RESUMO: Apresentou-se à consulta um paciente masculino de 74 anos, portador de uma mancha hiperpigmentada junto à borda palpebral inferior esquerda, com cores variadas, entre diferentes matizes de marrom; a biópsia confirmou o diagnóstico de lentigo maligno. A sua localização na borda palpebral é rara. Há alguma divergência na literatura quanto ao melhor método para seu tratamento. Opções terapêuticas não cirúrgicas, como o imiquimode, têm sido apresentadas bem como diferentes variantes no manejo cirúrgico e nas margens requeridas. No caso descrito, optou-se por manejo com margens conservadoras, preservando-se a funcionalidade da área.
Palavras-chave: MelanomaMelanoma,LentigoLentigo,Neoplasias PalpebraisNeoplasias Palpebrais,DermoscopiaDermoscopia,Patologia CirúrgicaPatologia Cirúrgica,Cirurgia PlásticaCirurgia Plástica.
Relato de caso
Lentigo maligno palpebral: o manejo com a interface Dermatologia-Oculoplástica: a propósito de um caso
Lentigo maligna of the eyelid: management with Dermatology- Oculoplastic interface: for the purpose of a case
Recepção: 21 Setembro 2018
Aprovação: 05 Abril 2019
O lentigo maligno melanoma, lesão in situ comumente encontrada na face e na região cervical, pode comprometer locais cujo tratamento é desafiador, como a região palpebral. O lentigo maligno nesta localização é raro (taxas inferiores a 1% entre os melanomas), representando até 1% de todas as malignidades palpebrais. 1,2 As lesões com acometimento conjuntival caracteristicamente têm comportamento mais agressivo. O prognóstico em geral é bom, porém as recorrências são frequentes, na dependência do tratamento empregado. O manejo deste tipo de melanoma, considerando sua relativa baixa agressividade e a sua delicada topografia, persiste como motivo de debate; muitos autores advogam a utilização de terapêuticas não cirúrgicas, ainda que sejam considerados índices de recidivas potencialmente superiores.12 Descrevemos o caso de paciente cuja lesão acompanhava a borda palpebral inferior, com excelente resultado oncológico, funcional e estético após tratamento cirúrgico.
Um paciente masculino, de 74 anos, compareceu à consulta com queixa de lesão escurecida no bordo ciliar inferior esquerdo, há dois anos, com crescimento progressivo. Consultou previamente oftalmologista por entrópio bilateral, com prescrição de colírio de lágrimas artificiais e extração dos cílios, tendo sido encaminhado à Dermatologia para avaliação da lesão pigmentada. Possuía história prévia de exérese de lesões na face e antebraço esquerdo há 10 anos, com impressão clínica de câncer de pele, sem comprovação histopatológica. O paciente apresentava diagnósticos prévios de hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia e insônia. Fazia uso contínuo de captopril, omeprazol e clonazepam. Previamente, havia sido submetido à cirurgia de hérnia de disco. Negava alergias medicamentosas, tabagismo e etilismo atuais ou prévios. Relatava história de câncer ocular em um primo de primeiro grau e negava história familiar positiva para câncer de pele.
Ao exame clínico, apresentava mácula assimétrica hiperpigmentada, com tonalidades variadas de coloração amarronzada, variando do claro ao escuro, com bordas irregulares, acompanhando a rima palpebral inferior esquerda (Figura 1). À dermatoscopia, havia rede pigmentar espessa, com área de pigmentação excêntrica em “borrão”, não poupando as aberturas foliculares, e presença de glóbulos na periferia da lesão (Figura 2). A impressão dermatoscópica foi de melanoma cutâneo.


O paciente foi encaminhado ao setor de Oculoplástica do Serviço de Oftalmologia para intervenção cirúrgica diagnóstica. Como havia triquíase na região central da pálpebra inferior esquerda, optou-se por uma ressecção de espessura total em pentágono da região central da pálpebra inferior esquerda, com o intuito de remover a área de cílios mal posicionados e obter material para análise histológica da lesão. Com o diagnóstico anatomopatológico de lentigo maligno (Figura 3A), corroborado pela imuno-histoquímica positiva para Melan A (Figura 3B) e HMB-45, foi planejada a ampliação com margens de 5mm, que correspondeu à ressecção total da pálpebra inferior esquerda. Foi realizada reconstrução da pálpebra inferior com retalho de rotação de Mustardé. O resultado terapêutico foi excelente, considerando-se aspectos do tratamento cirúrgico da neoplasia, funcionalidade do aparelho ocular e estética facial (Figura 4).


Diferentemente do que ocorre em outras regiões, a ampliação de margens nas lesões melanocíticas perioculares é um tema desafiador, uma vez que pequenas quantidades de tecido ressecado podem levar a importante comprometimento funcional e estético. Muitas vezes, é necessário limitar a ampliação de margens ao que se considera cirurgicamente aceitável em termos de ressecção e reconstrução. No caso descrito, optou-se por uma ressecção palpebral de espessura total, devido ao acometimento da pele palpebral, até a junção mucocutânea, mesmo que não houvesse comprometimento da conjuntiva palpebral.
Interessantemente, não há um consenso quanto à necessidade e/ou extensão da ampliação de margens na face conjuntival, quando não há comprometimento além da junção mucocutânea. 1,2 Embora a ressecção cirúrgica seja o método “padrão-ouro”, opções não cirúrgicas, como o uso do imiquimode, têm sido apresentadas, com resultados interessantes no tratamento de lesões in situ da região periocular. 3,5
Não obstante, seguir o princípio do tratamento cirúrgico oncológico para o manejo de melanomas cutâneos primários nos parece conferir uma segurança primordial, com índices de cura ainda não ultrapassados. A observação dos princípios oncológicos deve estar associada à preocupação quanto à funcionalidade e à estética resultantes da intervenção. 4
Para os melhores resultados de situações complexas, as equipes especializadas são importantes e devem unir esforços para uma interação produtiva.
À equipe do Serviço de Dermatologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Ana Carolina Krum dos Santos | ORCID 0000-0001-9863-1836, Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Renan Rangel Bonamigo | ORCID 0000-0003-4792-8466, Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Fernanda Poy Dondonis | ORCID 0000-0002-8307-2098, Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
André da Silva Cartell | ORCID 0000-0003-1436-9418, Aprovação da versão final do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.
Fernando Procianoy | ORCID 0000-0003-3365-8813, Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Correspondência: Ana Carolina Krum dos Santos R. Ramiro Barcelos, 2350 Santa Cecília 90035-903 Porto Alegre (RS) E-mail: anacksantos@gmail.com



