ESTUDOS DE CULTURA MATERIAL/DOSSIÊ

Cultura escrita e práticas sociais: a natureza do conhecimento filosófico-natural produzido nos espaços coloniais do Império Atlântico português (século XVIII)

Written culture and social practices: the nature of philosophical-natural knowledge produced in the Portuguese Atlantic Empire's colonial spaces (18th century)

GISELE CRISTINA DA CONCEIÇÃO
Universidade do Porto, Portugal

Cultura escrita e práticas sociais: a natureza do conhecimento filosófico-natural produzido nos espaços coloniais do Império Atlântico português (século XVIII)

Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, vol. 32, e26, 2024

Museu Paulista, Universidade de São Paulo

Received: 29 September 2023

Accepted: 16 February 2024

Resumo: Derivados de motivações políticas, sociais e econômicas, o conhecimento sobre o mundo natural dos espaços coloniais portugueses ao longo do período moderno, mas principalmente, a partir da segunda metade do século XVIII, foi produzido a partir de séries de dinâmicas que pretendiam responder ao repto Imperial de conhecer e dar a conhecer as potencialidades naturais que pudessem ser úteis para o motor econômico do Império. Tais dinâmicas acabaram por formar uma engrenagem composta por instituições metropolitanas e coloniais, assim como, por agentes oficiais e não oficiais, que controlaram e produziram o conhecimento sobre a filosofia natural daquele período. Este conhecimento, no âmbito deste artigo, será analisado a partir de duas linhas de pensamento: o da cultura escrita como instrumento de circulação de conhecimento, e o do conhecimento como instrumento de inserção social. O objetivo principal, portanto, é compreender qual é a natureza do conhecimento sobre filosofia natural produzido no Brasil durante a segunda metade do século XVIII observável nas fontes documentais. Também é foco de análise, a importância dada a esse conhecimento nas práticas sociais estabelecidas entre os agentes informais e as instituições oficiais metropolitanas.

Palavras-Chave: Brasil colônia, Filosofia natural, História Social do Conhecimento, Instituições científicas.

Abstract: Derived from political, social and economic motivations, knowledge about the natural world in Portuguese colonial spaces throughout the modern period, but especially from the second half of the 18th century onwards, was produced from a series of dynamics that were intended to respond to the Imperial challenge of knowing and making known the natural potential that could be useful for the Empire's economic engine. These dynamics formed a mechanism of metropolitan and colonial institutions and official and unofficial agents who controlled and produced knowledge about colonial natural philosophy. This knowledge, within the scope of this article, will be analysed from two lines of thought: written culture as an instrument of knowledge circulation and knowledge as an instrument of social acceptance. Therefore, the main objective of this article is to understand the nature of the knowledge about natural philosophy produced in Brazil during the second half of the 18th century, which can be observed in documentary sources. It also focuses on the importance of this knowledge in the power relations established between the informal producers and the official metropolitan institutions.

Keywords: Colonial Brazil, Natural philosophy, Social history of knowledge, Scientific institutions.

INTRODUÇÃO

O Período Moderno foi marcado por um aumento expressivo de interesse sobre o ambiente natural e os possíveis produtos que pudessem ser usados para fins comerciais e medicinais. Ou seja, a natureza, e tudo a ela circunscrito, passou a ser foco de observação, experimentação e processos de descrição, quase sempre associado aos possíveis usos que tal matéria natural poderia oferecer ao sistema imperial. Em praticamente toda cultura europeia, principalmente ao longo do século XVIII, houve um aumento expressivo de trabalhos que procuraram, de alguma forma, descrever o ambiente natural, em primeiro lugar europeu, mas muito fortemente os ambientes coloniais. Esta produção de conhecimento pode ser observada em todas as comunidades europeias e, em Portugal, tornou-se mais que a simples produção de conhecimento, passou a ser política da Coroa. Parte das políticas imperiais voltaram-se para o desenvolvimento de processos de divulgação de instruções que pudessem orientar a recolha de informações sobre a natureza metropolitana e colonial.1 Foram objeto destas políticas, conhecer e classificar o ambiente natural e as suas potencialidades, assim como, o de dominar o território colonial e as populações originárias. Como centro das atenções imperiais estava o estreitamente de laços entre Portugal e os seus domínios coloniais. Como resultado deste processo, é possível observar a produção de inúmeros textos sobre as culturas locais e a filosofia natural do Brasil, África e Índia.2 Neste artigo, o foco será o Brasil e a produção de conhecimento desempenhada por agentes oficiais e informais, e de instituições científicas e educacionais oficiais.

A análise será empreendida com foco em perceber a produção de conhecimento desse período através da ideia de que ali também nasceu uma cultura escrita sobre a natureza colonial que, quantitativamente, foi produzida e circulou através de extensas redes informais e auto-organizadas, entretanto, conectados com os poderes centrais.3 Grande parte dessa produção textual permaneceu manuscrita, mas acabou por formar uma cultura escrita informal e que foi fundamental para o fomento das políticas imperiais relativas ao melhor conhecimento das colônias. É dentro deste contexto que as análises deste artigo se encontram, com o objetivo de perceber a natureza dessa produção de conhecimento nos espaços coloniais e sua possível circulação. Levar-se-á em consideração, de igual modo, o papel fundamental dos espaços de produção e difusão desse conhecimento como tendo sido fundamentais no processo de construção da cultura escrita sobre o ambiente natural colonial.

Para tanto, será preciso olhar para uma historiografia que procura compreender a produção de conhecimento a partir da busca por sua natureza. Num artigo seminal, publicado em 2004, James Secord4 procurou fazer um balanço da tendência que estava a ganhar terreno no campo dos estudos sobre a Natureza do Conhecimento Científico (NOS). Nele, Secord concluiu que, naquele momento, eram identificáveis diversos indícios de que os estudiosos de NOS começavam cada vez mais a encarar, de uma perspectiva fundamentalmente histórica, a produção do conhecimento como sendo uma prática essencialmente comunicativa, intimamente ligada ao estabelecimento de relações sociais: hierarquia, relações de poder, trocas e negociações seriam fundamentais nesse processo.5 A partir disso, torna-se essencial considerar a produção e a circulação do conhecimento, em termos históricos, a partir de práticas comunicacionais, sociais e hierárquicas, muitas vezes, estabelecidas através do clientelismo - prática comum no universo lusófono de produção de conhecimento ao longo do período moderno.6

Um dos períodos que mais suscita atualmente investigações sobre esses processos, é, sem dúvida, o período a que comumente denominamos de Iluminismo7 e o seu vasto conjunto de processos sociais, políticos e intelectuais, que envolveu muito mais do que os intelectuais norte-europeus, mas antes, um complexo amplo de agentes em outros centros da Europa, e fora dela.8 E neste contexto, podemos inserir o caso português, e as múltiplas tentativas de aproximar sua cultura científica da segunda metade do século XVIII aos princípios que estavam sendo construídos e disseminados a partir do norte da Europa. A capacidade da corte portuguesa de influenciar os aspectos da cultura escrita, ao longo do século XVIII, possibilitou a formulação de sua própria concepção de iluminismo. No contexto da produção de conhecimento nos espaços geográficos de domínio português, as tensões e a lógica das relações cortesãs podem ser consideradas como a essência da natureza do conhecimento produzido e da cultura escrita que se estava formando.9 E, em grande medida, essa cultura escrita foi desenvolvida a partir da ação de agentes informais distribuídos nos espaços coloniais, e que estavam próximos das comunidades locais originárias.

Este será o cenário no qual as análises deste artigo estarão integradas, e a pergunta a que se pretende responder é: Quais são as principais características da cultura escrita desenvolvida nesse período em território colonial brasileiro? Teriam os agentes informais um papel relevante? Ao procurar perceber as dinâmicas destas redes e agentes informais, pretende-se também destacar a dimensão social da cultura escrita, evidenciando-a como um fenômeno frequentemente coletivo que se desenvolve, em grande parte, através de redes de interação, disputadas de poder e clientelismo.10

CONTEXTOS DE PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO CASO PORTUGUÊS

Não é possível falar em produção de conhecimento filosófico natural nos espaços coloniais do Império português ao longo do século XVIII, sem referir à Universidade de Coimbra, a contratação de Domenico Vandelli e a Academia das Ciências de Lisboa. Contratado a partir de 1764, o médico e filósofo natural italiano Domenico Vandelli (1735-1816) foi o principal idealizador de uma série de reformas científicas e de viagens pelo Reino e possessões ultramarinas, todas elas ligando o caráter científico às intenções de cunho econômico e político.11 Estas, por sua vez, podem ser consideradas como uma das políticas provenientes das reformas pombalinas empreendidas a partir de 1750 por Sebastião José de Carvalho, o Marquês de Pombal.

Dentro do complexo de políticas formulados para a ciência Imperial, inventários sobre os recursos naturais que pudessem ser explorados comercialmente e cientificamente, foram os principais produtos requeridos por Vandelli e sua equipe, que circulavam por Portugal, por diversos países da Europa e pelos territórios coloniais. Estes agentes produtores de conhecimento tinham como principal objetivo estudar as particularidades naturais que pudessem ser relevantes para a economia, para a política imperial e para os estudos em História Natural.12 As instruções saídas da Universidade de Coimbra reformada, comandadas por Vandelli, e que mais tarde foram seguidas por outras instituições, como a Academia das Ciências de Lisboa, eram claras: os agentes em território colonial deveriam efetivar a catalogação e classificação de todos os elementos da natureza através da observação, classificação e catalogação, dando especial atenção aos usos que as populações locais aplicavam a esses elementos. Domenico Vandelli acreditava, e foi contratado para coordenar, num projeto que pudesse envolver, além de aspectos filosófico-naturais, também os político-imperiais. Para ele, o conhecimento sobre o território e suas potencialidades poderia significar poder - sobre o território, sobre as populações locais, sobre a economia imperial e sobre as disputas com os vizinhos espanhóis nas zonas de fronteira.13

As políticas formuladas no âmbito oficial foram também pensadas para atingir agentes que não estavam conectados formalmente com as instituições metropolitanas. Por essa razão, podemos observar que a produção de conhecimento sobre a natureza colonial não esteve vinculada apenas ao fomento direto promovido pela Coroa, ou através do trabalho desenvolvido por indivíduos com formação acadêmica. Há um expressivo número de agentes que, mesmo sem uma formação acadêmica voltada para os estudos filosófico-naturais, produziram textos sobre a natureza das colônias. Estes eram, quantitativamente numerosos, tais como militares, funcionários da Coroa, médicos, cirurgiões e agentes ligados às instituições religiosas. Estes agentes, de alguma forma, estiveram em contato com as políticas imperiais relativas à produção de conhecimento filosófico-natural.14 Parte significativa dos trabalhos produzidos em território colonial foram desempenhados por esta classe de produtores, que enviavam seus trabalhos para centros de investigação metropolitanos, como as Academias de ciências, jardins botânicos e a própria Universidade de Coimbra.

A historiografia que se dedica a esta matéria há muito considera que a produção de conhecimento sobre a natureza colonial do Império português foi desempenhada por estes agentes informais.15 Entretanto, devemos também considerar as razões e as dinâmicas que estiveram envolvidas para que estes indivíduos tomassem como relevante a ideia de produzir esses trabalhos. Uma parte da resposta pode ser encontrada na análise de alguns espaços que foram criados e que se desenvolveram para garantir que as políticas imperiais e acadêmicas relativas a essa produção de conhecimento pudesse circular e atingir um expressivo número de indivíduos. Estes espaços, devem ser considerados como um locus de produção, recepção e difusão de conhecimento filosófico-natural. A cultura escrita e visual que estava em formação, dependia, em grande parte, destes espaços específicos, que tinham capacidade de aglutinar agentes formais e informais e fomentar o clientelismo.

O Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda é sem dúvida um espaço que pode ser inserido neste contexto. Formado no período pós terremoto de 1755, ainda sob o reinado de D. José I, tornou-se, em 1768, o Real Jardim Botânico. Neste momento, o Jardim já estava sendo organizado por Domingos Vandelli e seu colega italiano Júlio Mattiazi (?-1794). Vandelli, transferiu para Lisboa parte do acervo do Jardim Botânico de Pádua, do qual foi também idealizador, e a partir deste espaço e de seu trabalho na Universidade de Coimbra, coordenou o projeto imperial das Viagens Filosóficas para os espaços coloniais. O Jardim da Ajuda foi um dos locus de importância para a recepção de trabalhos produzidos sobre a filosofia natural metropolitana e colonial. Foi também um importante centro de difusão de instruções para recolha de dados fora da Metrópole, e principalmente, por agentes sem formação acadêmica específica em História Natural.16

A Casa Literária do Arco do Cego (1799-1801) é outro caso exaustivamente estudado pela historiografia. Foi sob o comando do Secretário de Estado de Negócios da Marinha e Ultramar, D. Rodrigo de Sousa Coutinho (1755-1812) que se idealizou os trabalhos que ali seriam produzidos, sendo efetivamente comandada pelo luso-brasileiro Frei José Mariano da Conceição Velloso (1742-1811).17A Casa Literária do Arco do Cego desempenhou um papel significativo no desenvolvimento do movimento enciclopedista em Portugal. Um dos principais focos de ação foi uma maior promoção do conhecimento produzido sobre a natureza, e um maior estímulo, organização e otimização da exploração das potencialidades econômicas tanto do Império como da colônia, abordando essas questões sob uma perspectiva iluminista. Apesar de ter operado por um período relativamente curto, a Casa Literária do Arco do Cego desempenhou um papel fundamental na moldagem de novas visões sobre a natureza, em Portugal, e na reinterpretação da natureza dos espaços coloniais.

Alguns locais de produção e circulação de conhecimento também foram implementados em território colonial e são relevantes para percebermos o quanto as questões políticas e o centralismo metropolitano estiveram presentes nos processos de tomadas de decisão quanto à formação destes espaços e a sua manutenção. A Academia Científica do Rio de Janeiro (1772),18 formada no final do século XVIII, pode ser um exemplo. Com o aumento do volume de trabalhos sendo produzidos sobre a natureza colonial, e conectado ao fato de o território da colônia ser demasiado grande, foi preciso pensar em um espaço que pudesse, ainda em território colonial, melhor organizar o fluxo de produção de conhecimento que seria enviado para a metrópole.19 Baltasar da Silva Lisboa, por exemplo, produziu alguns trabalhos sobre a filosofia natural da Capitania da Bahia, da qual foi Ouvidor e Juiz Conservador das Matas de Ilhéus. Em um texto de 1786 “Discurso Histórico, Político e Económico dos Progressos, e estado actual da Filozofia Natural Portugueza, acompanhado de algumas reflexoens sobre o Estado do Brasil”, ele afirmou a importância deste espaço acadêmico no sentido de melhor organizar e fazer circular os trabalhos que estavam sendo produzidos na colônia.20 Entretanto, os jogos de poder estabelecidos entre a Metrópole e a colônia, impuseram o fecho da Academia em 1779, tendo alguns de seus membros sido acusados de subversão.21

Havia, claro, uma intenção intrínseca na autorização e fomento de criação destes espaços: o controle sobre aquilo que seria produzido, sobre quem estava produzindo, e para quem iriam enviar esses trabalhos. Não podemos deixar de notar que o conhecimento sobre as potencialidades naturais coloniais também significava poder econômico e controle imperial. É evidente que o incentivo à produção de conhecimento era primordial, mas as reuniões de intelectuais em território colonial deveriam ser feitas em espaços coordenados e dominados pelo poder régio, para que assim a Coroa pudesse ter um maior controle das ações desses intelectuais. As estruturas de autoridade, em suas configurações características do Antigo Regime, também podem ser observadas nessas iniciativas de promoção da ciência, destacando-se a preocupação em manter uma ligação e controle sobre suas atividades por parte de outras instituições semelhantes já estabelecidas ou recém-criadas na Metrópole. A influência de questões políticas e econômicas na construção e mantenimento de comunidades científicas, não foi exclusiva do caso português. Kapil Raj22 e Mario Biagioli,23 abordaram esta questão e compreenderam esse processo como sendo intrínseco às comunidades científicas ao longo do período do moderno. Enquanto Raj analisou em seus estudos o caso das possessões britânicas e francesas na Índia para compreender as dinâmicas e práticas sociais entre os europeus e os indianos e a influência destas dinâmicas na produção, circulação e validação do conhecimento, Biagioli estudou a vida e as obras de Galileu Galilei, e percebeu que, para além de suas muitas qualidades como cientista, Galileu também sabia como participar dos jogos de poder no âmbito das sociedades de corte de ciência, nos quais os contextos sociais e intelectuais acabam por moldar a maneira como a cultura escrita se desenvolvia e era validada.

Nesse sentido, duas vias de análise sobre os espaços destinados a produção, recepção e circulação de conhecimento são possíveis: podemos analisar o papel desses espaços, como as Academias científicas e Jardins botânicos, apenas como locais isolados dentro de um contexto maior no âmbito científico do período; ou podemos pensar nesses espaços como locais de discussão, aprimoramento, difusão, circulação e reconfiguração do conhecimento produzido, que conectavam indivíduos e seus trabalhos em uma complexa rede de trocas e circulação que se estendia por todo o Império e fora dele. Estes espaços teriam sido fundamentais para o desenvolvimento dessa cultura escrita oficial, e para o fomento ao desenvolvimento de uma cultura escrita informal. No caso português e no contexto imperial, estes locais podem ser considerados como espaços basilares para que o conhecimento filosófico-natural que estava sendo produzido pudesse ser transferido entre indivíduos segundo mecanismos de validação de conhecimento através de práticas sociais e de relações de poder.24 Mesmo com problemas de implementação e funcionamento, esses espaços tiverem papel fundamental nos processos de construção de conhecimento sobre as potencialidades naturais das colônias portuguesas, e principalmente, tiveram um papel fundamental no processo de validação daquilo que iria se tornar um conhecimento válido e difundido. A natureza da produção de conhecimento sobre a natureza colonial do Império português, está diretamente relacionada ao trabalho desenvolvido no âmbito destas Instituições e das dinâmicas sociais, políticas e culturais estabelecidas por seus membros.

CULTURA ESCRITA COMO MÉTODO DE DIFUSÃO DE CONHECIMENTOS

De todos os espaços acima mencionados, talvez o que tenha conseguido organizar e agrupar um expressivo número de agentes produtores de trabalhos com o intuito de fomentar a formação da cultura escrita e visual sobre a filosofia natural de Portugal e suas colônias, tenha sido a Academia das Ciências de Lisboa (fundada em 1780). Ali, num espaço hierarquizado e pensado para organizar e centralizar a produção de conhecimento, um expressivo volume de textos foi produzido com o intuito central de promover a circulação de ideias produzidas por seus membros oficiais, e o de receber trabalhos produzidos nos espaços coloniais, seja por agentes oficiais ou informais. Nos arquivos desta Academia é possível encontrar um expressivo número de trabalhos que foram enviados a partir das colônias para serem submetidos ao julgo de seus membros, com o intuito de serem validados no circuito metropolitano, fazendo com que seus autores passassem a fazer parte de um círculo restrito e prestigioso.

Uma das principais vertentes oficiais de divulgação científica, fundamental na segunda metade do século XVIII, foi elaborada e colocada em prática pelos membros honorários da Academia das Ciências de Lisboa através da publicação das Memórias da Academia das Ciências.25As Memórias eram um instrumento de publicação e circulação de ideias que, basicamente, colocava em circulação e validação os trabalhos produzidos por seus membros ou figuras prestigiosas. Havia ainda duas subdivisões de publicação, as Memórias de Agricultura (1788-1791), e as Memórias Económicas (1789-1815). Os temas publicados variavam, mas, é inquestionável que parte significativa dos textos dizia respeito ao estado da Filosofia Natural dos espaços coloniais.

Da natureza dos trabalhos produzidos no âmbito das Academias, uma parcela expressiva está relacionada com a elaboração de instruções de recolha de informações sobre o ambiente natural. Estas eram diretamente direcionadas com os indivíduos que não tinham qualquer formação específica para desempenhar este trabalho. Eram textos de instrução e manuais, que deveriam pôr em circulação os interesses da Coroa em envolver indivíduos sem treinamento ou educação formal em História natural, mas que, poderiam através da utilização destes textos, efetivar a construção de conhecimento sobre o Mundo Natural colonial. Esta foi uma forma de controlar e padronizar a natureza do conhecimento que seria produzido sobre o ambiente natural, e que estava diretamente relacionada com as condicionantes locais, sociais e cognitivas do produtor, ou seja, tinham um mesmo objetivo, mas, foram produzidos a partir de estruturas distintas.26 Vou demonstrar este aspecto analisando dois textos: um pode ser considerado como parte da produção oficial; e o outro, uma produção informal.

Um exemplo de texto produzido no âmbito oficial que visava pôr em circulação instruções de produção de conhecimento filosófico-natural é, sem dúvida, as “Breves instruções”27 de 1781. Este seria um manual, com regras de como o trabalho deveria ser construído a partir da descrição das espécies em seu pormenor, ou, através da recolha de espécimes e sua preparação para ser enviado para a Europa. Um dos principais objetivos, como vimos anteriormente, era o de formar um Museu, na Metrópole, a partir da coleta de espécimes que seriam coletadas nas colônias, principalmente a partir do trabalho informal. Por essa razão, as “Breves instruções” devem ser consideradas nesse contexto de padronização e organização do processo de produção de conhecimento.

Breves instruções aos correspondentes da Academia das Ciências de Lisboa, sobre as remessas dos produtos, e notícias pertencentes a História Natural, para formar um Museu Nacional, Lisboa, na Regia Oficina Tipográfica, 1781, com licença da Real Mesa Censória.
Figura 1
Breves instruções aos correspondentes da Academia das Ciências de Lisboa, sobre as remessas dos produtos, e notícias pertencentes a História Natural, para formar um Museu Nacional, Lisboa, na Regia Oficina Tipográfica, 1781, com licença da Real Mesa Censória.
Biblioteca Nacional Digital/Portugal. Disponível em: https://purl.pt/720.

As Breves Instruções foram pensadas e produzidas no âmbito da Academia das Ciências de Lisboa, e não foi a única. Em 1779, Vandelli também publicou um texto direcionado aos agentes que iriam produzir conhecimento de maneira informal. Em seu trabalho ele foi claro quanto ao que deveria ser feito, a partir de algumas regras básicas: “… conhecer, para os animais, a sua anatomia, maneira de viver e o modo de se multiplicarem e de se alimentarem; para as plantas, o seu interesse económico e virtudes medicinais; para os minerais, as suas propriedades”28. Este é um texto largamente analisado pela historiografia, da qual posso destacar o trabalho de Lorelai Kury,29 que estudou esse documento e percebeu que, para a sua escrita, Vandelli baseou-se em um outro documento com as mesmas características e que pretendia os mesmos objetivos: o Instructio peregrinatoris (1759). A obra de Vandelli sublinhava a necessidade de uma observação atenta e da meticulosa anotação referente a plantas, animais, minerais, populações autóctones, clima e geografia, ressaltando igualmente a importância das técnicas de coleta de espécimes e da elaboração dos respetivos desenhos.30 Vandelli mantinha uma relação próxima com Lineu, e a sistemática lineana foi rapidamente transferida para a academia portuguesa, ou seja, partia de Vandelli e sua equipe a instrução de que a Sistemática Lineana deveria ser a base dos estudos filosófico-naturais. Esta característica fica bastante clara em um texto publicado em 1788, o Diccionario dos termos technicos de História Natural.31 Em seu Diccionario, Vandelli partiu do princípio de que aqueles que estavam envolvidos na produção informal de conhecimento deveriam seguir uma abordagem mais estruturada, baseada em conceitos e técnicas descritivas, notadamente as estabelecidas por Lineu em sua sistemática. A primeira análise dos trabalhos produzidos e encaminhados à Metrópole era conduzida considerando essa perspectiva.

A partir disso, passo a demonstrar uma produção informal. É provável que textos como estes de Vandelli e os produzidos no âmbito da Academia das Ciências de Lisboa, possam ter influenciado a produção de outros, de origem informal. Na Biblioteca da Academia das Ciências de Lisboa há um manuscrito datado de 1792, escrito por um médico coimbrão, e que também passou pela Universidade de Montpellier, chamado Manoel Joaquim de Souza Ferraz. Ferraz circulou largamente pela Europa e acabou por viver no Brasil, onde foi médico. O manuscrito Memória sobre a Botânica e as vantagens que dela resultam para a praxe Médica, traz uma série de noções, partilhadas por Ferraz, para que as espécies de plantas pudessem ser observadas, descritas e coletadas de forma a não perder suas qualidades. O objetivo era o descrever as plantas permitindo que outros indivíduos as pudessem identificar em natura. Um aspecto interessante de seu trabalho é o fato de Ferraz ter construído seu manual a partir da ideia de que a sistemática lineana deveria ser a ferramenta fundamental para que qualquer indivíduo pudesse escrever sobre a fisiologia vegetal das plantas e suas qualidades medicinais. Seu texto promove uma clara adequação de princípios relativos ao processo de observação, recolha, preparação, classificação e catalogação de espécies vegetais. Não há registo visual do seu trabalho, apenas escrito. Este foi um trabalho que permaneceu manuscrito.

Com estes dois exemplos, podemos dizer que a natureza do conhecimento produzido através das políticas e normas das Instituições pode ser compreendido a partir de dois caminhos: o primeiro é o de um conhecimento de natureza formal e institucionalizado. Este seguia regras que, por vezes, tinham sido elaboradas pelo próprio produtor do trabalho que, como Vandelli, fazia parte do círculo oficial das Instituições e definia as regras e as políticas que deveriam ser seguidas; por outro lado, com o trabalho de Ferraz, temos um conhecimento de natureza informal e não institucional, produzido por agentes que não faziam parte direto dos círculos oficiais, mas que, de alguma forma, ficaram a conhecer as políticas, as normas, as instruções e fizeram parte do corpus de agentes que contribuíram para o desenvolvimento dessa cultura escrita. Estes agentes e seus trabalhos, mesmo que não tenham feito parte do circuito oficial e institucional, acabam por fazer parte da massa de trabalhos que devem ser analisados para que se possam compreender a natureza dos trabalhos filosófico-naturais produzidos nesse período. Como sugerem Kapil Raj e Mario Biagioli, as práticas sociais, as conjunturas políticas e as dimensões cognitivas são, nesse caso de análise, distintas. Vandelli e Ferraz estavam socialmente afastados, não estavam inseridos nos mesmos contextos sociais e políticos, e suas formações profissionais eram distintas. No entanto, o objetivo central de seus trabalhos foi o mesmo: através da cultura escrita, dar a conhecer as regras normativas de produção de conhecimento, que deveriam ser seguidas por todos aqueles que se dedicassem a construir conhecimento sobre o ambiente natural colonial, e colocar em circulação métodos de construção de conhecimento que pudessem ser usados por agentes em territórios variados.

Parte significativa dos textos enviados para avaliação e validação pelos pares da Academia, tinham como objetivo fundamental serem aceites para publicação nas Memórias. No entanto, não apenas a qualidade dos textos e do trabalho desenvolvido era suficiente para que o trabalho fosse admitido neste círculo intelectual. Os membros associados tinham privilégios e seus trabalhos costumeiramente eram publicados nas Memórias, ficando de fora uma expressiva produção de conhecimento, principalmente, vindas dos espaços coloniais.32

Para corroborar esta ideia, vou analisar alguns trabalhos escritos pelo militar baiano Domingos Alves Branco Muniz Barreto, e as dinâmicas estabelecidas por ele para que seus textos fossem validados e postos a circular.

Conhecimento Como Instrumento De Inserção Social

Um outro aspecto que podemos notar ao analisar a formação do conhecimento filosófico-natural sobre o Brasil, prende-se com a ideia de que, boa parte do conhecimento produzido tinha como propósito primeiro a tentativa de seu autor de acessar um sistema hierarquizado na metrópole. As Instituições oficiais eram clubes bastante fechados, e para entrar, era preciso conhecer as dinâmicas e as políticas de interesse. Sem dúvida, as políticas metropolitanas, principalmente na segunda metade do século XVIII, estavam direcionadas para os estudos filosóficos das potencialidades naturais de suas colônias. Uma notícia que rapidamente se espalhou, principalmente através das instruções de produção de conhecimento que eram publicadas oficialmente, como já pudemos notar. As políticas que promoviam a ideia de que a Coroa deveria melhor conhecer os espaços coloniais e a natureza que poderia ser mais bem explorada para fins comerciais e filosóficos, demonstravam os interesses metropolitanos e as ideias dos reformistas que estavam sendo empreendidas. A partir disso, estabeleceram-se jogos de poder, negociações e trocas, que influenciaram diretamente a natureza da produção de conhecimento. O clientelismo e a hierarquização da produção do conhecimento podem ser considerados centrais no caso ibérico33 e no caso que irei analisar a seguir.

Ao considerarmos as dinâmicas de poder que permeavam a produção do conhecimento nesse período, torna-se evidente que, em diversas ocasiões, essas dinâmicas desempenharam um papel significativo na disseminação e, sobretudo, na validação e tomada de decisão sobre o que deveria ser impresso ou não. Surgiram disparidades substanciais entre as obras que conseguiram ser impressas e aquelas que permaneceram em formato manuscrito. É notável que muitos desses manuscritos poderiam ter sido impressos, o que teria facilitado sua disseminação. Por outro lado, muitos dos trabalhos que foram impressos, o conseguiram devido à inserção dos produtores em ambientes e contextos que favoreciam a aceitação e a divulgação de suas obras. Essa realidade, que ganhou força na segunda metade do século XVIII devido às políticas de incentivo dos poderes metropolitanos, não passou despercebida por alguns autores que já notavam esse processo seletivo e hierarquizado das obras, e o criticavam.

Exemplo deste processo pode ser observado na vida e obra de um militar baiano chamado Domingos Alves Branco Muniz Barreto, que tem sido objeto de investigação, principalmente por uma historiografia brasileira.34 Este foi um importante agente no contexto colonial. Ele esteve envolvido nos processos de expansão territorial para o extremo sul, e no controle e mantenimento das leis indigenistas que estavam sendo aplicadas no final do século. Muniz Barreto bem conhecia as práticas sociais que deveria estabelecer para que seu pensamento crítico pudesse atingir os agentes oficiais metropolitanos. As dinâmicas estabelecidas por ele para encontrar validação e a possível publicação de seus textos ficam evidentes quando analisamos uma série de manuscritos enviados por ele para a Metrópole. Estes documentos estão disponíveis, hoje, em diferentes centros de documentação em Portugal, tais como, a Academia das Ciências de Lisboa, a Biblioteca Nacional, a Torre do Tombo, e a Biblioteca Pública Municipal do Porto. O militar baiano enviou diversas cópias dos seus textos, o que fomentou a sua circulação.

Observaçoens relativas a Agricultura, Commercio, e Navegação do Continente do Rio Grande de S. Pedro no Brasil, por Domingos Alz Branco Muniz Barreto, Cavalleiro professo na Ordem de S. Bento d`Aviz, Cap.m de Infantaria de Regimento de Estremós, 1778.
Figura 2
Observaçoens relativas a Agricultura, Commercio, e Navegação do Continente do Rio Grande de S. Pedro no Brasil, por Domingos Alz Branco Muniz Barreto, Cavalleiro professo na Ordem de S. Bento d`Aviz, Cap.m de Infantaria de Regimento de Estremós, 1778.
Biblioteca Nacional de Portugal - BNP, COD 6941//5.

Um dos manuscritos (1778),35 foi produzido no âmbito da expansão territorial para o extremo sul do Brasil, num momento decisivo de demarcação de fronteiras entre Portugal e o vizinho espanhol. O texto relata uma série de pontos relevantes para a Coroa, tais como, informações sobre as populações locais e seus costumes relativos à agricultura, os limites geográficos da região do extremo sul, a qualidade do solo (fertilidade e possíveis culturas que poderiam ser aplicadas) e notícias sobre elementos naturais que poderiam ser imediatamente explorados ou transplantados para outras regiões do Brasil e para Portugal. Muniz Barreto produziu três cópias deste texto e enviou para diferentes personagens do contexto metropolitano: Martinho de Melo e Castro, que foi secretário de Estado da Marinha e do Ultramar de 1770 a 1795), D. Rodrigo de Sousa Coutinho (Ministro e Secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos de 1795 a 1801),36 e o Bispo titular do Algarve e Confessor da Rainha.37 Se sua intenção era a aceitação de seu trabalho pelos colegas metropolitanos, ele então escolheu enviar o texto para figuras que estavam hierarquicamente muito bem-posicionados na conjuntura política e social do contexto Imperial.

A tentativa de estabelecer relações favoráveis com as esferas de poder na Metrópole, nas quais poderia negociar o reconhecimento de seu trabalho, sugere que Muniz Barreto buscava transformar suas experiências e estudos em contribuições valiosas para o conhecimento do Estado, afastando-se assim da ideia de que seu trabalho era apenas resultado da pura curiosidade individual. Ele escreveu sobre temas que acreditava serem do interesse de seus interlocutores e que seriam mais valorizados. Esta era, sem dúvida, uma prática comum na época e que, na maior parte dos casos, determinava a validação do trabalho produzido, ou não.38

Estas dinâmicas de produção e validação do trabalho produzido nos espaços coloniais, sempre associadas as questões políticas, as variáveis relacionadas à posição social e às dinâmicas de poder entre os autores e os poderes centrais metropolitanos exerciam uma influência significativa não apenas na produção, mas também na disseminação das obras. Isso, por sua vez, afetava a natureza do que estava sendo produzido e a possível aceitação ou validação desse conhecimento, o que poderia ser facilitado por meio da impressão das obras. A posição social do indivíduo também desempenhava um papel relevante na própria criação do trabalho, influenciando a escolha de material, a apresentação e o público-alvo. Os processos de construção do conhecimento, portanto, não devem ser analisados sem considerarmos esses aspectos, uma vez que, a consolidação de uma cultura escrita sobre a natureza no contexto do Império português esteve intimamente ligada às muitas formas e relações de poder, e esse aspecto não foi limitado ao século XVIII.39

Há um outro trabalho de Muniz Barreto que pode corroborar à elaboração dos argumentos deste artigo. A busca do militar por inserção social e hierárquica foi além dos circuitos de poder político e econômico. Existem evidências de que ele também procurou se inserir no circuito da Academia das Ciências de Lisboa através da produção de um trabalho sobre plantas medicinais.40 Da natureza deste trabalho, podemos destacar a importância da associação entre cultura escrita e visual. Algo que, nos processos de construção de conhecimento filosófico-natural, era fundamental, e que fazia parte dos manuais de instruções para um melhor ordenamento daquilo que seria produzido informalmente. Uma cultura que, para este período, era comum e que pode demonstrar o grau de conhecimento do autor sobre as políticas centrais para a produção de conhecimento.

O militar Muniz Barreto, que antes tinha apenas produzido um texto descritivo sobre as potencialidades naturais da Capitania do Rio Grande de São Pedro, agora iria produzir um manual de recolha, preparação e catalogação de espécies de plantas medicinais, seguido das descrições das plantas e seus usos na medicina. Para produzir este trabalho, ele usou como fonte de conhecimento as populações locais nativas da região do recôncavo baiano. Foram cinco aldeias percorridas e, em cada uma delas, ele descreveu a cultura local, o número populacional, o nível de organização e o conhecimento destas populações sobre plantas medicinais locais. Este foi um trabalho coadunado com a ordem inicial que recebeu de verificar o estado das populações indígenas que ali viviam, de acordo com as leis indigenistas daquele período.41

Para cada uma das aldeias, por exemplo, para além de descrever as populações locais, sua cultura e sua integração com as regras estabelecidas pelas leis indigenistas, Muniz Barreto também produziu um mapa do local, como este da Aldeia de São Fidélis da Comarca de Ilhéus.

FBN, manuscritos, 50, 1, 029. “Notícia da viagem e jornadas que fez o capitão Domingos Alves Branco Muniz Barreto entre os índios e sublevados nas vilas, aldeias das comarcas dos Ilhéus, Norte na capitania da Bahia”.
Figura 3
FBN, manuscritos, 50, 1, 029. “Notícia da viagem e jornadas que fez o capitão Domingos Alves Branco Muniz Barreto entre os índios e sublevados nas vilas, aldeias das comarcas dos Ilhéus, Norte na capitania da Bahia”.
Fundação Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.

Este foi, sem dúvida, um trabalho que corroborou ao menos duas iniciativas. A primeira de descrever as populações locais e controlá-las. E a outra, de descrever a cultura destas populações relativamente às tradições medicinais. Para cada aldeia percorrida, Muniz Barreto procurava observar o conhecimento das populações locais sobre as plantas medicinais e seus usos, descrevendo todo o processo, desenhando as plantas que pôde observar e por fim, descrevendo a aldeia através do mapa e da contagem de almas que ali viviam. O objetivo do autor residia em dois pontos fundamentais: o primeiro, reconhecer as populações nativas e as manter sob o domínio imperial: a segunda, inserir-se no círculo mais hierarquizado daquele momento, a Academias das Ciências de Lisboa, através de um trabalho sobre medicina.

No texto que vem a seguir aos mapas e as descrições geográficas e etnográficas, Muniz Barreto procurou descrever as plantas medicinais locais e a História Natural daquela região a partir do conhecimento das populações locais. A pergunta é: como ele recolheu este conhecimento? De duas formas: primeiro observando o cotidiano das populações de cada uma das aldeias percorridas, e depois, desempenhando uma espécie de entrevista com o indígena mais experiente de cada aldeia. Ele deixa este processo de construção de conhecimento bem claro em seu texto, e, claro, sem dar nomes, aponta que o conhecimento adquirido e transcrito em seu trabalho veio diretamente desses homens indígenas experientes:

Da povoação de Una segui por terra para a aldeia dos índios de S. Fidélis, que fica distante légua e meio, por serem estes igualmente experientes de ervas medicinais. Muito satisfeito fiquei nessa observação porque aprontou-me o regente dessa aldeia seis índios, os mais experientes ervolários, para me darem notícia de todas as frutas silvestres [...]42

A partir do conhecimento adquirido nessa interação, que claro, envolveu relações de poder e hierarquia, Muniz Barreto desempenhou um outro processo de construção de conhecimento: o da descrição da espécie e seus usos na medicina a partir da cultura textual e visual, como podemos observar nas imagens das figuras 4 a 6.

A primeira página aponta a aldeia em questão. Academia das Ciências de Lisboa - ACL, Série Azul de Manuscritos, COD 627.
Figura 4
A primeira página aponta a aldeia em questão. Academia das Ciências de Lisboa - ACL, Série Azul de Manuscritos, COD 627.
Plantas do Certão do Gram Pará.

A segunda traz a descrição da planta e suas virtudes. Academia das Ciências de Lisboa - ACL, Série Azul de Manuscritos, COD 627.
Figura 5
A segunda traz a descrição da planta e suas virtudes. Academia das Ciências de Lisboa - ACL, Série Azul de Manuscritos, COD 627.
Plantas do Certão do Gram Pará.

A terceiro apresenta a estampa da planta descrita. Academia das Ciências de Lisboa - ACL, Série Azul de Manuscritos, COD 627.
Figura 6
A terceiro apresenta a estampa da planta descrita. Academia das Ciências de Lisboa - ACL, Série Azul de Manuscritos, COD 627.
Plantas do Certão do Gram Pará.

A partir da análise deste trabalho de Domingos Alves Branco Muniz Barreto, podemos observar a natureza do conhecimento produzido por ele também na vertente da Filosofia natural. Fica claro que ele, mesmo sendo um militar de média patente, estava atento às políticas da Coroa e das instituições científicas que procuravam fomentar o desenvolvimento de trabalhos como este. Fica claro também, que ele estava conectado com as técnicas de produção deste tipo de conhecimento que circulavam através dos manuais, como já discutimos no início deste artigo. Este é um exemplo da cultura escrita que se formou através da circulação das políticas imperiais e das instruções oficiais produzidas no âmbito das instituições metropolitanas e coloniais. Muniz Barreto, seguiu as regras normativas estabelecidas oficialmente, e procurou estar alinhado com as políticas imperiais, entretanto, o seu trabalho e as suas ações foram informais.

Conhecendo as regras metropolitanas para obter aceitação de seu trabalho, ele produziu três cópias desse trabalho sobre as plantas medicinais e enviou para Portugal.43 Um deles foi claramente submetido para a Academia das Ciências de Lisboa, seguido de um pedido para que fosse tornado sócio daquela instituição. Tanto trabalho e dedicação sobre uma matéria que era absolutamente paralela ao seu posto oficial como militar, só podia significar um desejo evidente de ser inserido num circuito de muito prestígio. Fato é que os trabalhos de Muniz Barreto nunca foram publicados, e tão pouco foram validados pelos pares da Academia das Ciências ou por qualquer outro membro.

Ao longo do século XVIII, em várias instâncias, as relações de poder parecem ter desempenhado um papel dominante nos processos de produção e disseminação do conhecimento. Muitos tratados sobre a natureza das colônias, embora meticulosamente elaborados, permaneceram inéditos, circulando de maneira restrita na comunidade científica e sem conquistar notoriedade ou prestígio significativos além das fronteiras do Império português. Em todo caso, torna-se evidente que os critérios utilizados para determinar a validade da publicação de um trabalho nem sempre se alinhavam com padrões estritamente científicos ou acadêmicos. Com frequência, fatores de ordem política e social exerciam uma influência muito mais pronunciada do que a própria qualidade do conteúdo produzido. É plausível supor que muitos outros casos tenham compartilhado de circunstâncias semelhantes às de Muniz Barreto.

A compreensão da natureza do conhecimento produzido por Muniz Barreto requer uma análise que não apenas considere os contextos em que ele atuava, mas também leve em conta suas interações com outros indivíduos, a circulação de textos provenientes da metrópole que alcançavam as áreas coloniais, as questões políticas e sociais locais, além dos processos de troca, negociação e resistência que moldavam o entendimento que ele obtinha a partir de seus encontros com lugares e pessoas diversas. A produção de conhecimento empreendida por Muniz Barreto esteve assente nas interações entre ele e as populações locais, o que imprimiu ao seu trabalho características distintas daquelas que seus pares metropolitanos estavam à espera. O trabalho de Muniz Barreto é claramente influenciado pelas culturas das populações locais originárias. Normalmente, não é notório o reconhecimento por parte dos europeus sobre o conhecimento das populações locais. Muniz Barreto deixou claro que ali, no seu texto, o que as pessoas iriam ler seria um conhecimento produzido a partir de sua interação, mesmo que forçada, com as populações locais. Este foi, sem dúvida, um processo que determinou a natureza do que se estava ali produzindo - um conhecimento transcultural, que já não podia ser denominado apenas como europeu, mas que pode ser considerado como parte da cultura escrita daquele período e acaba também por fazer parte fundamental da cultura escrita do universo lusófono. O trabalho de Muniz Barreto nunca chegou a ser publicado, e tão pouco obteve aquilo que desejava, pois, ele nunca foi nomeado sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa.

Considerações Finais

A Natureza do conhecimento produzido ao longo da segunda metade do século XVIII sobre a Filosofia Natural dos espaços coloniais está intimamente ligada a três características fundamentais: as relações de poder e hierarquias, critérios de validação através das práticas sociais e a formação de uma cultura escrita baseada no trabalho de agentes informais. Tentativa de inserção social e reconhecimento, busca por validação e circulação de conhecimento, podem ser ações recorrentes nas trajetórias dos autores de trabalhos sobre a História Natural colonial. O poder estava relacionado, muitas vezes, com o domínio do território, mas também, com o domínio sobre o conhecimento sobre o território e suas potencialidades naturais. O projeto de Vandelli e da Coroa portuguesa para a construção de conhecimento filosófico-natural esteve intimamente ligado a questões econômicas, sociais e políticas. Algo que se refletiu sobre a produção de conhecimento, que tem como natureza fundamental as relações políticas e a tentativa de fomentar o comércio através dos elementos naturais que pudessem ser extraídos, cultivados e transplantados. Outra natureza deste conhecimento está relacionada com o domínio sobre as populações originárias e o conhecimento delas sobre o ambiente natural e suas potencialidades. Cañizares-Esguerra44 ao observar a construção de conhecimentos sobre as culturas mesoamericanas notou as escolhas europeias por suprimir a cultura escrita dos povos originários. No caso português, a cultura escrita e visual produzida no período moderno não deixou de notar essas “gentes da terra” e sua cultura, mesmo que oprimida e suprimida pela escrita europeia desta história.

Análises não só dos contextos que envolviam estas dinâmicas de produção, mas também as relações do autor com um amplo espectro de indivíduos, têm sido fundamentais para notar as principais características e a natureza do conhecimento. No entanto, há novas correntes historiográficas, que têm procurado traçar perfis mais complexos para esta produção de conhecimento desempenhada nos espaços coloniais por agentes informais que estiveram em contato com as culturas das populações locais. Questões políticas e sociais, conectadas com as práticas sociais que eram estabelecidas entre instituições e agentes oficiais e não oficiais, implicavam em processos de troca, negociação e resistência. Estes processos vêm sendo, cada vez mais, entendidos não apenas como a simples difusão ou transmissão de ideias, mas como interações transculturais, que neste caso, também envolviam as populações originárias e sua vasta cultura. A produção de conhecimento sobre o meio natural colonial produzidas por agentes informais assentou nas interações entre os europeus e os saberes locais. A partir desse momento, na Europa e nos espaços coloniais, começaram a surgir novos métodos e modelos de observação, descrição e classificação do ambiente natural. Esses novos modelos de conhecimento foram construídos, em grande parte, a partir da relação entre o conhecimento pré-existente e a necessidade de incorporação de novas realidades culturais, políticas, sociais e mesmo ambientais.

Desta forma, a natureza da cultura escrita sobre o conhecimento filosófico-natural produzido no e sobre o Brasil do século XVIII pode ser visto como um conhecimento transcultural e fruto de dinâmicas de interações entre grupos distintos, com objetivos conectados à política, economia, sociedade e ciência imperiais. Mesmo que a centralização metropolitana, no caso português, procurasse criar um mecanismo de controle sobre esta produção de conhecimento, o que notamos através da análise das fontes documentais, é que esta produção de conhecimento ganhou métodos e sinergias distintas e específicas em cada local, produzindo naturezas de conhecimento diversas, entretanto, conectadas com as políticas centrais.

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Notes

2 Sobre os casos em Índia e África ver: Bracht (2019) e a vasta obra de Magnus Pereira.
3 Conceição, op.cit., p. 55-87.
5 Lundberg (2023, p. 67-81).
10 Denipoti, op. cit.
11 Conceição, op. cit.
12 A cadeira de História Natural na Universidade de Coimbra foi criada a partir da contratação de Vandelli, e que acabaria por se tornar central neste processo de produção, construção e circulação de conhecimento filosófico-natural.
13 Conceição, op.cit., Domingues (2006) e Pataca (2006).
14 Pataca, op. cit. e Conceição, op.cit.
16 Pataca, op.cit.
18 Após a criação da Academia Científica do Rio de Janeiro, outros espaços foram criados, também sem sucesso de permanência. Por exemplo, em 1784, houve a criação da Casa de História Natura no Rio de Janeiro, por Luís de Vasconcelos e Sousa. Este foi um espaço de apoio para as atividades de coleta de espécies zoológicas e botânicas. Pataca, (2006, p. 272-274). Em 1786, criou-se a Sociedade Literária do Rio de Janeiro, que tinha por objetivo constituir-se como um espaço de estudos em História Natural, cujo foco seria a pragmatização e utilização imediata dos produtos naturais que eram coletados na colónia. Kury; Munteal Filho (1995, p. 105-122).
19 Também chamada de Sociedade de História Natural do Rio de Janeiro; Academia de Ciências e História Natural; Academia Fluviense Médica, Cirúrgica, Botânica, Farmacêutica. Os fundadores atuavam, em grande parte, como médicos. Pataca, op. cit., p. 262.
21 Pataca, op. cit., p. 262-268.
22 Raj (2010 e 2013).
24 Raj, op. cit.
25 Memórias económicas da Real Academia das Ciências de Lisboa - Para o adiantamento da Agricultura, das Artes, e da Indústria em Portugal, e suas conquistas - Tomo I, de 1789. Lisboa, na officina da Academia Real das Sciencias, 1789.
26 Raj (2010).
27 Disponível em: BNP-Digital: http://purl.pt/720.
28 Carvalho (1987, p. 58).
30 Ibid., p. 75 e Pereira (2012).
31 Disponível em: http://purl.pt/13958.
34 Ver obras de Juciene Apolinário Ricarte e Gisele C. Conceição.
37 ANTT, COD PT/TT/MSBR/0047, p. 2-5, itálico nosso.
39 Biagioli (2003).
43No Arquivo Histórico do Museu Bocage está a Relação dos produtos que se remetem (AHMB - REM 634); na Academia das Ciências de Lisboa, encontram-se os documentos sobre a Viagem a parte da Comarca dos Ilheos na Capitania da Bahia e as estampas Plantas do Certão do Gram Pará (ACL, Série Azul de Manuscritos, COD 374 (25)eACL, Série Azul de Manuscritos, COD 627). Já na Biblioteca Pública do Porto, temos cópias dos mesmos manuscritos que foram enviados à Academia, intitulados pelos arquivistas da Biblioteca como Descripção de parte da Comarca dos Ilheos da Capitania da Bahia dirigida à Academia R. das Sciencias de Lisboa, eErvas Medicinais do Brasil(BPMP - MS 688). Partes destes manuscritos foram compilados em uma pesquisa recente, finalizada e publicada em 2008 por Ana Paula Martins. Martins reconheceu a autoria dos manuscritos, a datação (1793) e vinculou o manuscrito com as estampas das plantas medicinais, depositado na Academia das Ciências de Lisboa Plantas do Certão do Gram Pará, a Muniz Barreto” (Conceição, 2019, p. 186).
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