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Cisto veloso eruptivo periorbital: tratamento desafiador em localização atípica
Periorbital eruptive vellus hair cyst: a challenging treatment in an atypical location
Surgical & Cosmetic Dermatology, vol. 17, e20250356, 2025
Sociedade Brasileira de Dermatologia

Relato de caso


Received: 04 March 2024

Accepted: 18 April 2024

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2025170356

RESUMO: O cisto veloso eruptivo é uma entidade rara decorrente do desenvolvimento anormal dos folículos vellus, que se manifesta na forma de múltiplas pápulas foliculares. Eventualmente, pode localizar-se na face, sendo descritos na literatura apenas cinco casos na região periorbital. Seu tratamento é desafiador, especialmente neste relato de caso, devido à peculiaridade da localização das lesões, com risco de cicatriz e discromia pós-procedimento. Relata-se o diagnóstico desafiador e o tratamento satisfatório de um caso raro de cisto veloso eruptivo localizado na região periorbital.

Palavras-chave: Cisto folicular, Pálpebras, Procedimentos cirúrgicos menores.

ABSTRACT: Eruptive vellus hair cyst is a rare condition resulting from the abnormal development of vellus hair follicles, leading to the formation of multiple follicular papules. While it can appear on the face, only five cases specifically located in the periorbital region have been described in the literature. Its treatment is challenging, particularly in the case we report here due to the peculiar location of the lesions, which increases the risk of postoperative scarring and dyschromia. We present a report that addresses the challenging diagnosis and successful treatment of a rare case of eruptive vellus hair cyst located in the periorbital region.

Keywords: Follicular Cyst, Eyelids, Surgical Procedures, Operative.

INTRODUÇÃO

O cisto veloso eruptivo (CVE), descrito pela primeira vez em 1977,1 é uma condição rara decorrente do desenvolvimento anormal dos folículos vellus a nível infundibular, o que leva à retenção do fio, dilatação cística da parte proximal do folículo e, secundariamente, atrofia do bulbo capilar.2,3 Apresenta maior prevalência em crianças e jovens, sem predileção por gênero ou raça. Sua patogênese ainda é desconhecida, podendo estar associada tanto à forma esporádica da doença quanto à herança autossômica dominante com penetrância incompleta,2,3 hipótese sustentada por numerosos relatos de famílias nas quais dois ou mais membros são afetados.4 Habitualmente, são lesões assintomáticas, podendo estar associadas, em alguns casos, a discreto prurido e alteração de sensibilidade. Ocasionalmente, acometem a face.2 Seu tratamento é desafiador e, até o presente momento, não há consenso quanto à melhor opção terapêutica. Neste relato, os autores apresentam o caso de um paciente portador de CVE na região palpebral, cuja localização atípica levou ao diagnóstico incorreto de milia desde a infância. O objetivo deste relato é ilustrar e demonstrar uma opção terapêutica que resultou em um desfecho estético satisfatório.

MÉTODOS

Paciente do sexo masculino, 19 anos de idade, sem comorbidades conhecidas, apresenta, desde os 6 anos de idade, pápulas normocrômicas e hipocrômicas, de consistência firme, localizadas nas pálpebras superiores e inferiores, assintomáticas. Não havia histórico familiar de lesões semelhantes. Referiu consultas médicas prévias, com diagnóstico de milia e prescrição de esfoliantes tópicos, sem resposta favorável. No entanto, devido ao aumento progressivo do número de lesões, que passaram a se agrupar em pápulas aglomeradas (Figura 1), optou-se pela realização de biópsia excisional. A análise histopatológica evidenciou cistos revestidos por epitélio escamoso queratinizado, contendo queratina lamelar e ocasionais hastes de pelos vellus (Figura 2), confirmando o diagnóstico de CVE. Devido ao incômodo estético importante, optou-se por realizar extração de algumas lesões com agulha 30G, com preparo tópico prévio por 14 dias com fórmula de Kligman (hidroquinona 40 mg/g + tretinoína 0,5 mg/g + fluocinolona acetonida 0,1 mg/g creme), a fim de evitar hipercromia pós-inflamatória.


Figura 1
Pápulas normocrômicas e hipocrômicas de consistência firme, algumas aglomeradas, localizadas nas pálpebras superiores e inferiores


Figura 2
Estudo anatomopatológico: cisto localizado na derme revestido por epitélio escamoso queratinizado, contendo queratina lamelar e hastes de pelos velus em seu interior (HE, 100x)

Descrição da técnica:

Anestesia infiltrativa com lidocaína 2% com vasoconstritor.

Incisão das lesões com agulha 30G (Figura 3a).


Figura 3
A - Incisão das lesões com agulha 30G. B - Extração manual do conteúdo das lesões

Extração do conteúdo das lesões com agulha 30G ou extração manual (Figura 3b).

Hemostasia com compressão local com gaze.

Limpeza local com soro fisiológico 0,9%.

RESULTADO

O paciente evoluiu com discreto edema nos primeiros dias do pós-operatório. Atualmente, 2 meses após o procedimento, apresenta boa cicatrização, resultado estético satisfatório e sem recidiva das lesões até a presente data (Figura 4).


Figura 4
Redução do tamanho e número de lesões após extração com agulha

DISCUSSÃO

O CVE apresenta-se clinicamente como múltiplas pápulas foliculares, planas ou cupuliformes, de aproximadamente 1-5 mm, de superfície lisa e consistência firme, cuja coloração é variável (eritematosas, normocrômicas, hipercrômicas ou até mesmo esbranquiçadas e amareladas). As pápulas podem apresentar crosta hiperqueratótica e umbilicação central.2,3 Localizam-se, em sua maioria, no tórax, extremidades superiores e inferiores e, ocasionalmente, acometem abdome, pescoço, axilas, região inguinal e face.2 Essa distribuição aparentemente não é aleatória, e parece sobrepor-se às unidades pilossebáceas e apócrinas.4 O diagnóstico definitivo é realizado por meio de estudo anatomopatológico, uma vez que, clinicamente, assemelha-se muito a outras entidades. No caso relatado, essa semelhança clínica resultou em diagnóstico e manejo incorretos de milia por tempo prolongado.2,3,5 Além da milia, o diagnóstico diferencial inclui molusco contagioso, queratose pilar, esteatocistoma múltiplo, foliculite, tumores anexiais múltiplos e siringomas.2,3,5 A histopatologia do CVE revela sua localização na derme média ou superior, revestida por várias camadas de epitélio escamoso estratificado queratinizado (até 12 camadas). Em seu interior, observa-se queratina lamelada em quantidade variada, além de múltiplos pelos vellus cortados oblíqua e transversalmente, o que resulta na oclusão e dilatação da unidade folicular. Habitualmente, não se encontra glândula sebácea na parede do cisto.2,3,5 O CVE na região periorbital, como relatado neste caso, é raro, com apenas cinco casos descritos na literatura.4-7 O tratamento do CVE é pouco descrito, mas estima-se que sua remissão espontânea ocorra em cerca de 25% dos casos, por eliminação transepidérmica ou destruição secundário ao processo inflamatório local.2,3,5 Até o presente momento, não há terapia universalmente aceita, somente relatos do uso de ácido lático e retinóides (tretinoína e isotretinoína), porém, os resultados ainda são insuficientes.2,3 Também são citadas como terapias alternativas a dermoabrasão, o laser Erbium-YAG, a vaporização com laser de dióxido de carbono e a extração com agulha, que têm como limitações a possibilidade de formação de cicatrizes e o alto índice de recorrência precoce.2,3,8

CONCLUSÃO

Os autores reportam este caso por tratar-se de uma doença rara e em localização atípica. Além disso, o relato visa alertar para a consideração dessa afecção frequentemente subdiagnosticada, em razão de seus principais diagnósticos diferenciais corresponderem a entidades de maior prevalência. Ademais, embora benigna, pode causar incômodo estético significativo e até gerar prejuízo psicológico ao paciente, sendo, portanto, de grande importância a instituição de uma terapêutica adequada e resolutiva. Assim, apesar dos desafios relacionados ao tratamento, destaca-se a resposta satisfatória à abordagem adotada neste caso.

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Notes

Fonte de financiamento: Nenhuma.

Author notes

Correspondência: Bruna dos Anjos Bortolini, E -mail: bdabortolini@gmail.com

Conflict of interest declaration

Conflito de interesses: Nenhum.


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