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Articulação entre as aprendizagens individual, grupal e organizacional em uma instituição hospitalar
The Linkage Between Individual, Group and Organizational Learning at a hospital
Revista de Administração da Universidade Federal de Santa Maria, vol. 11, núm. 5, Esp., pp. 1198-1221, 2018
Universidade Federal de Santa Maria

ARTIGOS



Recepción: 15 Abril 2015

Aprobación: 23 Diciembre 2017

Resumo: Este artigo visa a analisar a articulação entre os níveis individual, grupal e organizacional da aprendizagem em uma instituição hospitalar. A fim de atender a tal objetivo e, em acordo com estudos anteriores, foi realizada uma pesquisa quantitativa, a partir da aplicação de questionários, com os enfermeiros do hospital. Os dados angariados foram analisados seguindo-se a modelagem de equações estruturais. Os resultados demonstram que a aprendizagem nos grupos está relacionada à aprendizagem que ocorre nos níveis individual e organizacional, porém, a aprendizagem individual não se mostrou significativamente associada à aprendizagem organizacional. Além disso, constatou-se que a aprendizagem grupal influencia substancialmente a aprendizagem organizacional, em comparação à aprendizagem individual. Os resultados obtidos são consoantes aos encontrados em outros estudos da mesma natureza.

Palavras-chave: Aprendizagem Organizacional, Aprendizagem Grupal, Aprendizagem Individual.

Abstract: This article aims to analyze the relation between individual, collective and organizational levels of learning in a hospital. In order to meet this objective, according to previous studies, a quantitative survey was carried out, from the application of questionnaires, with the hospital nurses. The data were analyzed followed by the technic of structural equation modeling. The results demonstrate that learning in groups is related to the learning that occurs at the individual and organizational levels. However, individual learning was not significantly associated with organizational learning. Furthermore, it was found that the collective learning substantially influences the organizational learning, compared to individual learning. The results are consistent to those found in other similar studies.

Keywords: Organizational Learning, Group Learning, Individual Learning.

1 Introdução

Estudada e discutida de forma assídua há mais de cinquenta anos, a aprendizagem nas organizações ainda é tema de divergências – talvez propositais – e que demandam profundidade nas pesquisas. Não somente na academia, no cenário empresarial também se observa a importância crescente que se passou a dar à aquisição, à manutenção e à transferência da aprendizagem e do conhecimento como ferramentas estratégicas e como instrumentos de empregabilidade para os trabalhadores.

Devido ao crescente reconhecimento da importância do conhecimento como recurso estratégico para as organizações modernas, é notório que muitas áreas da Administração e de outras ciências concentram-se em investigar e viabilizar sua criação, transformação, aprendizagem, uso e gestão (BENNET; TOMBLIN, 2006). Nesse contexto, a gestão da aprendizagem organizacional aparece como fator primordial nestas questões ao ser capaz de potencializar estes processos que permeiam as esferas dos indivíduos, dos grupos e das próprias organizações.

O termo “aprendizagem organizacional” (AO) é observado em uma multiplicidade de conceituações, classificações e aplicações. Neste artigo, admite-se o foco no nível organizacional, por meio de uma perspectiva normativa (SHIPTON, 2006), à medida que busca evidenciar o aprendizado organizacional em suas diferentes dimensões. Assume-se, portanto, assim como outros autores (FYOL; LYLES, 1985; KIM, 1998; CROSSAN, LANE; WHITE, 1999; ABBAD; BORGES-ANDRADE, 2004 CROSSAN; MAURER; WHITE, 2011), que a aprendizagem em nível organizacional compreende os processos de aprendizagem individual (AI) e aprendizagem grupal (AG). Estas dimensões estão interconectadas e devem ser levadas em consideração quando se examina o fenômeno de aprendizagem.

Há de se apontar, contudo, as dificuldades e problemas inerentes às pesquisas na área, dentre as quais Neder e Bido (2017) destacam: 1) a quantidade crescente de textos científicos; 2) a dificuldade de analisar essa diversificada produção por meio das metodologias comumente utilizadas na área; e 3) a dificuldade de se compreenderem as complexas relações presentes nesse aglomerado de textos científicos. Adicionalmente, Correia-Lima, Loiola e Leopoldino (2017) evidenciam que apesar da diversidade de escalas criadas – especialmente no âmbito internacional –, poucos são os métodos e medidas de avaliação, de verificação e de mensuração do fenômeno da AO.

A despeito de ser reconhecida a existência de unidades ou níveis de análise para o fenômeno da aprendizagem nas organizações, o relacionamento entre as três dimensões da aprendizagem se constitui em assunto que ainda está para ser esclarecido (BIDO et al., 2011). A otimização dos processos de aprendizagem e transferências nesses níveis é necessária (ABBAD; BORGES-ANDRADE, 2004). No entanto e para tanto, o aprofundamento a respeito da mensuração e da análise do processo de aprendizagem organizacional é fator essencial nas pesquisas acadêmicas (FYOL; LYLES, 1985). Ainda assim, medições do fenômeno de AO enfrentam muitos desafios (CORREIA-LIMA; LOIOLA; LEOPOLDINO, 2017).

Tendo em vista estas considerações, bem como o baixo volume de publicações relacionadas ao tema na área da saúde, principalmente no Brasil, onde a pesquisa é incipiente (BORBA, 2009), o presente artigo tem como objetivo analisar a articulação entre os níveis individual, grupal e organizacional da aprendizagem em uma instituição hospitalar. Em um ambiente hospitalar, constituído de grande complexidade, no qual atuam pessoas com diferentes formações e funções, e em que as situações de trabalho sofrem altas variações, os processos de aprendizado e o desenvolvimento de conhecimentos adequados têm impacto direto na conduta definida e no bem-estar do paciente, além de serem um dos fatores primordiais para a melhoria da qualidade do serviço.

Por meio desta pesquisa, espera-se evidenciar o nível de correlação entre as aprendizagens individual, grupal e organizacional, contribuindo com a academia no avanço da temática, à medida que direciona esforços empíricos para a articulação destes três fenômenos, tão pouco estudada. Nesse sentido, neste artigo serão realizadas análises comparativas com estudos prévios similares. Do mesmo modo, almeja-se facilitar a observação, pela instituição pesquisada, sobre aspectos que necessitam ou não de reforços em relação à aprendizagem, além de instigar os gestores, em geral, a buscarem maiores informações para a gestão da aprendizagem em seus contextos específicos.

2 Aprendizagens Organizacional, Grupal e Individual e suas Articulações

Consoante à ideia de que não é possível classificar com exatidão um ou outro estudo sobre aprendizagem (SHIPTON, 2006), e que abordagens cognitivistas e behavioristas se separadas são mais restritivas que se complementadas (NICOLINI; MEZNAR, 1995), assume-se que as organizações são agentes do processo e, seja essa uma escolha consciente ou inconsciente, todas as organizações aprendem. A aprendizagem é um requisito crítico para a existência sustentada das organizações (KIM, 1998), um processo contínuo que as permite influenciarem e serem influenciadas por seu ambiente. Não é algo que a organização escolhe, mas algo inerente à sua configuração sistêmica (NICOLINI; MEZNAR, 1995).

A aprendizagem organizacional é tida como o processo de aprimoramento de ações a partir de conhecimento e compreensão apropriados (FYOL; LYLES, 1985; HUBER, 1991). Corresponde à ampliação da capacidade da organização para tomar decisões e ações eficazes (KIM, 1998) e ao principal meio pelo qual a organização pode renovar-se estrategicamente (CROSSAN et al., 1999). A aprendizagem organizacional, assim como em nível individual, não implica necessariamente mudanças observáveis. Por ser um processo desenvolvido em uma organização de forma única (COOK; YANOW, 1996), discussões que envolvem a AO necessitam de contextualização (CHAN; SCOTTT-LADD, 2004).

Embora possa se afirmar que o fenômeno da aprendizagem nas organizações não possua uma separação artificial por níveis (GHERARDI; NICOLINI, 2001), admite-se que a aprendizagem em nível organizacional compreende os processos de aprendizagem individual e grupal, de forma interconectada, tanto dentro como entre organizações (CROSSAN; MAURER; WHITE, 2011).

A importância da aprendizagem individual para a aprendizagem organizacional é ao mesmo tempo óbvia e sutil: óbvia, pois todas as organizações são constituídas de indivíduos, e sutil, porque as organizações podem aprender de maneira independe de qualquer indivíduo específico, mas não independentemente de todos os indivíduos (KIM, 1998). Assim, uma organização pode aprender apenas a partir de seus membros, mas não é dependente de nenhum membro em particular. Os indivíduos, por sua vez, podem aprender sem a organização, e o aprendizado adquirido/desenvolvido não necessariamente tem implicações organizacionais (ARGYRIS; SCHON, 1978; KIM, 1998).

Segundo Zanelli (2004), a AI é produto da experiência de interação do indivíduo com seu meio ambiente, que lhe possibilita a apreensão de algo como capacidade ou disposição com potencial de ser futuramente manifestado, evidenciado ou revelado por meio de alguma mudança em seu comportamento. Entretanto, tais mudanças não necessariamente determinam mudanças de comportamento (FRIEDLANDER, 1983), tampouco mudanças exclusivamente observáveis (COOK; YANOW, 1996).

A AO não é simplesmente a soma de cada aprendizado individual de seus membros. Organizações, contrariamente às pessoas, desenvolvem e mantêm sistemas de aprendizagem que não apenas influenciam diretamente seus membros, mas são transmitidos a outros por meio de histórias e normas organizacionais (FYOL; LYLES, 1985). Neste sentido, a aprendizagem organizacional tem como fator intrínseco a coletividade, é uma atividade que pode apenas ser feita em grupos, a partir da interação. Quando um grupo adquire o know-how associado à sua habilidade de executar tarefas coletivamente, constitui-se a AO (COOK; YANOW, 1996). A aprendizagem nos grupos se constitui em um importante fator da competitividade das organizações (CHAN, 2003).

O grupo é um espaço organizacional privilegiado para compartilhar e mediar os diferentes modelos mentais apresentados pelos indivíduos (PAWLOWSKY, 2001). Nesse sentido, a AG é o processo de discutir abertamente diferenças de opinião, testar premissas e descobrir causas das falhas de planos. Influenciam a aprendizagem e desempenho dos grupos tanto os aspectos estruturais, tais como sua composição e clareza nas tarefas a serem realizadas, quanto o contexto organizacional no qual estão inseridos e questões interpessoais que interferem no comportamento do grupo (EDMONDSON, 1999). Wilson, Goodman e Cronin (2007) ressaltam, porém, que algumas pesquisas que abordam a aprendizagem grupal ainda são confusas, pois não conseguem distinguir a aprendizagem individual no contexto do grupo e aprendizado coletivo no contexto do indivíduo.

Kim (1998) propõe um modelo integrado de aprendizagem organizacional, o qual ilustra a transferência da aprendizagem por meio da permuta de modelos mentais individuais e compartilhados, ou seja, ilustra a articulação entre AI, AG e AO. Modelos mentais dizem respeito tanto a mapas tácitos semipermanentes do mundo que os indivíduos retêm em sua memória de longa duração, quanto às percepções de curto prazo que as pessoas constroem como parte dos seus processos diários de raciocínio, podem ser particulares ou compartilhados (SENGE, 1994).

No referido modelo, muito embora os efeitos dos grupos não estejam explicitamente inclusos, o autor imputa aos grupos a condição de ‘miniorganização’, nos quais também há o compartilhamento de modelos mentais individuais. “Um grupo pode então ser visto como um indivíduo coletivo, com seu próprio conjunto de modelos mentais, que contribui para os modelos mentais compartilhados e para a aprendizagem da organização” (KIM, 1998, p. 78).

É preciso atentar-se para o fato de que os indivíduos e os grupos não aprendem da mesma forma e na mesma velocidade, e que ambas as aprendizagens podem ocorrer naturalmente, sem intervenções externas. Ou seja, o processo de aprendizagem pode ocorrer espontaneamente ou ser algo planejado e executado pelas organizações por meio de ações de treinamento, desenvolvimento e educação (ABBAD; BORGES-ANDRADE, 2004).

Especificamente no ambiente de saúde, o caso deste artigo, o modelo mental compartilhado considera o processo de aprendizagem como uma atividade estruturada, relacionada a cada indivíduo, na medida em que este se prepara para realizar suas atividades para, posteriormente, buscar melhorias nas habilidades clínicas e não clínicas. A fim de ampliar a construção da AO em organizações do setor de saúde, o processo de reflexão, reinterpretação, refinamento e codificação do conhecimento deve ser realizado por grupos, e não apenas individualmente (EDMONDSON; BOHMER, 2001).

O aprendizado permite às organizações construírem uma base de compreensão e interpretação de seus próprios ambientes e a partir disso, a acessar estratégias viáveis. Para tanto, o processo de aprendizagem demanda experimentação, desaprendizado de métodos passados e o encorajamento de debates entre múltiplos pontos de vista. É preciso promover uma cultura de conhecimento compartilhado, encorajar a experimentação e a liderança, estimulando a tolerância e o aprendizado a partir dos erros, assim como são necessárias políticas de recompensas aos empregados por suas contribuições, a fim de sustentar esta nova dinâmica na organização (CHAN; SCOTT-LADD, 2004). Criar condições para a aprendizagem organizacional significa contribuir para que os indivíduos assumam a incerteza ao invés de ignorá-la ou evitá-la (FRIEDMAND, LIPSHITX; OVERMEER, 2001).

Reconhecer que uma organização pode aprender apenas a partir de seus membros, implica que é preciso ativar características individuais que facilitem a aprendizagem e sua transferência. O direcionamento deste processo é elemento crucial para a função executiva à medida que garante que a aprendizagem está ocorrendo e que assegura a sobrevivência da organização ao longo do tempo. Bem por isso, a mensuração e a análise do processo são fatores essenciais (FYOL; LYLES, 1985). O próximo tópico deve tratar, assim, de instrumentos de medição das aprendizagens nos níveis organizacional, grupal e individual.

2.1 Instrumentos de Medição das Aprendizagens Organizacional, Coletivo e Individual

Apesar da importância reconhecida da aprendizagem organizacional no cenário atual, observa-se que os estudos empíricos recebem pouco destaque, principalmente os que se orientam para a mensuração da inter-relação entre os três níveis de aprendizagem (BAPUJI; CROSSAN, 2004; ANTONELLO; GODOY, 2008; BIDO et al., 2011; CORREIA-LIMA; LOIOLA; LEOPOLDINO, 2017). Encontram-se mais pesquisas acadêmicas voltadas à avaliação da capacidade de aprendizagem organizacional a partir de modelos e dos impactos no desempenho organizacional e na inovação (RUSHEMER ET AL.,2007; GRAY, 2007; ALEGRE; CHIVA, 2008; ARGOTE; MIRON-SPEKTOR, 2011).

Embora em quantidade não expressiva, os instrumentos desenvolvidos para mensuração da aprendizagem organizacional nos três níveis se constituem de questionários desenvolvidos a partir de técnicas de fidedignidade e validação. Correia-Lima, Loiola e Leopoldino (2017) analisaram 24 escalas e constataram que estas se caracterizam pelo: (1) foco em processos e resultados da aprendizagem; (2) foco em fatores que facilitam a aprendizagem; (3) foco em AO e desempenho. Os mesmos autores advertem, contudo, que problemática de conversão de AI em AO ainda é negligenciada pelas pesquisas, além do que a aprendizagem de indivíduos nas organizações permanece em situação de confusão com AO.

A consulta à literatura também permitiu identificar instrumentos próximos a abordagem deste estudo, como os desenvolvidos por Watkins & Marsick (1993), o de Templeton, Lewis e Snyder (2002), de Bontis, Crossan e Hulland (2002), de López, Peón e Ordás (2005) e de Chan (2003). As escalas apresentadas pelos quatro primeiros trabalhos apresentam muita similaridade no arcabouço teórico. No entanto, são relativamente pontuais e não priorizam os relacionamentos entre os níveis de aprendizagem organizacional, grupal e individual, objetivo deste artigo.

Já o questionário desenvolvido por Chan (2003), consoante às premissas deste estudo, analisa a inter-relação entre os três níveis de aprendizagem (AI, AG e AO). É baseado em outros três instrumentos de mensuração de aprendizagem, cada qual voltado a uma das dimensões específicas. O questionário é constituído por 41 indicadores, distribuídos por 9 itens avaliando a AI, 11 itens a AG, compreendendo comportamentos de aprendizagem interno e externo, e 21 itens voltado à mensuração da AO, que compreendem as seguintes dimensões: clareza de propósito e missão, comprometimento da liderança e delegação de poder, práticas e recompensas, transferência de conhecimento, equipe de trabalho e solução de problemas em grupo. Chan (2003) validou este instrumento numa pesquisa em hospital Australiano em 2000, com uma amostra de 189 funcionários de apoio. Nesta pesquisa, a AI não é um prognóstico significativo de AG; já a AG foi significativamente prognóstico da AO.

A escala de Chan foi validada no contexto brasileiro por duas pesquisas empíricas: Bido et al.(2010) e Bido et al. (2011). Na primeira, a amostra constituiu-se de 46 funcionários, instalados em uma planta industrial no Brasil. Um dos principais resultados foi a relação significativa entre AG e AO. Na segunda pesquisa, a amostra foi de 105 respostas válidas de uma empresa multinacional financeira. Nesta pesquisa, o principal resultado foi a influência de AI em AO, fato não observado no estudo de Chan (2003). Entre as três pesquisas, não houve diferenças significativas nos resultados, indicando certa robustez do instrumento na capacidade de mensurar adequadamente o proposto. Sendo assim, o questionário desenvolvido por Chan (2003) será utilizado também nesta pesquisa.

Uma vez que o presente artigo visa ao contexto hospitalar, buscou-se também por outros estudos que tratassem de aspectos relacionados à aprendizagem organizacional em hospitais (VASSALOU, 2001; BORBA, 2009). O estudo de Vassolou (2001) foi aplicado em hospitais gregos, foram mapeados os mecanismos e sugerido um modelo de avaliação de AO baseados em cinco princípios, sendo eles: entendimento da missão e visão compartilhada, liderança voltada para a aprendizagem, transferência de conhecimento, trabalho em grupo e cooperação e cultura de experimentação. Já Borba (2009) desenvolveu um modelo de avaliação do processo de aprendizagem estruturado em quatro princípios: processos de aprendizagem, transformação fundamentado na mudança de atitude, ação e, criação e reflexão para aprendizagem.

Com efeito, um dos fatores primordiais para a melhoria da qualidade de atendimento nas instituições hospitalares é a compreensão do processo de aprendizagem existente na organização, sobretudo na geração de ferramentas e metodologias que apoiem o processo de tomada de decisão (BORBA, 2009), além da geração de informação que subsidiem tais procedimentos. No entanto, especialmente no Brasil, as pesquisas direcionadas a esta temática são ínfimas. Os instrumentos de Vassolou (2001) e Borba (2009), a despeito de apresentarem alguma similaridade temática com o de Chan (2003), não cobrem a articulação entre AI, AG e AO. O próximo tópico irá descrever os procedimentos metodológicos utilizados na pesquisa.

3 Procedimentos Metodológicos

A classificação metodológica da pesquisa caracteriza-se por ser exploratória e quantitativa, e a estratégia utilizada corresponde à abordagem de survey (HAIR Jr. et al., 2005), dentro de um contexto da realização de estudo caso (YIN, 2015). A organização, objeto de análise, foi selecionada de forma intencional, por conveniência.

O instrumento utilizado para coleta de dados foi o questionário, e a análise seguiu os procedimentos estatísticos consoantes à modelagem de equações estruturais (MARUYAMA, 1998). O intuito foi o de seguir os passos metodológicos já utilizados por Bido et al. (2010) e Bido et al. (2011), a fim de que comparações pudessem ser realizadas.

A organização hospitalar selecionada a participar desta pesquisa está localizada em São Paulo – SP e é reconhecida nacional e internacionalmente como um centro de excelência em atendimento médico-hospitalar. Dentre as principais áreas do hospital estão as de Internação, Unidades Críticas e UTIs, Centro Cirúrgico, Atendimento, Centros e Núcleos de Medicina Avançada, Comodidades e Estrutura, Bancos de Sangue e Centro de Diagnósticos e Imagem. O hospital é também reconhecido por seu Instituto de Ensino e Pesquisas, direcionado à geração e disseminação do conhecimento.

Foram convidados a participar da pesquisa os enfermeiros do hospital, grande maioria dos participantes do estudo conduzido por Chan (2003). Considerando o ambiente hospitalar, duzentos questionários impressos foram repassados ao sujeito responsável pela autorização da pesquisa, que, por sua vez, os distribuiu aleatoriamente aos coordenadores das áreas de Enfermagem, Hospedagem e Atendimento. O período de coleta foi no mês de julho de 2013. Os coordenadores entregaram os questionários aos seus subordinados que os devolviam preenchidos aos próprios coordenadores. Coletaram-se 165 questionários válidos, com taxa de retorno de 82,5%.

O instrumento utilizado se baseou naquele dos estudos de Bido et al., (2010) e Bido et al. (2011), o qual, por sua vez, representa a tradução validada do instrumento elaborado por Chan (2003). Dessa maneira, conceitos e construtos destes referidos estudos foram aplicados na íntegra e literalmente. Nesse momento, portanto, não houve a pretensão de criticá-los/revisá-los, mas tão somente aplicá-los em determinado contexto para então apresentar possíveis recomendações. Tendo em vista a semelhança do ambiente em que os questionários foram aplicados, hospital, a escala selecionada foi a mesma utilizada por Chan (2003): Likert de sete pontos, ancorada em “Concordo Totalmente” e “Discordo Totalmente”. Os itens do instrumento podem ser visualizados no tópico seguinte, em que são abordadas a apresentação e a discussão dos resultados.

Inicialmente, foi realizada a verificação de dados faltantes (missing values). No software utilizado para a análise, SmartPLS, estes foram registrados e não passam dos 6,7%. Os itens com escala reversa, oito no total, tiveram as respostas recodificadas (1 -> 7; 2 -> 6; 3 -> 5; 4 -> 4; 5 -> 3; 6 -> 2; 7 -> 1).

Para estimar as relações entre AI, AG e AO, foi utilizada a modelagem em equações estruturais com estimação a partir da técnica PLS (Partial Least Squares), tendo em vista a sua aplicabilidade em amostras pequenas, sua capacidade de estimar modelos bastante complexos (com grande número de variáveis latentes e observáveis) e o fato de que possui premissas menos restritivas com relação à distribuição das variáveis e dos termos de erro e à normalidade (HENSELER; RINGLE; SINKOVICS, 2009). Cita-se também sua melhor adequação a modelos com uma combinação de variáveis formativas e reflexivas (HAIR JR.; RINGLE; SARSTEDT, 2011), como o caso deste estudo, além da possibilidade de comparação com pesquisas anteriores.

Com respeito ao tamanho da amostra mínima, a recomendação indicada na literatura sobre PLS-SEM é a de que esta seja dez vezes o maior número de caminhos estruturais direcionados a um determinado construto latente no modelo estrutural (HAIR JR.; RINGLE; SARSTEDT, 2011). A despeito das limitações desta regra prática, para o presente estudo, nota-se que seriam minimamente necessários vinte casos, número largamente ultrapassado pela amostra coletada de 165 casos. Tal circunstância possibilitou o uso da técnica de bootstrapping.

O algoritmo básico da PLS segue um procedimento em duas etapas. Primeiramente, efetua-se o exame da confiabilidade e validade das medidas, para que num segundo momento sejam avaliadas as estimativas do modelo estrutural (HAIR JR.; RINGLE; SARSTEDT, 2011). Assim, foi avaliado o modelo de mensuração (validade convergente, discriminante e confiabilidade), retirando-se itens que possuíam baixas cargas fatoriais. A análise foi completada com a elaboração do modelo estrutural, possibilitando a comparação com os resultados de Chan (2003), Bido et al. (2010) e Bido et al. (2011).

4 Apresentação e Análise dos Dados

Esta seção foi dividida conforme os estágios da análise pela técnica PLS. Serão apresentadas considerações sobre o perfil do respondente, sobre a avaliação do modelo de mensuração e, por fim, sobre o modelo estrutural e análises comparativas.

4.1 Perfis demográfico e profissional dos respondentes

Por meio dos dados coletados, é possível identificar que 72,7% dos respondentes são mulheres; que predomina a faixa etária de 26 a 35 anos de idade (49,6%) e que o nível de escolaridade com maior representatividade é a pós-graduação completa (34,5%). Foi também levantado o perfil profissional dos participantes da pesquisa. Em relação ao tempo de instituição, observou-se que embora haja preponderância de sujeitos que trabalhem no hospital há até apenas 4 anos (22,4%), notou-se também significativa presença daqueles que já são membros do hospital há mais de 16 anos (17%).

Apesar de os questionários serem previamente distribuídos aleatoriamente aos coordenadores das áreas de Enfermagem, Hospedagem e Atendimento, estas foram ampliadas para uma variedade dispersa dos cargos e das áreas de atuação dos respondentes. São em maior quantidade os técnicos em enfermagem (32,7%) e enfermeiros (28,5%), sendo as áreas mais presentes a Unidade Internação (17%), Hospedagem (10,3%) e UTI (9,1%).

Os dados que traçam o perfil do indivíduo responsável pelas informações aqui analisadas são relevantes principalmente no que tange a questões como a idade, escolaridade e tempo de empresa, importantes aspectos a serem considerados, em se tratando da percepção sobre a aprendizagem, uma vez que remetem a aspectos como experiência e conhecimento na função desempenhada (GHERARDI, NICOLINI; ODELLA, 1998).

4.2 Avaliação do modelo de mensuração

A análise do modelo de mensuração, ou outer model, constitui o exame da confiabilidade composta, da validade convergente e discriminante das medidas de cada construto e das relações entre eles (HAIR JR. et al., 2012).

Conforme mostra a Tabela 1, na primeira coluna, todos os construtos, de primeira e segunda ordem, apresentaram a raiz quadrada da Variância Média Extraída (AVE – sigla em inglês) maior que 50% (0,5), o que atinge os critérios de Chin (1998) e Hair Jr. et al. (2005) para a indicação da existência da validade convergente. Isso significa que os conjuntos de indicadores definidos representam um único e exclusivo construto subjacente (HENSELER et al., 2009). Já a segunda coluna, demonstra que os valores da validade composta para todos os construtos estão acima de 0,7 (HENSELER et al., 2009), uma estimativa da consistência interna dos construtos.

Tabela 1
AVE e confiabilidade composta dos construtos

Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa.

Neste momento, retoma-se o trabalho de Bido et al. (2010), para o qual o construto Equipe de Trabalho e Solução de Problemas em Grupo (ETSP) não foi constatada a confiabilidade. No caso deste artigo, atribui-se a confiabilidade provavelmente em virtude do volume maior da amostra, já que, assim como no trabalho dos autores supracitados e de Bido et al. (2011), este construto também teve um de seus indicadores eliminados, o mesmo, inclusive, devido à sua carga fatorial não significante.

Na sequência, a Tabela 2 apresenta a Matriz de Cargas Cruzadas (Cross Loadings), base para a análise sobre a validade discriminante do modelo proposto. A validade discriminante significa que os indicadores mensurados representam apenas um construto. Os itens de uma escala não devem ter convergência com os itens de uma escala diferente (HAIR JR. et al., 2006). O critério utilizado implica que a carga do indicador relativa ao construto latente com o qual está associado deve ser mais alta que a carga que ele apresenta para os construtos restantes no modelo (HAIR JR. et al., 2011). Assim, quando ela for alta, tem-se que o construto é único e consegue capturar algum fenômeno que as outras medidas não conseguem.

Tabela 2
Matriz de cargas cruzadas.

Fonte: elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa.(a) = Item excluído nas análises de Chan (2003); (b) Item excluído nas análises de Bido et al. (2010); (c) Item excluído nas análises de Bido et al. (2011).

Os valores em negrito são as cargas fatoriais dos indicadores correspondentes aos seus respectivos construtos. Como se pode perceber, estas cargas são maiores do que as outras, de outros construtos, dessa forma, é possível atribuir a validade discriminante ao modelo, em sua totalidade. Os indicadores que não possuem número estão preenchidos por “-”, são aqueles que foram eliminados do modelo devido à sua baixa carga fatorial, considerando T = 2,56. Os valores de p mostraram-se significantes para todos os itens (p < 0,01), exceto o item Q16CEAG (0,02709). À exceção dos indicadores Q18FAI e Q37IAI, observa-se que todos os outros itens eliminados neste estudo também o foram por ao menos algum outro, quando não por dois dos trabalhos em comparação (CHAN, 2003; BIDO et al., 2010; BIDO et al., 2011). Este fato pode configurar possíveis problemas com tais indicadores, fazendo-se necessária suas revisões para futuros estudos.

Outro critério a ser considerado na análise da validade discriminante é o de Fornell-Lacker, segundo o qual um construto compartilha mais variância com seus indicadores do que com qualquer outra variável latente do modelo estrutural. Em termos estatísticos, a raiz quadrada AVE de cada construto deve ser maior que a maior correlação desse construto com qualquer outro (CHIN, 1998; HAIR Jr. et al. 2011). Os valores da raiz quadrada da AVE estão em negrito, nas Tabelas 3 e 4. A partir da Tabela 3, é possível confirmar a validade discriminante do modelo, para as variáveis latentes de primeira ordem, e na Tabela 4, esta ratificação se dá pelas variáveis latentes de segunda ordem.

Tabela 3
Correlação de Pearson das variáveis latentes de primeira ordem.

Fonte: elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa.

Tabela 4
Correlação de Pearson das variáveis latentes de segunda ordem.

Fonte: elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa.

O valor destacado na Tabela 3 indica que entre os construtos PR e CLD não há validade discriminante entre eles. Entretanto, este fato, assim como ocorreu em Bido et al. (2010), não é um problema, já que ambas as variáveis latentes foram utilizadas como indicadores reflexivos do mesmo construto, a AO. No caso do valor destacado na Tabela 4, este indicaria a falta de validade discriminante entre os construtos AG e AO. Entretanto, uma vez que sua distância da raiz da AVE não é muito alta, e que há a justificativa de o construto AG levar indiretamente os efeitos da AI para o construto AO, esta inferência deve ser desconsidera. Logo, confirma-se a validade discriminante ao modelo.

Em relação às estatísticas descritivas apresentadas, destaca-se que o construto “Importância da AI” obteve a maior média (6,603), enquanto a variável latente “Práticas e Recompensas” mostrou a menor média (4,561). Estes resultados apontam que, se por um lado, os respondentes afirmam que para se tornar um bom funcionário é importante melhorar continuamente as habilidades no trabalho, e que é fundamental aprender como ser um melhor funcionário, por outro, as práticas e recompensas que potencialmente estimulariam e reforçariam estes comportamentos não são consideradas relevantes. Segundo os indicadores deste construto, fica evidente que os respondentes não concordam que possam propor com frequência novas ideias para a organização ou que os novos funcionários sejam encorajados a questionar o modo como as coisas são feitas. Também discordam que os gestores encorajem os funcionários a experimentar, bem como que as ideias inovadoras que funcionam são frequentemente recompensadas pela direção da organização.

Neste contexto, enfatiza-se que não somente adotar e implementar a AO passou a ser essencial, como também institucionalizá-la. Para tanto, Chan e Scott-Ladd (2004) postulam que é preciso promover uma cultura de conhecimento compartilhado, em que haja o desenvolvimento e facilitação de um ambiente de trabalho que encoraje a experimentação, a tolerância e o aprendizado a partir dos erros, assim como recompense os empregados por suas contribuições. Percebe-se o contraste desta assertiva na realidade da organização estudada, segundo a visão dos respondentes, no que tange às práticas de recompensas. No entanto, há que se considerar a motivação intrínseca dos profissionais deste setor (THOMAS, 2009).

4.2 Avaliação do modelo estrutural

Todas as análises de validade e confiabilidade realizadas anteriormente indicaram a pertinência de se manter todos os parâmetros propostos no modelo de mensuração (Outer Model), que, uma vez validado, possibilitou que se prosseguisse para a etapa de avaliação do modelo estrutural (Inner Model) (HENSELER et. al, 2009). O modelo estrutural refere-se às relações de fato entre AI, AG e AO.

No método PLS-SEM, o indicador que melhor reflete o ajuste do modelo estrutural é o coeficiente de determinação (R²), o qual representa a porção da variância explicada de cada variável latente endógena (HAIR Jr. et al., 2012). O valor do R² deve ser suficiente para que o modelo tenha um nível mínimo de poder explicativo; assim, quanto mais alto, melhor o ajuste do modelo. A Figura 1 representa o modelo em que AI e AG foram utilizadas como preditoras de AO e os valores de R² destacados dentro dos construtos.


Figura 1
Modelo estrutural das relações entre AI, AG e AO

Todos os coeficientes estão na forma padronizada e são altamente significantes (p < 0,01), com exceção do coeficiente entre AI e AO. A significância foi estimada por meio de bootstrapping com N = 75 e 500 repetições. Os indicadores foram omitidos para melhor disposição da figura.

Comp. interno = comportamentos internos da AG; Comp. externo. = comportamentos externos da AG; CPM = clareza de propósito e missão; CLDP = comprometimento da liderança e delegação de poder; PR = práticas e recompensas; TC = transferência de conhecimento; ETSP = equipe de trabalho e solução de problemas em grupo; AI = aprendizagem individual; AG = aprendizagem grupal (AG); AO = aprendizagem organizacional.

Fonte: elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa.

A Figura 1 indica o modelo estrutural proposto. Os valores inseridos nos construtos AI, AG e AO são os valores de R² e indicam a explicação das variações entre um e outro. Nesse sentido, 51,9% das variações em AO são explicadas pelas variações de AG e AI, enquanto 25% das variações em AG são explicadas pelas variações em AI. Os valores nas setas representam os valores dos coeficientes estruturais e explicitam que AG influencia substancialmente AO (0,545) em comparação à AI (0,272).

Após realizadas as análises dos modelos de mensuração e estrutural do presente artigo, na Tabela 5 estão dispostos valores de R² e dos coeficientes estruturais das pesquisas de Chan (2003), Bido et al. (2010) e Bido et al. (2011) e da pesquisa atual, todos considerando p < 0,01, permitindo sua comparação.

Tabela 5
Comparação entre R² e coeficientes estruturais dos estudos de Chan (2003), Bido et al. (2010), Bido et al. (2011) e a pesquisa atual.

Fonte: elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa.Nota. n.s. = não significante ao p < 0,01.

Os dados contidos da Tabela 5 possibilitam verificar que os resultados da pesquisa atual possuem valores de R² maiores que os outros trabalhos. A presente pesquisa assemelha-se à de Bido et al. (2010) à medida que ambas possuem seus coeficientes estruturais de maior representatividade na relação AG à AI, enquanto o menor valor diz respeito à relação AI à AG. Já no que tange à pesquisa de Chan (2003), nota-se que embora o ambiente hospitalar esteja presente também na pesquisa atual, os valores de R², embora maiores para AG e menores para AO, são razoavelmente distantes. Em termos de distribuição, no entanto, os trabalhos se assemelham.

Os resultados da pesquisa atual, em consonância aos outros três trabalhos, reforçam a ideia de Kim (1998) de que a importância da AI para a AO é óbvia e sutil, mas principalmente sutil, pois, uma vez que a associação entre ambas não é expressiva, o efeito da AI sobre a AO é indireto. Se é plausível afirmar que uma organização pode aprender apenas a partir de seus membros, é ainda mais pertinente argumentar que uma organização pode aprender apenas a partir de seus grupos.

A aprendizagem individual é produto da experiência de interação do indivíduo com seu meio ambiente (ZANELLI, 2004). Logo, à medida que constitui este ambiente outros indivíduos em interação entre si, têm-se os grupos. Ainda, há o argumento de que a aprendizagem organizacional não é simplesmente a soma de cada aprendizado individual de seus membros, e que a aprendizagem organizacional tem como fator intrínseco a coletividade (COOK; YANOW, 1996). Tais assertivas, em conjunto com os resultados apresentados, instigam a conclusão de que a AG é maior fator de influência da AO em comparação à AI.

5 Considerações Finais

O presente artigo foi desenvolvido com o objetivo analisar empiricamente a articulação entre os níveis individual, grupal e organizacional da aprendizagem em uma instituição hospitalar. Em comparação, observou-se que entre a pesquisa atual e os trabalhos de Chan (2003), Bido et al. (2010) e Bido et al. (2011) não houve discrepâncias substanciais. Os resultados apresentados, significativos, demonstram que a aprendizagem nos grupos de trabalho está relacionada à aprendizagem que ocorre nos níveis individual e organizacional, porém, a aprendizagem individual não se mostrou significativamente associada à aprendizagem organizacional.

No caso do ambiente hospitalar, as circunstâncias de desproporções entre AI, AG e AO podem ser mais específicas à medida que, para ampliar a construção da AO em organizações do setor de saúde, os processos de reflexão, reinterpretação, refinamento e codificação do conhecimento devem ser realizados por grupos, e não apenas individualmente (EDMONDSON; BOHMER, 2001). Assim, especula-se que, necessariamente a aprendizagem organizacional é dependente da aprendizagem nos grupos, da passagem de AI para AG para que ocorra AO.

Outro ponto de atenção deve-se à percepção dos membros da organização estudada em relação à importância da AI em contraste às práticas e recompensas neste tópico. Viu-se que, se apesar do primeiro item ter apresentado expressividade relevante, as práticas e recompensas que potencialmente estimulariam e reforçariam estes comportamentos não o foram. Supõe-se que estes resultados sejam consoantes à ideia de que determinadas atividades laborais, como as desempenhadas por profissionais da saúde, não demandam dos seus sujeitos estímulos e recompensas externas. Isso em virtude de que certas condições que caracterizam a atividade fazem que os profissionais sejam estimulados pela motivação intrínseca (THOMAS, 2009), e tal fato não significa que estas pessoas não estejam aprendendo em seu ambiente de trabalho. No caso dos resultados aqui encontrados tal circunstância é possível, já que os respondentes consideram a importância da aprendizagem individual um aspecto fundamental.

O direcionamento do processo da aprendizagem organizacional é elemento crucial para a função executiva à medida que garante que a AO está ocorrendo e que assegura a sobrevivência da organização ao longo do tempo. Por este contexto e pelos resultados da pesquisa, alerta-se que na organização estudada há indícios da necessidade de aprofundamento sobre os processos de transferência da aprendizagem, da passagem da AI para AO por meio da AG. Isso em virtude da importância atribuída à AI pelos respondentes e sua necessária transferência para AG, tendo em vista a baixa correlação entre AI e AO diretamente. Daí decorre a considerar a promoção de cultura de conhecimento compartilhado, que pode ser feito a partir do encorajamento à experimentação e à liderança, da tolerância e do aprendizado a partir dos erros, assim como à prática de recompensas aos empregados por suas contribuições.

Enfim, é preciso frisar algumas limitações do estudo. Primeiramente, destaca-se que a pesquisa realizada não se faz passível de generalização à toda a organização estudada. As articulações encontradas entre AO, AG e AI são resultados provenientes da visão dos respondentes. Se considerarmos todo o quadro de funcionários do hospital em questão, a amostra utilizada é apenas uma parcela de alguns setores específicos.

Em segundo lugar, aponta-se limitações na forma de aplicação do questionário. Uma vez que estes foram administrados por coordenadores da organização, os pesquisadores tiveram pouco controle sobre a amostra, o que também pode ter causado algum erro sistemático. Há também que se admitir limitações encontradas no instrumento utilizado. Algumas perguntas foram formuladas de modo a não tomar certos cuidados com palavras que podem ter tendenciado o respondente ou ainda enviesado o questionário (PAYNE, 1951). O modelo de Kim (1998) pode ser utilizado como base para uma reformulação do questionário, uma vez que prevê o ciclo da aprendizagem de forma mais completa, possibilitando análises mais ajustadas à articulação e transferência do aprendizado entre três os níveis.

A partir da aplicação empírica de uma pesquisa que busca investigar a articulação entre AI, AG e AO, os resultados apresentados nesta pesquisa juntamente, devem aguçar o pesquisador a aprofundar este tema, com ênfase nas passagens do aprendizado entre os níveis considerados. É notório que a literatura concentra-se substancialmente nos níveis individual e organizacional, e que o nível interorganizacional continua a ser negligenciado (CORREIA-LIMA; LOIOLA; LEOPOLDINO, 2017). Entretanto, a aprendizagem grupal tem se mostrado sumária nos contextos em que a metodologia em pauta foi aplicada (BIDO et al., 2010; BIDO et al., 2011).

Para estudos futuros recomenda-se que modelos concorrenciais sejam elaborados e testados, com as seguintes formatações: 1) utilizar indicadores formativos para as variáveis latentes de primeira ordem para AI e AG; 2) eliminar as variáveis de primeira ordem dos construtos AI e AG; 3) inverter a associação entre AI e AG; 4) e utilizar a associação recursiva entre AI e AG. É preciso ainda rever algumas questões sobre o modelo de mensuração utilizado, no que tange aos indicadores reflexivos nas variáveis de primeira ordem. Estas recomendações podem representar refinamentos no modelo proposto por Bido et al. (2010), refinamentos estes viáveis e necessários para avanços na temática que se refere ao relacionamento entre as dimensões individual, grupal e organizacional da aprendizagem nesta formatação metodológica de pesquisa.

Não se descartam, também, pesquisas qualitativas que em abordagens mais aprofundadas são capazes de oferecer maior compreensão sobre a aprendizagem nos três níveis trabalhados, particularmente, assim como sobre suas articulações, em contexto empírico. Mais urgente que refinamentos estatísticos e estudos qualitativos, porém, seja a investigação e o avanço teórico na área, especialmente em relação à aprendizagem em grupos, visto que apesar de afetar diretamente a aprendizagem organizacional, este é um assunto que apresenta carência e demanda descobertas científicas

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