirado; E - Sutura ao longo do sulco da hélice. F - Cicatriz longitudinal ao longo da hélice

A - Carcinoma basocelular na hélice da orelha esquerda;
								B - Defeito retangular após exérese do tumor com
							margem; C - Sobra de tecido de pele e cartilagem a ser
							excisado em formato de meia-lua; D - Sutura ao longo do
							sulco da hélice
Figura 2
A - Carcinoma basocelular na hélice da orelha esquerda; B - Defeito retangular após exérese do tumor com margem; C - Sobra de tecido de pele e cartilagem a ser excisado em formato de meia-lua; D - Sutura ao longo do sulco da hélice

A - Carcinoma basocelular na hélice da orelha esquerda;
								B - Defeito retangular após exérese do tumor com margem
							e retalhos de avanço bilaterais (visão posterior); C -
							Sutura ao longo do sulco da hélice
Figura 3
A - Carcinoma basocelular na hélice da orelha esquerda; B - Defeito retangular após exérese do tumor com margem e retalhos de avanço bilaterais (visão posterior); C - Sutura ao longo do sulco da hélice

Um defeito retangular na hélice da orelha é criado após a exérese das lesões malignas (Figuras 1B, 2B e 3B), realizando-se dois retalhos de avanço bilateralmente ao defeito, no sentido horizontal (Figura 1C). Em seguida, é feito o descolamento de pele que recobre a cartilagem em ambos os lados, com aproximação e sutura inicialmente da cartilagem com náilon 4-0, e a seguir a da pele, com náilon 5-0, evitando a coincidência das duas em um mesmo plano, e criando um escalonamento entre elas, ainda que sob discreta tensão inicial (Figuras 1C e 2C).

Na sequência, tentamos inicialmente colocar os dois retalhos de avanço para trás, com objetivo de suturá-los junto à cartilagem que se projetou também para trás. Quando o local da cartilagem suturada coincide exatamente no mesmo plano dos retalhos suturados, é possível realizar diretamente a sutura final sem nenhuma compensação. Quando isto não é possível e a cartilagem fica mais alta do que os retalhos (Figura 2C) são retiradas pele e cartilagem da anti-hélice E, de forma paralela em formato de meia-lua do tamanho excedente, retirando assim a tensão inicial da sutura dos retalhos (Figuras 1D e 2C - a seta indica o formato da meia-lua a ser retirado no caso ilustrado). Por fim, é feita sutura das demais regiões anteriores e posteriores dos retalhos (Figuras 1E, 2D e 3C).

RESULTADOS

Essa técnica de reconstrução da hélice da orelha foi realizada nos três pacientes ilustrados nas figuras com sucesso e recuperação completa sem intercorrências. O resultado do exame anatomopatológico das peças cirúrgicas de todos os pacientes indicou carcinoma basocelular com margens livres. As cicatrizes se mantêm ao longo do sulco da hélice da orelha, obtendo-se ótimo resultado estético e funcional.

DISCUSSÃO

O pavilhão auricular tem anatomia complexa, sendo subdividido em hélice, anti-hélice, fossa escafoide, concha, trágus, antitrágus e lóbulo, sendo a hélice a estrutura principal que confere sua forma característica.5

Quando um tumor atinge a hélice, existem duas alternativas clássicas: exérese em V ou retirada em retângulo e avanço de dois retalhos laterais. Entretanto, se ficarem muito tensos, ambos provocam a formação de uma dobra no pavilhão auricular, sendo necessários triângulos de compensação.5

Em qualquer técnica de reconstrução da hélice em que dois retalhos de avanço são utilizados, quando há sua aproximação direta forma-se uma dobra inevitável na cartilagem. Essa dobra é jogada para trás no ato cirúrgico e, para corrigi-la, a técnica tradicional retira com uma incisão vertical o excesso da dobra, num formato triangular. Entretanto, corrigindo-se desta forma, a orelha é sempre deslocada anteriormente, ficando desalinhada e assimétrica quando comparada ao lado contralateral.

Na técnica descrita neste trabalho, forçamos os dois retalhos de avanço para trás, com objetivo de suturá-los junto à cartilagem que se projetou para trás. Em alguns casos, é possível realizar diretamente a sutura sem nenhuma compensação, com melhor resultado estético uma vez que a orelha não é projetada anteriormente. Contudo, na maioria das vezes, a cartilagem que foi colocada para trás fica mais alta do que os retalhos já suturados, e não é possível sua sutura direta. Nessa situação, cortamos o excesso de forma paralela em meia-lua aos dois retalhos até que consigamos suturá-los. Com isso a orelha não é projetada anteriormente e a sutura fica longitudinal ao longo da hélice, evitando a tradicional, que fica visível de forma transversal.

A técnica do escalonamento consiste em suturar pele e cartilagem da hélice em planos distintos, sendo fundamental para um bom resultado estético. Quando são suturados juntos, a cicatrização provoca retração, que se expressa por sulco visível transversal na hélice.

CONCLUSÃO

Ilustramos técnica alternativa ao triângulo de compensação, cuja vantagem principal é a cicatriz ao longo da curva da hélice, que apresenta melhor camuflagem do que a cicatriz perpendicular proporcionada pelo triângulo e menor chance de curvar o pavilhão auricular para frente, com melhores resultados estéticos.

REFERÊNCIAS

Gallegos-Hernández JF, Martínez-Méndez MA, Ábrego-Vázquez JA, Hernández-Sanjuan M, Minauro-Munoz GG, Ortiz-Maldonado AL. Características clínicas de los tumores malignos originados en el pabellón auricular. Cir & Cir. 2015;83(6):473-7.

Kyrgidis A, Tzellos TG, Kechagias N, Patrikidou A, Xirou P, Bour-lidou E, et al. Cutaneous squamous cell carcinoma (SCC) ofthe head and neck: Risk factors of overall and recurrence-freesurvival. Eur J Cancer. 2010;46(9):1563-72.

Cannavó SP, Borgia F, Trifiró C, Aragona E. Skin and sun exposure. G Ital Med Lav Ergon. 2013;35(4):219-21.

Gandhi SA, Kampp J. Skin Cancer Epidemiology, Detection, and Management. Med Clin N Am. 2015;99(6):1323-35.

Rosa IP. Cirurgia das Orelhas. In: Gadelha AR, Costa IMC, editors. Cirurgia dermatológica em consultório. São Paulo: Ed Atheneu; 2009. p. 759-88.

Notas

Trabalho realizado na Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal do Estado de São Paulo (Unifesp) – São Paulo (SP), Brasil.
Suporte Financeiro: Nenhum

Autor notes

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Marina Zoéga Hayashida | 0000-0002-2960-3134

Planejamento, elaboração, redação e discussão do manuscrito; acompanhamento clínico dos pacientes.

Mauro Yoshiaki Enokihara | 0000-0002-3815-7201

Supervisão, orientação, discussão e correção do manuscrito; acompanhamento clínico dos pacientes.

Sérgio Henrique Hirata | 000-0003-4026-9664

Supervisão, orientação, discussão e correção do manuscrito; acompanhamento clínico dos pacientes.

Ival Peres Rosa | 0000-0002-8463-007

Planejamento, elaboração, redação, supervisão, orientação e discussão do manuscrito; acompanhamento clínico dos pacientes.

Correspondência para: Marina Zoéga Hayashida, Av. Borges Lagoa, 508, Vila Clementino, 04038-001, São Paulo - SP, Brasil. E-mail:mahayashida@hotmail.com

Declaração de interesses

Conflito de Interesses: Nenhum
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