RESUMO: O dermatofibrossarcoma protuberante é um sarcoma localmente agressivo, de malignidade intermediária, que predomina na faixa de adultos jovens à meia-idade. Lesões congênitas ou na infância são raras, mas foram relatadas. Nos estágios precoces, pode ser mal diagnosticado e ser incompletamente excisado, o que aumenta o risco de recorrências. Relata-se o caso de paciente do sexo masculino, de 24 anos, com história de mácula hipercrômica em região abdominal desde o nascimento que evoluiu para tumoração após duas abordagens cirúrgicas. Biópsia e imuno-histoquímica confirmaram o diagnóstico de dermatofibrossarcoma protuberante, e a lesão foi excisada com margem de 3cm.
Palavras-chave: DermatofibrossarcomaDermatofibrossarcoma,Neoplasias de Tecido FibrosoNeoplasias de Tecido Fibroso,SarcomaSarcoma.
ABSTRACT: Dermatofibrosarcoma protuberans is a locally aggressive sarcoma of intermediate malignancy that predominates in the range of young adults to middle age. Congenital or childhood lesions are rare but have been reported. It can be misdiagnosed and incompletely excised in the early stages, which increases the risk of recurrence. The present article reports the case of a 24-year-old male patient presenting a hyperchromic macula in the abdominal region from birth that evolved into a tumor after several surgical approaches. Biopsy and immunohistochemistry confirmed the diagnosis of dermatofibrosarcoma protuberans, and the lesion was excised with a 3 cm margin.
Keywords: Dermatofibrosarcoma, Neoplasms, Fibrous Tissue, Sarcoma.
Relato de caso
Dermatofibrossarcoma protuberante mimetizando queloide
Dermatofibrosarcoma protuberans simulating keloid
Recepção: 11 Novembro 2019
Aprovação: 25 Fevereiro 2020
O dermatofibrossarcoma protuberante (DFSP) é um tumor fibro-histiocitário de malignidade intermediária que, apesar de ser raro, representa a maioria dos sarcomas cutâneos. Apresenta crescimento local agressivo, alta taxa de recorrência, mas baixo potencial metastático. É mais frequentemente relatado na faixa etária de 20 a 50 anos e apresenta ligeira predominância no sexo masculino.1,2,6
A localização mais frequente é o tronco (40-60%), seguido pelos membros (20-30%) e cabeça e pescoço (10-15%)3, sendo excepcionalmente descrito na parede abdominal, já que representa o tumor de tecidos moles menos frequente dessa região.4
Na sua fase inicial, pode-se apresentar como uma placa endurecida, assintomática, cor da pele, violácea, marrom-avermelhada ou levemente hipercrômica, semelhante a queloide. Eventualmente, desenvolve-se para nódulos violáceos a vermelho-acastanhados, com até vários centímetros de diâmetro. Na palpação, a lesão é sólida e aderida ao tecido subcutâneo. Existem relatos de lesões que se desenvolvem após trauma ou em cicatriz prévia de cirurgia.1,3,7
O exame histopatológico mostra uma coleção densa uniforme de células fusiformes em arranjo estoriforme (em turbilhão ou semelhante a uma esteira) característico, com pouco pleomorfismo nuclear e baixa atividade mitótica. O tumor pode infiltrar o subcutâneo distorcendo a arquitetura do tecido adiposo, com aspecto em favo de mel. Projeções profundas em direção a fáscia e músculo dificultam sua delimitação e consequente remoção cirúrgica.3,5,6
Na imuno-histoquímica, células fusiformes são positivas para CD34 e negativas para fator XIIIa, o que auxilia na diferenciação do dermatofibroma, principal diagnóstico diferencial histopatológico, no qual as células são negativas ao CD34 e positivas ao fator XIIIa.2,7,8
Excisão cirúrgica completa, incluindo a cirurgia micrográfica de Mohs, é o tratamento padrão para o DFSP. O mesilato de imatinibe foi experimentado em pacientes com DFSP irressecável, recorrente e/ou metastático.2
O objetivo do presente estudo é destacar a importância do diagnóstico precoce desse tumor, que, apesar de raro, pode simular clinicamente diversas lesões cutâneas como queloide, e observar que a primeira abordagem cirúrgica com margens amplas apresenta maior chance curativa, reduzindo as chances de recidivas locais e a alta morbidade.
Paciente do sexo masculino, 24 anos, procedente de Belo Horizonte, com relato de lesão na região epigástrica abdominal desde o nascimento, que se iniciou como mácula hipercrômica acompanhada de dor no local.
Realizou biópsia aos 12 anos de idade que foi sugestiva de queloide, segundo o paciente, que não apresentava o resultado anatomopatológico no momento da consulta. Foi submetido à abordagem cirúrgica aos 12 e 16 anos, com posterior recidiva e crescimento da lesão, que evoluiu para nódulos e placa normocrômica. Também não tinha os resultados histopatológicos dessas cirurgias.
Aos 24 anos, foi submetido à nova biópsia solicitada por dermatologista, que foi sugestiva de fibromixoma, sem sinais de malignidade. O paciente foi, então, encaminhado ao serviço de Dermatologia da Santa Casa de Belo Horizonte. Ao exame físico, apresentava tumoração lobulada eritêmato-violácea de consistência fibrosa, de aproximadamente 8 x 6cm, na região epigástrica abdominal (Figuras 1 e 2).


Diante da apresentação clínica, a principal suspeita foi de dermatofibrossarcoma protuberante e, portanto, foi realizada revisão da lâmina do anatomopatológico. A revisão revelou células fusiformes em arranjo estoriforme (Figura 3), e o material foi submetido à avaliação imuno-histoquímica. Tal exame revelou positividade para o anticorpo CD34, sendo conclusiva de dermatofibrossarcoma protuberante, confirmando a principal hipótese clínica.

Além disso, o paciente foi submetido à ressonância nuclear magnética para avaliar extensão da lesão e invasão local. O exame mostrou lesão expansiva multilobulada em pele e subcutâneo e um nódulo hepático, podendo corresponder a acometimento neoplásico secundário. Porém, a propedêutica do nódulo não mostrou, até o presente momento, relação com a neoplasia cutânea.
A lesão foi excisada pela equipe de cirurgia plástica, com margem ampla de 3cm, com retirada da fáscia do músculo reto abdominal e fechamento da parede por abdominoplastia reversa, apresentando bom resultado estético (Figuras 4 e 5). Conforme discutido com patologista, o anatomopatológico da peça cirúrgica foi compatível com DFSP, com fragmentos da fáscia muscular livres de neoplasia, e foi afastada a possibilidade de transformação mais agressiva na peça analisada.


Nenhum tratamento adjuvante foi administrado. Até o presente momento, um ano após o procedimento cirúrgico, o paciente não apresenta indícios de recidivas locais ou à distância.
O dermatofibrossarcoma protuberante é uma neoplasia de células fusiformes com malignidade intermediária e baixo risco de metástases. No entanto, o comportamento indolente do tumor e suas características imprecisas frequentemente levam à demora em sua percepção pelos pacientes e médicos, ocasionando atraso no diagnóstico. Além disso, devido à maior prevalência de casos de carcinomas basocelulares, carcinomas espinocelulares e melanomas cutâneos, os dermatologistas estão mais familiarizados com o diagnóstico, prognóstico e tratamento dessas neoplasias.1,3
O estágio precoce, por se tratar de lesão inespecífica e assintomática, pode ser mal diagnosticado como tumor benigno e ser incompletamente excisado. O diagnóstico diferencial clínico inclui queloide, dermatofibroma, dermatomiofibroma e morfeia.2,7
A coleta adequada de material para realização de anatomopatológico (AP) é de suma importância, pois amostras superficiais de material para AP podem não produzir material diagnóstico.2
A primeira intervenção é de extrema importância, uma vez que a disseminação tumoral após a primeira ressecção inadequada pode levar a crescimento local descontrolado ou à metástase.1
As altas taxas de recidiva locais, acompanhadas da alta morbidade do DFSP, justificam o esforço no diagnóstico precoce e a necessidade de tratamento inicial, que possibilita maior taxa de cura.3,7,9
As lesões com múltiplas recidivas após o tratamento inicial parecem ter maior probabilidade de diferenciação em sarcomas de alto grau de malignidade com aumento do risco de metástases.3
Os principais fatores prognósticos são a remoção cirúrgica inadequada com margens comprometidas, tumores grandes, localização na cabeça e presença de áreas de fibrossarcoma na histologia.3
O tratamento com maiores chances curativas é a ressecção cirúrgica com excisão local ampla. A disseminação microscópica do tumor por projeções de células tumorais, semelhantes a tentáculos, sob a pele clinicamente normal, torna difícil a remoção cirúrgica completa da lesão. Quando possível de ser realizada, a cirurgia micrográfica de Mohs apresenta as maiores taxas de cura para esse tumor.1,3 No caso em questão, optou-se pela cirurgia convencional com amplas margens cirúrgicas feita pela cirurgia plástica devido à grande extensão da lesão.
Agradeço a dedicação dos preceptores Michelle dos Santos Diniz, Maria Silvia Laborne e Cassio Ferreira Guimarães.
Juliana Chaves Fabrini Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Michelle dos Santos Diniz Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Mônica Maria de Faria Pimenta Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito.
Maria Silvia Laborne Alves de Sousa Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Ralph Brito Damaceno Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.
Cassio Ferreira Guimarães Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.
Correspondência: Maria Silvia Laborne Alves de Sousa Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte Avenida Francisco Sales, 1111 - Santa Efigênia 30150-221 Belo Horizonte (MG) E-mail: jmsdermatologica@terra.com.br




