Resumo: Com a finalidade de explorar o panorama de empreendedorismo acadêmico, propôs-se a realização deste estudo, que objetiva analisar as características comportamentais empreendedoras (CCE’s) em alunos do curso de graduação em administração de uma instituição de ensino superior. Para isso, estabeleceram-se os seguintes objetivos específicos: traçar o perfil dos acadêmicos de administração da instituição estudada; mapear as características comportamentais empreendedoras dos referidos acadêmicos; e propor ações para aprimorar tais características. A pesquisa realizada, com abordagem metodológica quantitativa e descritiva, obteve uma amostra de 374 alunos respondentes do questionário de CCE’S de McClelland, permitindo identificar carências nas características “persistência”, “correr riscos calculados”, “estabelecimento de metas” e “persuasão e redes de contato”. Assim, sugere-se que os órgãos gestores da referida universidade incentivem a criação de programas e projetos que estimulem o desenvolvimento do comportamento empreendedor dos seus alunos, tendo em vista a relevância do papel do empreendedor na sociedade.
Palavras-chave:EmpreendedorismoEmpreendedorismo,Características Comportamentais EmpreendedorasCaracterísticas Comportamentais Empreendedoras,AdministraçãoAdministração.
Abstract: With the purpose of exploring the panorama of academic entrepreneurship, it was proposed to carry out this study, which aims to analyze the entrepreneurial behavioral characteristics (CCE’s) in undergraduate students in the administration of a higher education institution. For this, the following specific objectives were established: to outline the profile of the management students of the studied institution; Mapping the entrepreneurial behavioral characteristics of these academics; And propose actions to improve these characteristics. The research, with a quantitative and descriptive methodological approach, obtained a sample of 374 students responding to the McClelland CCE’S questionnaire, allowing the identification of deficiencies in the characteristics “persistence”, “taking calculated risks”, “goal setting” and “persuasion and networks Of contact”. Thus, it is suggested that the governing bodies of this university encourage the creation of programs and projects that stimulate the development of the entrepreneurial behavior of its students, in view of the relevance of the entrepreneur's role in society.
Keywords: Entrepreneurship, Entrepreneurial Behavioural Characteristics, Management.
Artigos
CARACTERÍSTICAS COMPORTAMENTAIS EMPREENDEDORAS: UM ESTUDO COM ACADÊMICOS DE ADMINISTRAÇÃO DE UMA UNIVERSIDADE BRASILEIRA
ENTREPRENEURIAL BEHAVIORAL CHARACTERISTICS: A STUDY WITH ACADEMICS OF ADMINISTRATION OF A BRAZILIAN UNIVERSITY
Recepção: 23/11/2016
Aprovação: 30/06/2017
As condições socioeconômicas do mundo contemporâneo requerem a atuação de indivíduos inovadores, que se apresentem como agentes de mudança, destacando fatores positivos das situações em que se encontram. Especificamente na esfera dos negócios, esses indivíduos são relevantes ativos intelectuais que podem contribuir para o desenvolvimento das organizações, devendo, para isso, estarem preparados para lidar com as adversidades do mundo dos negócios, o que implica buscar oportunidades, correr riscos calculados e estabelecer metas. Tais comportamentos representam algumas das características do perfil empreendedor, e o desenvolvimento dessas características nos gestores pode contribuir para a criação e gestão das organizações.
Os índices de desemprego brasileiro demonstrados no Relatório de Inflação (2015) encontram-se em patamares nunca vistos. Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), em 2015, 81 mil empregos formais foram eliminados, e o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2015), recuou 0,2% no primeiro trimestre desse ano em relação ao quarto trimestre de 2014. Ferreira e Callado (2015), por sua vez, afirmam que o Brasil está, desde 2008, em um processo de retração econômica. Tais indicadores evidenciam a necessidade latente de incentivar novos empreendedores para que estes impactem o desenvolvimento da economia, gerando novas ideias e transformando-as em empreendimentos lucrativos (RAUFFLET; BRES; FILION, 2014).
A dependência cada vez maior da capacidade de ativos intelectuais para gerar ideias que visem ao desenvolvimento econômico e social (QUANDT et al., 2014) traz à tona a discussão sobre o papel dos empreendedores nesse contexto. Isso se explica pois tais atores se caracterizam como detentores de habilidades capazes de impulsionar o processo de desenvolvimento econômico e social (LIMA et al., 2015b).
Visto que atributos do comportamento empreendedor podem ser aperfeiçoados (POLITIS, 2005; HOLCOMB et al., 2009; DOLABELA; FILION, 2013; ZAMPIER; TAKAHASHI, 2014), é preciso lembrar que as universidades são as principais influenciadoras nesse processo de desenvolvimento de indivíduos empreendedores. Nesse sentido, Bernardes e Ribeiro (2014) sugerem que as universidades sejam facilitadoras da mudança de comportamento dos indivíduos, a partir da utilização de métodos pedagógicos específicos. Para isso, os cursos de graduação necessitam estar em sintonia com as demandas da sociedade, assim como com a geração de conhecimentos na área de empreendedorismo, por meio de práticas didáticas que estimulem o desenvolvimento do comportamento empreendedor (BALCONI, 2016). Dessa forma, os métodos utilizados devem abordar práticas contemporâneas e convencionais de forma equilibrada e condizente com o contexto empreendedor (VIEIRA; ROCHA 2015).
Com base nesse raciocínio, a Comissão Europeia (2007) reforça a relevância de programas de formação empreendedora, citando o caso de países como Espanha, Irlanda, Chipre, Polônia e Reino Unido, que contemplam o empreendedorismo nos currículos de ensino básico. Somado a isso, destaca-se que a referida Comissão, em 2012, estabeleceu diretrizes estratégicas para o avanço do perfil empreendedor mediante a educação como uma das principais ações para a promoção da atividade empreendedora nos países em questão (COMISSÃO EUROPEIA, 2012).
Corroborando esse raciocínio, dados quantitativos motivam o desenvolvimento do empreendedorismo, especialmente nas instituições de ensino superior. De acordo com o Ministério da Integração Nacional (2013), as universidades podem ser um importante vetor para o desenvolvimento regional, pois, além de capacitar pessoas e atrair pesquisadores, geram demandas que podem ajudar a movimentar a economia de uma região. Um estudo realizado por Cruz et al. (2008) mostrou que, a cada 1% de acréscimo nos investimentos em educação, os índices de produtividade e de renda per capta, na região em que se inserem, aumentam 0,47% e 0,27%, respectivamente. Isso evidencia a necessidade de mobilização de instrumentos, sobretudo de políticas públicas, voltadas para a disseminação de conhecimentos a respeito do empreendedorismo, podendo as universidades atuarem na transmissão desses saberes (GOMES et al., 2014).
Para Garcia (2012), um dos principais instrumentos que contribuem para o desenvolvimento econômico e tecnológico dos países são os empreendedores acadêmicos, ou seja, empreendedores que ainda estão inseridos em instituições de ensino superior. Isso ocorre devido à possibilidade de esses alunos criarem organizações estruturadas a partir de conhecimentos científicos e tecnológicos. Ainda segundo o mesmo autor, os empreendedores acadêmicos apresentam maior capacidade, se comparados a empreendedores não acadêmicos, para a concepção de novas organizações, em função de que, muitas vezes, os negócios gerados por eles são frutos de resultados de pesquisas acadêmicas aprofundadas cientificamente (GARCIA, 2012). Desse modo, tais empresas possuem maiores chances de estabelecer atividades inovadoras, contribuindo, assim, para efeitos ou resultados positivos para a sociedade.
Nesse cenário, inserem-se os futuros administradores, hoje acadêmicos do curso de administração. Esses alunos atuarão em atividades empresarias que demandam certas habilidades, as quais podem ser aprimoradas com o desenvolvimento de características do comportamento empreendedor. Segundo Minello (2010), é a partir do nível de habilidades que os alunos apresentam maior propensão de desenvolver características empreendedoras, podendo estas ser moldadas e estimuladas.
Para que o desenvolvimento de características empreendedoras se torne contínuo e habitual, as universidades precisam estar comprometidas e engajadas. Além disso, vale salientar que a figura do administrador, independentemente da área de atuação, exerce uma ampla variedade de papéis a fim de conduzir a organização ao alcance dos seus objetivos.
Diante do exposto, o presente estudo visa analisar as características comportamentais empreendedoras (CEE’s) mais evidentes em acadêmicos de administração dos alunos de graduação de uma Instituição Federal de Ensino Superior (IFES) brasileira. Em termos específicos, almeja-se: i) traçar o perfil dos acadêmicos de administração da IFES; ii) mapear as características comportamentais empreendedoras dos referidos acadêmicos; e iii) propor ações para aprimorar as características empreendedoras desses alunos.
Ressalta-se que o presente trabalho é um recorte do projeto intitulado “Educação e Atitude Empreendedoras”, que está em andamento na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e tem como objetivo desenvolver e estimular a atitude empreendedora por meio da educação empreendedora em técnicos, professores e acadêmicos da referida instituição.
Em termos de contribuição prática, este estudo é importante pois permitirá identificar as características empreendedoras dos alunos de administração e analisar em que medida elas são ou podem ser aproveitadas, levando em consideração a relevância do desenvolvimento do comportamento empreendedor na economia e na sociedade. Além disso, poderá auxiliar no desenvolvimento de novas práticas sobre o ensino do empreendedorismo, identificando pontos fortes e fracos, bem como sugestões de melhorias para a adoção de medidas que incentivem o comportamento empreendedor de alunos de graduação.
Sabe-se que o empreendedorismo é identificado como um fenômeno propulsor do desenvolvimento econômico, visto que está positivamente relacionado à criação de novas empresas e à geração de empregos (MONTEIRO, 2014). O empreendedor, nesse sentido, é caracterizado como um agente de mudança inovador que, por meio de características especiais e habilidades específicas, desempenha determinada atividade empreendedora (SCHUMPETER, 1985). Minello (2014, p. 79) parece corroborar essa ideia, ao afirmar que o empreendedor é aquele “que desenvolve algo inovador, tem iniciativa, capacidade de organizar e reorganizar mecanismos sociais e econômicos a fim de transformar recursos e situações para proveito prático e aceita o risco ou o fracasso de suas ações”.
Sob essa perspectiva, Lorentz (2015) evidencia que o indivíduo empreendedor manifesta uma série de características que o identificam, distinguindo-o de acordo com o conjunto de habilidades que mais se aproxima da sua forma de ser. Dessa forma, as características empreendedoras fazem com que o empreendedor seja um ator social dinâmico em questões comportamentais (MARINHO, 2016). A partir disso, para identificar o comportamento empreendedor e as características empreendedoras, Brancher et al. (2012) apontam que é necessário analisar o trabalho de David McClelland (1961).
Para McClelland (1961), o indivíduo empreendedor possui três conjuntos de necessidades motivadoras – realização, afiliação/planejamento e poder –, que independem de gênero, idade ou cultura. A necessidade de realização é identificada como a primeira necessidade empreendedora e evidencia a aceitação do indivíduo ante suas habilidades (BARTEL, 2010). Já a afiliação demonstra a necessidade de estabelecer ou manter relações emocionais com as pessoas, resultando da capacidade de planejamento para soluções de dificuldades a partir de tais relações (MCCLELLAND, 1961). A necessidade de poder, por sua vez, refere-se à preocupação do indivíduo em exercer poder sobre os outros.
Nessa perspectiva, Engelman e Fracasso (2011) salientam que considerar as características empreendedoras – busca de oportunidades e proatividade, tolerância ao risco, persistência, exigência de qualidade, comprometimento, busca de informações, estabelecimento de metas, planejamento, persuasão, independência (MCCLELLAND, 1972) e outras habilidades e características individuais – pode contribuir para o desenvolvimento econômico e social, razão pela qual tais características ganham relevância, devendo ser desenvolvidas (RAUPP; BEUREN, 2011).
A partir disso, o autor identifica uma série de CCE’s, conforme explicita o Quadro 1 a seguir.
Tais características podem ajudar os indivíduos a enfrentar os desafios de empreender (MCCLELLAND, 1987), assim como sua inexistência pode inviabilizar a formação de um negócio. Nesse sentido, ressalta-se que o ensino do empreendedorismo pode auxiliar a aprimorar tais características e habilidades de gestão, promovendo a aprendizagem empreendedora (ZAMPIER; TAKAHASHI, 2014; LEIVA; ALEGRE; MONGE, 2014) e diminuindo os casos de insucessos empresariais, situação essa ratificada por Mizumoto et al. (2010), quando coloca que uma das principais razões para o insucesso empresarial é a falta de práticas de gestão, particularmente de planejamento e busca de informações.
Da mesma forma, o potencial empreendedor é algo latente, que precisa ser despertado, desenvolvido e aprimorado para que aconteça. Entende-se que tal potencial abarca traços ou características comportamentais similares às características das pessoas que alcançaram sucesso empresarial. Rauch e Frese (2007) acreditam que traços ou características da personalidade possuem um papel decisivo no processo pelo qual um indivíduo opta por abraçar uma carreira empreendedora.
Diante disso, ao identificar as características empreendedoras, despertam-se os alunos para ações que levam a comportamentos e atitudes empreendedoras. Santos (2013) amplia essa perspectiva ao afirmar que desenvolver metodologias que auxiliem indivíduos na identificação de características empreendedoras cria condições iniciais para intervenções que promovem o desenvolvimento do potencial empreendedor. Tal fato, por sua vez, pode estimular a criação de novos negócios.
Com base no objetivo definido para este artigo – analisar as CCE’s mais evidentes em acadêmicos de administração dos alunos de graduação de uma universidade brasileira – esta pesquisa teórico-empírica apresenta enfoque quantitativo, do tipo descritivo. Tal enfoque, para Ramos (2013), é utilizado quando se busca descrever e/ou comparar características de grupos sociais, realidades, contextos ou instituições e estabelecer relações causais, caso deste estudo.
A população desta pesquisa é composta de 810 alunos. Para o cálculo do tamanho mínimo da amostra, optou-se pela fórmula a seguir (Equação 1), que, segundo Fonseca e Martins (1996), destina-se a uma população finita, considerando-se 95% de nível de confiança e 5% de erro padrão.
Onde:
e corresponde ao erro amostral;
N corresponde ao tamanho da população;
n corresponde à amostra mínima
a = 0,05 corresponde ao nível de significância
p = 0,5 e q = 0,5;
Z2α/2 = 1,96 para um nível de confiança de 95%.
Conforme a equação exposta e considerando 95% de nível de confiança e 5% de erro amostral, a amostra mínima corresponde a 262 alunos. A população-alvo da pesquisa corresponde aos alunos de dois cursos de administração da UFSM (Campus Palmeira das Missões e Campus Santa Maria). Tendo em vista que a amostra de discentes deve representar a população dos dois cursos, a amostra final contempla, para fins de coleta de dados, um estrato de cada curso (Tabela 1).
O percentual apresentado na Tabela 1 corresponde à equivalência na participação de cada curso de administração na amostra mínima da pesquisa. O total coletado a partir de uma amostra não probabilística consistiu em 374 instrumentos, sendo 219 do campus de Palmeira das Missões e 155 do campus de Santa Maria, ambos pertencentes à UFSM, universidade em que a pesquisa foi realizada. Nesse sentido, a amostra mínima foi superada por uma diferença de 112 instrumentos. Estes foram coletados entre os meses de março e maio de 2015, tendo sido entregues pessoalmente nas salas de aula, seguindo um cronograma prévio com a descrição dos horários e das salas de aulas de cada turma.
Ressalta-se que, para esta pesquisa, não foi considerada a diferença de localização dos dois cursos pesquisados. Desse modo, a análise refere-se a alunos de administração da UFSM, não distinguindo o campus desses alunos.
Para a coleta de dados, utilizou-se um questionário formado por um conjunto de 61 questões, sendo dividido em duas partes. A primeira parte possui seis questões acerca do perfil do pesquisado, incluindo aspectos referentes à idade, ao gênero, ao estado civil, à renda e ao semestre. A segunda parte é baseada nas dez CCE’s de McClelland (MANSFIELD, 1987), composta de 55 afirmações. Cada uma delas foi respondida de acordo com uma escala Likert de 5 pontos, conforme a seguinte gradação: 1 = nunca, 2 = raras vezes, 3 = algumas vezes, 4 = usualmente e 5 = sempre.
As CCE’s dividem-se em dez características, e cada uma delas é identificada por cinco questões do questionário, conforme exposto no Quadro 2.
No Quadro 2, o (*) corresponde às questões negativas, em que a pontuação deve ser subtraída do resultado final da respectiva característica e deve-se acrescentar seis pontos ao final do somatório. As questões de número 11, 22, 33, 44 e 55 correspondem ao “Fator de Correção”, utilizado para evitar que, muitas vezes de modo inconsciente, o respondente apresente uma autoimagem excessivamente favorável. O Fator de Correção é utilizado se o somatório da pontuação dessas questões for igual ou superior a 20 pontos. Se isso ocorrer, todas as CCE’s deverão ser corrigidas com a subtração dos pontos correspondentes, conforme apresentado no Quadro 3.
A pontuação final, após a aplicação do Fator de Correção, identifica a intensidade de cada uma das dez características empreendedoras. A pontuação máxima é de 25 pontos para cada uma das características. Quando o total for superior a 50% da pontuação, o indivíduo possui a respectiva característica e é considerado empreendedor (MANSFIELD et al., 1987).
No entanto, para o presente estudo optou-se por adotar uma estratificação para analisar a intensidade das CCE’s nos alunos participantes, com o objetivo de melhor compreender as características dos alunos de administração. Desse modo, desenvolveu-se uma estratificação, dividindo-se a pontuação total em quatro partes. Essa escala transforma em percentual os limites obtidos, classificando-os em níveis em uma escala de razão de zero a 100%. Esses níveis são: Característica Inexistente, Muito Baixo, Baixo, Alto e Muito Alto. Para melhor visualização dos dados com essa estratificação, utilizou-se uma escala complementar de cores. Logo, para o instrumento das CCE’s (MANSFIELD et al., 1987), a estratificação ocorre da seguinte forma: Característica Inexistente de 0 a 50% (preto), Muito Baixo de 50,01% a 62,50% (vermelho), Baixo de 62,51% a 75% (laranja), Alto de 75,01% a 87,50% (amarelo), e Muito Alto de 87,51 a 100% (verde), o que pode ser verificado na Figura 1.
Para a análise, os dados foram tabulados com a utilização do Microsoft Office Excel® e, posteriormente, analisados pelo programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) v. 24. Os métodos utilizados para análise estatística contemplaram, inicialmente, a estatística descritiva com a identificação das médias, do desvio-padrão e dos mínimos e máximos, calculados por construto e característica. Após, foi testada a normalidade dos dados por meio do teste Kolmogorov-Smirnov, uma vez que a amostra da pesquisa obteve “n” maior do que 30. O referido teste de normalidade identificou dados não normais, o que indicaria o uso de testes paramétricos. Porém, para Leech, Barret e Morgan (2005), as variáveis em que a medida Skewness constar entre -1> e <1 estão aptas para testes paramétricos, visto que ocorre uma normalidade aproximada dos dados. Nesse sentido, após o teste de normalidade, estipulou-se testes paramétricos para os dados. Com o objetivo de testar a confiabilidade dos dados, foi calculado o Alfa de Cronbach. Em seguida, para verificar a adequação da amostra, foi utilizada a medida de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO). Também foram realizados o teste de esfericidade de Bartlett e a análise fatorial por característica e por construto.
Para verificar a dimensionalidade de cada construto dos instrumentos e para determinar a quantidade de fatores extraídos, foi utilizada a análise fatorial exploratória com o método eigenvalue, o qual indica que os fatores devem ter um autovalor maior que 1. Por fim, realizaram-se a correlação de Pearson e o teste de comparação de médias. Com a finalidade de estabelecer a relação entre as características empreendedoras, foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson.
Participaram da pesquisa 374 alunos de graduação em Administração da UFSM, cujo perfil é apresentado, a seguir, no Quadro 4.
Conforme o quadro exposto, no que se refere ao perfil sociodemográfico dos participantes, a amostra foi composta de 61% de alunos do sexo feminino e 39% do sexo masculino, os quais se encontram na faixa etária de 22 a 27 anos (45%) e até 21 anos (38%). Com relação ao estado civil, 84,8% são solteiros. Quando questionados sobre a existência de negócios na família, 51% dos respondentes responderam positivamente, enquanto que 43% responderam negativamente.
Inicialmente, apresenta-se a estatística descritiva (Quadro 5) composta pelo cálculo das médias, desvio-padrão e pontuações mínimas e máximas de cada CEE (MSI, 1990). Salienta-se que o limite máximo para cada CCE é 25 pontos.
A partir dos resultados apontados, destacam-se as características “Estabelecimento de metas” (7) e “Persuasão e redes de contato” (7), que apresentaram o menor valor mínimo diante das outras características. Esse resultado pode indicar que os alunos investigados concedem menor importância para a definição de metas de longo prazo e para o estabelecimento de objetivos mensuráveis de curto prazo; e que não estão inclinados a influenciar ou persuadir as pessoas. Com base na análise estratificada proposta, ambas as CCE’s apresentam médias (Figura 2) caracterizadas com a coloração laranja, ou seja, em nível considerado baixo.
A partir da Figura 2, verifica-se que a característica “Busca de oportunidades e iniciativa” (19,8) obteve a maior média. Segundo McClelland (MS1, 990), essa característica envolve certas atitudes do empreendedor, como fazer as coisas antes do solicitado, atuar para expandir seu conhecimento e aproveitar oportunidades fora do comum para iniciar um projeto inovador (SEBRAE, 2011). Já a característica que obteve a segunda maior média foi “Comprometimento” (19,3). De acordo com McClelland (MSI, 1990), tal característica implica fazer um sacrifício pessoal ou despender um esforço extraordinário para completar uma tarefa, bem como colaborar com o próximo ou se colocar no lugar dele, se necessário, para terminar um trabalho (SEBRAE, 2011). Nesse sentido, os alunos que evidenciaram essa característica indicam assumir responsabilidades e exercer suas atividades com dedicação.
Por outro lado, a característica “Persistência” (16) obteve a menor média. Ser persistente, segundo McClelland (MSI, 1990), significa agir diante de um obstáculo significativo; agir repetidamente ou mudar de estratégia, a fim de enfrentar um desafio ou superar um obstáculo; e assumir responsabilidade pessoal pelo desempenho necessário ao atingimento de metas e objetivo (SEBRAE, 2011). Nesse sentido, isso pode sugerir que os estudantes de administração não agem com o objetivo de superar um obstáculo significativo, o que demonstra ser um fator preocupante, visto que, o mundo dos negócios, ambiente em que irão se inserir os futuros administradores, é caracterizado como hostil e repleto de desafios tanto organizacionais quanto pessoais.
Com o objetivo de melhor compreender o nível de cada característica empreendedora, apresenta-se, na Figura 3, a escala de intensidade, na qual demonstra-se proporcionalmente o percentual das CCE’s dos respondentes.
Quanto à inexistência de características, identificada pela cor preta, ressaltam-se “Persistência” e “Correr riscos calculados” (ambas com 15,51%). Isso pode sinalizar uma menor disposição dos alunos investigados para assumir desafios e avaliar as alternativas, a fim de reduzir os riscos e controlar os resultados para tomada de decisão; bem como de agir diante de um obstáculo significativo, de modo a enfrentar desafios ou superar obstáculos. Ser persistente, segundo Schmidt e Dreher (2008), corresponde ao enfrentamento de desafios e à não desistência diante de obstáculos. Nesse sentido, a persistência pode ser considerada a sinergia que leva o indivíduo a agir de diferentes formas, saindo da zona de conforto com o objetivo de atingir sua meta.
Em relação à intensidade muito baixa de características, identificada pela cor vermelha, apontam-se “Persistência” (42,51%) e “Persuasão e redes de contato” (36,63%). Esses resultados permitem inferir que o comportamento dos alunos investigados não está inclinado a influenciar ou persuadir e também que há falta de persistência ao buscar atingir determinado objetivo.
Destaca-se, ainda, a característica empreendedora “Busca de oportunidades e iniciativa” como a predominante nos alunos, tanto no nível alto (41,71%) quanto no nível muito alto (14,71%). Tal característica indica que o comportamento dos alunos investigados está voltado à busca de objetivos desafiadores em médio e longo prazos, visando à satisfação e ao desenvolvimento pessoal (MCCLELLAND, 1987).
A partir da estratificação de cada característica apresentada nas Figuras 2 e 3, infere-se que a maioria das características comportamentais empreendedoras dos alunos de administração se apresenta em nível muito baixo e baixo.
Como passo seguinte de análise, foi realizado o teste de normalidade Kolmogorov-Smirnov, indicado para amostras grandes (n ³ 30) (BELFIORE, 2015). Os resultados desse teste são apresentados no Quadro 3, exposto a seguir.
Os resultados para o teste de normalidade indicaram que os escores das características e suas respectivas dimensões obtiveram significância menor que 0,05, o que significa que a distribuição dos dados difere de uma distribuição normal (Sig.<0,05). No entanto, para Leech, Barret e Morgan (2005), pode-se considerar as variáveis aptas para testes paramétricos quando o Skewness constar entre -1> e <1, momento em que, para os autores, ocorre uma normalidade aproximada, permitindo que se apliquem testes paramétricos.
Na sequência, com o objetivo de estimar a confiabilidade dos resultados, foi calculada a consistência interna por meio do coeficiente Alfa de Cronbach (SAMPIERI; COLLADO; LUCIO, 2013). O valor do coeficiente Alfa de Cronbach pode variar de 0 a 1 – quanto mais próximo de 1, melhor a confiabilidade, uma vez que maior será a consistência interna do instrumento ou maior a congruência entre os itens, indicando a homogeneidade da medida do mesmo fenômeno (MATTHIENSEN, 2011). Obteve-se o coeficiente a = 0,931, o que demonstra a existência de confiabilidade nos resultados obtidos.
Para verificar a adequação da amostra, foi utilizada a medida de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), cujos valores aceitáveis são entre 0,5 a 1,0. Obteve-se um KMO de 0,595, resultado considerado ruim (LOPES, 2015), no entanto aceitável para a análise fatorial (HAIR JR. et al., 2009).
Também foi realizado o teste de esfericidade de Bartlett, que, para Lopes (2016), tem por finalidade testar a hipótese de que as variáveis não sejam correlacionadas (Ho) (p > 0,05). A hipótese básica diz que a matriz de correlação é uma matriz identidade, indicando que o modelo fatorial é inadequado. O teste de esfericidade Bartlett resultou em uma Sig. de 0,000, ou seja, indicou a significância das correlações entre os fatores das CCE’s, apoiando a conveniência da análise fatorial para os dois instrumentos, com nível de confiança de 95%. (HAIR et al., 2009).
Nesse sentido, para a análise fatorial, optou-se por analisar as dez CCE’s e suas três dimensões: realização, planejamento e poder. Para isso, foi utilizado o método de componentes principais com tratamento pairwise para os casos omissos. Para determinar a quantidade de fatores extraídos, foi empregado o método eigenvalue, que indica que os fatores devem ter um autovalor maior que 1. Para rotação dos fatores, optou-se pelo método Varimax, que atribui altas cargas aos fatores e diminui o número de variáveis em cada setor, não alterando as variâncias e as comunalidades, o que, para Hair Jr. et al. (2009), facilita a interpretação dos fatores, pois cada fator novo, após rotação, deve apresentar uma correlação forte com uma ou mais variáveis e correlação fraca com as demais variáveis.
No Quadro 4, consta a contribuição percentual dos fatores e a variância total, indicando que três fatores representam 72,57 % de contribuição.
No gráfico de escarpa (Figura 4), consta o número de componentes fatoriais extraídos em relação aos autovalores associados a esses fatores, verificando-se três fatores acima do limite 1,00.
Para o presente estudo, optou-se por considerar o resultado do critério da raiz latente (Quadro 4) confirmado no gráfico de escarpa (Figura 4), em que três fatores apresentaram autovalor maior que um. Após análise dos componentes extraídos, demonstra-se a matriz de coeficientes das cargas fatoriais (Quadro 5). Esse método verifica como os itens se agrupam em relação aos fatores. Foram incluídos na escala apenas os itens com cargas fatoriais superiores ou iguais a 0,30, já que, para Hair Jr. et al. (2009), para amostras superiores a 350, é indicado utilizar carga fatorial de 0,30.
A partir do Quadro 5, verifica-se que os resultados coincidem com a classificação das características elaboradas por McClelland, em que a dimensão “Realização” compreende as características de “Busca de oportunidades e iniciativa”, “Persistência”, “Comprometimento”, “Exigência de qualidade e eficiência” e “Correr riscos calculados”; a dimensão “Planejamento” compreende as características de “Estabelecimento de metas”, “Busca de informações” e “Planejamento e monitoramento sistemáticos”; e a dimensão “Poder” contempla as características de “Persuasão e redes de contanto” e “Independência e autoconfiança”. Verifica-se que a análise realizada confirmou a estrutura fatorial do instrumento de CCE’s (MANSFIELD et al., 1987).
Com a finalidade de estabelecer a relação entre as características empreendedoras, foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson, que, de acordo com Collis e Hussey (2005), consiste em uma técnica paramétrica que indica a medida de força de associação entre duas variáveis. De acordo com Hair Jr. et al. (2009), o coeficiente de correlação de Pearson tem o objetivo de medir a associação linear entre duas variáveis métricas e possui variação de -1,00 a 1,00. Valores de coeficiente “r” próximos a +1 um indicam pouca dispersão, o que expressa uma correlação forte e positiva; já os valores próximos de zero indicam muita dispersão e ausência de relação entre as variáveis; e, por fim, o valor de “r” próximo de -1 significa pouca dispersão e uma correlação negativa forte (LOPES, 2016). Para este estudo, foi adotada a convenção de Dancey e Reidy (2005), que apontam para a seguinte classificação: r = 0,10 até 0,39 (fraco); r = 0,40 até 0,69 (moderado); e r = 0,70 até 1,00 (forte).
A matriz de correlação e a significância entre as médias das características estudadas são apresentadas no Quadro 6.
Verifica-se que as correlações entre as características foram associações positivas fracas, em sua maioria, o que indica haver relação direta entre tais características, sendo a CCE com maior correlação a “Busca de informações”, com 0,64, que pode ser considerada uma correlação positiva moderada. Referente à relação entre as características empreendedoras e as dimensões “Realização”, “Planejamento” e “Poder”, a maior significância foi verificada na dimensão “Poder”, com o valor 0,88, da característica “Independência e Autoconfiança”, o que denota uma correlação forte; e a menor significância pertenceu à característica de “Comprometimento”, na dimensão “Realização”, com o valor de 0,70, o que corresponde a uma correlação forte. Dentre as dimensões, o “Planejamento” obteve maior pontuação, 0,73, ou seja, uma correlação forte.
No Quadro 7, apresenta-se o comparativo entre as CCE’s e dimensões dos respondentes do sexo masculino e feminino.
A partir do Quadro 7, infere-se que o sexo feminino obteve maior pontuação na maioria das CCE’s, inclusive nas dimensões de “Realização” e “Planejamento”. Para Balte (2010), as mulheres realizam as coisas antes do solicitado e aproveitam oportunidades para empreender. Além disso, procuram assumir a responsabilidade pessoal para agir diante de obstáculos e superá-los.
Já os respondentes do sexo masculino alcançaram maior pontuação nas CCE’s de “Independência e autoconfiança”, “Persuasão e redes de contato” (ambas pertencentes à dimensão “Poder”) e “Correr riscos calculados”. Isso pode ser explicado, conforme Balte (2010), porque os homens tendem a considerar mais os desafios ou riscos moderados nas situações, avaliando as alternativas e calculando os riscos para que tenham maior controle dos resultados. Para McClelland (1987), autoconfiança e independência são reveladas quando o indivíduo confia na sua própria capacidade e mantém seu ponto de vista diante da oposição ou de resultados contrários.
Ressalta-se que tanto os respondentes do sexo feminino quanto os do sexo masculino obtiveram pontuação igual para “Busca de informações” (17,96), o que pode ser explicado pelo fato de se tratarem de acadêmicos e, portanto, almejarem o conhecimento.
Considerando-se o objetivo geral deste estudo – analisar as CCE’s mais evidentes em acadêmicos de administração – pode-se afirmar que este foi alcançado. Isso se sustenta em função de que, após a análise dos instrumentos coletados, foi possível constatar que a maioria dos alunos apresenta CCE’s, porém em níveis considerados baixo e muito baixo. Tal fato pode ser destacado como preocupante, visto que alunos empreendedores podem impactar positivamente a sociedade.
Diante disso, pode-se apontar as universidades como um dos fatores que contribuem para baixos níveis de características empreendedoras dos alunos de graduação. Segundo a pesquisa “Empreendedorismo nas Universidades Brasileiras” (ENDEAVOR, 2016), as universidades brasileiras não estão atendendo às necessidades dos alunos, visto que apenas 36% do corpo discente das universidades está satisfeito com as iniciativas de empreendedorismo promovidas por sua instituição. Como alternativa, especificamente para o curso de administração da UFSM, sugere-se a aproximação da universidade com o mercado, com os empreendedores e com a comunidade em geral, já que isso propiciará o desenvolvimento de projetos e ações alinhadas com a demanda dos estudantes de administração e do mercado.
Com relação ao primeiro objetivo específico deste trabalho – traçar o perfil dos acadêmicos de administração da UFSM –, pode-se afirmar que a amostra foi composta predominantemente de alunos do sexo feminino (61%), os quais pertencem à faixa etária de 22 a 27 anos (45%). Além disso, 51% dos alunos apontaram a existência de empresas na família.
Para a execução do segundo objetivo específico – mapear as CCE’s dos referidos acadêmicos – realizou-se a aplicação, tabulação e análise do questionário sobre as CEE’s proposto por McClelland (MSI, 1990). Nesse sentido, os alunos evidenciaram características baixas e muito baixas, tais como: persistência, correr riscos calculados, estabelecimento de metas e persuasão e redes de contato. No entanto, esses alunos apresentaram características de nível alto para busca de oportunidades e iniciativa e comprometimento.
A partir das carências empreendedoras evidenciadas nos alunos de graduação de administração da UFSM, aponta-se o projeto “Educação e Atitude Empreendedora”, do qual faz parte o presente estudo, como forma de contribuir para suprir as deficiências evidenciadas neste artigo, uma vez que o referido projeto tem como objetivo estimular atitudes empreendedoras nos alunos de graduação da UFSM, por meio de atividades e ações integradas entre alunos, professores e gestores da instituição, buscando desenvolver alicerce para a criação de uma universidade empreendedora.
Quanto à contribuição deste estudo, salienta-se que os resultados aqui obtidos podem servir de base para um estudo longitudinal que permita acompanhar os alunos do curso de administração no decorrer dos semestres letivos, bem como realizar associações entre os diversos tipos de cursos da instituição de ensino pesquisada. Esse aspecto é reforçado pelo fato de que estudos nessa perspectiva ainda são poucos, visto que se constata uma carência dentro da área do conhecimento acerca de acadêmicos de graduação em relação às CCE’s. Como contribuição prática, aponta-se que as discussões a respeito das carências comportamentais empreendedoras dos alunos podem servir como estímulo para o desenvolvimento de novos projetos e ações que visem estimular o empreendedorismo na UFSM.
No que concerne às limitações deste estudo, não houve a possibilidade de abordar um grupo maior de alunos com a aplicação do instrumento, devido ao limite temporal da pesquisa, bem como do processo. Como sugestão para futuros estudos, recomenda-se que pesquisas sobre o tema ocorram de forma continuada no curso de graduação em administração, trazendo informações sempre atualizadas acerca das CCE’s dos alunos e permitindo verificar a evolução e o desenvolvimento tanto do comportamento dos indivíduos quanto das práticas educacionais do curso. Essa verificação em dois momentos não foi possível durante a realização deste trabalho, tendo em vista o escasso tempo para sua execução.