RESUMO: A completa remoção cirúrgica do lentigo maligno é desafiadora devido à dificuldade em determinar margens, disseminação subclínica e frequente localização facial. Neste artigo, relata-se abordagem cirúrgica de extenso lentigo maligno facial pela técnica de spaghetti, com margens livres no terceiro estágio cirúrgico. Essa técnica consiste na ressecção de margem circular periférica aos limites clínicos do tumor com avaliação histológica, sem remoção da lesão. Novas etapas incluem ampliação das margens comprometidas até que todo o perímetro esteja livre, quando então a ressecção do tumor e a reconstrução do defeito cirúrgico são realizadas simultaneamente. Objetiva atingir margens livres preservando tecido em áreas estéticas e funcionais.
Palavras-Chave: MelanomaMelanoma,Neoplasias cutâneasNeoplasias cutâneas,Procedimentos médicos e cirúrgicos de sangueProcedimentos médicos e cirúrgicos de sangue.
ABSTRACT: Complete surgical removal of lentigo maligna is challenging due to the difficulty in determining margins, subclinical spread and frequent facial location. In this article, we report the surgical approach of an extensive facial lentigo maligna with the "spaghetti" technique, with free margins in the third surgical step. This technique consists in the resection of a circular margin surrounding the clinical boundaries of the tumor, with histological evaluation, without removing the lesion. New steps include widening of the affected margins until the whole area is free, when tumor resection and reconstruction of the surgical defect take place simultaneously. The aim is to reach the free margins, preserving tissue in aesthetic and functional areas.
Keywords: Bloodless medical and surgical procedures, Melanoma, Skin neoplasms.
Relato de Caso
Abordagem cirúrgica do lentigo maligno facial pela técnica de Spaghetti
Surgical approach of facial lentigo maligna with the Spaghetti technique
Recepção: 20 Maio 2018
Aprovação: 08 Dezembro 2018
No espectro do melanoma in situ, o lentigo maligno (LM) representa lesões de crescimento lento nas áreas fotoexpostas de idosos, principalmente face. Clinicamente se manifesta como manchas pigmentadas irregulares e mal delimitadas. Corresponde à hiperplasia juncional de melanócitos atípicos e pode progredir para lesão invasiva. Seu tratamento cirúrgico costuma ser desafiador. Devido à predileção por áreas estéticas e funcionais, grandes dimensões e limites imprecisos, necessita de técnicas que alcancem margens livres poupando o máximo de tecido possível. Cirurgias com controle de margens mostram as melhores taxas de cura, mas costumam exigir longa curva de aprendizado e treinamento especializado, como a cirurgia micrográfica de Mohs. Uma opção tecnicamente mais simples é a técnica de spaghetti ou procedimento de perímetro por etapas.1,2 Objetiva-se relatar um caso de LM facial abordado cirurgicamente pela técnica de spaghetti.
Paciente do sexo feminino, 86 anos, apresentou-se à consulta com mancha acastanhada, irregular e assimétrica, de 3cm no maior diâmetro, na região malar direita há um ano. À dermatoscopia, evidenciavam-se, na porção superior, área de pigmentação acinzentada granular com estruturas rombodais perifoliculares e, inferiormente, área hipocrômica sem estruturas e fluorescente ao exame com lâmpada de Wood (Figura 1). Realizada a biópsia incisional, foi confirmada a suspeita diagnóstica de LM. Devido às grandes dimensões da lesão, sua proximidade com a pálpebra inferior, bem como a necessidade de margem de segurança livre de lesão, optou-se por realizar sua exérese segundo a técnica de spaghetti.

No primeiro estágio cirúrgico, foi excisada faixa de pele perilesional de 5mm sendo que a análise histológica identificou células tumorais em todo o segmento medial, inferior e lateral, com margem superior livre (Figura 2). No segundo estágio, observou-se acometimento de 2/3 da porção inferomedial da margem excisada (Figura 3). No terceiro estágio foi realizada exérese de toda a lesão incluindo nova faixa de pele de 5mm nas áreas que não estavam livres de tumor. A reconstrução do defeito foi realizada com enxerto de pele total proveniente da região clavicular direita (Figura 4). O exame anatomopatológico final mostrou margens livres de tumor. O período pós-operatório decorreu sem intercorrências e sem sinais de infecção da ferida operatória (Figura 5). O resultado estético e funcional foram favoráveis.




A técnica de spaghetti representa alternativa no tratamento cirúrgico do LM, possibilitando análise completa das margens cirúrgicas e preservação de tecido saudável. Após estabelecidos os limites clínicos da lesão, com auxílio da dermatoscopia e lâmpada de Wood, uma faixa de pele de três a 5mm é ressecada no perímetro do tumor. A ilha central contendo o tumor macroscópico é mantida intacta, e o defeito marginal é suturado. Apesar da possibilidade teórica de implante tumoral nos tecidos adjacentes, não há evidências que sustentem esse risco. A amostra excisada é marcada em pontos cardinais e encaminhada para análise histológica. Nas áreas que mantêm positividade de células neoplásicas, nova faixa de pele é excisada e analisada subsequentemente, até que todas as margens avaliadas sejam livres de tumor. Na etapa final, a lesão é removida por completo, e o defeito cirúrgico é reconstruído, com retalho cutâneo, enxerto ou fechamento primário.1-4
Estudo realizado na França1 revisou 16 casos de LM e cinco casos de melanoma lentiginoso acral tratados pela técnica de spaghetti com média de 1,55 estágio (1-4) e taxa de controle local de 95,24% em dois anos.
Trabalho realizado em Ontário2 com 11 pacientes operados por LM encontrou média de 1,9 estágio, com ausência de recidiva após cinco meses de seguimento.
Outro estudo francês3 associou avaliação das margens por microscopia confocal de reflectância in vivo em 33 pacientes com LM submetidos à exérese segundo a técnica de spaghetti. A média de estágios foi de 1,2, com 28 casos livres de tumor já no primeiro estágio. Não foram identificadas recidivas nos dez meses de acompanhamento pós-operatório.
A técnica de spaghetti é opção confiável para tratamento do LM. Apesar de necessitar de várias sessões operacionais para concluir o procedimento, é tecnicamente mais simples do que outras modalidades cirúrgicas com controle de margens, não exigindo treinamento específico como na cirurgia de Mohs, e mantendo taxas de cura semelhantes.
Correspondência para: Raíssa Rigo Garbin Av. Independência, 75 Independência 90035-072, Porto Alegre, RS Brasil E-mail: raissagarbin@hotmail.com




