Secciones
Referencias
Resumen
Servicios
Descargas
HTML
ePub
PDF
Buscar
Fuente


Processo de inovação: estudo de caso da adoção do sistema de produção de arroz orgânico vinculada ao NEMA
Process of innovation: a case study of the adoption of organic rice production system linked to NEMA
Revista de Administração da Universidade Federal de Santa Maria, vol. 9, núm. 2, pp. 262-279, 2016
Universidade Federal de Santa Maria


Recepção: 30 Janeiro 2014

Aprovação: 03 Junho 2015

DOI: https://doi.org/10.5902/19834659

Resumo: O agronegócio do arroz, no Rio Grande do Sul, vem enfrentando pelo menos dois problemas: o baixo preço da saca de arroz pago ao produtor e os impactos ambientais provocados pela lógica da produtividade. Estas duas problemáticas remetem para a discussão sobre a adoção de novas tecnologias, tais como a adoção da agricultura orgânica. Nesse sentido, a Teoria Evolucionária busca compreender o processo de mudança tecnológica, abordagem teórica na qual se destaca o framework micro-meso-macro. Diante disso, este artigo busca explicar a inovação como resultado de um processo que se insere em uma estrutura multinível de regras, que evolui ao longo do tempo. A partir dessa abordagem, fez-se a seguinte pergunta de pesquisa: quais são as regras da estrutura multinível que estão contribuindo para a adoção do sistema de produção orgânico associado ao Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (NEMA)? Para isso, foi utilizado o método de estudo de caso, abordado sob uma perspectiva essencialmente qualitativa. Os resultados permitiram evidenciar a importância de incluir “ONGs” e “empresas de pesquisa” como atores “estruturantes” e o “governo” como criador de “demandas específicas”, bem como de analisar os “recursos naturais” como possíveis “barreiras” para a adoção do sistema de produção de arroz orgânico. Em relação à dinâmica das regras, os resultados fornecem um primeiro indicativo da evolução destas ao longo do processo de adoção de novos sistemas de produção.

Palavras-chave: Inovação, Micro-meso-macro, Evolução, Orgânicos, Arroz.

Abstract: The rice agribusiness in Rio Grande do Sul state is facing at least two major problems: the low price of the rice bag paid to the producer and the environmental impacts caused by the logic of productivity. These two issues are related to the discussion on the implementation of new technologies, as: the adoption organic agriculture. In this sense, evolutionary theory seeks to understand the process of technological change. Within this theoretical approach, the framework micro-meso-macro is highlighted. This one attempts to explain innovation as the result of a process involving a multilevel structure of rules, which evolves over time. In this context, the following research question is made: what are the rules of multilevel structures that are contributing to the adoption of organic production system associated with the Center for Environmental Education and Monitoring (NEMA)? The results have highlighted the importance of including “NGOs” and research firms as actors “structuring”; the “government” as the creator of “specific demands”; as well as to analyze the “natural resources” like possible “barriers” to the adoption of organic rice production system. Regarding the dynamics of the rules, the results give a first indication of the evolution of these over the adoption of new systems of production process.

Keywords: Innovation, Framework Micro-meso-macro, Evolution, Organic, Rice.

1 INTRODUÇÃO

O Brasil está entre os dez maiores produtores de arroz no ranking mundial, com uma produção anual que varia entre 11 e 13 milhões de toneladas, o que o torna responsável por aproximadamente 82% da produção arrozeira do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) (SOSBAI, 2010). O Rio Grande do Sul é o estado com a maior produção orizícola do país, representando aproximadamente 64,4% da orizicultura brasileira. Em média, a produtividade do estado gaúcho está em torno de 8,3 mil quilos por hectare (BRASIL, 2011).

Porém, o agronegócio do arroz, no Rio Grande do Sul, vem enfrentando dois grandes problemas. Um deles consiste no baixo preço da saca de arroz pago ao produtor. Em uma análise de série temporal entre 1975 e 2010 do preço do arroz, identificou-se uma queda de 4,0% ao ano, e a projeção é de que essa baixa continue (SOSBAI, 2010). Nesse contexto, o aumento da produtividade foi a alternativa que os órgãos de pesquisa do Rio Grande do Sul encontraram para solucionar a problemática dos preços baixos. Com isso, o Estado passou de uma produção de 6.493.634 milhões de toneladas, em 2006/2007, para 8.047.897 milhões de toneladas, em 2008/2009 (PIRES, 2010).

O segundo problema enfrentado pelo agronegócio orizícola do Rio Grande do Sul, não menos importante, está associado ao aumento da produtividade arrozeira. A estratégia para o aumento da produtividade implica, geralmente, a adoção de inovações associada a novos fertilizantes, máquinas e agrotóxicos (PEDLOWSKI et al., 2006). Essa estratégia faz com que aumente, consideravelmente, a probabilidade de contaminação das águas, além de causar a perturbação dos processos ecológicos, podendo, ainda, ocasionar sérios problemas de saúde tanto para os produtores quanto para os consumidores, conforme a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, 2002).

Alguns dos danos derivados da ênfase na produtividade têm sido demonstrados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), por meio do “Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxico em Alimentos”. A vigilância reportou que no arroz, por exemplo, foram evidenciados 26,5% de componentes irregulares, o que indica uma situação crítica diante de notícias que mostram que muitas doenças vêm sendo relacionadas à presença de agrotóxicos nos alimentos (TEIXEIRA, 2011).

A preocupação com o excessivo uso de agrotóxicos é uma consequência direta de um maior cuidado da sociedade em geral com o meio ambiente, com o desenvolvimento sustentável (PINSKY; DIAS; KRUGLIANSKAS, 2013) e com a inovação sustentável (KNEIPP et al., 2011). Uma vez que as organizações em geral e as empresas em particular são cada vez mais impelidas a inovar, realizar o processo inovativo de modo a proteger o meio ambiente torna-se uma necessidade salutar, como bem colocam Oliveira e Silva (2012).

Esse contexto fez aumentar a busca por um cultivo de arroz ambientalmente melhor e com maior rentabilidade para os agricultores. Uma possibilidade de evolução e mudança, nesse sentido, é a adoção da produção orgânica de arroz, que cada vez mais é considerada vantajosa, tanto para preservar o meio ambiente quanto para evitar o consumo de alimentos com agrotóxicos.

A agricultura orgânica é um sistema holístico de gestão de produção que fomenta e melhora a qualidade do agroecossistema, em particular a biodiversidade, os ciclos biológicos e a atividade biológica do solo (FAO/OMS, 2007). Os sistemas de produção orgânica baseiam-se em normas de produção específicas e precisas, cuja finalidade é contribuir para que os agroecossistemas sejam sustentáveis do ponto de vista social, ecológico, técnico e econômico. No Brasil, o conceito de agricultura orgânica está definido no artigo 1º da Lei n.º 10.831, de 23 de dezembro de 2003, que caracteriza um sistema orgânico de produção agropecuária como aquele em que se adotam “[...] técnicas específicas, [...] empregando sempre que possível, métodos culturais, biológicos e mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, a eliminação do uso de organismos geneticamente modificados e radiações ionizantes [...]” (BRASIL, 2003, p. 1). Um exemplo de produção orgânica é conduzido pelo Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (NEMA), que coordena cinco produtores de arroz orgânico, distribuídos em uma área de 160 hectares.

As inovações que sustentaram o crescimento da produtividade até os dias atuais, predominantemente, ocorreram com base no modelo de inovação induzida. Nesse modelo, o desenvolvimento rural acontece, principalmente, por meio das ações das instituições, sobretudo do setor público, que tem importante participação na criação e no incentivo de tecnologias de pouco interesse para o setor privado (GOMES, 1986). Esse modelo, somado às atividades de desenvolvimento do meio rural, durante a década de 70, serviu de base para a expansão do padrão de modernização do setor agrícola, por meio de ações públicas que deram origem à chamada “Revolução Verde” (MACHADO, 1998). Embora esse modelo de inovação tenha possibilitado forte progresso técnico, há muitas críticas a respeito de suas limitações, como, por exemplo, a maneira mecânica de lidar com o processo de inovação. Além disso, por priorizar a preservação dos fatores de produção agrícola, esse modelo é considerado produtivista (MACHADO, 1998).

Essas críticas sugerem uma perspectiva evolucionária para compreender esse processo de mudança tecnológica. A mudança tecnológica, dentro de um processo evolucionário de inovação, segue uma trajetória própria e, por estar relacionada à acumulação do conhecimento e de experiências, caracteriza-se por path dependence (CORAZZA; FRACALANZA, 2004). Logo, essa perspectiva compreende a mudança como um processo e leva em conta o conhecimento dos indivíduos e das organizações locais interessadas. Dentro dessa abordagem teórica, destaca-se o framework micro-meso-macro, que busca explicar a inovação (como é o caso da adoção do sistema de produção orgânica), como o resultado de um processo que envolve uma estrutura multinível de regras, que evolui ao longo do tempo. Nesse sentido, ressalta-se, ainda, que a regra é definida como um esquema dedutivo que favorece o acontecimento das operações econômicas (DOPFER; FOSTER; POTTS, 2004; DOPFER, 2005).

Considerando a necessidade de sistemas de produção mais benéficos ao meio ambiente e, ao mesmo tempo, com perspectivas evolucionárias de inovação, faz-se a seguinte pergunta de pesquisa: qual é a estrutura multinível de regras que contribui para a adoção do sistema de produção orgânico associado ao NEMA? Dessa forma, estabeleceu-se como objetivo geral descrever a dinâmica de regras multiníveis associadas à adoção do sistema de produção orgânico de arroz pelos produtores coordenados pelo NEMA.

Ao responder a questão de pesquisa, este artigo quer contribuir para a aplicação do framework micro-meso-macro no entendimento da transição de sistemas agrícolas e para a identificação da estrutura de regras multiníveis no contexto da adoção da tecnologia de produção orgânica de arroz. Em termos empíricos, esta pesquisa espera colaborar com os produtores pesquisados e com o NEMA, no que diz respeito ao desenvolvimento de um sistema de produção ambientalmente mais adequado. Além disso, busca, também, contribuir com a possibilidade do arroz orgânico se tornar uma alternativa de valorização do produto, permitindo aos consumidores escolher alimentos mais saudáveis. Por fim, os resultados desta pesquisa podem auxiliar a elaboração de políticas públicas de fomento à produção orgânica.

Para isso, procurou-se organizar este artigo da seguinte forma: na seção 2, é discutida a abordagem do framework micro-meso-macro. Na seção 3, é apresentada a metodologia adotada. Na seção 4, realiza-se a discussão dos resultados encontrados sobre o processo de adoção do sistema orgânico coordenado pelo NEMA, com destaque para as regras identificadas em cada uma das fases de evolução do processo de adoção do sistema orgânico e para as alterações que ocorreram entre as fases. Por fim, na seção 5, são apresentadas as considerações finais.

2 FRAMEWORK MICRO-MESO-MACRO

O framework micro-meso-macro surge como um framework genérico, que possui o objetivo de satisfazer os estudos científicos sobre o comportamento evolutivo dos sistemas econômicos (DOFPER; FOSTER; POTTS, 2004; DOPFER, 2005). Há quatro elementos estruturais e principais dessa teoria: mente, regras, habilidades dos condutores das regras e trajetórias. O primeiro elemento consiste no reconhecimento de que a mente humana é o primeiro ponto do sistema econômico, onde se originam, se adotam e se retêm as regras.

O segundo elemento estrutural da teoria micro-meso-macro é o conceito de regras. As regras de ordem zero são representadas pelas regras constitucionais do sistema e indicam as normas legais ou informais enraizadas no contexto cultural em que o condutor de regras está inserido. As regras de primeira ordem, por sua vez, são aquelas de que o condutor faz uso para criar valor. Uma regra genérica ou de primeira ordem é um procedimento dedutivo que orienta as atividades operacionais. O termo dedutivo, nesse contexto, visa incorporar um conjunto de termos como heurísticas, designs, esquemas lógico-dedutivos, regras legais, estratégias etc. (DOPFER, 2005). A regra genérica especifica “o que fazer” e “como combinar as coisas”, e é esse conhecimento que, combinado com recursos, produz valor (DOPFER; POTTS, 2009). As pessoas ou os grupos de pessoas possuem suas regras genéricas comuns, as quais são cristalizadas em um corpo de entendimento e em um corpo de prática (DOPFER, 2005). O processo de aquisição das regras genéricas é a unidade central do princípio dinâmico da economia evolucionária e ocorre por meio das trajetórias de evolução, segundo as fases de origem, adoção e retenção (DOPFER; POTTS, 2009). Essas fases serão discutidas em detalhes ainda nesta seção, junto ao conceito de meso-trajetória. Já as regras de segunda ordem são específicas para o desenvolvimento de novas ideias, versando sobre como aprender, adotar, adaptar e reter um novo conhecimento. Essas regras induzem o condutor de regras genéricas para o mundo exterior (DOPFER; POTTS, 2009).

O terceiro elemento diz respeito à habilidade dos condutores de regras para realizar suas operações e criar valor. As operações podem ocorrer sob múltiplas formas, como, por exemplo, incorporadas na produção de bens de capital, socialmente em redes ou internamente nos hábitos de ação e/ou nas rotinas mentais. As regras genéricas e seus condutores são definidos como uma unidade meso do sistema econômico (DOPFER; POTTS, 2009). Nesta pesquisa, os condutores são os produtores rurais, e a unidade meso foi delimitada pelo grupo de produtores que aceitaram o desafio de produzir no sistema orgânico coordenado pelo Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (NEMA).

Por fim, o quarto elemento é a mesotrajetória. Ela se baseia no processo pelo qual as mesounidades emergem, formam-se e se estabilizam (DOPFER; POTTS, 2009), podendo ser descrita em níveis micro, meso e macro (DOPFER; FOSTER; POTTS, 2004; DOPFER, 2005; DOPFER; POTTS, 2009). As regras genéricas e seus condutores são definidos como as mesounidades do sistema econômico. O termo meso não é utilizado aqui em um sentido classificatório ou de recortes de sistemas econômicos, como ocorre, por exemplo, com as expressões clusters ou distritos industriais, mas no sentido de identificar e conceituar os elementos que constroem e fazem evoluir um sistema econômico (DOPFER; FOSTER; POTTS, 2004).

A base dessa análise das mesounidades é o nível micro que trata de uma ou mais regras genéricas, sendo conduzido por um condutor de regras. Micro é o domínio dos condutores de regras genéricas. Pode-se dizer que, assim, a discussão em nível micro é sobre como um condutor inserido no sistema econômico usa as regras genéricas e como são os processos pelos quais essas regras mudam. Especificamente, essa discussão trata sobre o modo como os condutores originam, adotam, adaptam e retém uma nova regra genérica. De uma perspectiva evolucionária, cada condutor encontra-se engajado continuadamente na solução de um problema que resulta na construção e manutenção de um sistema complexo de regras (DOPFER; FOSTER; POTTS, 2004). O nível macro, por sua vez, é definido como uma estrutura que junta todas as mesounidades, constituindo um todo, em um estado de equilíbrio genérico de coordenação (DOPFER; POTTS, 2009).

A evolução da trajetória de uma mesounidade é estruturada em três fases: meso 1, que corresponde à “origem”, meso 2, que considera a “adoção” e meso 3, que representa a “retenção”. As três fases são decompostas nos níveis micro e macro. No nível meso 1, há a origem e a inserção de um conhecimento novo na organização. Durante a meso 2, acontecem na organização a adoção, a acomodação e a propagação da nova regra genérica. E a meso 3 é a parte final da mesotrajetória, que envolve manutenção, replicação e retenção da nova regra genérica (DOFPER; FOSTER; POTTS, 2004).

A Figura 1, exposta a seguir, apresenta um modelo simplificado de um agente condutor de regras genéricas.


Figura 1
Hierarquia de regras de uma agência inserida em um sistema econômico
Dopfer e Potts (2009).

A Figura 2, por sua vez, apresenta as regras de ordem zero e de segunda ordem associadas ao processo de inovação, com base nos estudos de Dias (2011), Pedrozo, Dias e Abreu (2012) e Dias, Pedrozo e Silva (2014). Para a elaboração da Figura 2, esses autores identificaram quais são as regras associadas ao processo de inovação, independentemente do objeto do processo de inovação, a partir de uma revisão das diversas abordagens teóricas sobre inovação.

Como regras de ordem zero ou constitucionais, Dias (2011) e Pedrozo, Dias e Abreu (2012) identificaram as regras “dinamismo do conhecimento”, “potencial estruturante” e “especificidade da demanda”. Cada uma dessas regras de ordem zero possui subdivisões, que representam a intensidade da regra. Tais subdivisões são denominadas pelos autores de categorias.

Na mesma lógica, os autores identificaram as regras de segunda ordem, que foram denominadas de “aquisição”, “reconfiguração”, “implantação”, “condições promotoras” e “barreiras (externas, organizacionais e internas)”. Da mesma forma como ocorre nas regras de ordem zero, cada uma dessas regras possui subdivisões que foram denominadas pelos autores de categorias. Um maior detalhamento de cada uma das regras em seus diferentes níveis pode ser encontrado no trabalho original de Pedrozo, Dias e Abreu (2012).


Figura 2
Estrutura multinível das regras para inovação – o todo
adaptado de Dias (2011) e de Pedrozo, Dias e Abreu (2012).

3 METODOLOGIA

O método de pesquisa utilizado foi o estudo de caso. Essa metodologia foi escolhida por ser adequada para examinar acontecimentos contemporâneos (YIN, 2010). Caracterizou-se como uma pesquisa de abordagem qualitativa, pois buscou verificar e descrever a dinâmica de regras que estão contribuindo para a adoção da tecnologia de produção orgânica de arroz. A unidade de análise deste estudo foi o conjunto de produtores de arroz orgânico coordenados pelo Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (NEMA).

A coleta de dados ocorreu por meio de entrevistas, tanto semiestruturadas quanto não estruturadas, realizadas com produtores pertencentes ao sistema de produção orgânica de arroz do NEMA, de documentos e de observação direta. Segundo Yin (2010), a entrevista é uma das mais importantes fontes de informações para a elaboração de um estudo de caso. A partir das entrevistas, foram fornecidos documentos, assim como foi feita a observação direta da área de abrangência da rede de produtores. Para facilitar a análise, foi realizada a transcrição de todas as entrevistas. Como os entrevistados não autorizaram a identificação completa, inclusive a divulgação dos nomes, utilizou-se apenas uma sigla para identificá-los. Essa sigla aparece descrita a seguir na coluna “Entrevistado” (Quadro 1).

Quadro 1
Informações sobre os entrevistados e a realização das entrevistas.

elaborado pelos autores.

Os dados foram analisados por meio da análise de conteúdo (BARDIN, 1977), a qual pode ser definida como um conjunto de procedimentos que englobam as fases de classificação, codificação e categorização dos conceitos. A metodologia da análise de conteúdo é dividida, principalmente, em três partes: a pré-análise; a exploração do material e o tratamento dos resultados; e a inferência e a interpretação (BARDIN, 1977). Para realizar esta análise, foi utilizado osoftware NVivo.

O primeiro objetivo específico desta pesquisa consistiu na identificação e na descrição das fases de evolução da adoção do sistema orgânico. A adoção do sistema de produção orgânico foi definida como regra genérica ou de primeira ordem em evolução. Este sistema foi assim definido porque os produtores rurais fazem uso dele para criar valor à sua atividade e porque ele é constituído de normas que orientam as atividades operacionais destes produtores. Para atender a esse objetivo específico, utilizaram-se as variáveis tempo e área.

Como segundo objetivo específico, pretendeu-se identificar as regras de ordem zero e de segunda ordem, a fim de associá-las a cada uma das fases da evolução de adoção do sistema orgânico. Para atender a esse objetivo específico, buscou-se codificar as regras de ordem zero e de segunda ordem e associá-las a cada uma das fases.

As categorias de análise utilizadas foram as categorias de regras da proposição de Dias (2011) e Pedrozo, Dias e Abreu (2012), apresentadas na Figura 2. Para isso, levantou-se a cobertura de cada categoria, fator que representa o percentual de determinada categoria considerando-se todas as categorias presentes nos dados coletados. Uma categoria foi considerada com maior influência quando sua cobertura foi superior a 1,5 vez a média geral de todas as categorias.

4 RESULTADOS

4.1 HISTÓRICO DA REDE DE PRODUTORES ORGÂNICOS COORDENADOS PELO NEMA

Em meados de 1985, alunos do curso de Oceanografia da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), em parceria com a Autarquia do Balneário Cassino (ABC), fundaram o Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (NEMA) em Rio Grande, Rio Grande do Sul, com a proposta de juntar o conhecimento científico de sua equipe com o conhecimento empírico da comunidade local em trabalhos de educação e monitoramento ambiental (Entrevistado REVICA). Em 1987, o NEMA passou a ter personalidade jurídica, sendo caracterizado como uma associação privada sem fins lucrativos e de utilidade pública municipal.

A atuação do NEMA na produção de arroz orgânico começou em 2002, quando o Governo Federal lançou um edital para a elaboração de planos de desenvolvimento sustentável no entorno de unidades de conservação. O NEMA participou desse edital em parceria com a comunidade do entorno da unidade de conservação do Taim nas cidades de Rio Grande e Santa Vitória do Palmar, no Rio Grande do Sul. Na etapa de elaboração da sua proposta, o NEMA pesquisou os produtores e a comunidade para identificar os principais problemas.

No momento em que o NEMA teve sua proposta aprovada no Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira (PROBIO), foram estabelecidas cinco ações prioritárias à sustentabilidade das áreas de entorno do Taim, incluindo iniciativas ecológicas de produção agropecuária (BRASIL, 2004). Nessa direção, o NEMA indicou a produção do arroz orgânico, pois a produção convencional dessa cultura é vista como conflituosa com a conservação ambiental. Dessa forma, essa sugestão foi identificada mais como uma estratégia de conservação do que como uma estratégia comercial, já que o objetivo do NEMA não é comercial, mas ambiental (Entrevistado REVICA).

A evolução da área plantada e da produção pode ser vista na Figura 3. A primeira safra foi no ano de 2003/2004, identificada como a fase de origem de adoção do sistema orgânico. Nesse ano, o grupo coordenado pela NEMA contava com seis produtores envolvidos, e a área plantada foi de 6,5 hectares. A ideia passou a ser adotada progressivamente nas três safras seguintes. Na safra de 2004/2005, a área plantada cresceu para 14,7 hectares, índice ampliado para 45,1 hectares na safra de 2005/2006. Já na safra 2006/2007, a área plantada foi de 124,7 hectares. Nas duas safras seguintes, ocorreu um declínio da área plantada. Em 2007/2008, a área plantada diminui para 91,45 hectares. E em 2008/2009, a redução foi ainda maior, chegando a 71,4 hectares. O sistema entrou em um período de readoção nas duas safras posteriores, de modo que, na safra de 2009/2010, a área plantada chegou a 142 hectares e, na safra de 2010/2011, atingiu 229 hectares (Entrevistado GIGOTE).


Figura 3
Evolução da produção de arroz orgânico de acordo com a área plantada.
elaborado pelos autores

Nas três primeiras safras (2003-2006), período de vigência do projeto aprovado pelo NEMA, o grupo de produtores recebeu apoio financeiro para custear toda a produção orgânica, o que tornou mais atrativa a entrada dos primeiros produtores nesse sistema de produção. Para a safra seguinte, o NEMA conseguiu novo apoio do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), agora com a finalidade de capacitação e treinamento do grupo de produtores (Entrevistado REVICA).

Um fator restritivo à adoção mais ampla do sistema orgânico é o solo. Solos degradados, por terem sido utilizados anteriormente para a produção convencional, foram impeditivos. A restrição ocorre por uma maior incidência de ervas daninhas em solos degradados, o que compromete a produtividade da lavoura orgânica, já que não é possível a utilização de produtos herbicidas no cultivo orgânico (Entrevistado EVRINEQUA). Nesse caso, fez-se necessário um período de pousio do solo, que dura em média três anos, para possibilitar a transição entre os sistemas.

Essa restrição exige do produtor a habilidade de conhecer e desenvolver em sua propriedade outras atividades agrícolas com o propósito de manter a sua renda. Geralmente, nas propriedades agrícolas em que se planta arroz, esta é a única atividade desenvolvida, motivo pelo qual os produtores que não tinham condição de exercer atividades alternativas nesse período não aderiram à tecnologia ou não conseguiram incorporar novas áreas ao sistema (Entrevistado GIGOTE).

O grupo de produtores coordenado pelo NEMA recebe apoio técnico do Instituto Rio Grandense do Arroz (IRGA), da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER) e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), que ocorre por meio de fóruns coletivos, em que essas instituições discutem e ensinam sobre as técnicas de produção do arroz orgânico (Entrevistado GIGOTE). Porém, esse grupo declarou que não recebe nenhum tipo de apoio na experimentação agrícola local ou no acompanhamento das lavouras para os problemas técnicos identificados pelo grupo por parte dessas instituições. O grupo conta com um engenheiro agrônomo, que atualmente também é um produtor. Uma tentativa do grupo para suprir a lacuna de experimentação científica é a realização de dias de campo nas propriedades em épocas de pré e pós-colheita, quando se analisam experiências próprias e se discutem os possíveis planos de ações para a safra. Entretanto, o grupo conclui que eles nem sempre possuem o conhecimento e os recursos necessários para chegar a alguma conclusão acerca dos resultados obtidos (Entrevistado REVICA).

A comercialização nas duas primeiras safras foi realizada, exclusivamente, para a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB). A operacionalização ocorreu pela atuação da Cooperativa Sul Ecológica e do Centro de Apoio ao Agricultor (CAPA), que adquiriam a produção e a distribuíam, juntamente com a Prefeitura de Pelotas, para pessoas em situação de risco ou em situações de necessidade, como, por exemplo, para creches, asilos e escolas. Nesse período, o grupo de produtores recebeu 30% a mais pelo seu produto, em comparação do valor do produto do sistema convencional. A partir da safra de 2005/2006, o NEMA não conseguiu vender para a CONAB e, como consequência, teve de vender todo o seu arroz orgânico sem diferenciação alguma, recebendo, portanto, o mesmo valor pago pelo arroz produzido pelo sistema convencional. Esse fato criou apreensão no grupo quanto à viabilidade da produção orgânica. Na tentativa de solucionar o problema de comercialização, os produtores coordenados pelo NEMA tentaram vender sua produção por meio de uma marca própria, que foi denominada de “Amigo do TAIM”. Todo o armazenamento e o beneficiamento foram realizados em instalações próprias do grupo de produtores.

Na busca por novas soluções para os problemas de comercialização, deu-se início, ainda no decorrer da safra de 2006/2007, a uma parceria com a empresa Josapar, que passou a beneficiar a produção e a embalar a marca Amigo do TAIM. Quatro ações de melhorias foram identificadas a partir da efetivação dessa parceria. A primeira delas foi a necessidade de mudar a tecnologia das embalagens para um sistema a vácuo, com o propósito de aprimorar o acondicionamento e aumentar a vida útil do produto. A segunda foi a necessidade de conquistar a Certificação Orgânica, que veio a ser obtida junto à empresa certificadora de conformidade de orgânicos, ECOCERT® Brasil.

A terceira necessidade de melhoria dizia respeito à remuneração do preço do saco do arroz e às atribuições de cada um dos agentes. Para a definição do preço, se adotaria a regra de 45% a mais sobre o preço do saco do arroz convencional (desse montante, 30% seriam destinados ao produtor, e 15% seriam pagos ao NEMA). O produtor teria de acatar as normas da certificadora, e o NEMA se responsabilizaria pelo acompanhamento da produção e do processo de certificação. A partir desse acerto, toda a comercialização da produção de arroz orgânico do NEMA seria vendida para a Josapar.

A quarta ação de melhoria consistia na necessidade de ampliar a comercialização por meio de outras marcas de arroz orgânico existentes. Nesse sentido, a produção do grupo do NEMA também seria comercializada por meio de duas outras marcas da própria Josapar: Tio João Integral Orgânico e Taeq. A marca Amigo do TAIM ficou reservada para comercialização pelo próprio NEMA e passou a ser considerada como institucional pelo grupo de produtores coordenado pelo NEMA (Entrevistado REVICA).

Com essa nova parceria e as ações empreendidas, observou-se que, na safra de 2010/2011, a demanda da Josapar ao grupo de produtores do NEMA foi maior que a produção realizada pelos produtores (Entrevistado REVICA). Por outro lado, com as normas de certificação, ocorreram também novas restrições à produção. A primeira delas diz respeito ao manejo da água. A lavoura orgânica deve ser sempre a primeira a receber água, para não ser contaminada por produtos químicos utilizados nas outras plantações. A segunda consiste na limpeza do maquinário (Entrevistado REVICA). Os equipamentos devem ser todos devidamente limpos. Por exemplo, o pulverizador deve ser exclusivo para a lavoura orgânica, ou seja, não é possível usar para orgânicos um mesmo equipamento que já foi utilizado para pulverizar uma produção convencional, o que exige mais investimentos (Entrevistados EVRINEQUA e LAKA). A terceira refere-se à logística, de modo que o caminhão transportador da produção, por exemplo, deve ser bem higienizado para evitar contaminação. Essas novas restrições, principalmente quanto à necessidade de captar a primeira água da fonte, implicaram uma redução da área de produção nas safras de 2007/2008 e de 2008/2009.

4.2 AS REGRAS MULTINÍVEIS ENCONTRADAS NO PROCESSO DE ADOÇÃO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO ORGÂNICO

Esta etapa tem o propósito de identificar as regras de segunda ordem e de ordem zero, as condições promotoras e as barreiras associadas à evolução na adoção do sistema orgânico de produção de arroz da rede de produtores coordenados pelo NEMA.

4.2.1 Regras de ordem zero – dinamismo da produção do conhecimento, potencial estruturante e especificidade da demanda

Esta etapa teve o propósito de identificar as regras de ordem zero, associadas à adoção do sistema de produção orgânico. As categorias identificadas e as passagens nomeadas na análise das entrevistas e dos documentos podem ser vistas no Quadro 2, exposto a seguir.

Os resultados indicaram a presença de regras de ordem zero ligadas a especificidades da demanda. Como foram verificadas demandas específicas de diferentes organizações, classificaram-se estas em especificidades dos “consumidores” e do “governo”.

Quadro 2
Regras de ordem zero associadas ao sistema de produção orgânico do NEMA.

elaborado pelos autores.

Na análise das categorias de regras de ordem zero relacionadas às regras com potencial estruturante, foram encontradas categorias ligadas às “regulamentações ou políticas públicas”. Associadas a essas políticas públicas, foram evidenciados “atores públicos” e “privados” interessados em colaborar para a operacionalização dessas normas. Quanto às categorias relacionadas à presença de atores pouco sensitivos à atividade econômica da rede, foi relatada a presença desse comportamento nas “instituições de pesquisa”. Quanto à análise das categorias de regras de ordem zero relacionadas ao dinamismo da produção de conhecimento, constatou-se este fator como estável, com incremento baseado na experiência acumulada.

Nesse sentido, ao se comparar o framework proposto por Dias (2011) e Pedrozo, Dias e Abreu (2012) (Figura 2) com as regras de ordem zero encontradas no caso estudado (Quadro 2), pode-se constatar que não houve nenhuma nova regra de ordem zero. Já em relação às categorias associadas às regras de ordem zero, verificou-se no caso estudado a importância de se incluir organizações não governamentais (“ONGs”) e “empresas de pesquisa” como atores “estruturantes” e o “governo” como criador de “demandas específicas” ao processo de inovação do sistema de produção de arroz orgânico.

4.2.2 Regras de segunda ordem − aquisição, reconfiguração e implantação do conhecimento

Quanto às regras de segunda ordem ligadas à aquisição do conhecimento, foram identificadas as categorias “atividades para conhecer a realidade local”, “atividades para conhecer novas informações externas” e “atividades para conhecer informações internas”. As “atividades ligadas ao desenvolvimento de novos produtos ou processos” estiveram associados aos experimentos realizados pelos grupos de produtores. Em relação às regras de segunda ordem ligadas à reconfiguração, foram encontradas “coespecialização” e “atividades de aprendizagem”.

Quadro 3
Regras de aquisição, reconfiguração e implantação associadas ao sistema de produção orgânico do NEMA.

elaborado pelos autores.

Ao comparar o framework proposto por Pedrozo, Dias e Abreu (2012) e Dias (2011) (Figura 2) com as regras encontradas no caso estudado (Quadro 3), pode-se constatar que não houve nenhuma nova regra ou categorias de segunda ordem associadas à aquisição, reconfiguração e implantação do conhecimento.

4.2.3 Regras de segunda ordem − condições promotoras e barreiras

A única barreira encontrada foi associada aos “procedimentos do passado” de conduzir a propriedade agrícola como uma monocultura do arroz. Foi identificada, também, uma nova categoria denominada de “recursos naturais”, relatada pelos entrevistados como uma barreira à produção orgânica, principalmente pelas condições atuais dos solos para a produção de arroz e pelas exigências para a certificação. Em relação às condições promotoras, somente foi identificada a categoria “intenção”, que foi desdobrada em “intenção ecológica” e “financeira”.

Quadro 4
Condições promotoras e barreiras associadas ao sistema de produção orgânico do NEMA.

elaborado pelos autores

4.3 DINÂMICA DA ESTRUTURA DE REGRAS MULTINÍVEIS

Em uma análise mais geral, o Quadro 5 indica a presença de múltiplas regras e categorias associadas, tanto de ordem zero quanto de segunda ordem, para cada fase da adoção do sistema de produção orgânico. Também se pode verificar que nem todas as regras estão presentes em todas as fases, assim como nem todas as regras presentes indicaram o mesmo grau de influência.

Quadro 5
Grau de presença das regras, barreiras e condições promotoras associadas ao sistema de produção orgânico do NEMA.

Legenda: P −> Presente; P+ −> Presente com maior influência; A −> Ausente.

elaborado pelos autores

No intuito de caracterizar a dinâmica dessas regras, realizou-se uma análise horizontal das regras que sofreram mudança entre as fases de evolução (Quadro 6).

Quadro 6
Regras e categorias selecionadas que se alteraram no processo de adoção do sistema de produção orgânico.

Legenda: + −> aumento da influência; - −> redução da influência; = −> sem alteração na influência

elaborado pelos autores

A transição da fase de origem para a adoção caracteriza-se por alterações na regra de aquisição. Durante a fase de adoção, ainda nessa regra, observou-se a presença de “atividades para conhecer informações internas” e de “atividades para conhecer informações externas” e a ausência de “atividades para conhecer a realidade local”. Na mesma transição, apesar de presentes, foi observada menor influência dos “atores públicos” e das “políticas públicas” ligadas à regra potencial estruturante.

A transição da fase de adoção para o declínio, por sua vez, caracteriza-se por alterações na regra de barreiras. Nessa regra, durante a fase de declínio, identificou-se, embora presente nas fases anteriores, maior influência dos “procedimentos passados” e dos “recursos naturais – água, solo e quantidade de terra”. Na mesma fase de transição, pode-se observar que ocorreram mudanças na regra de reconfiguração, em que “coespecialização”, embora já presente na fase de adoção, tornou-se presente com maior influência na fase de declínio. Também ocorreram alterações com a regra de potencial estruturante. Nessa regra, no período da fase de declínio, fizeram-se presentes os “atores privados de comercialização interessados” e tornaram-se ausentes os “atores públicos de comercialização interessados” e as “políticas públicas”. Ainda nessa mesma transição, a regra de especificidade da demanda sofreu alterações. Nessa regra, apesar de presente nas fases anteriores, observou-se maior influência de “consumidores”, bem como incremento da especificidade do “Governo”.

Já a transição da fase de declínio para readoção se caracteriza por alterações na regra de barreiras. Na fase de declínio, identificou-se que, embora continuassem presentes, os “procedimentos passados” e “recursos naturais” – água, solo e quantidade de terra –, que eram mais influentes, passaram a ser menos influentes.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo teve como objetivo geral descrever a dinâmica das regras multiníveis associadas à adoção do sistema de produção orgânico de arroz pelos produtores coordenados pelo Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (NEMA). Nesse sentido, ao comparar o framework proposto por Pedrozo, Dias e Abreu (2012) e Dias (2011) (Figura 2) com as regras encontradas no caso estudado (Quadro 5), pode-se constatar que não houve nenhuma nova regra de ordem zero ou de segunda ordem. Já em relação às categorias associadas às regras de ordem zero e de segunda ordem, verificou-se no caso estudado a importância de incluir “ONGs” e “empresas de pesquisa” como sendo “atores estruturantes”; e o “governo” como criador de “demandas específicas”, assim como de analisar os “recursos naturais” como possíveis “barreiras” ao processo de inovação do sistema de produção de arroz orgânico (Quadro 5). Em uma perspectiva mais ampla, também se constatou que a quantidade de regras associadas ao grupo de produtores orgânicos vinculados ao NEMA é menor do que a quantidade identificada por Dias (2011), o que pode indicar uma menor complexidade do caso em estudo.

Em relação à dinâmica dessas regras, Pedrozo, Dias e Abreu (2012) e Dias (2011) não fizeram nenhuma proposição teórica. Nesse sentido, o Quadro 5, em combinação com o Quadro 6, confere um primeiro indicativo da evolução de regras ao longo da adoção de novos sistemas de produção.

A limitação desta pesquisa está associada à metodologia adotada para seu desenvolvimento: estudo de caso único. Essa metodologia não permite generalizações dos resultados para outras populações ou outros universos de pesquisa.

Ressalta-se, ainda, que o framework micro-meso-macro de Dofper, Foster e Potts (2004) e Dopfer (2005) e a proposição de regras multiníveis associadas ao processo de inovação de Pedrozo, Dias e Abreu (2012) e Dias (2011) poderiam ser aplicados em novos estudos, em outras redes de produtores orgânicos ou em temas como o dilema nos alimentos e biocombustíveis, na responsabilidade social corporativa, na inovação social e nas certificações.

REFERÊNCIAS

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.

BRASIL. Lei nº 10.831, de 23 dezembro de 2003. Dispõe sobre a agricultura orgânica e dá outras providências. República Federativa do Brasil, DF, 2003.

BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Brasil Projeções do Agronegócio 2010/2011 a 2020/2021. Brasília, DF, 2011.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Relatório de atividades PROBIO 2002-2004. Brasília, DF, 2004.

CORAZZA, R. I.; FRACALANZA, P. S. Caminhos do pensamento neo-schumpeteriano: para além das analogias biológicas. Nova Economia, Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 127-155, ago. 2004.

DIAS, M. F. P.; PEDROZO, E. A.; SILVA, T. N. D. The innovation process as a complex structure with multilevel rules. Journalof Evolutionary Economics, Germany, v. 24, n. 5, p. 1067-1084, Oct. 2014.

DIAS, M. F. P. Dinâmica de configurações de regras para inovação: um olhar complexo e interteórico numa organização de pesquisa agrícola do agronegócio orizícola do Rio Grande do Sul. Tese (Doutorado em Agronegócios) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2011.

DOPFER, K. The evolutionary foundations of economics. Cambridge: Cambridge University, 2005.

DOPFER, K.; FOSTER, J.; POTTS, J. Micro-meso-macro. Journal of Evolutionary Economics, Germany, v. 14, n. 3, p. 263-279, July. 2004.

DOPFER, K.; POTTS, J. On the theory of economic evolution. Evolutionary and Institutional Economics Review, Tokio, v. 6, n. 1, p. 23-44, Sept. 2009.

FAO - Organización de las Naciones Unidas para la Agricultura. Agricultura Mundial: hacia los anõs 2015/30 - Informe resumido. Roma, Itália, 2002.

FAO/OMS - Organización de las Naciones Unidas para la Agricultura y la alimentación, y organización Mundial de la Salud, Directrices para la producción, elaboración, etiquetado y comercialización de alimentos producidos orgánicamente. Roma, Itália, 2007.

GOMES, S. T. Condicionantes da modernização do pequeno agricultor. São Paulo: IPE-USP, 1986.

KNEIPP, J. M. et al. Emergência temática da inovação sustentável: uma análise da produção científica através da base Web Of Science. Revista de Administração da UFSM, Santa Maria, v. 4, n. 3, p. 442-457, dez. 2011.

MACHADO, R. T. M. Fundamentos sobre o Estudo da Dinâmica das Inovações do Agribusiness, Revista de Administração Contemporânea, São Paulo, v.2, n.2, p. 127-141, ago. 1998.

OLIVEIRA, N. D. A. de; SILVA, T. N. da. Inovação social e tecnologias sociais sustentáveis em relacionamentos intercooperativos: um estudo exploratório no CREDITAG –RO. Revista de Administração da UFSM, Santa Maria, v. 5, n. 2, p. 277-295, ago. 2012.

PEDLOWSKI, M. A. et al. Um Estudo sobre a Utilização de Agrotóxicos e os Riscos de Contaminação num Assentamento de Reforma Agrária no Norte Fluminense. Journal of the Brazilian Society of Ecotoxicology, v. 1, p. 185-190, 2006.

PEDROZO, E. A.; DIAS, M. F. P.; ABREU, M. C. S. de. MultiTheoretical Analysis in Organizational and Strategic Configurational Changes: Using Mixed Methods with Multilevel Rules for Innovation. In: WANG, C. L.; KETCHEN, D. J.; BERGH, D.D. (Eds.). West Meets East: Toward Methodological Exchange (Research Methodology in Strategy and Management, Volume 7), Emerald Group Publishing Limited, 2012. p. 265-305.

PINSKY, V. C.; DIAS, J. L.; KRUGLIANSKAS, I. Gestão estratégica da sustentabilidade e inovação. Revista de Administração da UFSM, Santa Maria, v. 6, n. 3, p. 465-480, set. 2013.

PIRES, E. Produção de arroz cresceu 24% no Rio Grande do Sul. IRGA, Porto Alegre, 16 fev. 2010. Disponível em: <http://www.irga.rs.gov.br/conteudo/2604/producao-de-arroz-cresceu-24-no-rio-grande-do-sul > Acesso em: jul. 2013.

SOSBAI. Sociedade Sul-Brasileira de Arroz Irrigado. Arroz Irrigado: recomendações técnicas da pesquisa para o Sul do Brasil. Porto Alegre, RS, 2010. 188 p.

TEIXEIRA, M. Orgânicos possuem mais nutrientes do que alimentos convencionais. GLOBO, Rio de Janeiro, 25 mar. 2011. Disponível em: <http://g1.globo.com/globo-reporter/noticia/2011/03/organicos-possuem-mais-nutrientes-do-que-alimentos-convencionais.html>; Acesso em: mar. 2013.

YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2010.

Autor notes

Possui graduação em Bacharelado em Administração pela Universidade Federal de Pelotas, UFPEL e mestrado em andamento em Administração pela Universidade Estadual de Londrina, UEL. Londrina. Santa Catarina. Brasil.
Possui graduação em Agronomia pela Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, mestrado em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS e doutorado em Agronegócios pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS. Pelotas. Rio Grande do Sul. Brasil.
Possui graduação em Administração pela Universidade Federal de Pelotas, UFPEL, mestrado em Administração pela Universidade Federal de Santa Maria, UFSM e doutorado em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS. Pelotas. Rio Grande do Sul. Brasil.


Buscar:
Ir a la Página
IR
Visualizador XML-JATS4R. Desarrollado por