Resumo: A gestão de projetos no setor público tem assumido novos conteúdos, objetivando transformar as práticas de gestão num modelo de inteligência para implementação de estratégias, de onde emergiu o interesse em ampliar os estudos na esfera municipal. O objetivo foi identificar as práticas de gerenciamento de projetos, segundo o padrão de boas práticas PMBoK. Os procedimentos metodológicos envolveram uma etapa exploratória com coleta de dados junto aos secretários municipais, o que contribuiu para a ampliação do conhecimento sobre práticas de gerenciamento e, consequentemente, para a estruturação do questionário respondido posteriormente por autopreenchimento por 60 gestores. A análise dos dados utilizou o tratamento estatístico básico, suficiente para alcançar o objetivo, cujo resultado revelou que o gerenciamento de escopo, integração e aquisições encontram-se em nível superior de aderência às boas práticas, enquanto custos, qualidade, cronograma e comunicações em nível inferior e riscos e recursos humanos em nível mais crítico.
Palavras-chave:Gestão de projetosGestão de projetos,Áreas de conhecimentoÁreas de conhecimento,PMBoKPMBoK.
Abstract: Project management in the public sector has assumed new content, aimed at transforming the management practices in intelligence model for implementation of strategies, from which emerged the interest in expanding the studies at the municipal level. The goal was to identify the project management practices, according to the standard of good practice PMBoK. The methodological procedures involves an exploratory stage with data collection with municipal secretaries, which contributed to the expansion of knowledge about management practices and hence for structuring the questionnaire later answered by self-administered for 60 managers. Data analysis used the basic statistical analysis, enough to reach the goal, the result revealed that the management scope, integration and acquisitions are on the upper level of adherence to best practices, as cost, quality, schedule and communications level and lower risks and human resources for more critical level.
Keywords: Project management, Areas of knowledge, PMBoK.
ARTIGOS
BOAS PRÁTICAS EM GESTÃO DE PROJETOS: UM ESTUDO NA PREFEITURA DE PRAIA GRANDE
GOOD PRACTICES IN PROJECT MANAGEMENT: A STUDY IN THE MUNICIPALITY OF PRAIA GRANDE
Recepção: 09 Fevereiro 2014
Aprovação: 20 Maio 2016
Embora o tema gestão de projetos no setor público não seja novo, tem assumido novos conteúdos nas últimas décadas, evidenciando a construção de consenso em torno da necessidade de transformar as práticas no setor público em favor de uma administração mais eficiente e focada em resultados para o cidadão, tanto na esfera estadual quanto na municipal (MATUS, 2004). Atualmente, a inovação na forma de gerir o governo tem a preocupação de gerenciar projetos que atendam aos anseios da população como questão da maior relevância (TEIXEIRA, 2006).
Os conflitos e obstáculos na implantação de uma inovação dependem, também, de características da organização, tais como cultura, coalizões, estrutura, formalização, estratégia, capacitação dos membros, entre outros fatores (SILVA; GONÇALVES, 2011).
Nesse sentido, os dilemas da gestão pública municipal democrática estão em evidência no mundo moderno em face da exigência por parte do governo federal, que determina que as contas públicas municipais sejam disponibilizadas de forma transparente à sociedade (PFEIFFER, 2010). Para Sato, Dergint e Hatakeyama (2003), a gestão de projetos está sendo aplicada nas mais diversas áreas, em consequência da aceleração do ritmo de mudanças em qualquer ambiente organizacional, inclusive nas administrações municipais, sendo alvo de atenção de pesquisadores e preocupação dos gestores públicos.
Em paralelo, considere-se que Verzuh, já em 2001, alertava para o fato de que uma das relevantes características do bom uso de práticas de gerenciamento de projetos era transformar a administração pública municipal num modelo de inteligência, que permitisse auxiliar na implementação das estratégias e no acompanhamento dos objetivos traçados no cenário dos planejamentos municipais (VERZUH, 2001). Todavia, uma instituição pública está condicionada a processos específicos, geralmente relacionados com a burocracia do setor público e com as restrições impostas pela legislação (GOHR et al., 2013).
Nesse sentido, o problema de pesquisa que originou este estudo emergiu do interesse em ampliar os estudos em gestão de projetos na esfera municipal, a partir de um olhar de boas práticas para o seu gerenciamento.
Orientada por esse interesse, a busca de referências que subsidiassem um roteiro de boas práticas encontrou vários estudos, como o de Kerzner (2006), PMI (2008), Ruuska e Brady (2011), Kniess, Teixeira e Maccari (2012), Demeulemeester, Kolisch e Salo (2013), Carvalho, Abreu e Pedrozo (2013), Donato, Kubo e Domingues (2013) e Radaieski, Fróes e Bandeira (2015). Entretanto, observou-se, nos materiais pesquisados, que as técnicas de gerenciamento de projetos convergem para um padrão próximo ao presente no guia de boas práticas PMBoK (Project Management Body of Knowledge). Assim, embora o gerenciamento de projetos possa ser executado sob outras orientações, a opção pelo padrão previsto nesse guia deve-se à sua intensa presença no ambiente de gerenciamento de projetos nas organizações (PMI, 2008).
Registre-se, ainda, que se buscou realizar o estudo a partir de uma unidade administrativa municipal, que fosse ao encontro do que a abordagem de Verzuh (2001), anteriormente citada, apregoava para a administração pública municipal. Além disso, o uso efetivo de projetos nas organizações não tem sido acompanhado de um desenvolvimento de teorias de gerenciamento de projetos. Portanto, paradoxalmente, isso mostra que o gerenciamento de projetos, no contexto organizacional, é algo completamente novo e, provavelmente, pouco compreendido (DEMEULEMEESTER; KOLISCH; SALO, 2013).
Assim, o interesse pela escolha da Prefeitura de Praia Grande (PPG) como caso a ser estudado empiricamente deve-se a dois aspectos. De um lado, o amplo espaço ainda a ser estudado para descrição do novo ambiente de gestão esperado para o setor público, em especial nas administrações municipais, à luz do modelo mais empreendedor e inovador, conforme abordagem de Matus (2004) e Silva e Gonçalves (2011). De outro, os resultados presentes no ambiente da PPG, os quais registram destaques por entidades externas acerca da administração dessa prefeitura. Tais resultados referem-se a: recebimento, pela quinta vez, em 2011, do prêmio “Empreendedor do ano” oferecido pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae); recebimento, em 2011, do prêmio “Cidade amiga da bicicleta”, pela criação do programa “Educação para o futuro”; obtenção do melhor índice de futuridade, segundo a Fundação Seade, em 2011; e reconhecimento e referência por outros municípios da Baixada Santista.
Assim, este estudo objetiva identificar as práticas de gerenciamento de projetos praticadas pela PPG, segundo o padrão de boas práticas do guia PMBoK. Este artigo está estruturado em seis partes. Além desta primeira parte introdutória, a segunda apresenta o referencial teórico, construído a partir da abordagem de autores que versam sobre gestão de projetos e sobre as áreas de conhecimento para seu gerenciamento, incluindo as trabalhadas pelo guia de boas práticas PMBoK. A terceira parte apresenta os procedimentos metodológicos utilizados para a realização da pesquisa empírica, enquanto a quarta parte trata da análise de seus resultados, segundo o objetivo específico delineado. A quinta parte trata das conclusões, e, por fim, apresentam-se as limitações e recomendações deste estudo.
Esta seção se compõe de dois tópicos: conceituação de projetos e áreas de conhecimento de boas práticas.
2.1 Conceituação de projetos
Sob a perspectiva da teoria de Amaral (2005) e Carvalho, Abreu e Pedrozo (2013), um projeto pode ser definido como um empreendimento único e temporário que necessita de planejamento específico para atingir seus objetivos. De acordo com o PMI (2008), um processo de gerenciamento de projetos é um conjunto de ações gerenciais e atividades realizadas para obter um conjunto preestabelecido de produtos, resultados ou serviços.
A abundante literatura disponível sobre gestão de projetos é, também, um relevante indicativo da importância do tema deste estudo. Uma reflexão sobre as temáticas presentes na literatura selecionada fez emergir uma discussão sobre o ambiente de gerenciamento de projetos no setor público quanto à sua dinâmica das práticas de gerenciamento de projetos. Apesar da constante evolução das metodologias de gestão de projetos, de acordo com Verzuh (2001) e PMI (2008), as novas e mais recentes políticas de gestão de projetos necessitam estar dedicadas, ou mesmo alinhadas, com os planejamentos municipais, em especial em sintonia com a gestão urbana. Sendo assim, nas gestões municipais, o apoio do Executivo, no caso, o prefeito, ao longo do processo de definição das estratégias e das ações/programas/projetos delas decorrentes é “considerado condição fundamental para a eficácia dos esforços de planejamento” (ROMEIRO et al., 2011, p. 76).
De um lado, o projeto pode ser considerado como um esforço temporário, no qual se pretende atingir um objetivo em comum, enquanto seu gerenciamento implica o estabelecimento de habilidades, técnicas e iniciativas para atingir o seu sucesso (KERZNER, 2006;PMI, 2008). Por outro lado, a gestão de projetos refere-se à ênfase dada à área de conhecimento dos membros participantes da equipe técnica (KERZNER, 2006;PMI, 2008).
Muitas organizações não examinam criticamente as causas para o fracasso do projeto e isso as impede de aprender com seus erros. Mesmo nos casos de insucesso do projeto, existe a possibilidade de se extrair conhecimentos úteis à organização, por meio das lições aprendidas (RUUSKA; BRADY, 2011).
Apesar da constante evolução das metodologias de gestão de projetos, as dificuldades para concluir os planos dentro do prazo, com as características desejadas e mantendo os custos dentro do orçado, ainda persistem (CAMPOS; CSLILIAG; SAMPAIO, 2001). Para Donato, Kubo e Domingues (2013), atualmente, predomina na literatura a ideia de que conflitos, naturais e inevitáveis nas relações humanas, produzem efeitos positivos e negativos nas organizações. Já Gama (2003) levanta quatro fatores para a solução desses problemas: comprometimento da alta administração com a gestão de projetos; recursos e capacitação; cultura da organização; e maturidade em gestão de projetos.
O guia PMBoK é norma reconhecida para o gerenciamento de projetos, que estabelece diretrizes para gerir os projetos individuais, definindo os conceitos e descrevendo o ciclo de vida do gerenciamento de projetos e os seus processos, e tem como principal objetivo identificar o subconjunto do conjunto de conhecimentos em gerenciamento de projetos (PMI, 2008). Assim, uma boa prática não significa que o conhecimento descrito deverá ser aplicado uniformemente em todos os projetos. O gerente de projetos é o responsável por definir o que é adequado para um projeto específico (PMI, 2008).
Santos e Cabral (2005) enfatizam que muitos projetos falham por atrasos no cronograma ou má gestão orçamentária e defendem que o gerenciamento de riscos representa papel essencial para o sucesso dos projetos. Sob a perspectiva de Cintra e Vieira (2007), para a implementação da gestão de projetos em órgãos públicos é preciso selecionar colaboradores que tenham habilidade para utilizar, elaborar e acompanhar o desenvolvimento dos projetos. Para Radaieski, Fróes e Bandeira (2015), a cultura do país e a natureza da organização (pública versus privada) são variantes que poderiam ser mais bem exploradas.
Conforme Matus (2004), a essência do planejamento estratégico municipal é o acompanhamento constante da realidade e a avaliação das decisões esperadas, com o propósito de verificar se os resultados produzidos tendem na direção dos resultados pretendidos. Já para Andrade et al. (2005), a prática do planejamento nos municípios visa corrigir distorções administrativas; facilitar a gestão municipal; alterar a comunidade local sobre condições indesejáveis; remover empecilhos institucionais e assegurar a viabilização de propostas estratégicas, o alcance dos objetivos e a realização das ações planejadas. Segundo Reid (2011), o envolvimento dessas práticas no processo de planejamento pode auxiliar no sucesso do projeto.
Assim, planejar a cidade parece ser o ponto de partida para uma administração municipal mais efetiva, em que a qualidade da gestão de seus projetos estabelecerá os rumos para uma boa ou má gestão, com reflexos diretos no bem-estar dos munícipes (SANTOS; RIBEIRO, 2004).
2.2 Áreas de conhecimento de boas práticas
Conforme visto anteriormente, projeto é um empenho em que recursos humanos, materiais e financeiros são organizados em uma forma moderna, para empreender um escopo de trabalho (SOUZA; EVARISTO, 2004).
Sob a ótica de Kerzner (2006) e Amaral (2005), o gerenciamento de projetos é realizado através de processos, usando conhecimento, habilidades, ferramentas e técnicas que recebem entradas e geram saídas. Os processos são agregados em cinco grupos: iniciação, planejamento, execução, controle/monitoramento e encerramento (KERZNER, 2006; AMARAL, 2005).
Devido à relevância do gerenciamento de projetos, a sua gestão transformou-se em uma disciplina fundamental para as organizações, pois, entre outros fatores, os projetos são importantes meios de implementação da estratégia (YOUNG et al., 2012).
De acordo com Prado (2004), entre os principais benefícios da utilização do gerenciamento de projetos, pode-se destacar: evita surpresas durante a execução dos trabalhos; permite desenvolver diferenciais competitivos e novas técnicas; antecipa as situações desfavoráveis; disponibiliza os orçamentos antes do início dos gastos; agiliza as decisões; aumenta o controle gerencial de todas as fases a serem implementadas, devido à realização do detalhamento; facilita e orienta as revisões da estrutura do projeto que forem decorrentes de modificações no mercado ou no ambiente competitivo; aperfeiçoa a alocação de pessoas, equipamentos e materiais necessários; documenta e facilita as estimativas para futuros projetos. Destaca-se, ainda, que verificar o sucesso de um projeto não é uma tarefa fácil, pois o sucesso é um conceito complexo e ambíguo que muda ao longo das diferentes etapas do ciclo de vida (DUARTE et al., 2012).
Assim, em síntese, o gerenciamento de projetos, segundo Kerzner (2006) e PMI (2008), pode ser observado a partir de nove áreas de conhecimento, abordadas a seguir.
* Gerenciamento do escopo: inclui os processos necessários para garantir que o projeto inclua todo o trabalho necessário. O gerenciamento do escopo do projeto trata principalmente da definição e controle do que está e do que não está incluído no projeto. Este processo aborda e documenta os requisitos do projeto e da entrega, os requisitos do produto, os limites do projeto, os métodos de aceitação e o controle de alto nível do escopo.
* Gerenciamento de integração: inclui os processos e as atividades necessárias para identificar, definir, combinar, unificar e coordenar os diversos processos e atividades de gerenciamento de projetos.
* Gerenciamento do cronograma: inclui os processos necessários para que o projeto seja concluído no tempo previsto.
* Gerenciamento de custos: inclui os processos envolvidos em planejamento, estimativa, orçamentos e controle de custos, de modo que seja possível terminar o projeto dentro do orçamento aprovado.
* Gerenciamento da qualidade: inclui todas as atividades da organização executora que determinam as responsabilidades, os objetivos e as políticas de qualidade, de modo que o projeto atenda às necessidades que motivaram sua realização. Essas atividades implementam o sistema de gerenciamento da qualidade por meio da política, dos procedimentos e dos processos de planejamento, garantia e controle da qualidade, com atividades de melhoria contínua dos processos conduzidas do início ao fim.
* Gerenciamento de recursos humanos: inclui os processos que organizam e gerenciam a equipe do projeto. Esta é composta de pessoas com funções e responsabilidades atribuídas para o término do projeto. Os membros da equipe devem estar envolvidos em grande parte do planejamento e da tomada de decisões do projeto, fortalecendo o compromisso.
* Gerenciamento das comunicações: emprega os processos necessários para garantir a geração, coleta, distribuição, armazenamento, recuperação e destinação final das informações sobre o projeto de forma oportuna e adequada. Os processos de gerenciamento das comunicações do projeto fornecem as ligações críticas entre pessoas e informações que são necessárias para comunicações bem-sucedidas.
* Gerenciamento de riscos: inclui os processos que tratam da realização de identificação, análise, respostas, monitoramento e controle, e planejamento do gerenciamento de riscos. A maioria desses processos é atualizada durante todo o projeto. O objetivo principal do gerenciamento de risco é aumentar a probabilidade e o impacto dos eventos positivos.
* Gerenciamento de aquisições: inclui os processos para comprar ou adquirir, de fora da equipe do projeto, os produtos, serviços ou resultados necessários para realizar o trabalho. Além disso, inclui também o gerenciamento de contratos e de controle de mudanças necessários para administrar os contratos ou pedidos de compra emitidos e autorizados pelos membros da equipe do projeto.
Assim, as nove áreas de conhecimento propostas no guia de boas práticas PMBoK foram utilizadas como categorias, para subsidiar o desenvolvimento do instrumento de coleta de dados aplicado junto aos gestores atuantes no gerenciamento de projetos da PPG, com vistas a atender ao objetivo deste estudo.
A abordagem de pesquisa do estudo foi exploratória, no sentido de que seus resultados não podem ser generalizados, mas podem subsidiar a formulação de hipóteses sobre o fenômeno aqui estudado (YIN, 2005; CRESWELL, 2007; GIL, 2010). Sob essa abordagem, a investigação classifica-se ainda como pesquisa descritiva quantitativa, visto seu interesse em descrever o fenômeno a partir de uma abordagem analítica de natureza quantitativa (GIL, 2010).
Assim, os dados foram coletados por meio de um questionário estruturado, com nove dimensões ilustrativas das práticas de gerenciamento de projetos: escopo e integração de projetos contou com dez indicadores; cronograma do projeto, sete indicadores; custos do projeto, quatro indicadores; qualidade do projeto, seis indicadores; recursos humanos do projeto, 11 indicadores; comunicações do projeto, seis indicadores; riscos do projeto, 12 indicadores; e aquisições do projeto, nove indicadores. Os entrevistados opinaram sobre a presença das situações investigadas no gerenciamento dos projetos da PPG, utilizando uma escala de notas de 0 a 10 pontos, sendo que a nota “0” significou discordo totalmente e a nota “10” significou concordo totalmente. Esse questionário foi encaminhado a uma população composta por oitenta gestores envolvidos no processo de gerenciamento de projetos, com retorno de uma amostra composta por sessenta gestores. Assim, a amostra da pesquisa é não probabilística, composta pelas seguintes funções técnicas: assistentes contábeis (13 gestores), gestores de apoio (oito gestores) e gestores técnicos (39 gestores), conforme registrado na Tabela 1.
O software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) foi o apoio utilizado para a aplicação do tratamento estatístico.
Objetivando tornar didático o processo de análise dos resultados, adotou-se o conceito de aderência das situações observadas em relação às situações esperadas, identificadas por seus resultados padronizados para a escala de 0 a 10 pontos. Registre-se que a expectativa teórica para cada prática investigada considera 10 pontos como a situação ideal da dinâmica de cada prática de gerenciamento de projeto. Embora a avaliação da aderência tenha se pautado apenas pela relação de proporção do resultado observado em relação ao teoricamente esperado, foi criada uma convenção de valores para qualificação dessa aderência adaptada da convenção utilizada para qualificar o coeficiente de correlação linear simples de Pearson, presente em texto de Godeardo (1970).
Registre-se que esse coeficiente de correlação mede “a força ou o grau de associação linear entre duas variáveis” (GUJARATI; PORTER, 2011, p. 43). Portanto, mesmo não sendo a técnica de análise estatística aplicada no presente estudo, pareceu que a convenção que orienta a sua qualificação seria didaticamente útil para orientar a qualificação de aderência da pontuação observada para um item (variável ou dimensão ou objetivo) e a pontuação máxima teoricamente esperada para esse respectivo item (10 pontos, no caso do presente estudo).
Assim, optou-se por seguir a qualificação atribuída ao valor “0” do coeficiente de correlação linear, ou seja, “nenhuma correlação” (GODEARDO, 1970), para atribuir a qualificação “nenhuma aderência” à pontuação “0” da escala de notas utilizada como instrumento de mensuração da opinião do entrevistado, e assim sucessivamente, para atribuir as outras seis qualificações até o nível de aderência perfeita para a gradação máxima 10 pontos, conforme ilustrada na Tabela 2, a seguir.
Para o atendimento aos objetivos deste estudo, a análise dos resultados foi construída de forma a explicitar os resultados segundo cada área de conhecimento aqui investigada em gerenciamento de projetos. Nesse sentido, inicialmente cada tabela analítica buscou identificar as práticas de gerenciamento de projetos executadas na PPG, segundo o padrão de boas práticas do guia PMBoK a partir do retrato da opinião dos entrevistados para cada variável e sua agregação na dimensão/área de conhecimento focada em cada momento, conforme proposto no objetivo deste estudo.
Registre-se que a amostra realizada em todas as tabelas analíticas é de sessenta gestores.
* Dimensão Plano de gerenciamento do escopo e integração do projeto (Tabela 3):
Conforme a opinião dos entrevistados, em termos médios, essa dimensão totaliza 6,57 pontos, ou seja, ainda está relativamente distante da situação ideal em termos de boas práticas (representada pela pontuação máxima de 10 pontos), embora a pontuação média, apresentada pelas variáveis que operacionalizaram a dimensão, tenha sido relativamente homogênea, variando entre 6,32 pontos e 6,88 pontos, o que sugere vulnerabilidade em termos de boas práticas.
Assim, de um lado, os maiores gaps ou o distanciamento da situação ideal de boas práticas são encontrados nas variáveis falta de clareza no desenvolvimento do termo de abertura do projeto e na falta de clareza na descrição preliminar do projeto, ambas pontuadas com 6,32 pontos na opinião dos entrevistados, o que se distancia da situação esperada para essas práticas, de forma plena, como encontrado nas abordagens de Kerzner (2006) e do PMI (2008), para os quais essas variáveis são atividades necessárias para identificar, definir e coordenar os diversos processos e atividades do gerenciamento de projetos. De outro lado, as aderências em relação à situação ideal de boas práticas estariam representadas nas variáveis maior clareza no desenvolvimento do termo de abertura do projeto (pontuação média de 6,88 pontos) e na descrição preliminar do projeto (pontuação média de 6,72 pontos).
* Dimensão Plano de gerenciamento do cronograma do projeto (Tabela 4):
Sob a percepção dos gestores técnicos entrevistados da PPG, em termos médios, essa dimensão totaliza 6,20 pontos, enquadrando-se na faixa de aderência moderada, o que sinaliza certo distanciamento da situação ideal, representada pela pontuação máxima de 10 pontos, sugerindo vulnerabilidade em termos de boas práticas em gerenciamento de projetos. A pontuação média, apresentada pelas variáveis que operacionalizaram a dimensão, foi também relativamente homogênea, variando entre 6,03 pontos e 6,42 pontos. Sendo assim, sob a ótica dos entrevistados, as variáveis definição e sequenciamento de atividades, estimativas de recursos e duração da atividade, e desenvolvimento e controle do cronograma encontram-se distantes da situação esperada em termos de boas práticas, como encontrado nas abordagens de Kerzner (2006) e do PMI (2008), para os quais essas variáveis são necessárias para que o projeto seja concluído no tempo previsto.
* Dimensão Plano de gerenciamento de custos do projeto (Tabela 5):
Segundo a visão dos entrevistados, em termos médios, essa dimensão totaliza 6,29 pontos, sinalizando, também, certo distanciamento da situação esperada em termos de boas práticas, representada pela pontuação máxima de 10 pontos. Os resultados revelaram que a pontuação média, apresentada pelas variáveis estimativa, agregação e controle de custos, foi relativamente homogênea, variando entre 6,20 pontos e 6,38 pontos, o que se distancia do padrão esperado de boas práticas, como também visto nas abordagens de Kerzner (2006) e do PMI (2008), para os quais essas variáveis possibilitam que o projeto seja concluído dentro do orçamento aprovado.
* Dimensão Plano de gerenciamento da qualidade do projeto (Tabela 6):
Essa dimensão, que totaliza 6,28 pontos, encontra-se, em termos médios, distante da situação ideal de 10 pontos. Os resultados revelaram uma aderência moderada, com pontuação média, representada pelas variáveis que operacionalizaram a dimensão, relativamente homogêneas, variando entre 6,22 e 6,35 pontos, sendo que as variáveis que apresentaram maior distanciamento da situação ideal foram a falta de monitoramento de resultados específicos do projeto e a falta de monitoramento de resultados de forma a identificar maneiras de eliminar as causas de desempenho insatisfatório. De acordo com as abordagens de Kerzner (2006) e do PMI (2008), os processos que incluem planejamento, garantia e controle da qualidade são necessários para a melhoria contínua da qualidade dos projetos.
* Dimensão Plano de gerenciamento de recursos humanos do projeto (Tabela 7):
Em termos médios, essa dimensão totaliza 5,69 pontos, e a pontuação média, representada pelas variáveis que operacionalizaram a dimensão, foi relativamente homogênea, variando entre 5,43 e 6,17 pontos. Sob a ótica dos entrevistados, constatou-se que a aderência moderada apresentada por essa dimensão foi mais vulnerável nas variáveis falta de desenvolvimento de ações para melhor interação da equipe do projeto e falta de retorno sobre a avaliação de desempenho dos membros da equipe, ambas com pontuação média de 5,43 pontos. Esse cenário se distancia dos parâmetros considerados ideais de boas práticas, como encontrado na teoria de Kerzner (2006) e do PMI (2008), para os quais essas atividades são de competência dos gestores de projeto e necessárias para a boa condução do projeto.
* Dimensão Plano de gerenciamento das comunicações do projeto (Tabela 8):
Segundo a opinião dos entrevistados, essa dimensão totaliza, em termos médios, 6,12 pontos, estando distante da situação ideal, representada pela pontuação máxima de 10 pontos. As variáveis que operacionalizaram essa dimensão obtiveram pontuações médias relativamente homogêneas, variando entre 6,05 pontos e 6,18 pontos. Os resultados apontaram que a variável dificuldade na coleta e distribuição das informações sobre o desempenho do projeto foi a mais vulnerável entre todas as outras enquadradas no patamar de aderência moderada. Ou seja, tal variável distancia-se da situação esperada em termos de boas práticas. De acordo com as abordagens de Kerzner (2006) e do PMI (2008), as atividades que incluem coleta e distribuição das informações sobre o projeto de forma oportuna e adequada são necessárias para uma comunicação bem-sucedida.
* Dimensão Plano de gerenciamento de riscos do projeto (Tabela 9):
Com o resultado médio de 5,80 pontos, essa dimensão evidenciou uma aderência moderada, sugerindo vulnerabilidade em termos de boas práticas, uma vez que as variáveis que a operacionalizaram apresentaram uma pontuação média, relativamente homogênea. O maior gap foi encontrado na variável falta de clareza na identificação dos novos riscos (pontuação média de 5,53 pontos), o que se distancia, de forma plena, da situação ideal em termos de boas práticas, como encontrado nas abordagens de Kerzner (2006) e do PMI (2008), para os quais essa atividade é fundamental para aumentar a probabilidade e o impacto dos eventos positivos.
* Dimensão Plano de gerenciamento de aquisições do projeto (Tabela 10):
Totalizando 6,57 pontos, essa dimensão apresenta uma distância relativa da situação ideal, que seria a pontuação de 10 pontos, em termos de boas práticas. Os resultados apresentados pelas variáveis, em termos médios, evidenciaram uma aderência moderada, com pontuação relativamente homogênea, variando entre 6,42 pontos e 6,72 pontos. Assim, de um lado, os maiores gaps ou distanciamentos da situação ideal de boas práticas, na opinião dos entrevistados, foram encontrados nas variáveis dificuldade na seleção de fornecedores mediante análise das propostas, dificuldade na escolha de um entre possíveis fornecedores e dificuldade na negociação de contrato por escrito (pontuação média de 6,42 pontos), o que se distancia da situação esperada em termos de boas práticas, como encontrado nas abordagens de Kerzner (2006) e do PMI (2008), para os quais tais atividades são necessárias para o bom gerenciamento do projeto.
De outro, as aderências em relação à situação ideal de boas práticas estariam representadas na variável documentação com clareza dos requisitos de produtos, serviços e resultados a serem obtidos nas contratações, com pontuação média de 6,72 pontos, próxima do limite inferior da aderência alta.
A título de ilustração do posicionamento médio do conjunto de áreas avaliadas no gerenciamento de projetos, registrou-se na Figura 1 a dinâmica das práticas de gerenciamento de projetos, por meio da apresentação da média de pontos obtida em cada área. Foram evidenciados também os indicadores mais e menos favoráveis em cada prática.
Figura 1 – Síntese dos resultados da pesquisa empírica segundo as áreas de conhecimento estudadas em gerenciamento de projetos
Embora esse quadro deva ser limitado ao âmbito da PPG, os resultados podem sugerir um conjunto de hipóteses sobre o ambiente de gerenciamento de projetos nas administrações municipais, alertando inclusive para a possibilidade de maior distanciamento das ações de gerenciamento em relação ao padrão de boas práticas, visto que a unidade municipal aqui focada foi selecionada em função de apresentar um conjunto de características que a destacaram como unidade de interesse. Nesse sentido, o conhecimento das áreas posicionadas nos patamares inferiores da avaliação feita pelos entrevistados sugere a necessidade de maior atenção a três áreas: gerenciamento de recursos humanos, gerenciamento de riscos e gerenciamento de comunicações. Também, orienta o delineamento de pelo menos a seguinte hipótese: a falta de preparação da equipe de gerenciamento de projeto, em termos de ações de melhoria de sua competência, é fator impeditivo do avanço da aderência do padrão de gerenciamento da administração municipal ao padrão das boas práticas.
Os resultados obtidos nesta pesquisa evidenciaram que, em todas as áreas de conhecimento, há sensível distanciamento em relação às boas práticas propostas no guia de boas práticas PMBoK, alertando sobre o espaço ainda a ser ocupado para que o gerenciamento de projetos seja realizado de acordo com um padrão. Dessa forma, será possível transformar a administração pública municipal num modelo de inteligência em termos de implementação de estratégias e acompanhamento de objetivos traçados no planejamento municipal, conforme abordado por Verzuh (2001), Reid (2011), Romero (2011) e Carvalho, Abreu e Pedrozo (2013).
De forma geral, os resultados mostraram ser pequena a variabilidade entre as áreas em termos do nível de aderência ao padrão de boas práticas, o qual se situou ao redor de 6 pontos, evidenciando a construção de quatro patamares de resultados dentro desse espaço de variabilidade.
Na parte inferior desse espaço, com resultados abaixo de 6 pontos, encontram-se duas áreas de conhecimento: gerenciamento de recursos humanos e gerenciamento de riscos. Quanto ao gerenciamento de recursos humanos, os itens mais vulneráveis foram a falta de desenvolvimento de ações para melhor interação da equipe do projeto, de retorno sobre a avaliação de desempenho dos membros da equipe e de desenvolvimento de ações de melhoria de competências dessa equipe. Quanto ao gerenciamento de riscos, o destaque foi o item falta de clareza na identificação dos novos riscos. Na sequência, o gerenciamento de comunicações também revela uma posição vulnerável, sugerindo como maiores dificuldades da área a coleta e distribuição de informações sobre o desempenho do projeto.
Num terceiro nível de desempenho, encontram-se os resultados relativos às áreas de gerenciamento de custos, qualidade e cronograma, que, segundo os entrevistados, apresentam-se com notas ligeiramente superiores aos dois primeiros patamares, ou seja, 6,29, 6,28 e 6,20 pontos, respectivamente. Nessas áreas, os pontos avaliados pelos entrevistados com maior criticidade foram: i) com relação aos custos, a dificuldade de estimativa global do projeto e de controle de fatores que criam as variações de custos; ii) com relação à qualidade, o controle e avaliação dos resultados, segundo padrão técnico e identificação das causas do desempenho insatisfatório; e iii), com relação ao cronograma, a dificuldade de controle das mudanças do projeto, a análise dos recursos necessários e a estimativa do período de trabalho.
Por fim, no nível superior, ficaram os gerenciamentos de escopo e integração e de aquisições (situações mais objetivas e, portanto, de maior visibilidade ao gestor). Ainda assim, são pontos mais frágeis da primeira área a falta de clareza no desenvolvimento do termo de abertura do projeto e a falta de clareza na descrição preliminar do projeto. Na segunda, são evidenciadas a dificuldade de seleção de fornecedores, a dificuldade em determinar o melhor momento de compra/serviço e a negociação do contrato por escrito.
Espera-se que a descrição de conteúdos para as áreas de conhecimento promovida neste estudo possa contribuir para a discussão do padrão de gerenciamento de projetos na administração municipal, a partir de sua replicação. Adicionalmente, e independentemente de estudos acadêmicos, espera-se também que o instrumento de coleta de dados desenvolvido para a pesquisa aplicada, disponível no linkhttp://www.uscs.edu.br/posstricto/administracao/dissertacoes/2013/index.php, possa ser utilizado como uma ferramenta de avaliação do estágio de gerenciamento de projetos em outras administrações municipais, tendo como referência as variáveis descritas nas tabelas de resultado em cada área de conhecimento investigada.
Dadas as limitações da presente pesquisa, recomenda-se como fonte de pesquisa futura a décima área do conhecimento, “partes interessadas”, que não foi contemplada neste estudo, uma vez que a quinta versão foi posteriormente editada. Todavia, esta pesquisa contribuiu para a identificação de aspectos a serem melhorados no gerenciamento de projetos da administração pública municipal.
Os resultados deste estudo não podem ser generalizados, visto tratar-se de estudo de apenas um caso. Contudo, esses resultados contribuem como força motriz para que futuros estudos, que vislumbrem a necessidade ou oportunidade de aprofundar no tema, possam partir de uma base de variáveis já construídas aqui, permitindo sua replicação e ampliação.
Esta pesquisa caracteriza-se por uma abordagem exploratória, o que alerta para os limites em termos de extrapolação ou inferência dos resultados descritos para outras instituições.
Contudo, ratifica-se que os resultados obtidos na pesquisa da PPG são conclusivos somente no âmbito da sua esfera e orientam hipóteses a serem verificadas no âmbito de outras unidades da administração pública municipal.
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