Como eu faço?

K.I.S.S. technique: sistematização para um preenchimento labial simples e seguro

K.I.S.S. Lip Filler Technique - keeping injections simple and safe when filling lips

Vivian de Carvalho Amaral
Clínica particular, Brasil
Fernanda Aquino Cavallieri
Clínica particular, Brasil

K.I.S.S. technique: sistematização para um preenchimento labial simples e seguro

Surgical & Cosmetic Dermatology, vol. 15, e20230187, 2023

Sociedade Brasileira de Dermatologia

Recepção: 14 Outubro 2022

Aprovação: 14 Junho 2023

RESUMO: Para tornar o preenchimento labial mais simples e seguro, desenvolvemos a técnica de preenchimento labial K.I.S.S. - Keep Injection Simple and Safe. Para ser simples, a técnica recomenda apenas a avaliação de quatro parâmetros anatômicos e o preenchimento de cinco áreas labiais. Por segurança, a injeção é realizada apenas no plano supramuscular, por meio de cânulas de ponta romba, inseridas a partir de quatro portas de entrada, duas no lábio superior e duas no lábio inferior. O preenchimento é realizado em vetores anatômicos específicos para volumização, projeção, melhora do contorno e sustentação do arco do cupido e comissuras labiais.

Palavras-chave: Ácido hialurônico, Preenchedores dérmicos, Lábio.

ABSTRACT: To simplify the procedure and increase lip augmentation safety, we have developed the KISS - Keep Injection Simple and Safe lip filler technique.To be simple, the method recommends only the evaluation of four anatomical parameters and the filling of five labial areas.To be safe, the injection is performed only in the supramuscular plane, using cannulas with a blunt tip, inserted in four entries: two in the upper lip and two in the lower lip. Fillers are injected in specific anatomical vectors for lips volumization, projection, contour improvement, and support of cupid’s bow and lip corners.

Keywords: Hyaluronic acid, Dermal fillers, Lip.

INTRODUÇÃO

Lábios volumosos sempre foram associados à juventude e à beleza. Por isso, o preenchimento labial (PL) com ácido hialurônico (AH) é um dos procedimentos mais solicitados.1 Entretanto, os múltiplos parâmetros anatômicos que devem ser avaliados para análise estética dos lábios, associados à intensa variabilidade vascular da área, tornam o procedimento desafiador quanto à análise labial e à escolha dos sítios de injeção.

No último ano, desenvolvemos e utilizamos um modelo simples de preenchimento do vermelhão labial, que envolve duas etapas: a primeira seria a análise de quatro parâmetros anatômicos para planejamento das injeções; e a segunda seria a injeção, propriamente dita, em cinco áreas labiais, sempre priorizando os planos considerados mais seguros.

Demos ao modelo o nome de K.I.S.S. Technique, idealizado com o objetivo de entregar excelentes resultados, mantendo as injeções labiais simples e seguras.

MÉTODOS

20 mulheres, entre 25 e 45 anos, tiveram os seguintes parâmetros labiais avaliados para planejamento de PL:

  1. altura das colunas filtrais (CF): se mais longas que 1,5cm, não seria realizado preenchimento na área;

  2. altura dos lábios superiores (LS) e inferiores (LI): LS menores que 0,8cm e LI menores que 0,9cm foram considerados finos e foram injetados;

  3. projeção anterior do LS no perfil: deveria ser cerca de 2mm mais projetado em relação ao LI;

  4. relação volumétrica entre LS e LI: o LS deveria ter cerca de 80% do volume do LI.

Após assepsia adequada, foram realizados quatro botões anestésicos com lidocaína 1%, todos a 0,5cm do contorno labial, sendo um em cada CF, superiormente, e um em cada linha paralela ao limite lateral das asas nasais, inferiormente (Figura 1). Cada ponto anestesiado correspondeu a uma porta de entrada pela qual uma cânula 25G, 5cm, foi inserida e através da qual o AH foi injetado no plano superficial, por retroinjeção.

Pontos de inserção, vetores e áreas de injeção de AH nos lábios
							inferiores e superiores pela técnica K.I.S.S. Os pontos brancos
							representam os pontos de inserção cutânea da cânula 25G, 5cm.
							Superiormente, eles se encontram nas CF a 0,5cm do CL. Inferiormente, a
							0,1cm do CL, paralelamente ao limite lateral das asas nasais. O PL foi
							realizado em cinco pontos anatômicos, três no LS (K1, K2 e K3) e quatro
							no LI (K4 e K5). A localização de cada ponto e o resultado obtido com o
							seu preenchimento foram os seguintes: - K1: vetor diagonal dirigido ao
							tubérculo medial (TM) do LS: projeção anterior do LS e melhora discreta
							do CL medial; - K2: um a dois vetores quase perpendiculares à porta de
							entrada, dirigidos aos tubérculos laterais (LT): projeção anterior e
							dimensão vertical do LS, além de suporte ao arco do cupido (AC); - K3:
							um a dois vetores diagonais, direcionados lateralmente até o limite
							lateral das asas nasais: volume e CL do LS; - K4: dois vetores
							mediamente direcionados, um superiormente para o tubérculo labial
							inferior (IT) e outro inferiormente paralelo ao CL inferior: volume e
							contorno medial do LI; - K5: um vetor paralelo ao CL, direcionado à
							comissura labial (CL), no sentido de sustentá-la
Figura 1
Pontos de inserção, vetores e áreas de injeção de AH nos lábios inferiores e superiores pela técnica K.I.S.S. Os pontos brancos representam os pontos de inserção cutânea da cânula 25G, 5cm. Superiormente, eles se encontram nas CF a 0,5cm do CL. Inferiormente, a 0,1cm do CL, paralelamente ao limite lateral das asas nasais. O PL foi realizado em cinco pontos anatômicos, três no LS (K1, K2 e K3) e quatro no LI (K4 e K5). A localização de cada ponto e o resultado obtido com o seu preenchimento foram os seguintes: - K1: vetor diagonal dirigido ao tubérculo medial (TM) do LS: projeção anterior do LS e melhora discreta do CL medial; - K2: um a dois vetores quase perpendiculares à porta de entrada, dirigidos aos tubérculos laterais (LT): projeção anterior e dimensão vertical do LS, além de suporte ao arco do cupido (AC); - K3: um a dois vetores diagonais, direcionados lateralmente até o limite lateral das asas nasais: volume e CL do LS; - K4: dois vetores mediamente direcionados, um superiormente para o tubérculo labial inferior (IT) e outro inferiormente paralelo ao CL inferior: volume e contorno medial do LI; - K5: um vetor paralelo ao CL, direcionado à comissura labial (CL), no sentido de sustentá-la

O PL foi realizado em cinco pontos anatômicos, três nos LS aos quais denominamos K1, K2 e K3, e dois nos lábios inferiores, aos quais denominamos K4 e K5 (Figuras 2 e 3). A localização de cada ponto e o resultado obtido com o seu preenchimento foram os seguintes:

Imagem superior pré e imagem inferior pós-procedimento (imediato).
							Injetadas todas as áreas da sistematização, observando-se volumização do
							tubérculo medial superior pela injeção de K1, volumização e definição do
							arco de cupido por injeção em K2, volumização lateral e melhora do
							contorno do lábio superior por injeção em K3, volumização dos tubérculos
							inferiores por injeção em K4 e melhora do contorno e suspensão dos
							ângulos labiais por injeção de K5. Perceba a ausência de hematomas e o
							edema discreto pós-injeção por cânula
Figura 2
Imagem superior pré e imagem inferior pós-procedimento (imediato). Injetadas todas as áreas da sistematização, observando-se volumização do tubérculo medial superior pela injeção de K1, volumização e definição do arco de cupido por injeção em K2, volumização lateral e melhora do contorno do lábio superior por injeção em K3, volumização dos tubérculos inferiores por injeção em K4 e melhora do contorno e suspensão dos ângulos labiais por injeção de K5. Perceba a ausência de hematomas e o edema discreto pós-injeção por cânula

Imagem superior pré e imagem inferior pós-procedimento (imediato).
							Injetadas todas as áreas da sistematização, procurando-se obter,
							principalmente, aumento discreto do lábio inferior e elevação dos
							ângulos labiais
Figura 3
Imagem superior pré e imagem inferior pós-procedimento (imediato). Injetadas todas as áreas da sistematização, procurando-se obter, principalmente, aumento discreto do lábio inferior e elevação dos ângulos labiais

  1. K1: vetor diagonal dirigido ao tubérculo medial (TM) dos LS: projeção anterior do LS e melhora discreta do contorno labial (CL) medial;

  2. K2: um a dois vetores quase perpendiculares à porta de entrada, dirigidos aos tubérculos laterais (LT): projeção anterior e dimensão vertical dos LS, além de suporte ao arco do cupido (AC);

  3. K3: um a dois vetores diagonais, direcionados lateralmente até o limite lateral das asas nasais: volume e CL dos LS;

  4. K4: dois vetores mediamente direcionados, um superiormente para o tubérculo labial inferior (IT) e outro inferiormente paralelo ao contorno labial inferior: volume e contorno do LI;

  5. K5: um vetor paralelo ao CL, direcionado à comissura labial (CL), no sentido de sustentá-la.

RESULTADOS

Todas as pacientes ficaram satisfeitas com o resultado estético obtido (Figuras 4, 5 e 6). As maiores intercorrências relatadas foram equimoses nas portas de entrada e edema, que se resolveram espontaneamente em sete dias. Três pacientes desenvolveram nódulos, por acúmulo local de produto, que se resolveram com massagem local vigorosa.

Imagem superior pré e imagem inferior pós-procedimento (imediato).
							Imagem lateral, demonstrando projeção adequada do lábio superior, frente
							ao inferior, de cerca de 2mm, pós-procedimento
Figurea 4
Imagem superior pré e imagem inferior pós-procedimento (imediato). Imagem lateral, demonstrando projeção adequada do lábio superior, frente ao inferior, de cerca de 2mm, pós-procedimento

Parâmetros anatômicos simplificados para preenchimento labial. A
							dimensão vertical do vermelhão do LS deve estar entre 8,5 e 9mm,
							enquanto a do LI fica entre 9,5 e 10mm, aumentando alguns mm ao nível do
							IT. O volume do vermelhão do LS deve ser de 75 a 80% do inferior,
							seguindo a proporção áurea. A altura das CF devem estar idealmente entre
							12 e 15 mm. A protrusão anterior do LS deve ser 1,5 a 2mm maior que a do
							LI
Figura 5
Parâmetros anatômicos simplificados para preenchimento labial. A dimensão vertical do vermelhão do LS deve estar entre 8,5 e 9mm, enquanto a do LI fica entre 9,5 e 10mm, aumentando alguns mm ao nível do IT. O volume do vermelhão do LS deve ser de 75 a 80% do inferior, seguindo a proporção áurea. A altura das CF devem estar idealmente entre 12 e 15 mm. A protrusão anterior do LS deve ser 1,5 a 2mm maior que a do LI

Avaliação ultrassonográfica após preenchimento labial com a técnica
							K.I.S.S. Observe a presença do ácido hialurônico (AH) injetado, em um
							plano seguro, superficial ao músculo orbicular (ORB MUSCLE), distante da
							artéria labial superior (ART)
Figura 6
Avaliação ultrassonográfica após preenchimento labial com a técnica K.I.S.S. Observe a presença do ácido hialurônico (AH) injetado, em um plano seguro, superficial ao músculo orbicular (ORB MUSCLE), distante da artéria labial superior (ART)

DISCUSSÃO

A otimização dos resultados estéticos do PL com AH requer uma abordagem de tratamento individualizada, com a aplicação hábil de uma técnica de injeção adequada, embasada em conhecimentos anatômicos, para riscos mínimos de eventos adversos.2

A atratividade relativa dos lábios é determinada por uma combinação de proporção, definição e volume.3 Parâmetros anatômicos importantes que devem nortear o procedimento para evitar resultados inestéticos incluem:

  1. a dimensão vertical do vermelhão do LS deve estar entre 8,5 e 9mm, enquanto do LI fica entre 9,5 e 10mm, aumentando alguns mm ao nível do IT;4

  2. o volume do vermelhão do LS deve ser de 75 a 80% do inferior, seguindo a proporção áurea;4, 1

  3. a protrusão anterior do LS deve ser 1,5 a 2mm maior que a do LI;4

  4. a altura das CF deve estar idealmente entre 12 e 15 mm.4

Injeções que não se atentem a esses critérios podem tornar CF já longas mais evidentes, projetar LS já anteriorizado, trazendo o inestético aspecto de “bico de pato” ou fazer volumização excessiva, levando aos lábios a aquisição de um formato “salsichóide”.

Complicações ainda mais graves que os inesteticismos incluem os comprometimentos vasculares, que podem evoluir com necrose cutânea e cegueira.5

O suprimento arterial dos lábios apresenta variações anatômicas marcantes, inclusive ao comparar os lados da face na mesma pessoa.6 A localização mais frequente das artérias labiais superior e inferior foi o plano submucoso (58,5%), seguido dos planos intramuscular (36,2%) e subcutâneo (5,3%).7

Dissecções6 e análises ultrassonográficas7 sugeriram que um plano de injeção superficial, cerca de 4mm distante da junção vermelhão/mucosa, seria, portanto, a área mais segura para PL.6, 7, 8 Além disso, a abordagem perpendicular ao vermelhão labial (a partir do lábio cutâneo) também poderia aumentar a segurança, pois a artéria está localizada mais frequentemente no lábio vermelho.7 A injeção profunda entre a camada muscular e a mucosa, principalmente do LS, deve ser evitada.9

Para aumentar a segurança do procedimento, além do imprescindível conhecimento anatômico, pode-se lançar mão do uso de microcânulas de ponta romba para PL.10 Além da segurança, o uso das microcânulas, de maneira geral, produz menos hematomas e menos dor, com recuperação mais rápida pós-preenchimento.11

CONCLUSÃO

Sabemos que o preenchimento labial não pode ser padronizado, por isso propomos um modelo de análise e de injeção individualizado. Sabemos ainda que a variabilidade vascular labial traz muitos riscos ao procedimento. Assim, propomos também que a injeção seja realizada através de microcânulas de ponta romba, apenas nos sítios anatômicos labiais mais seguros, ainda que percamos refinamentos técnicos, aparentemente imperceptíveis a olhos leigos, já que pudemos observar alto grau de satisfação por parte das pacientes.

Por último, apesar de a técnica não prever o tratamento da região perioral, a abordagem dessa região é muitas vezes fundamental, principalmente em pacientes mais idosas, para que um excelente resultado estético seja atingido.

REFERÊNCIAS

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Fulton J, Caperton C, Weinkle S, Dewandre L. Filler injections with the blunt-tip microcannula. J Drugs Dermatol. 2012;11(9):1098-103.

Notas

Fonte de financiamento: Nenhuma.

Autor notes

Correspondência: Vivian de Carvalho Amaral Email: vivian.dermato@gmail.com

Declaração de interesses

Conflito de interesses: Nenhum
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