ESTUDOS DE CULTURA MATERIAL

A contribuição de Giacomo Palumbo para a formação do subúrbio moderno recifense (1922-1934)

Giacomo Palumbo's contribution to the shaping of Recife's modern suburb (1922-1934)

KARINE MARIA GONÇALVES CORTEZ
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Brasil
FERNANDO DINIZ MOREIRA
Universidade Federal de Pernambuco, Brasil

A contribuição de Giacomo Palumbo para a formação do subúrbio moderno recifense (1922-1934)

Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, vol. 32, e25, 2024

Museu Paulista, Universidade de São Paulo

Received: 02 February 2024

Accepted: 02 July 2024

Funding

Funding source: FACEPE

Contract number: IBPG-0616-6.04/19

Funding

Funding source: CNPq

Contract number: 311.908/2020-9

Funding statement: Esta pesquisa foi realizada com apoio da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (FACEPE) por meio de uma bolsa de mestrado, processo IBPG-0616-6.04/19 e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio da bolsa de Produtividade de Pesquisa 1-D, processo 311.908/2020-9.

RESUMO: O arquiteto italiano Giacomo Palumbo (1891-1966) foi o profissional de maior destaque atuando na cidade do Recife durante as décadas de 1920 e 1930. Marcado por sua formação em Paris, produziu inúmeras obras públicas e privadas seguindo vocabulário clássico e eclético, como o Palácio de Justiça, o Hospital Centenário, o Hotel Central, a Faculdade de Medicina, além de várias residências. Apesar da magnitude de sua obra, existem grandes lacunas e omissões na historiografia sobre sua figura e arquitetura. Este artigo objetiva analisar a contribuição de sua arquitetura na conformação da imagem moderna para o Recife, que se expandia para áreas suburbanas, por meio de novas tipologias edilícias. Com base nos estudos de periódicos, documentos e iconografia de acervos, foram escolhidos para análise cinco edifícios, localizados entre os bairros vizinhos do Derby, Graças e Aflitos. Essas regiões passaram a atrair as elites devido aos melhoramentos de infraestrutura, paisagísticos e construções de edifícios que representavam as novas formas de morar, trabalhar e de se socializar. Percebe-se que Palumbo buscou trazer unidade e coerência para a cidade, por meio da arquitetura que se adaptava às diferentes demandas e desejos dos clientes. Longe de uma aplicação literal dos modelos europeus, na verdade, estes edifícios revelam uma série de adaptações aos aspectos técnicos e urbanísticos locais, ligados ao contexto político, social, econômico e cultural do Recife. O estudo busca uma maior aproximação das disciplinas da história urbana, urbanismo, paisagismo e arquitetura para um entendimento mais profundo da modernização de nossas cidades.

PALAVRAS-CHAVE: Arquitetura, Expansão Urbana, Giacomo Palumbo, Modernidade, Recife, Subúrbio.

ABSTRACT: The Italian architect Giacomo Palumbo (1891-1966) was the most prominent professional working in the city of Recife during the 1920s and 1930s. Marked by his training in Paris, Palumbo designed numerous public and private works following a classic and eclectic presentation, such as the Palace of Justice, the Hospital Centenário, the Hotel Central, the Faculty of Medicine, in addition to several residences. Despite the magnitude of his work, there are large gaps and omissions in the historiography about his figure and architecture. This article focuses on analyzing the contribution of its architecture in shaping the modern image of Recife, which was expanding into suburban areas, through new building typologies. Based on studies of newspapers, documents and iconography collections, five buildings were chosen for analysis, located in the neighboring neighborhoods of Derby, Graças and Aflitos. These regions began to attract the elites due to improvements in infrastructure, landscaping and construction of buildings that represented new ways of living, working and socializing. It is clear that Palumbo sought to bring unity and leverage to the city, through architecture based on a classic style that adapted to different demands and wishes of those who commissioned him. Far from a literal application of European models, these buildings incorporated local technical and urban conditions, linked to the political, social, economic and cultural context of the Recife. This article seeks for a closer approximation of the disciplines of urban history, urbanism, landscaping and architecture for a deeper understanding of the modernization of our cities.

KEYWORDS: Architecture, Urban Expansion, Giacomo Palumbo, Modernity, Recife, Suburb.

INTRODUÇÃO

O arquiteto Giacomo Palumbo (1891-1966) atuou na cidade do Recife entre 1919 e 1939, período no qual produziu muitas obras públicas e privadas seguindo os ensinamentos herdados de sua formação como arquiteto em Paris, atrelado sobretudo a tradição clássica, e buscando atender às necessidades e aos anseios locais de modernidade do momento. Diante de toda a sua extensa produção, que inclui o Grande Hotel do Recife, a Faculdade de Medicina do Recife, o Hotel Central e o Hospital Centenário, é possível afirmar que ele foi o mais importante expoente de arquitetura no período na cidade. Entretanto, inexiste uma análise do conjunto de sua obra, muito menos sobre sua contribuição para a transformação da imagem da cidade nestas décadas. Além disso, sobram lacunas e omissões na historiografia sobre sua obra e trajetória.

João Maurício Miranda, a quem devemos a primeira tentativa biográfica de Palumbo, indica sua chegada à cidade do Recife em 1918. 1 Geraldo Gomes da Silva apresentou as características estilísticas do Palácio da Justiça, da residência Costa Azevedo e da Faculdade de Medicina, assim como apontou a versatilidade do arquiteto em lidar com elementos estilísticos distintos. 2 Guilah Naslavsky identificou a relação profissional entre Heitor Maia Filho e Giacomo Palumbo como sócios no escritório “Maia e Palumbo”, e acrescentou no rol de obras o Grupo Escolar Cleto Campello, em Gravatá, agreste de Pernambuco, projetado entre 1933 e 1934. 3 Já George Dantas mostrou que o Plano Geral de Sistematização de Natal, concebido em 1929 por Palumbo, foi de grande importância para o crescimento futuro daquela cidade. 4 Apesar de escassas, as poucas informações sobre Palumbo permitem entrever que ele esteve à frente dos grandes projetos públicos da cidade do Recife e de outras cidades da região nas décadas de 1920 e 1930.

O recorte temporal escolhido para este trabalho limitou-se ao período de 1922 a 1934, no qual foram projetados e construídos cinco edifícios localizados entre os bairros vizinhos do Derby, Graças e Aflitos, todos na proximidade do atual centro expandido da cidade, mas na época locados à cerca de 2 km da área mais densa do centro. Esses bairros representaram as novas formas de morar, trabalhar e de se socializar promovidas pelas elites que para ali acorriam. Na década de 1920, o Recife expandiu-se para novas áreas suburbanas, por meio da construção de pontes, avenidas, praças, palacetes, ampliação das linhas de bondes, ditando outro ritmo e novos hábitos, que contrastavam com o centro tradicional e traziam dinamismo para os antigos e bucólicos arrabaldes. 5

Historiadores e arquitetos têm se dedicado a estudar esse período do Recife, embora persistam determinadas lacunas. Antônio Paulo Rezende ofereceu magistral quadro da emergência de sensibilidades modernas. 6 Manuel de Souza Barros e Neroaldo Pontes de Azevedo analisaram a dimensão cultural recifense nesse período, o primeiro oferecendo um quadro do ambiente cultural e social, e o segundo focando no embate ocorrido no campo da literatura entre aqueles grupos considerados modernos e inovadores e aqueles considerados tradicionais. 7 Daniel Vieira estudou a construção dos olhares sobre o Recife e sua paisagem por meio da percepção do ambiente urbano e a elaboração de representações urbanas pelos veículos de imprensa. 8 Kate Saraiva mostrou como os cineastas do Ciclo do Recife (1923-1931) construíram um olhar sobre a paisagem da cidade e seu processo de modernização. 9 Fernando Moreira mostrou as ações do poder público na modernização das áreas suburbanas. 10 Por fim, Aline Silva, na sua história das intervenções paisagísticas, mostrou-nos a riqueza dos jardins projetados no momento em estudo. 11 Entretanto, a figura de Palumbo, o principal arquiteto trabalhando no Recife à época, ainda não foi objeto de estudo por parte da historiografia.

Este trabalho tem, portanto, como objetivo analisar a contribuição da arquitetura de Giacomo Palumbo na conformação da imagem moderna para o Recife, particularmente na sua área suburbana, que era ocupada por construções afastadas dos limites do lote. Pretende-se observar a aplicação das suas referências arquitetônicas, o atendimento às expectativas dos clientes e as questões técnicas e construtivas, assim como, a repercussão de sua obra na cidade.

Para tal, foram escolhidas cinco obras, de caráter público e privadas: 1. A Faculdade de Medicina, 2. O Hospital do Centenário, 3. Residência Bezerra de Mello, 4. Residência Costa Azevedo e 5. Residência Annita Cherques, todas realizadas por ele no período de 1922 a 1934. A análise dessas obras permitirá compreender como sua atuação contribuiu para criar uma face moderna para o Recife dos anos 1920.

O trabalho é pautado na pesquisa documental e bibliográfico, priorizando periódicos e jornais diários da época, documentos e iconografia de acervos públicos e privados, e está estruturado em quatro partes. A primeira oferece um panorama da cidade do Recife nos anos 1920, cenário de atuação do arquiteto Giacomo Palumbo. A segunda apresenta o arquiteto, sua origem, laços familiares, chegada ao Brasil e ao Recife. A terceira e a quarta partes apresentam as análises das obras, sendo as de caráter público na terceira e as residências privadas na quarta.

UMA CIDADE EM MODERNIZAÇÃO: O RECIFE DOS ANOS 1920

Para entender melhor a atuação de Palumbo, faz-se necessário compreender a cidade na qual por muitos anos atuou. Na década de 1910, o Recife se beneficiou de um grande conjunto de obras de modernização por meio de três eixos: a reforma do Bairro do Recife, a ampliação do Porto e o saneamento de grande parte do território.

Emulando as remodelações de Paris sob Haussmann e do Rio de Janeiro sob Pereira Passos, o bairro portuário do Recife foi redesenhado entre 1909 e 1915, causando o desaparecimento de sobrados e do traçado urbano colonial para possibilitar a abertura de duas avenidas radiais partindo da praça Rio Branco, hoje conhecida como Marco Zero. Como nos exemplos parisiense e carioca, essas avenidas receberam edifícios de arquitetura eclética, que passaram aqui a abrigar bancos, seguradoras e escritórios de empresas ligadas à atividade portuária, econômica e financeira. Essas propostas modernizantes estavam vinculadas ao padrão de progresso e civilização da cultura europeia, marcadas pela presença da arquitetura clássica e eclética, pela monumentalidade dos edifícios públicos e pelas ruas mais largas, e pelos subúrbios nos moldes das cidades jardins. Em paralelo, foi implementado o projeto de reaparelhamento e modernização do Porto com a construção de diques, de cais de atracação, muralhas e armazéns, serviços de dragagem e de aterros, implantação do calçamento e linhas férreas. 12 Ao mesmo tempo, era implantado o Plano de Saneamento do Recife, sob a direção do engenheiro Saturnino de Brito, com a intenção de modernizar o sistema de esgoto sanitário e de abastecimento d’água. 13

A cidade do Recife cresceu consideravelmente ao longo da década de 1920. Em 1920, a população chegou a 238.800 indivíduos. Em 1930, não houve recenseamento, mas em 1940, a população atingiu 348.400 habitantes. O núcleo central ocupado pelos quatro bairros principais (Santo Antônio, São José, Boa Vista e do Recife), se tornou mais denso e ampliado em direção aos seus limites. Santo Antônio e Boa Vista passam a concentrar mais atividades comerciais, enquanto São José continuou a manter um forte caráter residencial.

A partir desse núcleo central, linhas dos bondes passaram a estruturar o território interligando antigos núcleos ou povoações, como Torre, Madalena, Casa Forte, Monteiro, Apipucos, entre outros. Denominados por Mário Lacerda de Melo de “nódulos periféricos”, esses locais, por vezes, surgiam de antigos engenhos, e encontravam-se relativamente isolados na malha urbana. Conectavam-se por antigas estradas carroçáveis que, mais tarde, se transformaram nas principais vias da cidade, em uma configuração semelhante à de tentáculos, que se espalham pela periferia, acompanhando os cursos d’água e os caminhos antigos. 14

Ao longo dos anos 1920, esses tentáculos gradativamente perderam seu traçado linear tão característico. Os antigos “nódulos periféricos” cresceram e aos poucos passaram a ser interligados e os seus vazios ocupados, como ocorreu em bairros como Aflitos, Espinheiro, Graças e Madalena. É justamente nessas áreas que o arquiteto Giacomo Palumbo irá atuar como arquiteto, urbanista, perito e decorador.

A atuação de Palumbo teve grande ímpeto quando o jurista Sérgio Loreto (1922–1926), ascendeu ao posto de Governador do Estado de Pernambuco. O programa de intervenções urbanas capitaneado por Loreto e pelo Prefeito Antônio de Goés foi de grande importância para surgimento de obras significativas que marcaram a modernização da cidade.

Como primeira obra desse momento destaca-se a intervenção na Campina do Derby. Uma área desocupada e alagável às margens do rio Capibaribe, a Campina foi transformada em moderno bairro com drenagem da área por meio de um canal e a criação de um parque, cortado por duas avenidas perpendiculares e profusamente arborizadas, articuladas por meio de uma rótula. Os palacetes para as elites, afastados dos limites do lote e com jardins, foram construídos na área. Entretanto, nem todos os lotes foram vendidos e terminaram por serem utilizados para a construção de edifícios públicos. 15

Outro projeto importante desse processo de expansão e modernização se deu pela construção da Avenida Boa Viagem, inicialmente conhecida como Avenida Beira-Mar. O principal objetivo do projeto era criar uma conexão entre a área central e a zona sul da cidade, praticamente desabitada. O empreendimento abriu cinco quilômetros de avenida às margens do mar, tornando-se ponto de lazer para as elites, que ali construíram novos chalés e bangalôs. 16

Além do Derby e da Avenida Boa Viagem, acrescenta-se ainda a modernização, calçamento e retificação do traçado de antigos largos e praças nos núcleos suburbanos, como os largos do Entroncamento, do Paysandú, da Paz e da Encruzilhada. Essas últimas intervenções, promovidas pela Prefeitura, embora de pequeno impacto, pontuais e não expressas em um plano geral formalizado, estavam inseridas numa visão de conjunto e, na medida em que atuaram em locais estratégicos na estrutura urbana, produziram as condições ideais para a incorporação daqueles núcleos ao tecido urbano em crescimento. Desta forma, contribuíram fundamentalmente para o aumento da mancha urbana e para o preenchimento de seus vazios urbanos. 17

A modernização proposta por esses projetos proporcionou novo desenho à cidade do Recife. Estradas carroçáveis que atravessavam granjas e sítios transformaram-se em vias para automóveis, sendo necessário a desapropriação de construções, alinhamento, pavimentação, retificações dessas vias e oferecimento de serviços públicos. Isso ocorreu com as Avenidas Rui Barbosa e Rosa e Silva, José Hygino (Bairro da Madalena) fundamentais para a densificação da ocupação de vários bairros da zona norte do Recife, como Espinheiro, Aflitos, Graças e Jaqueira, que se consolidaram como áreas residenciais da classe abastada pernambucana (Figuras 1 e 2 ). Parte dessas mansões e residências, além de edifícios públicos, foram projetadas por Palumbo.

 - Localização da área de estudo (esquerda) e dos edifícios analisados (direita) sobre a Planta da Cidade do Recife, elaborada por Douglas Fox e Mitchell Whitley, 1906.
Figura 1
- Localização da área de estudo (esquerda) e dos edifícios analisados (direita) sobre a Planta da Cidade do Recife, elaborada por Douglas Fox e Mitchell Whitley, 1906.
Fonte: Museu da Cidade do Recife (editada pelos autores).

 - Detalhe com a localização dos edifícios estudados sobre a Planta da Cidade do Recife, elaborada por Douglas Fox e Mitchell Whitley, 1906.
Figura 2
- Detalhe com a localização dos edifícios estudados sobre a Planta da Cidade do Recife, elaborada por Douglas Fox e Mitchell Whitley, 1906.
Fonte: Museu da Cidade do Recife (editada pelos autores).

Quando usamos o termo subúrbio aqui não nos referimos mais à noção dos arrabaldes sonolentos e pitorescos descritos por inúmeros memorialistas do século XIX e do começo do século XX, nem aos grandes subúrbios norte-americanos dos anos 1930 em diante; grandes operações planejadas de extensão distantes dos centros possibilitadas pelos automóveis. O termo subúrbio aqui compreende um tipo de ocupação urbana distinto dos padrões tipológicos dos sobrados das áreas centrais, adotando uma ocupação de casas isoladas no lote para famílias de classe média e alta, mas em áreas pouco densas e lindeiras ao centro ou aos arrabaldes, acessados por linhas de bonde ou automóveis privados, mas definitivamente ligados à cidade, ao contrário dos grandes conjuntos norte-americanos. Com exceção do bairro do Derby, esta área do Recife foi gestada a partir de loteamentos particulares ou desmembramento de parcelas destinadas a chácaras, que, por sua vez, foram fruto de fragmentação anterior de antigos engenhos. Devido aos investimentos propostos pelo município, as áreas no entorno dessas edificações se tornaram favoráveis a uma ocupação imobiliária mais densa, dando novo significado e funcionalidade aos subúrbios, agora conectados ao centro. Na planta do Recife de 1906 (Figuras 1 e 2 ), feita pelos engenheiros ingleses Douglas Fox e Mitchell Whitley, foram destacados os bairros do Derby, Graças e Aflitos, lugares em que estavam localizadas as obras realizadas por Palumbo.

O ARQUITETO GIACOMO PALUMBO

As poucas fontes bibliográficas que temos sobre a trajetória de Giacomo Palumbo foram coletadas em entrevistas à filha única da Palumbo, Yvette, e ao seu neto, Hélio Eichbauer, realizadas por Miranda e Sá, respectivamente. 18 Por meio delas, ficamos sabendo que Giacomo Palumbo nasceu na Ilha de Corfu, na Grécia, em 1891, de pais italianos, Gabrielle e Giulia Palumbo. 19

Os entrevistados afirmam que Palumbo estudou na École de Beaux-Arts , em Paris, França, concluindo o curso em 1910, informação que foi continuamente repetida desde então. Contudo, ele assinava os seus projetos com a sigla E.S.A, informação que nos levou aos documentos existentes na École Spéciale d’Architecture(ESA), confirmando seu ingresso nesta instituição parisiense em 1908, e sua saída em 1911, sem o recebimento de diploma. 20 Diante das grandes dificuldades encontradas na Europa devido à Primeira Grande Guerra, ele resolveu migrar para a América do Sul em busca de trabalho e uma vida nova. É provável que tenha vindo ao Brasil ao lado de seu irmão, o engenheiro Victor Palumbo.

Apesar das entrevistas apontarem a chegada ao Recife em 1918, Eichbauer afirma que seu avô de fato chegou em 1919. Apesar dessas divergências, é certo que o casamento com Heloísa Meneses de Pádua em 24 de junho de 1919, celebrado no Rio de Janeiro, tenha acontecido antes de sua chegada definitiva ao Recife. Como a família Meneses de Pádua possuía certo prestígio na sociedade carioca, supomos que provavelmente a união lhe concedeu a oportunidade de fazer contatos que lhe permitiram obter projetos e obras na cidade do Recife, para onde o casal se mudou logo após se casarem. 21 Sua única filha, Yvette Palumbo nasceu na cidade em 21 de março de 1920.

Ao longo de sua permanência na cidade do Recife, Palumbo estabeleceu diversas parcerias. Com o pintor alemão Heinrich Moser desenvolveu os vitrais da Residência Costa Azevedo e do Palácio da Justiça. Conforme aponta Naslavsky, manteve também sociedade com Heitor Maia Filho, 22 que, segundo Cabral, desenhava cartas náuticas, antes de associar-se a Palumbo, atendendo ao seu convite. 23 Outro nome mencionado em periódicos por ter trabalhado ao seu lado, é Hugo de Azevedo Marques, no desenvolvimento do esboço para construção da nova sede social do Sport Club do Recife em 1940.

Assim, fica claro que a relação estabelecida por Palumbo com os principais arquitetos (ainda não diplomados) da época, ora considerados discípulos, ora parceiros para trabalhos pontuais, evidencia a grande proeminência dele no meio profissional local. Apesar de não ter registro de conclusão de curso, o fato de ter estudado em Paris, aliado à sua habilidade e capacidade, certamente qualificou-o para exercer com competência no Brasil não apenas as atividades de projeto e construção de edifícios, mas também as atividades ligadas ao ensino, como professor catedrático, e um dos fundadores da Escola de Belas-Artes de Pernambuco.

A princípio, o conjunto de sua obra no Recife pode ser dividido em dois grandes segmentos, fruto da finalidade e financiamento da obra: públicas e privadas. A partir dessa divisão se buscará analisar cinco obras: dois edifícios feitos por parceria público-privada, a Faculdade de Medicina e o Hospital do Centenário, e três residências: Bezerra de Mello, Costa Azevedo e Annita Cherques. Essas obras estão próximas umas das outras, dentro de um quadrante com pouco mais de 1 km de lado, entre os bairros do Derby, Aflitos e Graças, áreas que, como foi visto, receberam significativos investimentos na gestão de Sérgio Loreto (1922-1926).

Pouco tempo após seu estabelecimento na cidade, Palumbo passou a obter as principais encomendas de novos projetos, particularmente os edifícios públicos que se deram não só na gestão de Sérgio Loreto, como na seguinte, de Estácio Coimbra (1926-1930). Ao longo de sua atuação na cidade, aproximou-se da elite econômica de Pernambuco, entre eles, usineiros, comerciantes, empresários. Esses passaram a contratá-lo para o projeto de suas residências e empreendimentos, já que era considerado o “único arquiteto” estabelecido na cidade, segundo o jornalista Aníbal Fernandes, no Diário de Pernambuco em 1922, em uma fala com o caráter elitista comum na época:

Numa terra em que se commettem diariamente os mais horríveis attentados à belleza (sic), ao bom gosto e à própria dignidade da vida, em matéria de architectura, numa terra em que o architecto não existe, porque só consegue vencer o mestre de obra presumido e inconsciente, v. teve essa grande audácia, verdadeiramente inédita: mandar construir a sua habitação pelo único architecto que aqui existe. [...] Isso que v. está fazendo, meu amigo, e constitue neste pacato meio provinciano, um verdadeiro escândalo, fazem-no com applauso de todas as pessoas de gosto. 24

Além das encomendas públicas e projetos de residências, Palumbo foi responsável por outros trabalhos, desde decoração de eventos à perito de sinistros ocorridos no Estado. Teve também projetos além do Recife, atuando nas cidades de João Pessoa, Natal e Rio de Janeiro, onde conquistou e expandiu seu círculo de relacionamentos, colaborando em projetos como a ampliação do Colégio Santo Inácio, 25 o plano de urbanização para uma área no Recreio dos Bandeirantes 26 e o projeto do edifício Netuno, na Avenida Atlântica em Copacabana.

Após 1930, talvez pelo fato de seu estilo não estar sintonizado com a visão modernizante do regime de Vargas, em Pernambuco comandado por Carlos de Lima Cavalcanti (1930-1937) e Agamenon Magalhães (1937-1945), suas encomendas públicas foram drasticamente reduzidas, passando a atender mais ao setor privado. Talvez este fato tenha motivado sua saída do Recife em 1938 ou 1939 para se estabelecer, por definitivo, no Rio de Janeiro, até o seu falecimento em 1966.

OBRAS PÚBLICAS: HOSPITAL DO CENTENÁRIO E A FACULDADE DE MEDICINA

O Hospital do Centenário

No início da década de 1920, o Recife não possuía equipamentos hospitalares suficientes, tendo em vista que, a cidade tinha uma população de 238.800 habitantes em 1920 e atingiria 348.400 habitantes em 1940. O atendimento aos enfermos ficava a cargo das clínicas gerais da Santa Casa de Misericórdia, do Hospital Pedro II e do Hospital Beneficência Portuguesa. Diante da impossibilidade de suprir essa carência e pelo cenário de entusiasmo pelo Centenário da Independência, médicos liderados pelo Dr. Fernando Simões Barbosa e religiosos, pelo padre beneditino Dom Pedro Roeser, lançaram em 7 de setembro de 1922, a pedra fundamental para construção do Hospital do Centenário, hoje renomeado por Hospital dos Servidores do Estado de Pernambuco. Simões Barbosa, em um jornal destaca que:

Vamos realizar em Pernambuco um tipo completamente novo de hospitais sendo nosso desejo dar-lhe uma organização semelhante aos modernos nosocômios alemães e americanos. Será um tipo de hospital modelo, visando ao mesmo tempo atender as necessidades de assistência às classes abastadas e às classes pobres. Contribuiremos por tal forma para renovar os serviços hospitalares do Recife, imprimindo-lhes uma feição adiantada, perfeitamente adaptável ao nosso meio. 27

O fato de Fernando Simões Barbosa e D. Pedro Roeser serem representantes de prestígio na sociedade da época contribuiu para o surgimento de apoiadores financeiros. Uma fundação mantenedora do hospital foi criada com apoio de várias senhoras da classe abastada recifense, inclusive, foram elas as principais responsáveis em montar a sociedade jurídica para pleitear no Congresso do Estado uma lei que autorizasse o governo a contribuir com a construção e instalação do hospital. Em junho de 1922, com o apoio do governador interino, Severino Pinheiro e do senador Manoel Borba, o Congresso concede uma verba para a construção. Foi realizada uma concorrência pública, vencida pela empresa Brandão e Magalhães que ficou encarregada pela obra ( Figura 3 ).

Além dos anseios do doutor Fernando Simões Barbosa e de Dom Pedro Roeser em construir o hospital, a gestão de Sergio Loreto, por meio da atuação do médico Amaury de Medeiros, 28 diretor do Departamento de Saúde e Assistência, também tinha interesse em aumentar a prestação de serviços à saúde, particularmente como parte de uma política de melhoramentos para os subúrbios. Periódicos diariamente publicados em Recife, como Jornal Pequeno, Diário de Pernambuco, A Província, mostravam a participação governamental, inclusive com os relatos das visitas do Dr. Amaury de Medeiros, que acompanhava o andamento da construção, e se empenhava pela instalação do sistema de esgoto e água no edifício.

 - Fachada do Hospital do Centenário e o Arquiteto Palumbo.
Figura 3
- Fachada do Hospital do Centenário e o Arquiteto Palumbo.
Fonte: Jornal Pequeno ( 1923 ).

O edifício foi projetado para um local estratégico na estrutura urbana, próximo à praça do Entroncamento no bairro do Espinheiro. O nome da praça deriva do fato de que era ali que as linhas de bondes puxados a burro, entre 1870 e 1914, se cruzavam e redefiniam seus trajetos, e onde se iniciavam duas vias fundamentais para a estruturação da zona nordeste da cidade, as Avenidas Rui Barbosa e Conselheiro Rosa e Silva. 29

O projeto realizado por Palumbo estava de acordo com as concepções modernas para edifício hospitalar, que advogavam a solução de pavilhões interligados por uma galeria coberta. 30 Esse tipo pavilhonar propiciava maior isolamento das enfermarias, criando pátios, além de maior separação dos fluxos hospitalares. 31 O edifício pode ser dividido em dois blocos interligados, o primeiro, com fachada voltada para Avenida Rosa e Silva, antiga Estrada dos Aflitos, abrigava a casa de saúde, enquanto o segundo bloco, voltado para face posterior, o hospital. Ao criar esse hospital, Palumbo se prevalece dos vários pátios que são criados pela volumetria dos blocos, estabelecendo a separação dos pacientes enfermos a partir de barreiras físicas impostas pelo zoneamento dos blocos e pelas grandes circulações. Os banheiros geralmente eram postos nas extremidades e os locais de isolamento eram criados para os pacientes terminais.

O programa inicial, de acordo com as descrições dos periódicos, constava que no pavimento térreo o arquiteto criou uma sala central, uma farmácia ladeada com dois pequenos pórticos em arcos, além dos laboratórios e quartos amplos e arejados. Nos pavimentos superiores (primeiro e segundo andares), quartos foram propostos com a mesma disposição e quantidade. Há nos periódicos menção quanto a excelência da qualidade dos materiais empregados. No segundo pavimento se encontram também as salas de “intervenções operatórias”. Artigos da época apontavam para a paisagem que os pacientes poderiam vislumbrar do alto da edificação: “um descortinar dos trechos mais pitorescos da cidade, no qual a vegetação domina com uma riqueza luxuriante de tons” 32 .

No último pavimento também estavam localizadas duas enfermarias, uma para homens e outra para mulheres, no centro, as instalações cirúrgicas com serviços de esterilização, anestesia e operação, possuindo esse último duas alas, uma voltada para operações sépticas e a outra para operações assépticas, e, ambas as salas receberam revestimento de mármore artificial. Ao escolher o local para essa sala, o arquiteto foi criterioso evitando luz e ruídos excessivos no ambiente cirúrgico.

Embora sem data e com partes faltantes na planta baixa encontrada ( Figura 4 ), é possível identificar as enfermarias de homens e mulheres separadas, a disposição dos quartos ao longo do corredor, a presença de banheiros nas extremidades ou dando apoio a uma sala de aula. Na ala voltada para hospital, há uma policlínica no térreo, com salas voltadas para diversas especialidades médicas. Nos pavimentos superiores estavam as enfermarias com 16 leitos para os doentes que não possuíam poder aquisitivo. O edifício dispunha de uma boa ventilação natural e iluminação artificial. Reportagens da época ressaltaram a sensação de bem-estar e conforto proporcionado pelo teto em branco alvíssimo, ampla iluminação por meio das várias janelas e piso em granito artificial. No projeto existiam enfermarias particulares e coletivas, além de um elevador que comportava a cama e os respectivos enfermeiros. Havia também os pavilhões de residência das enfermeiras, o gabinete de anatomia patológica e o hospital de isolamento para os casos de doenças contagiosas, neste último, o edifício contava com seis quartos, uma sala chamada de “desinfectório” e uma lavanderia. Além disso, é ressaltado nos jornais da época, que o edifício contava com o sistema de coleta de esgoto e abastecimento de água potável. 33

 - Planta baixa do Hospital, sem data.
Figura 4
- Planta baixa do Hospital, sem data.
Fonte: Arquivo Público do Estado de Pernambuco.

 - Hospital do Centenário em construção, sem data.
Figura 5a
- Hospital do Centenário em construção, sem data.
Fonte: Arquivo Público do Estado de Pernambuco.
 - Fase de conclusão, sem data.
Figura 5b
- Fase de conclusão, sem data.
Fonte: Arquivo Público do Estado de Pernambuco.

Quanto a sua composição, a fachada do edifício voltado para a avenida principal ganha destaque com um elemento vertical (Figuras 5 ). A partir desse bloco o edifício vai surgindo de maneira escalonada, revelando um jogo compositivo marcado pelas formas geométricas que favorecem uma boa iluminação e ventilação a todos os blocos. As grandes e altas janelas simetricamente estabelecidas também contribuem para os preceitos da higiene hospitalar. O edifício tem vários elementos simplificados, talvez devido às questões financeiras, no entanto, mesmo com essa simplificação, é possível ver a marcação das cornijas ao longo de todo edifício conferindo a repartição da fachada em base, corpo e coroamento (Figuras 6 e 7 ).

Esse conjunto de práticas transformou o Hospital do Centenário em um lugar ideal para os cuidados com a saúde, sendo considerado o mais moderno empreendimento do Recife na época. Inaugurado em 3 de maio de 1925, o Hospital do Centenário foi destaque na imprensa local, como aparece no Jornal Pequeno: “[...] quem passa agora na estrada dos Aflitos, já tem uma excelente impressão do edifício que, dentro de pouco tempo, servirá de orgulho à cultura e ao progresso do Recife, representando uma soberba vitória da iniciativa particular” 34 .

 - Hospital do Centenário em 1926.
Figura 6
- Hospital do Centenário em 1926.
Fonte: Revista da Cidade, n. 1, 1926.

 - Hospital do Centenário em 1925.
Figura 7
- Hospital do Centenário em 1925.
Fonte: Revista de Pernambuco, n. 12, jun. 1925b .

Convidado pelos doutores Fernando Simões Barbosa e Arsenio Tavares para conhecer o edifício ainda em construção, Gilberto Freyre admite que o edifício possuía caráter e respeitava o seu fim e sua natureza, mas relutou em se posicionar, alegando que a obra ainda em curso coberta por tapumes poderia revelar surpresas. 35 Mesmo assim, questiona o fato de os canos de esgoto estarem aparentes na lateral do edifício: “Não haverá meio de os encobrir? A ciência de águas e esgotos tem direitos, por certo; mas a estética e a decência comum têm também os seus. Eu quisera ver estes direitos em revolta contra aqueles, para no fim haver uma conciliação” 36 . Segundo Correia, 37 Freyre era crítico dos excessos do higienismo que se estabelecia no ambiente médico, técnico e intelectual do Recife durante a década de 1920. Em outra oportunidade, não esconde sua insatisfação com a implantação do edifício próxima à rua, quando tinha visto nos Estados Unidos que estes eram locados preferencialmente em sítios mais tranquilos e distantes das ruas. 38

Apesar das críticas de Freyre, é inegável que Giacomo Palumbo estampou no Hospital do Centenário a marca de sua arquitetura com respeito ao programa, referenciada na história, na simplicidade e apropriada ao tipo pavilhonar, sem esquecer-se dos preceitos sanitários e higiênicos vigentes à época.

A Faculdade de Medicina

O Hospital do Centenário foi concluído em 1925, ano do início da construção da Faculdade de Medicina, o que indica que a relação com a classe médica deve ter favorecido a contratação de Palumbo para o desenvolvimento desse projeto. Esses dois edifícios, locados a cerca de 1 km um do outro, passaram a oferecer importante equipamento de saúde nessa área da cidade, correspondendo a uma intensificação do seu processo de ocupação. O ambiente de modernização demandava a formação de novos profissionais. Escolas e faculdades já faziam parte do ambiente recifense, como a de Direito, Engenharia, Farmácia e Medicina, mas receberam naquele momento mais investimentos antes de serem unificadas em uma universidade em 1946, a Universidade do Recife.

Fruto de uma longa luta da categoria médica local, a Faculdade de Medicina de Pernambuco criada em 1915, foi oficialmente inaugurada em 16 de julho de 1920. Inicialmente, funcionou em instalações modestas no bairro da Boa Vista, concedendo o diploma de médico aos primeiros concluintes em 24 de dezembro de 1925. 39

O novo prédio da Faculdade de Medicina é um dos mais emblemáticos para muitos pernambucanos por simbolizar a afirmação da medicina em nosso estado, além de ser um edifício que relaciona a composição clássica com os elementos do estilo neocolonial, movimento arquitetônico que buscava resgatar os elementos da arquitetura colonial como uma contribuição à criação de nova identidade nacional.

A Faculdade foi edificada em uma área de expansão - o bairro do Derby - planejada de acordo com princípios urbanísticos inspirados no movimento cidade-jardim. A face lindeira ao parque testemunhou o surgimento dos palacetes pertencentes às famílias mais abastadas. Além disso, tornou-se um local privilegiado para se observar as emergentes sociabilidades modernas, como competições esportivas, desfiles e paradas escolares e militares e passeios de automóvel.

O terreno foi doado em janeiro de 1925 pela gestão de Sérgio Loreto (1922-1926), inaugurando uma prática de doação de terrenos na área para instituições e entidades públicas, como o Hospital da Brigada Militar, a Maternidade Pública e, anos depois, a Escola Técnica de Pernambuco, onde funciona hoje a Fundação Joaquim Nabuco, o Colégio da Polícia Militar e a Casa do Estudante de Pernambuco. Apesar de ainda não ser, naquele momento, uma instituição pública, a Faculdade de Medicina, que devido ao caráter educacional sem fins lucrativos, teve o terreno concedido. Tais doações só foram possíveis porque nem todos os lotes foram vendidos para a construção de palacetes.

O projeto encomendado a Palumbo, provavelmente entre o final de 1924 e o início de 1925, foi apresentado pelo arquiteto na congregação da escola em 4 de março. A construção foi custeada pelos professores e a partir de empréstimos, devidamente pagos, à Liga Pernambucana Contra a Tuberculose e ao Coronel Mendo Sampaio. A pedra fundamental foi lançada em 24 de maio de 1925, a construção concluída em 27 de março de 1927 e o edifício solenemente inaugurado em 25 de abril do mesmo ano. 40

A escolha pelo estilo neocolonial para a Faculdade de Medicina também está associada ao movimento em defesa das tradições regionais que emergiu no Recife em meados dos anos 1920. O 1º Congresso Regionalista do Nordeste , promovido pelo Centro Regionalista do Nordeste e coordenado pelo então jovem Gilberto Freyre, aconteceu entre 7 e 11 de fevereiro de 1926, reunindo intelectuais e profissionais de destaque da cidade com o objetivo estabelecer um programa de defesa dos valores tradicionais da região. Em uma das sessões plenárias, Luís Cedro apresentou um projeto, que já havia sido por ele submetido à Câmara Federal em 1923, visando a criação de órgão para a salvaguarda do patrimônio construído, particularmente o colonial. 41 O arquiteto Nestor de Figueiredo, residente no Rio de Janeiro, apresentou seus projetos e de colegas seus naquela cidade, que certamente estavam sob a esfera de influência de José Marianno Filho. 42 Aníbal Fernandes sugere que fosse feito um apelo às autoridades eclesiásticas para que estes preservassem o caráter tradicional dos monumentos religiosos. O Diretor do Departamento de Saúde e Assistência, o médico Amaury de Medeiros, apresentou o trabalho intitulado “O estilo colonial de arquitetura do ponto de vista da higiene moderna”. Tendo em vista que naqueles anos Medeiros era uma das figuras mais importantes da Medicina, detinha enorme prestígio na administração estadual e teve papel central no processo de construção da sede da Faculdade, sendo bem plausível que tenha atuado na definição do estilo neocolonial. De fato, o Congresso ocorreu quase um ano após o projeto ter sido apresentado, mas é evidente que estas discussões já estavam em curso e devem ter influenciado a escolha do estilo do edifício. Os médicos estavam atentos ao papel da arquitetura em prover espaços higiênicos e arejados. 43

A implantação do edifício da Faculdade de Medicina entre a Beira-Rio e a Praça do Derby e perpendicularmente em relação ao quartel, finalizando uma longa esplanada que se estende pela frente deste último, confere-lhe caráter nobre ( Figura 8 ). A construção da Ponte Estácio Coimbra anos depois, que provocou a abertura de uma conexão em 45 graus com o eixo da via central da Praça, ampliou esse caráter ao possibilitar ricos ângulos de visadas do edifício. Apesar do intenso tráfego, é possível ainda apreender a fluidez espacial desse ambiente moderno pleno de espaços verdes e de edifícios erigido em estilos arquitetônicos diferentes.

 - Faculdade de Medicina do Recife, atual Memorial de Medicina de Pernambuco da UFPE.
Figura 8
- Faculdade de Medicina do Recife, atual Memorial de Medicina de Pernambuco da UFPE.
Fotografias do autor (2019).

O edifício é composto por um bloco central, ladeado por dois menores mais baixos, o que lhe confere forte dinamismo. Seu caráter monumental também se deve à composição de sua fachada, comandada por uma divisão tripartite, tanto no bloco central, como nos laterais. A fachada do bloco central, por sua vez, também é dividida em três blocos. A parte central é vazada em sua maior extensão por arcadas triplas, que delimitam um terraço no pavimento superior no salão nobre e possibilitam um amplo acesso para o hall, no térreo. Enquanto a arcada superior é bem mais discreta configurando um plano de parede liso, a térrea apresenta colunas torças, que lembram o baldaquino de Bernini na Basílica de São Pedro, no Estado do Vaticano. A fachada é ainda marcada por dois blocos laterais delimitados por pilastras dóricas, que contém aberturas marcantes com suas próprias colunas torsas, cornijas e frontões. De inspiração barroca, o frontão principal, encimado por uma cornija de asa de cesto ladeado por dois jarros, coroa o conjunto da fachada. Por trás do frontão e recuado do plano da fachada, um volume mais alto se anuncia coberto por um telhado de quatro águas com telhas em rabo de andorinha. Os blocos laterais são mais simples e possuem apenas um andar, mantém a divisão tripartite marcada por expressivas pilastras dóricas que separam as janelas em arco. A complexidade da composição da fachada atesta o domínio de Palumbo da composição e de um vocabulário clássico atemporal, aqui matizado pelos elementos da arquitetura neocolonial em voga no país que o adotou.

Revelando o débito de Palumbo com a tradição Beaux-Arts, as amplas salas foram arranjadas simetricamente ao longo de um eixo central. A forma como avançam progressivamente para o exterior confere dinamismo ao volume e proporciona boa iluminação interna. No térreo, os três elementos de destaque são o grande hall, o claustro central e o auditório. Ladeado por espaços administrativos da faculdade, o hall de recepção é um grande espaço que oferece uma continuidade visual entre a praça e o interior do edifício e um espaço adequado para a majestosa e convidativa escada que dá acesso ao pavimento superior. O segundo espaço significativo é o claustro que no térreo era circundado pelos laboratórios e no primeiro pavimento pelas salas de aula. Por fim, o auditório semicircular concluiu a composição na face oposta à fachada principal ( Figura 9 ). Desde que Jacques Gondoin, inspirado no Pantheon de Roma, resolveu utilizar a meia circunferência na Escola de Cirurgia de Paris entre 1769-1775, ele estabeleceu um modelo para escolas de medicina em todo o mundo. No segundo pavimento o destaque encontra-se no salão nobre da escola. O ladrilho do piso e os vitrais, dentre outros detalhes, mostram o esmero com que a edificação foi feita.

 - Faculdade de Medicina do Recife, atual Memorial de Medicina de Pernambuco da UFPE, Planta Baixa do Térreo e 1º Pavimento, sem data.
Figura 9
- Faculdade de Medicina do Recife, atual Memorial de Medicina de Pernambuco da UFPE, Planta Baixa do Térreo e 1º Pavimento, sem data.
Fonte: Fundarpe (1995).

O prédio da Faculdade de Medicina é uma das obras neocoloniais mais emblemáticas da cidade do Recife. Trata-se de uma construção sólida e harmoniosa que apenas um grande arquiteto, artista e técnico poderia conceber. Uma autêntica combinação de ornamentos inspirados nos elementos coloniais e de composição clássica, bem articulado ao seu entorno, aproveitando as qualidades visuais do terreno, por onde o Rio Capibaribe parece abraçá-la, uma obra que juntamente com o Quartel e os casarões residenciais, nas outras laterais, parece emoldurar a Praça do Derby.

TRÊS RESIDÊNCIAS: BEZERRA DE MELLO, COSTA AZEVEDO E CHERQUES

Palumbo desenvolveu projetos para residências nos subúrbios do Recife que representavam mudanças quanto ao modo de morar, aos programas e concepções arquitetônicas. Na lista pode-se incluir a reforma e ampliação da residência de Othon Lynch Bezerra de Mello (1922), a residência Costa Azevedo (1934) e a residência Annita Cherques (1927).

As antigas residências nos arrabaldes – sobrados, casas térreas, casas de chácara, muitas vezes elevadas do chão com varandas – aos poucos deram lugar a novas residenciais que tinham uma variedade de tipos morfológicos. Apesar de certos palacetes isolados em meio a jardins existirem desde o início do século XIX no Recife, 44 foi na década de 1920 que assistimos a uma maior disseminação deste tipo de habitação, a partir do momento em que as chácaras do século XIX eram parceladas. Adotando o estilo eclético, as novas residências destes subúrbios começaram a se destacar na paisagem. 45

Além de buscarem representar o status social de seus proprietários, eles expressavam mudanças nas relações familiares, reverberados na organização espacial interna dessas residências. O programa de distribuição espacial das residências passou a prever novo zoneamento funcional, mais bem setorizado, com áreas distintas de estar, repouso e serviço interligadas por vestíbulos e circulações. A partir deles, a transição entre os espaços poderia acontecer sem que necessariamente fosse preciso passar por dentro de uma zona específica da casa. Esse novo agenciamento progressivamente provocou o desaparecimento do esquema tradicional adotado nas residências coloniais, quando o centro de interesse estava na sala de jantar, e essa configurava percurso obrigatório aos quartos ou alcovas e cozinha. Novos equipamentos refrigeradores, e o fogão a gás facilitavam os afazeres domésticos, tornavam as cozinhas menores, embora não dispensassem as empregadas domésticas.

A vida social, especialmente para as mulheres, também começava a se diversificar e ampliar. O aparecimento de equipamentos de lazer e cultura nos subúrbios, tais como hipódromos, primeiros clubes sociais (British Country, Internacional e Alemão), praças e parques - permitiu que a rigidez dos costumes e os preconceitos fosse cada vez mais abrandados, conferindo um maior dinamismo a figura feminina, antes limitada a ficar em casa, longe do alcance visual dos espaços sociais e da rua, ganhando novos espaços de uso, como salões, os jardins, os parques e praças, Assim, as residências de Palumbo são símbolos desses anseios e representam o espírito de modernidade vigente.

O Casarão de Othon Lynch Bezerra de Mello , importante comerciante e industrial do ramo têxtil, foi um antigo sobrado do tipo chácara oitocentista edificado nas terras do loteamento da Capunga Nova. 46 Nessa região, as edificações eram construídas soltas nos grandes lotes, próximos ao rio Capibaribe. A partir da década de 1870, a região passou a usufruir do serviço de bondes puxados a burros que ligava o centro a outros arrabaldes da cidade mais distantes por meio da antiga Estrada Ponte D’Uchoa ou Estrada dos Maguinhos.

Em sua configuração original, a casa possuía traçado colonial, sem ornamentos na fachada, em composição simétrica quanto ao posicionamento e números de vãos, com coberta em quatro águas, sem calha, e fachada caiada de branco ( Figura 10 ). Nessa região residiam outras personalidades, entre eles comerciantes e banqueiros cujos palacetes representavam suas posições sociais. Na expectativa de que a casa pudesse atender as suas necessidades e refletir o status da família, o Sr. Othon Bezerra contratou o arquiteto Giacomo Palumbo, em 1922, para realizar a reforma e ampliação do seu imóvel em uma nova composição formal. 47

 - Residência Othon Lynch Bezerra de Mello, situação original.
Figura 10a
- Residência Othon Lynch Bezerra de Mello, situação original.
 - Fachada principal em aquarela de autoria de Palumbo (1922).
Figura 10b
- Fachada principal em aquarela de autoria de Palumbo (1922).
Fonte: Acervo Pessoal de Carlos B. Mello (Barreto, 2016 ).

Na proposta de Palumbo, a casa ganha um corpo que avança em relação à fachada original, criando um terraço e uma varanda para o segundo pavimento, embora o volume prismático do século XIX tenha sido conservado ( Figura 11 ). Nessa nova configuração, a varanda frontal recebe um tratamento compositivo com colunatas, arcadas e adornos. Na parte central dessa fachada, a partir de uma cornija marcante surgem no frontispício duas volutas, representação de folhagens, e um elemento que lembra um medalhão, típicas características do neocolonial. No pavimento superior, no lugar dos vãos fechados, luminárias em ferro fundido são colocadas, assim como um guarda-corpo de mesmo material. 48 Nos outros vãos, novas cercaduras com características mais ornamental aparecem para emoldurar as portas e janelas. Quanto à coberta, agora com nova configuração, recebeu nas pontas elemento conhecido como asa de andorinha, típico das casas coloniais.


							 - Residência Othon Lynch Bezerra de Melo.
Figura 11
- Residência Othon Lynch Bezerra de Melo.
Disponível em: https://www.fernandomachado.blog.br/novo/casa-cor-pernambuco-2016/ .

Na solução espacial dada a edificação, Palumbo propõe a articulação dos espaços por meio de eixos ortogonais, criando quadrantes que permitem uma leitura simétrica e harmoniosa da edificação. No quadrante central, ele estabelece a escada de acesso ao pavimento superior, que banhada por luz natural por uma claraboia, convida o transeunte a contemplar esse elemento de imediato. Ainda no térreo, observa-se que a configuração original praticamente é mantida, sendo acrescentada alguns novos compartimentos necessários as novas dinâmicas sociais e de salubridade presentes nas posturas sanitaristas. Outro elemento de destaque são as amplas varandas das fachadas frontal e posterior, ambas modificando por completo as características compositivas do imóvel. Na varanda principal, observa-se um semicírculo que parece quebrar com a ortogonalidade do prisma retangular da edificação ( Figura 12 ).

 - Residência Othon L. B. de Melo, plantas do térreo e do pavimento superior, com projeto de reforma.
Figura 12
- Residência Othon L. B. de Melo, plantas do térreo e do pavimento superior, com projeto de reforma.
Fonte: Barreto ( 2016 ).

Em relação ao programa, o arquiteto manteve no térreo os espaços sociais e de serviço, ainda na lógica original de distribuição, mas com uma dinâmica diferente, levando em consideração a contemplação da paisagem e funcionalidade dos espaços. Dessa forma, logo na entrada principal dispôs a sala de estar e, no lado oposto, a sala de jantar. Nas laterais dispôs outros ambientes de convívio social, como a sala de música, além dos espaços de serviço: cozinha, despensa e banheiros. O primeiro pavimento, acessado pela escada principal, recebe corredores de circulação laterais que levam aos quartos, escritório, suíte principal, a outro banheiro e a varanda, criada para estabelecer mais um espaço de convívio familiar. Havia também nesse andar, segundo Juliana Barreto, um pequeno oratório, símbolo das práticas religiosas da família. 49

Na via paralela à Estrada Ponte D’Uchoa, a conhecida Avenida dos Aflitos, atual Avenida Rosa e Silva com a esquina da Rua Amélia, se localizava a Residência Costa Azevedo (1934), cuja obra foi iniciada em 1931. O palacete projetado para os proprietários da Usina Catende se destacou como uma das mais luxuosas residências construídas nos anos 1930. Quanto a sua implantação, ela segue a tendência adotada a partir do final do século XIX, na qual a edificação se distancia dos limites do lote, atendendo aos novos requisitos de salubridade e higiene, e os jardins frontais e laterais ganham destaques. Nos limites de fundo do terreno, uma edícula foi construída para acomodação dos automóveis e apoio de funcionários, destruída para a construção de um grande edifício residencial no final dos anos 1990 no terreno, sendo a casa mantida como área de convívio e lazer dos condôminos ( Figura 13 ).

 - Residência Costa Azevedo, plantas do térreo e implantação, do segundo pavimento e corte.
Figura 13
- Residência Costa Azevedo, plantas do térreo e implantação, do segundo pavimento e corte.
Fonte: Acervo Saturnino de Brito ( 2010 ).

A busca por iluminação e ventilação para todos os cômodos conduziu a uma a composição volumétrica dinâmica e assimétrica ( Figura 14 ). Cada ângulo revela facetas diferentes que são unificadas por meio da disposição de colunas, pilastras e outros elementos decorativos de origem clássica e neorromânica ao longo de toda fachada, que, por sua vez, demarcam as amplas varandas e terraços, criados como prolongamento dos ambientes de estar. Destaca-se, ainda, na fachada voltada para Avenida Rosa e Silva e Rua Amélia um tipo torreão, com altura superior aos demais volumes, no qual formam meias-colunas que acentuam a verticalidade do volume.

 - Residência Costa Azevedo.
Figura 14
- Residência Costa Azevedo.
Fotos: Floriano Melchíades.

Essa composição dinâmica foi anotada por Nestor Goulart como uma característica das residências das famílias ricas deste período:

As moradias das famílias mais abastadas já incluíam, em muitos casos, recursos de conforto semelhantes aos das habitações europeias de sua época e seu tratamento formal ia sendo rebuscado, para atender com rigor aos padrões acadêmicos europeus, então em voga. Instaladas em geral em chácaras, ou, pelo menos em terrenos de grandes proporções, ofereciam aos arquitetos a possibilidade de composições relativamente complexas e a oportunidade para uma complicada ornamentação, onde se mesclavam os mais variados motivos da linguagem arquitetônica sancionada pela Academia. 50

Antônio da Costa Azevedo cuidou para que o seu palacete tivesse os principais profissionais da cidade, assim como o mobiliário, louças e metais sanitários fossem importados. O alemão Heinrich Moser ficou responsável pela confecção dos vitrais. Como valorizava os elementos integrados da arquitetura, era comum Palumbo reservar locais de destaque para o trabalho de artesãos e artistas. Um dos retratos da força e riqueza da indústria açucareira nas primeiras décadas do século XX, o palacete hoje é protegido pela instância municipal como um Imóvel Especial de Proteção e nele funciona o salão de festa do edifício que em seu terreno foi construído.

Mansões como as das famílias Bezerra de Melo e Costa Azevedo eram exceções. A grande maioria eram residências menos suntuosas e mais singelas para uma classe média e média alta, formada por profissionais e comerciantes e mesmo por membros empobrecidos da antiga aristocracia.

Um exemplo de residência de menor porte projetada por Palumbo foi a Residência Annita Cherques51 (1927) na Rua Jenner de Souza, nº 947, no Derby. Foram duas casas assobradadas e geminadas construídas no mesmo terreno, com uma planta rebatida. A residência fez parte de um dos primeiros trechos loteados do Derby para residências, os quais começaram a serem vendidos no final de 1924, como relata a Revista de Pernambuco: “já começavam a ser vendidos os terrenos do novo bairro, onde foram surgindo modernas residências de dois pavimentos” 52 . Estava próxima ao parque, defronte da fachada lateral da Faculdade de Medicina e com vista para o Rio Capibaribe, um local de muito prestígio para se observar a face moderna da cidade (Figuras 15 ).

 - Fachada de Residências Annita Cherques (1927).
Figura 15a
- Fachada de Residências Annita Cherques (1927).
Fonte: Arquivo Público do Estado de Pernambuco.
 - Residência em 2017, antes de ser demolida.
Figura 15b
- Residência em 2017, antes de ser demolida.
Fonte: Google Maps (2019).

No térreo foram localizados sala de estar, de jantar, cozinha, serviço, banheiro e um cômodo ao fundo. No primeiro pavimento estavam três quartos e um banheiro. A entrada se dava pela lateral, onde em planta baixa se caracteriza como “pórtico e passagem de automóvel”. É importante destacar a presença da garagem, enfatizando a prosperidade representada pela posse de um automóvel.

No hall de entrada se encontrava a escada de acesso ao primeiro pavimento. Desse hall era possível ter acesso à sala de estar, vinculada a um terraço com vista para a rua principal, e a sala de jantar no lado oposto. A escada funcionava como elemento de destaque e divisão entre esses dois espaços. Justaposto à sala de jantar, encontrava-se a cozinha. Ainda há um banheiro e um quarto no fundo do terreno, no entanto, o acesso só acontecia pela lateral (área externa) da casa ( Figura 16 ). Ainda que a residência aparente ter vestígios da organização das casas tradicionais coloniais pela disposição linear dos cômodos no térreo, a separação funcional estabelecida pelo hall garante um novo centro de interesse, pois a partir dele as zonas da casa foram postas de maneira independente, sem que fosse obrigatória a passagem por dentro de um ambiente para outro. Embora não tivesse a melhor solução, na parte posterior, essa configuração foi garantida com acesso externo. Possivelmente devido às necessidades, hábitos da proprietária ou pela própria limitação do terreno, Palumbo tenha encontrado nessa disposição a melhor solução para estabelecer as duas casas solicitadas.

 - Residências Annita Cherques (1927) Plantas-Baixas dos térreos e primeiro pavimentos.
Figura 16
- Residências Annita Cherques (1927) Plantas-Baixas dos térreos e primeiro pavimentos.
Fonte: Arquivo Público do Estado de Pernambuco.

Não se sabe se Annita Cherques chegou a morar nessa residência, ou apenas fez dela um investimento pelo potencial de crescimento que o bairro oferecia. O que se sabe, é que seu único filho, Jorge Cherques, nasceu um ano após a proposta de projeto de Palumbo, em 1928, na cidade do Rio de Janeiro. Infelizmente, a residência, foi demolida em 2019.

Residências como essas foram muito reproduzidas com variações pela cidade entre as décadas de 1920 e 1940, mostrando a popularização de um gosto historicista na arquitetura que marcou a paisagem de diversos bairros da cidade (Figuras 17 ). 53

Esse novo padrão urbanístico diferia bastante daquele das áreas centrais. O regulamento de construção do Recife (lei Nº 1.051, de 11 de setembro de 1919), também determinou parâmetros específicos que nortearam a ocupação de amplas áreas da cidade nessa época. A lei dividiu a cidade em quatro perímetros: 1º (principal), 2º (urbano), 3º (suburbano) e 4º (rural). Enquanto no 1º perímetro, ou seja, os bairros centrais: Recife, Santo Antônio, São José e parte da Boa Vista os edifícios deveriam se manter no alinhamento, nos 2º e 3º perímetros o regulamento exigia afastamentos laterais e recuos frontais para atender os requisitos de ventilação e iluminação. Os recuos frontais eram de 3 e 5 metros, respectivamente. 54 As moradias funcionavam como marcos vivos da modernização da cidade, e a noção de habitar que o Palumbo carregava de sua formação parisiense vinculava-se às novas necessidades sociais e culturais, hábitos, desejos e costumes da sociedade abastada recifense da época. Segundo Reis Filho, as novas formas de habitar e construir: “não devem ser consideradas apenas como consequências das mudanças vividas pelos vários grupos sociais, mas vistas como parcelas importantes dessa renovação” 55 .

 - A direita, residência neocolonial na Av. João de Barros, nº 236, Boa Vista.
Figura 17a
- A direita, residência neocolonial na Av. João de Barros, nº 236, Boa Vista.
Fonte: Fundaj, foto de Rucker Vieira, 1985 ECL_040_000398.
 - Ao centro, residência eclética, hoje demolida, na Avenida 17 de Agosto, nº 713, Santana.
Figura 17b
- Ao centro, residência eclética, hoje demolida, na Avenida 17 de Agosto, nº 713, Santana.
Fonte: Fundaj, foto de Severino Ribeiro, 1985 ECL_029_000284.
 - esquerda, residência eclética, hoje demolida, localizada na Rua Confederação do Equador, nº 45, Graças.
Figura 17c
- esquerda, residência eclética, hoje demolida, localizada na Rua Confederação do Equador, nº 45, Graças.
Fonte: Fundaj, foto de Severino Ribeiro, ECL_032_000317.

CONCLUSÃO

No decorrer dos anos de 1920, as estradas oriundas dos bairros centrais do Recife são ampliadas e gradativamente perdem seu traçado tão característico. As principais estradas são pavimentadas e se transformam em vias expressas, ligando os vários novos núcleos suburbanos entre si, bem como ao centro. As grandes e pontuais intervenções propostas pelo poder público - municipal e estadual - possibilitaram novas construções nos espaços vazios no entorno desses antigos núcleos, costurando-os em uma mesma trama urbana. Entre esses novos núcleos estavam os bairros vizinhos do Derby, Graças e Aflitos, lugares de atuação do arquiteto Palumbo, e que representavam as novas formas de morar, trabalhar e de se socializar promovidas pelas elites que ali residiam.

Embora diversos atores tenham participado da construção dessa malha urbana, não podemos desprezar o papel do italiano Giacomo Palumbo que projetou os edifícios mais significativos na cidade na década de 1920. A partir de sua formação acadêmica clássica - que privilegiava o respeito aos eixos, a hierarquia dos espaços, a composição cuidadosa das fachadas, marcada pela base, corpo e coroamento, e a conexão com a urbe – ele procurou trazer unidade e coerência para a cidade, por meio da arquitetura que tinha como base um estilo classicizante que se adaptava às diferentes demandas em termos de programas e de desejos dos clientes.

Longe de uma aplicação literal de modelos europeus, sua obra revela uma série de adaptações aos condicionantes culturais, técnicos e urbanísticos locais. Ele precisou se relacionar com contexto político, social, econômico e cultural da cidade do Recife, particularmente com clientes que desejavam expressar seus valores por meios dos seus edifícios. O estudo de sua obra nos mostrou que os exemplares arquitetônicos, em suas dimensões artística e técnica, devem dialogar com o estudo das origens das estruturas e das paisagens urbanas, assim como dos estudos dos clientes e de suas redes sociais e profissionais, para oferecer um entendimento mais complexo da história de nossas cidades.

AGRADECIMENTOS

Esta pesquisa foi realizada com apoio da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (FACEPE) por meio de uma bolsa de mestrado, processo IBPG-0616-6.04/19 e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio da bolsa de Produtividade de Pesquisa 1-D, processo 311.908/2020-9.

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Notes

1 Miranda ( 1981 , p. 116).
2 Silva (1987, p. 194-197).
3 Naslavsky ( 1998 , p. 187-190).
4 Dantas ( 2003 , p. 124-126).
5 Moreira ( 2022 , p. 192-200).
6 Rezende ( 1992 ).
7 Barros ( 1985 ) e Azevedo ( 1996 ).
8 Vieira ( 2003 ).
9 Saraiva ( 2017 ).
10 Moreira, op. cit.
11 Silva ( 2010 ).
12 Moreira, op. cit. , p. 154-166.
13 Moreira ( 2010 ).
14 Melo ( 1977 ).
15 Moreira, op. cit ., p. 188-191.
16 Ibid., p. 183-187.
17 Ibid., p. 192-200.
18 Miranda, op. cit. , e Sá ( 2008 ).
19 Seu pai era engenheiro e participava de obras de infraestrutura na Grécia. Ele atuou também como engenheiro da equipe de Ferdinand Marie de Lesseps, responsável pela construção do Canal de Suez.
20 Segundo Seitz ( 1995 ), a ESA foi criada por Émile Trélat em 1865, com o nome de École Centrale d’Architecture, recebendo apoio de importantes arquitetos como Viollet-le-Duc e Henri Labrouste, e sinalizava uma alternativa em relação ao sistema acadêmico da École des Beaux Arts ao promover uma abordagem mais pragmática com uma sólida formação técnica. Agradecemos a colaboração de Anne Chaise, secretaria-chefe da biblioteca da ESA pela identificação e envio de dados.
21 A neta do poeta parnasiano, professor, jornalista e político, João Cardoso de Meneses e Sousa, também conhecido como Barão de Paranapiacaba (1817-1915), Heloísa era muito presente em reuniões sociais e estava inserida em um meio ligado à arte e cultura. (Sá, op.cit., p. 189). Ainda se faz necessário uma pesquisa mais aprofundada para determinar as razões da vinda do casal para o Recife, pois não foram encontrados registros de obras de Palumbo nos primeiros anos na cidade. Entretanto, uma menção a uma parceria “Palumbo e Assis” no periódico Diário da Manhã como autora do projeto vencedor da concorrência para construção da Ponte Duarte Coelho em 1939 pode nos revelar uma pista. Acredita-se que o sobrenome “Assis” esteja relacionado ao construtor Francisco Lopes de Assis e Silva, responsável pela remodelação do Palácio do Governo de Pernambuco em 1920. A presença do escritório técnico de Assis, tanto no Recife quanto no Rio de Janeiro naquele período, pode ter sido a razão da vinda de Palumbo ao Recife.
22 Naslavsky, op. cit.
23 Cabral, op. cit.
24 Fernandes ( 1922 ).
25 Miranda, op. cit.
26 Menezes e Reinaux ( 1997 ).
27 Jornal Pequeno... ( 1923 ).
28 Nascido no Recife, Amaury de Medeiros (1893-1928) formou-se médico no Rio de Janeiro em 1916, onde atuou como pneumologista até ser convidado para assumir a chefia do Departamento de Saúde e Assistência de Pernambuco, em fevereiro de 1923, convidado por seu sogro, o governador Sergio Loreto. Esse departamento implementou uma ampla reforma dos serviços sanitários, com a criação de hospitais e postos de saúde, inspeções de imóveis, além de obras de drenagem de áreas alagadas e até mesmo uma incipiente política habitacional e assistencial. Medeiros foi ainda um defensor da arquitetura neocolonial como um estilo adequado às condições climáticas da região. Para uma visão de conjunto da obra dele no Recife ver Correia ( 2020 ).
29 Moreira, op. cit., p. 194
30 Segundo Miquelin ( 1992 ), em meados do século XIX, o hospital moderno surgiu no Brasil como fruto da passagem do modelo religioso para o modelo pavilhonar, seguindo forte influência das construções europeias, e, se estabeleceu até o começo do século XX, em resposta arquitetônica aos saberes e procedimentos médicos de uma época marcada pelos avanços da medicina. No século seguinte, passou a conviver com um número cada vez maior de edifícios monoblocos verticais (bloco único) de origem norte-americana, que surgem tendo como referência as novas tecnologias de construção, como o concreto armado, e o desenvolvimento dos equipamentos modernos, sendo considerado modelo até os dias atuais.
31 Pevsner ( 1997 , p. 151) cita que Jean-Baptiste Le Roy já havia sugerido em 1773 a criação de pátios, como uma “máquina para curar o doente” pela possibilidade de este gerar ventilação para os quartos, visto que ausência de ventilação era um dos principais motivos da alta mortalidade na época.
32 Jornal pequeno... ( 1923 ).
33 Ibid.
34 Ibid .
35 Freyre ( 1923 ).
36 Ibid .
37 Correia ( 2020 , p. 35).
38 Freyre ( 1979 , p. 272).
39 Freitas ( 1943 , p. 27) retrata que as primeiras tentativas de se criar uma escola médica no Estado remontam a 1895, quando o então Governador do Estado, Alexandre José Barbosa Lima, enviou ao Legislativo uma proposta de criação de uma escola médica, que foi rejeitada e retirada de pauta. Anos depois, em 1909, Octavio de Freitas, uma figura central para a estruturação dos serviços públicos de saúde em Pernambuco, organizou o Congresso Médico de Pernambuco, no qual alertou para a necessidade de se criar uma escola de medicina na cidade. Em 1914, Freitas estava entre o grupo de médicos locais que ensinavam na Escola de Farmácia e que iniciaram uma campanha visando a criação de uma escola de medicina no Estado.
40 Fundarpe ( 1985 ); Diário de Pernambuco... ( 1927 ).
41 Luís Cedro Carneiro Leão atuou como político, advogado, escritor e agricultor. Exerceu o mandato de deputado federal por Pernambuco entres os anos de 1921 a 1923, e 1933 a 1935 como deputado à Assembleia Nacional Constituinte. Uma das primeiras propostas para criação de instituições de proteção do patrimônio histórico foi apresentado por ele, em 1923, não chegando a se concretizar, ver CPDOC - Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil.
42 Azevedo, op. cit., p. 157-158. José Mariano Filho era médico de formação, defendia o retorno à arquitetura do passado colonial, que havia sido desenvolvido para se adequar ao clima, à cultura e às necessidades do Brasil. Mariano Filho ( 1924 , p. 161).
43 Alguns anos depois, o médico Aluízio Bezerra Coutinho demonstrou a necessidade da casa se adequar às condições locais e proporcionar ao usuário a satisfação das necessidades do corpo e do espírito, ou seja, ser uma moradia racional e higiênica. Ele buscou lançar diretrizes para o projeto de uma habitação higiênica para os países quentes, a partir da adaptação das vantagens climáticas das casas tradicionais às concepções, materiais e técnicas modernas. Coutinho ( 1930 ).
44 Menezes ( 2019 ).
45 Segundo Patetta ( 1987 ), Trigueiro ( 1986 , p. 118) e Moreira, op.cit. , p. 197 era o estilo que representava uma cultura burguesa em ascensão que dava primazia ao conforto o que demandou plantas mais complexas, interiores mais sofisticados e instalações sanitárias modernas. No Brasil o ecletismo alterou os padrões construtivos das residências da elite local e trouxe novidades com elementos estilísticos estranhos do norte da Europa, como o arco ogival, elementos de chalés suíços, artefatos em ferro e vidro e jardins afrancesados cercados por gradis.
46 Barreto, op. cit.
47 Ibid .
48 Ibid .
49 Ibid.
50 Reis Filho ( 2006 , p. 173-174).
51 As poucas informações encontradas sobre Annita Cherques revelam que era oriunda da comunidade judaica local, foi empresária no ramo de confecções e teve um filho chamado Jorge Cherques (1928-2011) nascido já no Rio de Janeiro. Jorge era ator e professor de interpretação, tendo atuado em várias telenovelas. Em 1939, Annita Cherques foi convidada pelo Governo do Estado da Bahia a orientar 20 mulheres na cidade do Rio de Janeiro para organizar um Instituto Industrial Feminino na Bahia, o chamado Instituto Industrial Feminino Visconde de Mauá, ver Tradicional e Moderna... ( 1939 ).
52 Os terrenos do Derby.… ( 1924 ).
53 Cantarelli (2020, p. 28).
54 Reynaldo ( 2017 , p. 137-139).
55 Reis Filho, op. cit, p. 146.
CORTEZ, Karine Maria Gonçalves; MOREIRA, Fernando Diniz. A contribuição de Giacomo Palumbo para a formação do subúrbio moderno recifense, 1922-1934. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, São Paulo, v. 32, p. 1-31, 2024.

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