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Recepção: 11 Abril 2016
Aprovação: 14 Novembro 2016
Resumo: Neste estudo, analisaram-se três municípios mineiros, Pedra do Indaiá, Santo Antônio do Monte e Divinópolis, no que concerne ao cumprimento das exigências legais estadual e federal dos Resíduos Sólidos Urbanos (RSU), a fim de identificar limitações e potencialidades das administrações. Para isso, foram utilizadas informações do Sistema Estadual de Informações sobre Saneamento (SEIS) e do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), observação in loco e entrevistas informais com diversos atores responsáveis pela coleta, pelo transporte e pela disposição final dos RSU. Constatou-se que as maiores restrições dos municípios são de cunho financeiro e técnico-administrativo e que nenhum deles tem, hoje, capacidade de cumprir as exigências legais em sua totalidade. Atualmente, já ocorre adesão a consórcios públicos que se apresentam como uma alternativa eficaz ao cumprimento das exigências legais. Dentre os fatores externos, considera-se como maior limitação a falta de sensibilização da sociedade e dos próprios governantes em relação ao tema. Assim, torna-se necessária uma abordagem mais profunda de situações semelhantes para a reformulação de práticas que levem os municípios ao cumprimento das leis e, consequentemente, proporcione melhor qualidade de vida aos cidadãos, por meio do equilíbrio socioambiental.
Palavras-chave: Gestão ambiental, Administração pública, Responsabilidade social.
Abstract: It was analyzed three municipalities of Minas Gerais state, Pedra do Indaiá, Santo Antônio do Monte e Divinópolis, considering the fulfillment of the State and Federal legal requirements of Municipal Solid Waste (MSW), identifying limitations and potentialities of administrations. It was used information from the State Sanitation Information System (SSIS) and the National Sanitation Information System (NSIS), on-site observation and informal interviews with various actors of collection, transportation and disposal of MSW. It was found that the major constraints of the municipalities are financially driven and technical-administrative and none of the municipalities has, today, the ability to meet the legal requirements in their entirety. Currently, already occurs, adherence to public consortia that are presented as an effective alternative in compliance with legal requirements. Among the external factors it is considered as a major limitation the lack of awareness of the society and govern. So it is necessary a deeper approach to similar situations for the reformulation of practices that lead municipalities to compliance with the laws and thus provide better quality of life for citizens, through the social and environmental balance.
Keywords: Environmental management, Public administration, Social responsibility.
1 INTRODUÇÃO
O Estado brasileiro sofreu, nos últimos anos, profundas mudanças econômicas e sociais, passando de um país rural a urbano e alcançando patamares socioeconômicos mais próximos aos de países desenvolvidos. Nesse contexto, a desigualdade social reduziu significativamente em números absolutos, e grande parte da população passou a ter acesso a uma gama maior de produtos e serviços.
Acompanhando tal evolução, que é comprovada por diversos estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Estado passou a fornecer à população mais serviços públicos básicos, tais como transporte e saneamento (MEDEIROS, 2001). Com isso, a Administração Pública precisou disponibilizar meios legais de padronizar esses serviços ditos essenciais, passando a ditar normas por meio de legislação aplicada aos Municípios, ao Estados e à União.
Assim como outras áreas, os serviços de saneamento básico, que incluem o abastecimento de água, o esgotamento sanitário, a drenagem pluvial e o manejo dos resíduos sólidos, passaram a ser regulados por uma legislação específica, sendo inclusive mais requisitados, devido à expansão urbana e ao crescimento populacional. Nesse sentido, a Lei n.º 11.445/2007 (BRASIL, 2007) prevê que os Municípios, os Estados e a União elaborem os planos de saneamento básico, e, mais recentemente, a Lei n.º 12.305/2010 (BRASIL, 2010) institui a Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS), que, dentre outras exigências, estabeleceu, com prazo previsto para o ano de 2014, a obrigatoriedade aos entes federados de darem destinação ambientalmente correta aos Resíduos Sólidos Urbanos (RSU).
Um levantamento do Programa Minas Sem Lixões, da Fundação Estadual de Meio Ambiente (FEAM), verificou que em 2013, no estado de Minas Gerais, 65% dos municípios (isto é, 544 dos 853) ainda dispunham incorretamente os seus RSU (MINAS GERAIS, 2014). Diante disso, o escopo deste estudo foi descrever e analisar como os municípios de Pedra do Indaiá, Santo Antônio do Monte e Divinópolis, ambos localizados no Centro-Oeste do Estado de Minas Gerais, têm se adequado para atender às leis n.º 11.445/2007, n.º 18.031/2009 e n.º 12.305/2010. Dessa forma, este estudo busca responder ao seguinte questionamento: quais são os motivos que levam grande parte dos municípios mineiros a não atender às exigências legais que regem o manejo e a destinação final dos RSU, sobretudo aquilo que está previsto no artigo 54 da Lei n.º 12.305/2010 – lei que institui a PNRS e a destinação ambientalmente adequada dos RSU?
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1 Evolução histórica da disposição dos Resíduos Sólidos Urbanos no Brasil
Os impactos ambientais decorrentes da disposição incorreta dos resíduos sólidos são motivo de preocupação ainda recente. Até pouco tempo, o importante na gestão dos resíduos sólidos municipais era a limpeza urbana. Hoje, despejar o lixo em áreas periféricas não é mais satisfatório e cria novos problemas, tanto sociais quanto ambientais (CAVÉ, 2011).
Nesse cenário, a coleta e o descarte dos resíduos em áreas não utilizadas não são mais suficientes para os detentores do serviço de coleta e destinação dos RSU (municipalidade) (CAVÉ, 2011): é preciso proceder à construção e operação de unidades adequadas para submeter os resíduos a algum tipo de tratamento. Em contrapartida e como um agravante dessa necessidade, está o crescimento da geração de RSU registrados no Brasil, que foi de 1,8%, de 2010 para 2011 – índices acima da taxa de crescimento populacional urbano do país, que foi de 0,9% no mesmo período (ABRELPE, 2011).
Uma pesquisa da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE), realizada em 2011, mostra que 58,06% dos RSU coletados no Brasil recebiam destinação correta. Por outro lado, 23,3 milhões de toneladas de lixo ainda não contavam com a destinação incorreta, indo parar em lixões e aterros controlados, valor 1,4% maior do que em 2010 (ABRELPE, 2011).
Ainda segundo a ABRELPE (2011), em 2011, 60,58% dos municípios dispunham incorretamente os RSU coletados. No ano anterior, esse índice era 0,54% maior. Apesar da evolução positiva, os índices estão muito abaixo das perspectivas abordadas na atual PNRS, aprovada em 2010, que previa a disposição correta dos RSU coletados em 100% dos municípios até agosto de 2014.
Diante do cenário atual, em que a maioria dos municípios brasileiros não apresenta uma gestão dos resíduos sólidos adequada, principalmente pela não disposição final ambientalmente correta desses resíduos (disposição em aterros sanitários) e pelo não tratamento dos resíduos coletados, após mais de duas décadas de discussão, foi adotada a PNRS (Lei n.º 12.305/2010 e Decreto n.º 7.404/2010) (CAVÉ, 2011). A adoção da PNRS pretende apontar soluções para sanar os problemas da gestão dos resíduos sólidos em nível nacional, por meio da obrigação do aterramento sanitário dos rejeitos, bem como da promoção do reaproveitamento dos resíduos sólidos até o esgotamento viável das possibilidades (BRASIL, 2010; CAVÉ, 2011).
2.2 A legislação ambiental pertinente aos Resíduos Sólidos no âmbito nacional e estadual (Minas Gerais)
No Brasil, já em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, faz-se referência à necessidade de manter um modelo de desenvolvimento ambientalmente correto, a fim de garantir às presentes e futuras gerações um ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida (BRASIL, 1988). O mesmo texto faz referência à responsabilidade compartilhada entre União, Estados e Municípios quanto à proteção do meio ambiente e ao combate à poluição em qualquer de suas formas (BRASIL, 1988).
Muitos foram os avanços vivenciados nas últimas décadas para atender tal necessidade expressa na Constituição Federal de 1988. Porém, como relatado por Xavier et al. (2012), muito ainda precisa ser feito para que se atinja um modelo de desenvolvimento sustentável que garanta desenvolvimento econômico e social com preservação e recuperação ambiental.
A fim de cumprir os princípios constitucionais e proporcionar mecanismos que permitam a solução não imediata, mas definitiva, dos RSU, o Estado de Minas Gerais, antes mesmo que a União, decretou a Política Estadual de Resíduos Sólidos (Lei n.º 18.031/2009). Limpeza urbana, manejo dos resíduos sólidos, abastecimento de água, esgoto sanitário, drenagem e manejo de águas pluviais fazem parte do conjunto de serviços públicos de saneamento básico e devem ser prestados de forma a garantir a saúde pública e a proteção do meio ambiente (BRASIL, 2007).
São objetivos da PNRS a não geração, a redução, a reutilização, a reciclagem e o tratamento dos resíduos sólidos, bem como a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos (BRASIL, 2010). A Política Estadual de Resíduos Sólidos do Estado de Minas Gerais traz ainda como princípios a prevenção da geração, o reaproveitamento e a valorização dos resíduos sólidos (MINAS GERAIS, 2009).
Além disso, a PNRS traz ainda uma importante contribuição, a definição legal de rejeitos, como sendo os resíduos sólidos que, depois esgotados todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente adequada (BRASIL, 2010).
Tal definição sugere que somente os rejeitos devem ser descartados em aterros sanitários, procedimento que contribui significativamente para o prolongamento da vida útil dos aterros e, consequentemente, para a redução dos impactos adversos ao meio ambiente gerados pela disposição dos RSU.
2.3 Cenário estadual tendo em vista o tratamento e/ou a disposição final dos resíduos sólidos
O artigo 54 da Lei n.º 12.305/2010 estabelecia, para agosto de 2014, o prazo máximo para União, Estados e Municípios darem destino final ambientalmente adequado aos rejeitos por eles produzidos (BRASIL, 2010). Apesar de não contemplados os prazos para a destinação final ambientalmente correta na Lei n.º 18.031/2009, a legislação mineira faz referência constante à necessidade de tal disposição, bem como remete no seu artigo 11 a responsabilidade aos municípios sobre a gestão dos resíduos sólidos, considerado esse serviço como público e essencial (MINAS GERAIS, 2009).
Mesmo com tal exigência estabelecida pela União na PNRS e com a referência na Política Estadual de Resíduos Sólidos, a FEAM (2013) demonstra que, no estado de Minas Gerais, 65% dos municípios não apresentam disposição final ambientalmente correta dos RSU, o que equivale a mais de 39% da população urbana não atendida pela destinação correta dos resíduos por ela produzida. A esse respeito, Castilhos Junior (2006) cita que a predominância de disposição incorreta em lixões ou aterros controlados se deve a fatores como a ausência de capacitação técnico-administrativa, à baixa dotação orçamentária, à falta de organização na estrutura das instituições públicas e, até mesmo, à pouca conscientização da população quanto aos problemas ambientais propiciados pela destinação incorreta dos resíduos.
Apesar de as limitações principais estarem ligadas à Administração Pública, a Política Nacional e Estadual de Resíduos Sólidos e a Lei de Diretrizes Nacionais para o Saneamento Básico exigem dos municípios ações que permitam a disposição de meios para incrementar a limpeza urbana e o manejo dos resíduos sólidos, incluindo a coleta, o transporte, o transbordo, o tratamento e a destinação final do lixo doméstico e do lixo originário da varrição e da limpeza de logradouros e de vias públicas (BRASIL, 2007).
2.4 Geração, coleta e destinação final dos RSU
A geração dos RSU, principalmente no que se refere ao âmbito domiciliar, varia de acordo com o porte do município, sua localização geográfica, a renda populacional, dentre outros fatores, tanto culturais quanto socioculturais (BIDONE; POVINELLI, 1999 apud CAMPOS, 2012; BRASIL, 2012). Segundo a ABRELPE (2013), no Brasil, cada habitante gera em média 383,2 quilogramas de resíduos ao ano.
Para Campos (2012), devido aos fatores que influenciam a geração de resíduos sólidos, tais como o aumento ou a redução da renda per capita, os RSU tornam-se um importante indicador socioeconômico, tanto por sua quantidade quanto por sua caracterização. No Brasil, a geração de resíduos sólidos tem superado os índices de crescimento populacional (CAMPOS, 2012; ABRELPE, 2013), crescendo 1,3% de 2011 a 2012, enquanto que o crescimento populacional urbano registrado foi de 0,9% (ABRELPE, 2013).
Levantamentos do Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (SNIS) mostram que a minoria dos municípios brasileiros consegue controlar o volume de resíduos gerados, com utilização de técnicas seguras como o uso de balanças, o que sugere que o volume gerado pode ser divergente da realidade (BRASIL, 2012). Dados do IBGE na Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) (2008) mostram que 61,2% das prestadoras de serviços de manejo dos resíduos sólidos eram entidades vinculadas à administração direta do poder público; 34,5% eram empresas privadas sob regime de concessão pública ou terceirização; e 4,3% eram entidades organizadas sob a forma de autarquias, empresas públicas, sociedades de econômica mista e consórcios (IBGE, 2010).
Esse fato, apesar de ser previsto, já que, de acordo com a constituição brasileira, é de competência do poder público local gerenciar os resíduos por este produzidos, mostra que se deve haver um esforço coletivo do poder público em todas as suas esferas, a fim de garantir o cumprimento da PNRS. Tendo em vista que o prazo para a extinção dos lixões e o atendimento à legislação com a destinação ambientalmente correta dos resíduos esgotou-se em 2014, esse esforço se torna ainda maior, uma vez que, de acordo com a pesquisa da ABRELPE, em 2013, 41,7% dos RSU coletados ainda recebiam destinação final incorreta, indo parar em lixões e aterros controlados, e no ano de 2014, reduziu-se apenas 0,1 ponto percentual, indo para 41,6% a quantidade de RSU que são depositados em lugares inadequados (ABRELPE, 2014).
2.5 Empregos gerados pelos serviços de limpeza urbana
Em sua pesquisa anual, a ABRELPE (2013) registrou um crescimento do mercado de limpeza urbana de cerca de 3% entre os anos de 2011 e 2012, superando os 320 mil empregos diretos. Esse mercado como um todo movimenta em média 23 bilhões de reais, sendo um importante propulsor da economia nacional ao gerar empregos e renda (ABRELPE, 2013).
O Diagnóstico do Manejo dos Resíduos Sólidos Urbanos de 2011, publicado pelo Ministério das Cidades, levantou dados acerca da geração de empregos diretos, sendo registrada uma média de 1,94 trabalhadores para cada grupo de 1000 habitantes (BRASIL, 2013). Por outro lado, o mercado de resíduos sólidos angaria um volume muito maior de trabalhadores que vivem na informalidade: o grupo dos catadores de matérias recicláveis. Esse grupo, pelo perfil de seus trabalhadores e pela ausência de políticas de inclusão, possui forte vínculo com níveis extremos de pobreza (PINHEL, 2013).
Para agravar a situação, dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) relatam que em 2001 havia mais de 45 mil crianças trabalhando com o lixo e pelo menos 25 mil catadores nos lixões, chagando a 22% o número com idade inferior a 14 anos (PINHEL, 2013). Esses trabalhadores, adultos e crianças, formam um grupo marginalizado, que vive muitas vezes no lixo e se sustentam dele. Para Gentil (2008 apud ZANETI; SÁ; ALMEIDA, 2009), trata-se de pessoas residuais, exploradas por empresários e pelo poder público.
Como uma alternativa para o problema da informalidade, diversas ações de Organizações Não Governamentais (ONG’s), da sociedade civil organizada, de organizações empresarias e do poder público surgiram com o intuito de formalizar esse trabalho, principalmente por meio da formação de cooperativas e associações de catadores, que devem ainda superar os entraves sociais, burocráticos e culturais atrelados ao trabalhador/catador, sendo este um dos principais desafios da ”nova” PNRS (PINHEL, 2013; BRASIL, 2010).
2.6 Coleta seletiva
Em meados da década de 1980, surgiram no Brasil os primeiros programas de coleta seletiva e reciclagem dos RSU, como uma alternativa inovadora para a redução da geração e para o estímulo à reciclagem (IBGE, 2010). A esse respeito, Pinhel (2013) relata que, a partir da década de 1990, ocorreu uma multiplicação das campanhas de coleta seletiva e inclusão de catadores, principalmente em razão de políticas e ações voltadas ao gerenciamento de resíduos, apoiadas por governos, ONG’s e instituições sociais.
A PNSB de 1989 registrou as primeiras informações oficiais sobre o tema e revelou a existência de 58 programas de coleta seletiva no país. Já na PNSB de 2008, o número chegou a 994, revelando um grande avanço na implantação da coleta seletiva nos municípios brasileiros (IBGE, 2010). Apesar da quantidade expressiva de iniciativas de coleta seletiva nos municípios brasileiros, a pesquisa da ABRELPE relacionada ao ano de 2012 alerta para o fato de que, muitas vezes, essas iniciativas se resumem à disponibilização de pontos de entrega voluntária ou convênios com cooperativas de catadores, não abrangendo a totalidade do território ou da população do município (ABRELPE, 2013).
A formalização de programas de coleta seletiva é priorizada pela legislação em vigor, sendo inclusive dispensada a licitação no caso da contratação de associações ou cooperativas formadas exclusivamente por pessoas físicas de baixa renda reconhecidas pelo poder público como catadores de materiais recicláveis (BRASIL, 1993). Esses catadores de matérias recicláveis compõem um importante grupo que contribui efetivamente para a gestão dos resíduos sólidos nas cidades (PINHEL, 2013) e participam da chamada cadeia produtiva da reciclagem, que compreende a segregação na fonte, a logística de coleta seletiva, as centrais de triagem e classificação, o beneficiamento e a reciclagem propriamente dita. De acordo com o Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis, o modelo de cadeia não existe sem a participação dos catadores (PINHEL, 2013).
Segundo a Lei n.º 12.305/2010, os planos de resíduos sólidos devem contemplar a inclusão social e emancipação econômica de catadores de materiais recicláveis (BRASIL, 2010). Essa meta vem ao encontro da superação de um dos principais problemas que envolvem a coleta seletiva, a marginalização dos catadores, que, segundo Zaneti, Sá e Almeida (2009), encontram-se à sombra do sistema capitalista.
3 METODOLOGIA
O presente estudo caracteriza-se como um estudo de multicasos, baseando-se, entre outros aspectos, no conhecimento empírico para investigar um fenômeno atual dentro do seu contexto de realidade. Como as fronteiras entre o fenômeno e o contexto não são claramente definidas, esses estudos desse tipo utilizam várias fontes de evidência, como descrito por Yin (2005 apud GIL, 2008).
Esta pesquisa buscou descrever a realidade da gestão dos RSU de três municípios mineiros, Pedra do Indaiá, Santo Antônio do Monte e Divinópolis, situados no Centro-Oeste do Estado, a cerca de 173 km, 194 km e 121 km, respectivamente, da capital Belo Horizonte. O levantamento dos dados foi construído em três etapas consecutivas: na primeira, foi feito o levantamento documental; na segunda, ocorreu a observação direta; e, na terceira etapa, foram realizadas entrevista informais com os atores envolvidos com a coleta, o transporte e o tratamento dos resíduos sólidos nos municípios pesquisados.
A etapa documental baseou-se na compilação de dados quantitativos apresentados nos arquivos de consulta pública disponibilizados no Sistema Estadual de Informações sobre Saneamento (SEIS) do Governo de Minas Gerais e no SNIS. Esses sistemas armazenam informações sobre o saneamento obtidas por meio de pesquisa junto às prefeituras e aos gerenciadores dos sistemas de saneamento, abarcando dados acerca do manejo dos RSU e do esgoto sanitário, por exemplo. Tais dados incluem a destinação dos resíduos, o número de trabalhadores, os custos com a manutenção dos serviços, a existência de financiamento para projetos e ações voltadas para a área de saneamento e a existência dos planos municipais de saneamento e gestão integrada de resíduos sólidos.
A segunda etapa consistiu na observação da situação dos resíduos sólidos nos municípios, com a observação in loco. Essa etapa permitiu levantar parâmetros limitantes e potenciais para o atendimento à legislação em vigor, tais como: existência de legislação própria, do Plano Municipal de Saneamento Básico e do Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos e visita aos locais de disposição de RSU desses municípios.
Na terceira etapa, em visita aos municípios, foram realizadas entrevistas informais junto aos atores envolvidos nos processos de manejo dos resíduos sólidos, tais como servidores municipais, colaboradores das empresas prestadoras e catadores. As entrevistas tinham como principal objetivo levantar possíveis fragilidades e potencialidades da administração dos serviços de saneamento, bem como confirmar os dados disponíveis nos arquivos municipais, no SEIS e no SNIS. Foram realizadas em cada município pelo menos uma entrevista com um servidor municipal e uma entrevista com catadores autônomos ou associados nas cooperativas de reciclagem.
Por fim, realizou-se o cruzamento dos dados obtidos na observação direta com os dados do SEIS e do SNIS, o que permitiu a elaboração de um mapa que motive o cumprimento parcial ou total das previsões legais acerca dos resíduos sólidos.
4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
Os dados levantados apontam inúmeras semelhanças entre os municípios pesquisados, desde características socioeconômicas até fatores limitantes e potenciais para a implementação das diretrizes de saneamento e da PNRS previstos em lei.
4.1 Caraterização dos municípios analisados
O Estado de Minas Gerais tem o maior número de municípios da Federação, 853, fato que confere ao Estado uma característica marcante: um grande número de municípios de pequeno porte. Segundo o IBGE (2010), 517 municípios mineiros, isto é, 60,6%, têm uma população de até dez mil habitantes – em nível nacional, os municípios com a mesma faixa de habitantes equivalem a 45,18% do total.
Os municípios de Pedra do Indaiá, Santo Antônio do Monte e Divinópolis, apesar de sua proximidade, apresentam diferenças significativas relativas às questões de urbanização, porte e economia (Tabela 1). Divinópolis possui o maior Produto Interno Bruto (PIB) e é o município com maior taxa de urbanização – 97,4%; Santo Antônio do Monte apresenta uma taxa de urbanização de 85,44% e o menor PIB entre os três municípios; e Pedra do Indaiá apresenta a menor taxa de urbanização, 52,98%.
A taxa de urbanização, bem como o PIB do município, influencia diretamente a produção dos RSU, uma vez que a produção está intimamente ligada ao modo de vida da população (BRASIL, 2012). Os três municípios analisados, de acordo com os dados do Programa Minas Sem Lixões, dispõem incorretamente os seus resíduos por meio do descarte em lixões.
O município de Divinópolis possui um Centro Municipal de Triagem – Coleta Seletiva em funcionamento em parceria com a Associação dos Catadores de Papel, Papelão e Materiais Reaproveitáveis de Divinópolis (ASCADI). Segundo servidores do município, a associação está em fase de reestruturação.
O município de Santo Antônio do Monte, por sua vez, apresenta uma área de disposição de resíduos saturada, utilizada há 18 anos e com horizonte de utilização de dez anos. Uma nova área foi adquirida pela Administração Municipal, porém não foram realizadas obras no local.
Em Pedra do Indaiá, a atual área para descarte é utilizada desde 2006 e possui horizonte de utilização de 20 anos, contando apenas com técnicas simples de manutenção, as quais precisam ser readequadas. O município está formalizando o processo de licenciamento ambiental para a implantação de uma Usina de Triagem e Compostagem no local.
Quanto ao porte populacional, Pedra do Indaiá, com 4.006 habitantes (IBGE, 2013), encontra-se na faixa de municípios com população inferior a 10.000 habitantes. Santo Antônio do Monte, com 26.168 habitantes (IBGE, 2013), está na faixa de 20.001 a 50.000 habitantes, juntamente com outros 12,3% dos municípios mineiros, e Divinópolis, com 215.247 habitantes (IBGE, 2013), o maior dos três, está na faixa que varia entre 100.001 a 500.000 habitantes, ao lado de outros 2,3% dos municípios mineiros.
As leis n.º 18.031/2009 e n.º 12.305/2010 possuem como objetivos comuns a não geração, a redução, a reutilização, a reciclagem, o tratamento dos resíduos sólidos e a destinação ambientalmente correta dos rejeitos. Ao analisar os dados de massa de resíduos coletados por habitantes nos municípios e as médias estadual e nacional (Figura 1), verifica-se que o município que mais se aproxima da média estadual e nacional é Santo Antônio do Monte (369,9 kg/hab./ano). Divinópolis atinge uma média de produção de RSU de 224,4 kg/hab./ano, e Pedra do Indaiá apresenta o menor índice de volume de produção de RSU (80,4 kg/hab./ano).
4.2 PMSB, PGIRS e atores envolvidos na coleta, no transporte e na destinação final dos RSU
O artigo 9º da Lei n.º 11.445/2007 estabelece aos titulares dos serviços de saneamento básico a obrigatoriedade da elaboração do Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB) como ferramenta para a implementação dos serviços em nível municipal e estadual. O Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PGIRS) e o PMSB, como ferramentas de gestão, permitem a aproximação ao cumprimento das ações preconizadas nas legislações estadual e federal, dentre elas a coleta e destinação final ambientalmente correta de 100% dos rejeitos.
No município de Pedra do Indaiá, o PMSB, financiado pela Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), foi finalizado em 2014. Já o PGIRS teve sua finalização no mesmo ano e foi elaborado com recursos dos cofres municipais. De acordo com informações de servidores municipais, esses planos não estão sendo colocados em prática, por falta de técnicos no município para sua implementação.
Conforme informações da Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Santo Antônio do Monte, o município teve o seu PMSB elaborado em 2013 e o seu PGIRS foi elaborado em anos anteriores pela equipe técnica do município. De acordo com relato dos servidores municipais entrevistados, faz-se necessária a revisão de ambos os planos para que ocorra um alinhamento entre eles.
O PGIRS de Divinópolis foi elaborado e aprovado em nível municipal no ano de 2013, por meio de recursos próprios. No ano de 2014, foi realizada uma revisão no PMSB, e, após esse período, não houve andamento nas ações do plano, conforme informações obtidas na Secretaria Municipal de Planejamento Urbano e Meio Ambiente (SEPLAM) em 2016.
Com relação aos atores envolvidos, buscou-se sua identificação, a fim de dimensionar o envolvimento do poder público, do setor privado e da sociedade civil organizada, uma vez que, de acordo com o previsto na Lei n.º 12.305/2010 e no PNRS, as metas pactuadas somente serão alcançadas com o envolvimento efetivo desses agentes (BRASIL, 2012).Diante dos fatos, é preciso que a sociedade civil se sensibilize quanto à importância de se mobilizar para assuntos como a coleta seletiva e a destinação correta dos resíduos. Nos municípios analisados: Pedra do Indaiá, Santo Antônio do Monte e Divinópolis, os programas de coleta seletiva ainda estão em fase de estruturação e o Governo Federal é um dos principais atores envolvidos para a efetivação da Lei n.º 12.305/2010, sendo que nesses municípios a principal fonte financiadora para implantação de obras, aquisição de máquinas (tratores e caminhões) e elaboração dos PMSB e PGIRS, é a FUNASA. Dados de convênios firmados entre os entes federados, os Municípios e a União disponíveis no Sistema de Convênios do Governo Federal (SICONV) corroboram essa informação.
Quanto à sociedade civil, observa-se que seu envolvimento é baixo, tendo em vista a falta de conhecimento acerca dos programas de coleta seletiva e a pouca divulgação sobre a destinação dos RSU. Tal índice de envolvimento é confirmado pelos próprios catadores de resíduos, que enfrentam a falta de adesão da população aos programas de coleta seletiva, com a não segregação dos resíduos, por exemplo.
Em Santo Antônio do Monte, essa coleta é mais efetiva, o que se deve principalmente ao fato de existir uma associação de catadores estruturada e apoiada efetivamente pela Administração Municipal. Em Divinópolis, além da ASCADI, existem outras associações que trabalham de forma descentralizada no município, não contanto com o apoio direto da Administração Municipal, fato que contraria a Lei n.º 12.305/2010. Segundo servidores do município, a coleta seletiva em Divinópolis ocorre sem apresentar grande êxito, contribuindo, porém, para redução do material depositado no Lixão Municipal. Já em Pedra do Indaiá, a coleta seletiva ocorre por meio de catadores individuais, sem estruturação e sem apoio efetivo da Administração Municipal. Conforme os relatos dos servidores municipais foram feitas algumas tentativas de implantação da coleta seletiva em nível municipal sem êxito.
Os catadores individuais, não associados a cooperativas ou outras instituições semelhantes, estão presentes em todos os municípios pesquisados, sendo sua inclusão nas chamadas rotas do lixo uma obrigatoriedade prevista na Lei n.º 12.305. Os planos de resíduos sólidos devem contemplar, assim, a inclusão social e emancipação econômica desses catadores de materiais recicláveis.
Um elemento que leva à disparidade entre os municípios analisados deve-se ao fato de que, no município de Divinópolis, os serviços de limpeza pública são executados por empresa terceirizada e, no município de Santo Antônio do Monte, a associação de catadores cumpre eficazmente seu papel, sendo a grande responsável por uma parcela significativa do volume de material coletado.
Quanto à terceirização dos serviços de limpeza pública em Divinópolis, existem apontamentos da Administração Municipal de que esse seja um modelo mais viável, uma vez que reduz custos com pessoal e manutenção da frota. A redução dos custos de pessoal é o fator que mais interfere na terceirização de serviços nos municípios analisados, já que a Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece limites de gastos com pessoal até o percentual máximo de 54% da receita corrente líquida para o executivo (BRASIL, 2000). Sendo assim, os governos municipais optam pela terceirização de serviços por meio de processos de licitação.
A terceirização apresenta-se, nesse contexto, como uma boa opção para esses municípios. Entretanto, em geral, a terceirização é onerosa aos municípios, com custos mais elevados em relação aos serviços executados pela própria Administração Municipal, ao mesmo tempo em que melhora a qualidade dos serviços ofertados à população.
Quando o setor privado é inserido na gestão dos RSU, seja por meio de contratados de prestação de serviços, seja por meio da privatização ou até mesmo por meio da gestão compartilhada, esse setor passa a ser um importante ator no processo da cadeia do lixo, sendo necessário o estabelecimento de regras claras e rígidas aos contratos, a fim de não ferir os preceitos legais.
4.3 Limitações e potencialidades no atendimento da legislação ambiental nos municípios pesquisados
A partir dos dados levantados junto ao SEIS, ao SNIS e às administrações municipais, bem como das entrevistas realizadas, observa-se que não somente municípios de pequeno porte têm tido dificuldades em atender à legislação em vigor, mas também os municípios de médio porte. Os três municípios analisados não estão cumprindo o artigo 54 da Lei n.º 12.305/2010, que previa para agosto de 2014 o fim dos lixões, devendo ser dado aos RSU a disposição ambientalmente correta, em aterros sanitários.
Entre os municípios analisados, a situação quanto à disposição final dos resíduos sólidos não difere da grande maioria dos municípios mineiros, uma vez que, de acordo com a FEAM (2013), a situação de tratamento e/ou disposição final dos resíduos sólidos no Estado de Minas Gerais em 2013 é a seguinte: 34% vão para aterros controlados; 31% para lixões; 14% para Unidades de Triagem e Compostagem (UTCs); 10% para aterros sanitários; 7% para outros locais; e 5% para aterros sanitários não regularizados. Sendo assim, todos os municípios analisados possuem lixão de acordo com o Programa Minas Sem Lixões, dados contraditos pelas Secretarias Municipais dos municípios analisados, que consideram seus depósitos de resíduos como aterros controlados, os quais, apesar de serem uma forma menos agressiva ao meio ambiente, são ainda uma forma incorreta para a disposição final.
O município de Divinópolis possui uma usina de reciclagem administrada pela ASCADI. Esse é um fator decisivo ao atendimento da legislação atual, que propõe reduzir a quantidade de resíduos e rejeitos encaminhados para disposição final ambientalmente correta por meio da redução, reutilização e reciclagem (BRASIL, 2010).
Analisando os pilares da cadeia do lixo – redução, reutilização e reciclagem – e os volumes produzidos nos municípios pesquisados, seria possível afirmar que o município de Pedra do Indaiá está mais próximo de atender aos parâmetros de não geração de resíduos, por ser o que possui menor volume de resíduos produzidos por habitante (80,4 kg/hab./ano). Porém, algumas observações devem ser feitas: esse município é o que possui a menor taxa de urbanização; além disso, uma questão cultural marcante muito comum e ainda presente na localidade é a queima dos resíduos nos quintais de casa, como observado durante este estudo.
Quanto ao município de Divinópolis, o que explica estar abaixo da média estadual (277,5 kg/hab./ano) e da média nacional (350,4 kg/hab./ano) pode ser o fato de ser o único município dos três que não apresenta 100% da população atendida com a coleta dos resíduos de acordo com os dados do SNIS, outro aspecto que está em desacordo com o PNRS. A esse respeito, ressalta-se que um dos fatores que interfere na média de produção de resíduos por habitante diz respeito à crescente concentração da população brasileira em áreas urbanizadas e ao crescimento consistente da expectativa média de vida do brasileiro (FORMAGGIA, 1995 apud NAIME; SARTOR; GARCIA, 2004).
Quanto aos pilares da reutilização e reciclagem, Rodrigues (2009) lembra que, na maioria das cidades brasileiras, os resíduos recicláveis e compostáveis têm sido desprezados como bem de valor, deixando, assim, de gerar emprego e renda, desperdiçando recursos naturais, causando impactos ambientais negativos, além de elevar os custos com a destinação ambientalmente correta, desperdiçando recursos públicos para essa finalidade. A não existência de programas de coleta seletiva, bem como a não existência de cooperativas ou associações de catadores, além de não cumprir com a função social de geração de emprego e renda, distancia os municípios do cumprimento da Lei n.º 12.305 e ainda fere o preconizado pela legislação nacional de redução dos gastos públicos (Lei Complementar n.º 101), uma vez que maior será o volume coletado pelos executores, demandando mais trabalhadores e maiores áreas de descarte. Esse fato pode ser um dos motivos para que o município de Pedra do Indaiá, o único entre os analisados que não possui catadores associados e programa de coleta seletiva efetivamente implantada, tenha o maior número de trabalhadores por habitantes envolvidos na limpeza pública (Figura 2).
A ausência de recursos financeiros, principalmente nos municípios de pequeno porte, com até 50.000 habitantes, tem sido superada pelo constante investimento principalmente por meio da FUNASA. Em muitos casos, os municípios terceirizam empresas para a elaboração do PMSB e do PGIRS. Porém, sabe-se que, depois de finalizados, a implementação dos planos prontos é o principal gargalo para o cumprimento das leis.
De acordo com servidores entrevistados nos municípios, os recursos não preveem a manutenção dos aterros sanitários prescritos em lei, não sendo possível aos municípios de pequeno e médio porte sua construção e operação. Uma alternativa apresentada por esses municípios é a adesão a consórcios de saneamento básico.
Quanto a esse aspecto, salienta-se que todos os municípios pesquisados estão atualmente associados ao Consórcio Regional de Saneamento Básico (CORESAB) Boa Vista, que prevê, dentre outras metas, a construção de aterros sanitários para atender os municípios associados e permitir o cumprimento da Lei n.º 12.305/2010, mesmo que em longo prazo. De acordo com os atores da Administração Municipal, um dos principais limitantes para a efetiva implementação da legislação é a ausência de recursos humanos, principalmente técnicos.
Pode ser observado, ainda, nos municípios pesquisados o estabelecimento constante de Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) entre os municípios e o Ministério Público, que ocorrem após a constatação de irregularidades, por meio de denúncias realizadas pelos munícipes ou por meio de fiscalizações periódicas realizadas pelos órgãos ambientais. Essa conduta é um dos aliados ao cumprimento da Lei n.º 12.305, uma vez que, após assinado o TAC, o município vê-se obrigado a executá-lo sob pena de multas e outras sanções legais.
A ausência de envolvimento da população é outro ponto a ser ressaltado: a falta de informação e até mesmo o descaso da população quanto às questões ambientais ainda é muito marcante na atualidade. Uma pequena parte da população se preocupa com a segregação dos resíduos em casa, e uma parcela ainda menor se preocupa com o destino dado aos resíduos gerados em suas residências, fato confirmado pelos atores envolvidos na coleta (catadores e garis) e observado durante este estudo.
Os três municípios pesquisados, mesmo com suas inúmeras diferenças, principalmente no que diz respeito à taxa de urbanização, apresentam fatores potenciais e limitantes semelhantes quanto ao cumprimento da legislação sobre RSU (Quadro 1). Essas limitações impedem o cumprimento integral da Lei n.º 12.305/2010 dentro dos prazos previstos, sendo necessário o prolongamento deste.
Observa-se que os atores diretamente ligados à Administração Municipal nos três municípios consideram a adesão ao Consórcio de Saneamento Básico como um ponto potencial, fato este indiscutível, bem como a existência dos PSBM e PGIRU. A falta de comprometimento dos gestores municipais foi apresentada somente pelos entrevistados no município de Santo Antônio do Monte.
O gestor do município de Divinópolis considera ter equipe técnica suficiente para atender às demandas da legislação. Nos municípios de Pedra do Indaiá e Santo Antônio do Monte, existem áreas adequadas para a implantação de seus aterros sanitários. Observa-se, ainda, que nos três municípios são baixas as adesões e o comprometimento de boa parcela da população quanto aos programas de coleta seletiva, o que se deve ao fato de haver pouca conscientização acerca das questões ligadas ao saneamento básico, principalmente no que concerne ao manejo de resíduos sólidos. Funcionários do município de Pedra do Indaiá, diretamente ligados à gestão dos RSU, apontam, também, para a baixa capacidade de endividamento do município como um fator limitante para investir no setor.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante dos dados levantados, observa-se que, mesmo sendo possível montar um quadro de limitações ou possibilidades para o atendimento da legislação que trata dos resíduos sólidos, o presente trabalho avaliou multicasos e representa dados específicos da realidade estudada, não podendo ser generalizado em face de outras realidades ainda que similares. Dentre os casos estudados, nenhum município conseguiu atender às exigências legais referentes aos RSU em sua totalidade. As principais limitações para o atendimento das exigências legais dizem respeito a aspectos de cunho financeiro e à ausência de pessoal com capacidade técnica nos municípios.
Dentre os fatores externos, pode-se considerar como maior limitação a falta de sensibilização da sociedade e dos próprios governantes em relação ao tema. Como principal alternativa para os municípios de pequeno e médio porte, existe a adesão a consórcios públicos, que, de forma exitosa, permite aos municípios atenderem à legislação imposta com menor aporte de recursos da máquina pública.
A existência dos Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos e de Saneamento Básico apresenta-se como potencialidade dos municípios pesquisados, uma vez que, para a elaboração desses planos, é preciso um conhecimento profundo da realidade local, conhecimento esse que dá subsídios aos detentores da gestão dos RSU. Entretanto, faz-se necessária, também, a implementação desses planos, os quais não podem ficar somente no papel.
Para um efetivo cumprimento das leis que regem as ações em torno da PNRS, dois fatores são decisivos: a sensibilização dos governantes e a sensibilização da população, para que, juntos, sociedade civil, governos e empresários possam buscar um norte comum, deixando para trás as crenças enraizadas de que o lixo é simplesmente lixo. Nesse sentido, os RSU devem ser vistos como fonte de geração de emprego e renda, e seu tratamento correto deve ser entendido como a única forma de manter o equilíbrio entre sociedade e meio ambiente.
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