RESUMO: A púrpura actínica é caracterizada por máculas roxas escurecidas localizadas, principalmente nas áreas fotoexpostas das faces extensoras dos braços e das mãos de indivíduos idosos. Até o momento, não há tratamento satisfatório. Relatamos o caso de um paciente de 80 anos que foi submetido ao tratamento com duas sessões de preenchimento dos antebraços com hidroxiapatita de cálcio, apresentando bom resultado.
Palavras-Chave: ColágenoColágeno,PúrpuraPúrpura,TerapêuticaTerapêutica.
ABSTRACT: Actinic purpura is characterized by dark purple patches, mainly on photoexposed areas of the extensor surfaces of the arms and hands of elderly individuals. Thus far, there is no satisfactory treatment. We report the case of an 80-year-old patient who underwent treatment with two sessions of calcium hydroxyapatite filler application in the forearms, with good results.
Keywords: Collagen, Therapeutics, Purpura.
Como eu faço
Tratamento de púrpura actínica com hidroxiapatita de cálcio
Treatment of actinic purpura with calcium hydroxyapatite
Recepção: 27 Maio 2018
Aprovação: 08 Dezembro 2018
A púrpura actínica ou senil é uma desordem do tecido conjuntivo dérmico devido à exposição crônica ao sol. Foi descrita em 1818 por Bateman e, por isso, também é conhecida como púrpura de Bateman. Afeta indivíduos idosos e é caracterizada por máculas roxas escurecidas, localizadas em áreas de pele fotodanificada das mãos e dos antebraços, principalmente.1 Mais recentemente, em 2007, o termo dermatoporose foi proposto para descrever a síndrome de fragilidade ou insuficiência cutânea crônica, causada pela diminuição progressiva de importantes estruturas da pele. A dermatoporose engloba a atrofia cutânea, a púrpura actínica e as pseudocicatrizes. Por volta dos 70-80 anos, as alterações da dermatoporose e suas complicações começam a aparecer.2 Com o envelhecimento da população, acreditamos que a dermatoporose irá se tornar muito mais frequente, e medidas profiláticas e novos tratamentos precisam ser estudados.
Um homem caucasiano de 80 anos de idade, fototipo I, apresentava atrofia cutânea, máculas roxas escurecidas e erosões com crostas hemáticas em ambos os antebraços, sendo o quadro mais intenso no antebraço esquerdo (Figura 1). A queixa principal consistia em máculas arroxeadas que permaneciam por muito tempo e que apareciam com traumas mínimos. Já havia tentado tratamentos tópicos com hidratantes, cumarínicos e heparina, sem melhora significativa.

Foram realizadas duas sessões de preenchimento com hidroxiapatita de cálcio (Radiesse® Merz Aesthetics São Paulo SP, Brasil). Em cada sessão, 1,5ml de hidroxiapatita de cálcio (CaHA) foi diluído em 3ml de soro fisiológico e lidocaína a 2%, em partes iguais, totalizando o volume de 4,5ml.3 As aplicações foram realizadas por injeções retrógradas, em leque, com cânula 22Gx2” no plano subdérmico. O antebraço foi dividido em três partes iguais, utilizando-se 1,5ml da solução diluída em cada terço (Figura 2). Duas sessões foram realizadas com intervalo de 30 dias entre elas. Apenas o antebraço esquerdo foi tratado por escolha do paciente, por ser o lado mais acometido. Nenhum outro tipo de tratamento tópico foi prescrito, exceto o uso de fotoproteção com FPS 30. Observou-se melhora clínica logo após a primeira sessão (Figura 3) e esta vem se mantendo após seis meses do início do tratamento. Entretanto, houve surgimento de novas lesões em áreas não tratadas, como dorso da mão e região próxima à dobra do cotovelo (Figura 4).



A dermatoporose pode ser primária, resultante da longa exposição ao sol sem fotoproteção juntamente com a idade avançada. Já a secundária iatrogênica se deve ao uso crônico tópico ou sistêmico de corticosteroides, o que induz a uma atrofia cutânea. Clinicamente, não há diferenças entre a primária e a secundária iatrogênica; entretanto, a secundária pode se iniciar mais cedo e ser mais grave em pacientes com fotodano.4
Apresenta quatro estágios clínicos: estágio I - atrofia cutânea, púrpura actínica e pseudocicatrizes; estágio IIa - pequenas lacerações (<3cm), superficiais e localizadas; estágio IIb - grandes lacerações (>3cm); estágio IIIa - hematomas superficiais; estágio IIIb - hematomas profundos sem necrose; estágio IV - largas áreas de necrose com ou sem complicações letais.1,2
A púrpura actínica resulta de um extravasamento do sangue para dentro da derme e até subcutâneo após um trauma mínimo. Normalmente, afeta as faces extensoras dos antebraços e das mãos, mas pernas, pescoço e face também podem ser afetados. A pele ao redor normalmente é alterada, apresentando-se atrófica, pigmentada e inelástica.1
O diagnóstico é clínico, e os estudos histológicos mostram epiderme fina sobre derme com fibras colágenas diminuídas, sendo progressivamente substituídas por fibras elásticas anormais. A parede dos vasos dérmicos tem a estrutura tensional normal, mas há extravasamento de hemácias e depósito de hemossiderina. Em 10%, há infiltração neutrofílica, sendo importante a diferenciação com dermatoses neutrofílicas e vasculites leucocitoclásticas.1
Permanece ainda como melhor tratamento a prevenção por meio do uso de fotoprotetores (UVA e UVB) com FPS maior que 50, utilizado de maneira regular nas áreas fotoexpostas. O uso de ácido retinoico a 0,1%, teoricamente, reverte sérios danos solares da pele, com a regeneração da derme e a redução das fibras elásticas anormais; entretanto, em alguns estudos, os autores não demonstraram melhora das placas de púrpura actínica.1 Já a associação de retinaldeídos e fragmentos de hialuronatos intermediários mostrou maior efeito sinérgico na proliferação de queratinócitos do que com ambos separados.5,6 O uso de creme com fator de crescimento epidérmico mostrou aumento da espessura da pele e diminuição do número de lesões purpúricas quando aplicado duas vezes por dia por seis semanas.1,6,7 Já o uso de misturas de bioflavanoides cítricos orais mostrou, no grupo estudado, melhora de 50% das placas purpúricas após seis semanas.1,6 O uso tópico de dehidroepiandrosterona (DHEA) a 1% em creme, duas vezes por dia por quatro meses, melhorou a atrofia epidérmica associada a peles pós-menopausadas; já o uso oral da DHEA para a profilaxia da púrpura senil necessita de mais estudos.6
As microesferas da CaHA são uniformes, medindo entre 25 e 45µ, de superfície lisa, têm uma boa biocompatibilidade e estimulam a produção de colágeno por meio de um processo inflamatório, levando à formação de uma cápsula fibrosa, sendo totalmente biodegradada ao final de 14 meses.8,9,10,11
Nosso paciente estava no estágio IIa, sendo o estágio I e IIa, clinicamente, os mais comuns.
A CaHA foi cogitada como opção de tratamento devido ao seu efeito bioestimulador e sua comprovada ação na melhora da espessura dérmica3,8,9,10, uma vez que, na púrpura actínica, a falta de sustentação e de proteção dada pela derme ao redor dos vasos leva ao extravasamento de hemácias e hemossiderina na derme e no subcutâneo, não se tratando de uma ruptura espontânea. Portanto, ao aumentar a espessura da derme, pode ser aumentada a proteção a esses vasos dérmicos. Acreditamos também que esse espessamento dérmico deve compensar a lipoatrofia senil que observamos em vários pacientes e que, provavelmente, facilita o aumento do trauma pela diminuição também do tecido celular subcutâneo, mas estas são observações que não vemos relatadas nos artigos publicados sobre o assunto.
Estudos histológicos e imuno-histoquímicos demonstram que a CaHA aumenta a expressão de colágeno tipo I e III, além da elastina e da neovascularização, com picos na produção de colágeno entre o quarto e o sétimo mês.3 Por meio de estudos de imagens de ultrassom, foi observado significante aumento da espessura dérmica neste período, entretanto sem alteração na espessura da epiderme.3
Com o envelhecimento, o colágeno torna-se irregular e desorganizado, levando à perda da estrutura tridimensional da derme, o que afeta negativamente a função dos fibroblastos. As microesferas de CaHA agiriam como um alicerce para a formação do novo tecido e na ativação dos fibroblastos com consequente formação de colágeno e elastina. Supõe-se que elas promovam uma estrutura estável para a adesão dos fibroblastos, muito semelhante àquela presente na pele jovem.3 O que se conclui é que a produção de colágeno novo dentro da matriz extracelular da derme resulta num melhor suporte estrutural, ocasionando maior firmeza e elasticidade à pele, e que, por essa razão, ocorrem menos rupturas vasculares aos mínimos traumas, com menor extravasamento de hemácias na derme e consequente melhora clínica da púrpura actínica.
A importância deste relato se deve ao fato de abordar uma patologia sem tratamento efetivo até o momento, em que o uso da CaHA foi um tratamento inédito, com resultado satisfatório e com diminuição na gravidade do quadro clínico.
Correspondência: Giseli Petrone de Souza Av. das Américas 3500, Sala 238 Condomínio Le Monde Hong Kong 3000 - Barra da Tijuca, 22640-102, Rio de Janeiro, RJ Brasil. Email: giselipetrone44@gmail.com



