Como eu faço?
Transplante capilar com técnica FUE: como eu faço?
FUE hair transplant: how I do it?
Transplante capilar com técnica FUE: como eu faço?
Surgical & Cosmetic Dermatology, vol. 14, e20220128, 2022
Sociedade Brasileira de Dermatologia
Recepção: 02 Fevereiro 2022
Aprovação: 21 Fevereiro 2022
RESUMO: O transplante capilar moderno está em constante evolução, e nossa intenção não é apenas demonstrar nossas técnicas e metodologias, mas, principalmente, descrever a dinâmica de todo o processo cirúrgico da técnica FUE (Follicular Unit Extraction), desde a discussão da estratégia cirúrgica com o paciente e a avaliação da área doadora até extração e implantação. É de extrema importância que o dermatologista compreenda a complexidade do procedimento e a necessidade de um treinamento adequado para que um bom resultado seja alcançado.
Palavras-chave: Alopecia, Cabelo, Folículo piloso.
ABSTRACT: Modern hair transplant is constantly evolving. We intend to demonstrate our techniques and methodologies, and especially to describe the dynamics of the entire surgical process of the FUE (Follicular Unit Extraction), technique, from the discussion of the surgical strategy with the patient and evaluation of the donor area to extraction and implantation. The dermatologist must understand the complexity of the procedure and the need for adequate training to achieve a good surgical result.
Keywords: Alopecia, Hair, Hair follicle, Transplant donor site.
INTRODUÇÃO
O transplante capilar não é um procedimento simples. Independentemente da técnica, há necessidade de uma equipe treinada e de um cirurgião apto e experiente para que melhores resultados sejam alcançados.
Inicialmente, o que era realizado por meio de grandes retalhos evoluiu para os enxertos com punchs maiores para, só então, chegarmos aos refinados transplantes de unidades foliculares. A identificação da unidade folicular (UF) como estrutura particular dos folículos pilosos foi essencial para se atingir o resultado mais natural.1
Na técnica FUT (Transplante de Unidade Folicular), há retirada de uma faixa de couro cabeludo na região doadora occipital, podendo-se chegar até as regiões temporais, e as UFs são separadas no microscópio. Na FUE, as UFs são retiradas individualmente de toda a área doadora segura em que não haja risco de miniaturização. São utilizados punchs com diâmetros que variam de 0,8 a 1,0mm na maioria dos casos. Essas microincisões cicatrizam-se por segunda intenção, não havendo necessidade da realização de sutura.1
O transplante capilar moderno está em constante evolução, e nossa intenção não é apenas demonstrar nossas técnicas e metodologias, mas, principalmente, descrever a dinâmica de todo o processo cirúrgico da técnica FUE, desde a discussão da estratégia cirúrgica com o paciente e avaliação da área doadora até extração e implantação.
MÉTODOS
1 - Planejamento cirúrgico
Na sala pré-operatória, são feitas fotos com os cabelos compridos, secos e depois molhados para melhor avaliação da área de rarefação. Discute-se com o paciente a estratégia cirúrgica (como altura do hairline e áreas de prioridade), alinhando expectativa com o que é possível em cada caso.2 Raspam-se, então, os cabelos do paciente entre 0,5 a 1,0mm, e novas fotos são feitas (Figura 1). Nos casos de rarefação, apenas nas entradas (Norwood-Hamilton 2) pode-se optar pela raspagem estilo militar (Figura 2).


2 - Avaliação da área doadora
Para avaliação da área doadora, são retiradas amostras de cabelos das regiões occipital, parietal e temporal. Um micrômetro digital é utilizado para avaliação da espessura desses fios (Figura 3) para que se possa realizar o cálculo do Coverage Value (CV), um software que determina quantas UFs podem ser extraídas sem que haja rarefação visível da área doadora.
Esta é dividida em cinco subunidades e, com um dermatoscópio acoplado em um tablet, são feitas as documentações fotográficas (Figura 4). Tanto a medida em centímetros quanto as fotografias são enviadas para o Coverage Value Software (Asmed Hair Transplant, Istambul). É calculado o valor aproximado de UFs/cm2 e fios/cm2 em cada subunidade, e um relatório é gerado, fornecendo informações para o manejo durante a extração como, por exemplo, valor aproximado de UFs para futuras cirurgias e em quais áreas podemos ser mais agressivos sem depleção da área doadora e sem comprometimento cosmético da mesma (Figuras 4 e 5).

3 - Anestesia
A infiltração anestésica e bloqueio regional são realizados com lidocaína 2% com vasoconstritor de forma extremamente lenta e associados a um estímulo vibratório para minimizar o desconforto.3 Uma solução tumescente é utilizada tanto na área doadora quanto na receptora.
4 - Extração
O primeiro passo consiste em decidir a profundidade do punch. Iniciamos a extração com uma profundidade de 3,0 a 3,5mm. Se houver capping (a epiderme é retirada, porém o folículo se mantém preso), provavelmente é porque o punch está muito superficial (Figura 6). Já se o enxerto sofrer transecção e ficar preso dentro do punch é porque este está muito profundo.4
O próximo passo é decidir o melhor diâmetro do punch. A escolha dependerá das características do enxerto, como grau de ondulação, nível de abertura e o modo como os folículos estão distribuídos em cada unidade folicular. Realizamos uma extração-teste de aproximadamente 50 enxertos com cada um e avaliamos o coeficiente de fios/UF e a taxa de transecção.5 Para a maioria dos pacientes, utilizamos punchs de 0,8 a 0,9mm.
Iniciamos o procedimento com o paciente na posição pronada para extração da região occipital. Depois, movemos o paciente lateralmente para extração das regiões parietais e temporais.
O aparelho que usamos na nossa prática é o Trivellini Mamba FUE device (Trivellini Tech, Paraguai), pois, por meio dele, pode-se determinar, caso a caso, o tempo de rotação seguido pelo tempo de oscilação do punch durante a perfuração cutânea, diminuindo as taxas de transecção dos bulbos foliculares.6,7 Após a perfuração, os enxertos são extraídos com duas pinças delicadas. Uma mais fina e reta para segurar a epiderme e outra serrilhada para retirar o enxerto propriamente dito.8

5 - Controle de qualidade e limpeza dos enxertos
Todos os enxertos são revisados no microscópio, sendo estes separados em UFs de 1, 2, 3 ou mais fios, e são calculadas as taxas de transecção total e parcial. A equipe limpa os enxertos, retirando o excesso de epiderme, pois, assim, há menor formação de crostas no pós-operatório, além de possibilitar uma maior densidade final, já que é possível colocar esses enxertos mais próximos uns dos outros.
6 - Armazenamento
As UFs são separadas em frascos de acordo com a área extraída e a quantidade de fios presentes (1, 2, 3 ou mais fios). Os primeiros enxertos retirados são os primeiros a ser implantados, diminuindo ao máximo o tempo fora do organismo. São armazenados em uma geladeira específica (4oC) em soro fisiológico. Umidificadores de ar são utilizados durante todo o procedimento.
7 - Implantação: incisões prévias
Preferimos a realização de incisões prévias na área receptora com lâminas personalizadas de 0,65 a 0,90mm de largura. Segue-se uma ordem específica: 1) A linha frontal irregular com duas a três fileiras de UFs de um fio; 2) Zona de transição com UFs de dois fios); 3) Zona de definição com UFs de três ou mais fios; 4) Outras regiões de calvície ou afinamento.9,10 É importante medir o comprimento dos enxertos e reduzir em 1mm a profundidade da incisão. Isso permite que a epiderme fique um pouco acima da superfície cutânea, diminuindo a foliculite pós-operatória e as cicatrizes irregulares.




8 - Colocação do enxerto: uso do KEEP
Nos últimos cinco anos, temos utilizado os implantes tipo KEEP (Figura 7). Esta ferramenta possui uma ponta especial que protege o enxerto durante a colocação, evitando traumatizá-lo. Com um movimento de rotação, o enxerto é encaixado dentro da ponta do KEEP; em seguida, o enxerto é suavemente deslizado para a incisão prévia, com o auxílio de uma pinça. Implantadores KEEP vêm em tamanhos diferentes para a colocação de UFs com número diferente de fios.
RESULTADOS
Após o término do procedimento, toda a área cirúrgica é limpa com soro fisiológico. Não deixamos nenhum tipo de curativo. O paciente é encaminhado para a sala de repouso onde são dadas todas as orientações e medicações pós-operatórias. Avaliamos o paciente no dia seguinte para lavagem do couro cabeludo e reorientação. Obtemos o resultado intermediário em torno de seis meses e o resultado final em um ano (Figura 8).
DISCUSSÃO
Apesar de ser um procedimento superficial, a cirurgia de transplante capilar tipo FUE exige que o cirurgião esteja atento a todas as fases do procedimento, levando em consideração não apenas o tratamento da área calva receptora, mas também o máximo de preservação da área doadora para melhor resultado para o paciente.
REFERÊNCIAS:
Jimenez F, Alam M, Vogel JE, Avram M. Hair transplantation: basic overview. J Am Acad Dermatol. 2021;85(4):803-14.
Shapiro R, Shapiro P. Hairline design and frontal hairline restoration. Facial Plast Surg Clin North Am. 2013;21(3):351-62.
Lam SM. Hair transplant and local anesthetics. Clin Plast Surg. 2013;40(4):615-25.
Bernstein RM, Rassman WR, Seager D, Shapiro R, Cooley JE, Norwood OT, et al. Standardizing the classification and description of follicular unit transplantation and mini-micrografting techniques. The American Society for Dermatologic Surgery, Inc. Dermatol Surg. 1998;24(9):957-63.
Radwanski HN, Ruston A, Lemos RG. Cirurgia da calvície: um histórico. In: Transplante Capilar: arte e técnica. São Paulo: Roca; 2011.
Trivellini, R. The trivellini system and technique. Hair transplant forum international september 2018;28(5):188-90.
Schambach, M. Why I switched to a multiphasic device. Hair transplant forum international november 2018;28(6):224-6.
Unger RH, Wesley CK. Technical insights from a former hair restoration surgery technician. Dermatol Surg. 2010;36(5):679-82.
Shapiro R. Principles and techniques used to create a natural hairline in surgical hair restoration. Facial Plast Surg Clin North Am. 2004;12(2):201-17.
Nakatsui T, Wong J, Groot D. Survival of densely packed follicular unit grafts using the lateral slit technique. Dermatol Surg. 2008;34(8):101622.
Notas
Autor notes
Luciana Takata Pontes 0000-0002-9383-0569
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Antonio Ruston 0000-0003-0067-9255
Participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura.
Correspondência: Luciana Takata Pontes dra.luciana@ruston.com.br
Declaração de interesses