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Um mapeamento da sexualidade em B. F. Skinner
A mapping of sexuality in B. F. Skinner
Acta Comportamentalia: Revista Latina de Análisis de Comportamiento, vol. 29, núm. 4, pp. 115-135, 2021
Universidad Veracruzana


Recepción: 06 Octubre 2020

Aprobación: 02 Febrero 2021

Resumo: A sexualidade humana vem sendo estudada por diversas áreas do conhecimento, mas não se destaca como tema de estudo na Análise do Comportamento, mesmo com o interesse crescente de seus estudiosos em temas sociais. Tendo em vista que diversos autores partiram da obra de B. F. Skinner para avançar em discussões sociais importantes, esta pesquisa teve como objetivo mapear as discussões sobre sexualidade em livros de B. F. Skinner. O critério de seleção dos capítulos foi conter o radical sex, o que totalizou 66 capítulos selecionados em 10 livros publicados entre 1938 e 1989. As análises foram realizadas por meio da quantificação das ocorrências do radical e categorização dos seus contextos de ocorrência no texto. No total, o radical sex apareceu 317 vezes na obra de Skinner. Os contextos de ocorrência foram divididos em nove categorias: comportamento sexual, reforçamento sexual, drive/privação e saciação, sexo biológico/gênero, aspectos biológicos, aspectos sociais e/ou culturais, orientação sexual, evento antecedente e outros. O mapeamento realizado na presente pesquisa pode servir de base a novos estudos analítico-comportamentais sobre sexualidade e a estudos que procurem estabelecer um diálogo com outras áreas do conhecimento que se debruçam sobre o tema.

Palavras-chave: sexualidade, comportamento sexual, comportamentalismo radical, sexo, análise do comportamento.

Abstract: Human sexuality has been studied by several areas of knowledge and its study has been marked by the conflict between essentialism and social constructivism. Alternatively, some authors point to the importance of considering biological, psychological, and social aspects in the study of sexuality. This conception comes close to the explanatory model of selection by consequences adopted by Behavior Analysis. However, sexuality does not stand out as a subject of study in Behavior Analysis, even with the growing interest of its scholars in social themes. Since the publication of Walden Two, B. F. Skinner has already shown his concern for applying behavioral principles to solving problems of this nature. Bearing in mind that several authors started from Skinner’s work to advance important social discussions, this research aimed to map the discussions about sexuality in books by B. F. Skinner from 1938 to 1989. The criterion for selecting the chapters was to contain the radical sex, which led to 66 selected chapters in 10 books. Chapters with five or more occurrences of the radical sex were fully and systematically read; and the chapters with less than five occurrences of the radical sex were partially read, focusing the analysis on the paragraphs the radical appeared. The analyzes were performed by quantifying the occurrences of the radical and categorizing their contexts of occurrence within the text. In total, the radical sex appeared 317 times in Skinner’s work, with 116 occurrences in the book Science and Human Behavior (1953) and 69 in the book Contingencies of Reinforcement (1969). Chapters with five or more occurrences of the radical sex were 15, and six of them are from Science and Human Behavior (1953), indicating another contrast for this book in Skinner’s sexuality discussions. The contexts of occurrence were divided into nine categories, which are, in decreasing order of appearance in the texts: sexual behavior, sexual reinforcement, drive/deprivation and satiation, biological sex/gender, biological aspects, social and/or cultural aspects, sexual orientation, antecedent event, and others. From these themes present in Skinner’s work, it is possible to observe that the author emphasizes the importance of the phylogenetic level in the explanation of sexual behavior, in which special susceptibilities to reinforcement by sexual contact were selected. Also, Skinner describes the importance of a history of reinforcement and social control exercised by the group and controlling agencies in the selection of sexual behavior. In this way, the mapping carried out in the present study can serve as a basis for new analytical-behavioral studies on sexuality and for studies that seek to establish a dialogue with other areas of knowledge that deal with the topic.

Keywords: sexuality, sexual behavior, radical behaviorism, sex, behavior analysis.

Ainda distante de um consenso, o estudo da sexualidade humana tem sido marcado pelo conflito entre duas posições: o essencialismo e o construtivismo social (Camargo et al., 2011; Heilborn & Brandão, 1999; Weeks, 2000). O essencialismo é representado por algumas vertentes das ciências biológicas e psicológicas que definem a sexualidade como “algo inerente à natureza humana”, seja por mecanismos fisiológicos ou instintos psíquicos (Heilborn & Brandão, 1999, p. 9). Já no construtivismo social, foco das ciências humanas e sociais, a sexualidade é entendida como uma construção social, que pode variar radicalmente em diferentes culturas (Bozon & Heilborn, 2006; Heilborn & Brandão, 1999; Weeks, 2000). Dessa maneira, esse conflito é permeado por “intensas disputas” entre as ciências biológicas e as ciências humanas (Senkevics & Polidoro, 2012, p. 16).

Entretanto, alguns autores sugerem uma terceira via de compreensão da sexualidade em que tanto a biologia quanto o social façam parte de uma explicação conjunta do fenômeno (Senkevics & Polidoro, 2012). Outros também ressaltam a importância dos aspectos psicológicos que, juntamente com os aspectos biológicos e sociais, constituiriam a complexidade da sexualidade humana (Pinafi, 2015; Senem & Caramaschi, 2017). Essa concepção alternativa se aproxima notavelmente do modelo de seleção pelas consequências adotado como modelo explicativo na filosofia comportamentalista radical. Segundo Skinner (1981/1987),

O comportamento humano é o produto conjunto de a) contingências de sobrevivência responsáveis pela seleção natural das espécies, e b) contingências de reforçamento responsáveis pelos repertórios adquiridos por seus membros, incluindo c) contingências especiais mantidas por um ambiente cultural evoluído. (p. 55)

Considerando essa noção, estudar a sexualidade sob a ótica da Análise do Comportamento poderia trazer uma perspectiva mais abrangente que abarcasse aspectos da história filogenética, ontogenética e cultural na explicação desse fenômeno. Todavia, alguns autores apontam que há poucos estudos sobre esse tema na área. Ao examinarem 42 anos de publicação no Journal of Applied Behavior Analysis (JABA), Carvalho et al. (2011) encontraram apenas sete artigos com a sexualidade como tópico principal. Dentre eles, destacam-se os estudos realizados entre as décadas de 1960 e 1970, os quais tratavam sobre a homossexualidade, entendida na época como desvio ou patologia.

Nesse contexto, procedimentos terapêuticos baseados em modificação do comportamento e aprendizagem respondente foram utilizados para “alterar a orientação sexual de homossexual para heterossexual” (Carvalho et al., 2011, p. 74). Tais estudos foram publicados até 1979 e possivelmente pararam de ser realizados por conta da retirada da homossexualidade do manual de transtornos mentais da Associação Americana de Psiquiatria em 1973, e pelo apoio da Associação Americana de Psicologia em 1975 (Carvalho et al., 2011; Mizael, 2018). Atualmente, é possível apontar diversos aspectos antiéticos envolvidos nos procedimentos baseados em modificação do comportamento (cf. Rutherford, 2006) e a própria Associação Americana de Psicologia, em 2009, indicou que as terapias que visaram a mudança da orientação sexual se mostraram ineficazes e inseguras aos indivíduos (Carvalho et al., 2011; Mizael, 2018). Os órgãos de saúde passaram a considerar a homossexualidade como “apenas uma variante possível da sexualidade humana” (Barreto, 2020, p. 18), e hoje, nenhum tipo de terapia deve ter como propósito a sua reversão, vide a resolução no 01/1999 do Conselho Federal de Psicologia, que proíbe aos psicólogos e psicólogas exercer práticas que visem o “tratamento” ou “cura” das homossexualidades (Carvalho et al., 2011; Costa-Júnior, 2020; Mizael, 2018; Mizael et al., 2019)3.

Conforme afirmam Carvalho et al. (2011), muitos avanços foram realizados nos estudos sobre sexualidade humana, mas isso “não se refletiu na produção de analistas do comportamento” (p. 79). Os procedimentos de reversão sexual realizados podem ser um dos motivos que afastou os estudiosos da área desse tema, haja vista as diversas críticas atribuídas a esses estudos. Diferentemente de outras psicologias, que se aliaram à luta dos movimentos sociais pelos direitos sexuais, os analistas do comportamento não têm discutido a sexualidade de maneira ampla e complexa, e a falta de um referencial teórico bem estabelecido pode suscitar em práticas anti-éticas por parte desses profissionais (Costa-Júnior, 2020). É importante ressaltar, contudo, que os compromissos ético-políticos da Análise do Comportamento vêm sendo discutidos há bastante tempo (e.g., Holland, 1978; Skinner, 1971, 1978) e a área parece ter ferramentas para discutir eticamente a sexualidade e rever a sua própria postura. Olhar para a filosofia que embasa essa ciência do comportamento de maneira sensível e compromissada com a diversidade sexual talvez auxilie a evitar que procedimentos antiéticos sejam realizados novamente.

Um campo de estudo relacionado ao da sexualidade que vem sendo alvo de pesquisas teóricas em Análise do Comportamento é o do gênero. Em uma revisão de literatura realizada por Couto e Dittrich (2017), é possível encontrar alguns trabalhos que buscaram aproximar a filosofia comportamentalista radical de teorias feministas (e.g., Ruiz, 1995, 1998, 2003, 2009). Segundo os autores, algumas teóricas feministas consideravam que o comportamentalismo era incompatível com seus estudos, mas ao analisar aspectos filosóficos comuns entre as duas áreas, Ruiz (1995) identificou alguns malentendidos realizados por tais teóricas sobre a Análise do Comportamento (e.g., que o Comportamentalismo Radical seria uma psicologia de estímulo-resposta mecanicista e que negaria sentimentos ou pensamentos, lidando apenas com comportamento manifesto). Assim, diversos esforços vêm sendo realizados para inserir discussões de teorias feministas na área.

Além disso, é possível observar um interesse crescente de analistas do comportamento no estudo de temas sociais ao longo dos anos. Desde a publicação de Walden Two, Skinner (1948/2005) já havia demonstrado sua preocupação em aplicar os princípios comportamentais para a resolução de diversos problemas de ordem social, e essa ideia continuou sendo sustentada por outros trabalhos da área (e.g., Holland, 1978; Mizael & De Rose, 2017; Moore, 2003; Skinner, 1971, 1978). Talvez pelas publicações iniciais de Skinner a respeito de temas sociais importantes, muitos autores partiram de seus trabalhos para avançarem suas discussões, como pode ser visto nos estudos sobre cultura e metacontingência (e.g., Glenn et al., 2016) e em proposições acerca do controle aversivo (e.g., Hunziker, 2017; Sidman, 1989), por exemplo.

Apesar de não ter publicado uma obra específica sobre sexualidade, Skinner (1938, 1953/2005, 1969, 1971) descreve o contato sexual como um reforçador primário importante para a sobrevivência da espécie e também discorre sobre os problemas de superpopulação decorrentes do conflito entre a suscetibilidade a ese tipo de reforçador e algumas práticas culturais vigentes, o que indica que algumas discussões sobre o tema podem ser encontradas em sua obra. Além disso, Fazzano et al. (2020) apontam que a falta de aprofundamento em alguns estudos sobre sexualidade pode estar relacionada ao fato de que uma base teórica sobre o tema ainda não está bem consolidada. Dessa maneira, investigar o que foi escrito por B. F. Skinner a respeito da sexualidade de maneira mais aprofundada pode contribuir para a reinserção teórica da Análise do Comportamento nos estudos sobre o tema considerando questões éticas e políticas nessa discussão.

Identificar aspectos mais específicos que Skinner possa ter descrito sobre a sexualidade também pode abrir a possibilidade de novos estudos analítico-comportamentais que avancem tanto discussões sobre a filogênese, aproximando a área das ciências biológicas, quanto sobre a ontogênese e cultura, que podem auxiliar em uma definição analítico-comportamental sistematizada do comportamento sexual e também aproximar a área das ciências sociais, aprofundando a relação entre práticas culturais e a sexualidade. Tendo isso em vista, esta pesquisa teve como objetivo mapear a discussão sobre sexualidade em livros de B. F. Skinner.

MÉTODO

Considerando o objetivo do texto, foi realizada uma revisão da literatura skinneriana e foi construído um mapeamento dos conceitos atrelados à sexualidade presentes em sua obra. Os procedimentos de seleção e análise dos textos serão descritos a seguir.

Seleção dos textos

Para identificar os registros textuais de Skinner, foi utilizado o artigo: “Acesso a Skinner pela sua própria obra: Publicações de 1930 a 1990” (Carrara, 1992), que é uma lista completa de todos os textos de Skinner, inclusive reedições, reimpressões e onde foram republicados. Foram selecionados todos os livros acadêmicos que tivessem Skinner como único autor, obtendo-se uma lista de 10 livros: (1) The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis (1938); (2) Science and Human Behavior (1953); (3) Verbal Behavior(1957); (4) The Technology of Teaching (1968); (5) Contingencies of Reinforcement: A Theoretical Analysis (1969); (6) Beyond Freedom and Dignity (1971); (7) About Behaviorism (1974); (8) Reflections on Behaviorism and Society (1978); (9) Upon Further Reflection (1987); e (10) Recent Issues in the Analysis of Behavior (1989). O livro Walden II, apesar de conter discussões que remetem ao tema da sexualidade, não foi selecionado por ser um romance e não uma obra acadêmica.

Todos os livros selecionados foram encontrados em sua forma digital e em língua original. Foi realizado um teste em cada um dos documentos digitais utilizando-se o programa Adobe Acrobat Reader para verificação da ferramenta de busca no interior do documento (i.e., ctrl+f), a qual possibilitou a seleção dos capítulos para análise. Após o teste de verificação da ferramenta de busca no interior do documento (i.e., ctrl+f), a seleção dos capítulos foi realizada utilizando-se tal ferramenta para buscar pelo radical sex, que foi escolhido por estar contido na maioria dos termos relacionados à sexualidade. Todos os 66 capítulos em que o radical apareceu foram automaticamente selecionados para análise e estão apresentados na Tabela 1.

Tabela 1. Textos Selecionados

Tabela 1
Textos Selecionados

a Capítulos com cinco ou mais ocorrências do radical sex.

Análise dos textos

A partir das buscas realizadas no interior de cada livro digital selecionado, as ocorrências do radical sex foram quantificadas e catalogadas por livro e por capítulo em uma tabela para obtenção de dados quantitativos gerais. Uma segunda busca pelo radical foi realizada nos arquivos a fim de que as palavras em que o radical sex estava contido pudessem também ser quantificadas e catalogadas. Dessa maneira, algumas palavras antecedentes e sequentes também foram inseridas na catalogação para que um primeiro contexto temático pudesse ser identificado (e.g., behaving sexually, sexual behavior, same sex, sexual reinforcement).

Os capítulos selecionados que continham cinco ou mais ocorrências do radical foram lidos na íntegra; nos capítulos em que o radical apareceu menos de cinco vezes, foi lido o parágrafo em que eles estavam contidos, além dos parágrafos antecedentes e sequentes. Nos casos em que as autoras julgaram necessário, outras partes do texto foram lidas para uma melhor compreensão do contexto. O critério para a leitura integral ou parcial dos textos foi estabelecido de maneira arbitrária, que possibilitasse a exequibilidade da pesquisa. Ao longo da leitura, os trechos em que eram realizadas discussões sobre a sexualidade foram transcritos em uma tabela. Junto aos trechos, foram inseridos na tabela comentários gerais, especificações sobre os níveis de seleção focalizados na discussão e sobre as teses defendidas e criticadas pelo autor. Categorias de discussão temáticas foram criadas no decorrer da leitura e das análises (e.g., comportamento sexual, reforçamento sexual, drive/privação e saciação).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nesta seção serão apresentados dados quantitativos referentes à frequência de ocorrência do radical sex e das palavras e expressões utilizadas por Skinner referentes à sexualidade. Com base na leitura dos capítulos selecionados, será realizada uma discussão a respeito dos contextos em que Skinner discorreu sobre sexualidade ao longo de sua obra.

Frequência de ocorrência do radical sex

A busca pelo radical sexrealizada nos 10 livros de Skinner recuperou apenas palavras e expressões relacionadas à sexualidade. Dessa maneira, só não foram contabilizadas as ocorrências contidas nos Index dos livros. No total, o radical apareceu 317 vezes na obra selecionada, com uma média de 31,7 ocorrências por livro. A distribuição da frequência em cada um deles pode ser observada na Figura 1.


Figura 1
Frequência Total de ocorrência do Radical Sex por Livro

Tomando como base os dados da Figura 1, percebe-se um destaque nas ocorrências do radical sex em dois livros skinnerianos: Science and Human Behavior (1953), com um total de 116 ocorrências; e Contingencies of Reinforcement (1969), com 69 ocorrências. Ao retirar da contagem essas duas obras que se sobressaem em relação às outras em termos quantitativos, a média de aparições do radical no restante dos livros é de 16,5 ocorrências por livro, número que se reduz a pouco mais da metade da média em todas as obras. Além disso, considerando em porcentagem, o livro Science and Human Behavior (1953) contém 36,59% do total de ocorrências do radical sex, enquanto o Contingencies of Reinforcement(1969) contém mais 21,76%, representando juntos um total de 58,35% das ocorrências, mais da metade do número total.

No que concerne aos capítulos em que é possível encontrar o radical sex, a Tabela 1 apresenta os 15 em que o número de ocorrências foi igual ou maior a cinco (i.e., os que foram lidos na íntegra). O livro Science and Human Behavior (1953) também se destaca nesse quesito, pois seis desses 15 capítulos com mais ocorrências do radical fazem parte deste livro. Outros três capítulos estão presentes em Beyond Freedom and Dignity (1971); e dois com um número expressivo de ocorrências fazem parte de Contingencies of Reinforcement (1969). Os outros quatro capítulos que completam os 15 com cinco ou mais ocorrências do radical sex estão distribuídos em quatro livros: The Behavior of Organisms (1938), The Technology of Teaching (1968), Upon Further Reflection (1987) e Recent Issues in The Analysis of Behavior (1989).

Nos outros 51 capítulos selecionados para análise, o número de ocorrências do radical sex varia entre um e quatro. Um total de 18 capítulos apresentaram apenas uma vez o radical, distribuídos em nove dos livros selecionados, com exceção do Science and Human Behavior (1953), que não tem nenhum capítulo com apenas uma ocorrência. Outros 14 capítulos recuperaram duas ocorrências do radical, também distribuídos em nove obras, mas com exceção do About Behaviorism (1974), que não tem nenhum capítulo com duas ocorrências. Os capítulos com três ocorrências estão distribuídos em seis obras e configuram um total de 12 capítulos. Já os que possuem quatro ocorrências são sete capítulos, dispostos em três obras (i.e., Science and Human Behavior, 1953; About Behaviorism, 1974; eReflections on Behaviorism and Society, 1978).

Contextos de ocorrência do radical sex

As palavras e expressões em que o radical sex estava contido foram agrupadas em nove diferentes categorias, que, de maneira geral, representam as discussões sobre sexualidade realizadas por Skinner. É importante ressaltar que a divisão das categorias foi didática e em alguns casos as discussões se entrelaçam, como é o caso da divisão entre “Comportamento Sexual” e “Reforçamento Sexual”, que podem se unir na medida em que um comportamento pode ser definido por suas consequências reforçadoras. Outro exemplo pode ser observado na categoria “Drive/privação e saciação”, que poderia ser uma parte da categoria “Aspectos Biológicos”, por envolver aspectos da história filogenética. A Figura 2 apresenta a frequência total de cada categoria na obra pesquisada e a Tabela 2 apresenta os termos inseridos em cada categoria.


Figura 2
Frequência Total de Ocorrência das Categorias Relacionadas à Sexualidade

Tabela 2
Termos Incluídos em Cada Categoria

Comportamento Sexual

Constituindo 39,11% da frequência total de ocorrência nos textos (i.e., 124 ocorrências), a categoria denominada “Comportamento Sexual” foi a que prevaleceu na obra de Skinner. Um primeiro termo dessa categoria que merece especial atenção é “sexual reflexes”, que foi apresentado apenas uma vez, em The Behavior of Organisms (1938). Nessa época, Skinner ainda não havia desenvolvido por completo o paradigma operante e, muitas vezes, usava o termo “reflexo” como sinônimo de “comportamento” (Pereira, 2013). A partir de Science and Human Behavior (1953), o autor se referia ao comportamento sexual principalmente pelo próprio termo “sexual behavior”, que só não aparece nos livros The Technology of Teaching (1968) e About Behaviorism (1974), sendo encontrado em Beyond Freedom and Dignity (1971) em sua forma mais comum em países não americanos: “sexual behaviour”. Além disso, outros termos menos frequentes também foram incluídos nessa categoria, por exemplo “sexual.sex activity”, “sex play” e “behaving sexually”.

Um dos aspectos considerados pelo autor é a importância do nível filogenético na explicação do comportamento sexual, que pode ser identificada quando ele afirma que: “comportamento sexual é essencial à sobrevivência das espécies” (Skinner, 1978, p. 92). No entanto, no caso da espécie humana, as contingências de reforçamento parecem se sobressair em relação às variáveis filogenéticas, argumento que pode ser constatado pela afirmação de que: “as condições pelas quais uma pessoa jovem é primeiramente reforçada sexualmente determinam a extensão e a forma da atividade sexual posterior” (Skinner, 1969, p. 56). Além dos aspectos filogenéticos e ontogenéticos, Skinner (1953/2005) também discorreu sobre aspectos sociais e culturais atrelados à sexualidade, afirmando que o comportamento sexual depende também do “controle ético das relações sexuais, de restrições governamentais e religiosas, da educação sexual e assim por diante” (p. 422).

Reforçamento Sexual

Outra categoria que se destaca em relação à frequência total de ocorrência dos termos relacionados à sexualidade foi denominada de “Reforçamento Sexual”, e é representativa de 27,44% do total. Foram agrupados termos relacionados tanto ao processo de reforçamento sexual (e.g., “sexual reinforcement”, “reinforce sexually” e “sexually reinforced”) quanto aos eventos ou estímulos que são considerados reforçadores sexuais. Nesse caso, destaca-se o termo “sexual contact”, que apareceu 32 vezes ao longo da obra e foi descrito por Skinner (1953/2005, 1969, 1971, 1978, 1987, 1989) como um reforçador primário, com valor de sobrevivência. Juntamente com água, comida e a fuga de condições prejudiciais, o contato sexual é um evento de “importância biológica óbvia” (Skinner, 1953/2005, p. 76), tendo obtido função reforçadora já na história filogenética. Além de usar o próprio termo de referência ao contato sexual, Skinner utilizou o termo único “sex” 21 vezes no decorrer da obra para se referir a tal evento reforçador. Uma discussão recorrente na obra do autor acerca desse tema foi em relação aos problemas de superpopulação que a suscetibilidade ao reforçamento por contato sexual produz em uma sociedade sem fome, peste e guerras (Skinner, 1969, 1971, 1978, 1987, 1989), que atinge diversos países ainda nos dias atuais. A despeito de já existir métodos anticoncepcionais na época, Skinner (1971) aponta que isso não seria suficiente se as pessoas não os usassem, e então o problema poderia ser resolvido por uma tecnologia do comportamento.

Além da importância biológica do reforçamento sexual, Skinner (1953/2005) aponta eventos que, pareados ao contato sexual como reforçador primário, tornam-se reforçadores sexuais condicionados por meio da história ontogenética. Quando variáveis sociais são consideradas e um evento é pareado com mais de um reforçador primário, esse evento passa a ser denominado de reforçador generalizado (Skinner, 1953/2005). Um deles foi descrito como “especialmente conectado ao contato sexual como reforçador primário” (Skinner, 1953/2005, p. 78): o afeto. A expressão “affection is mainly sexual” apareceu apenas uma vez e foi incluída nessa categoria por ser o afeto um reforçador generalizado especialmente sexual4.

Drive/privação e saciação

As considerações sobre sexualidade realizadas em The Behavior of Organisms (1938) se resumem predominantemente na sua relação com o drive sexual. Já nessa época, Skinner (1938) não considerava o drive como uma necessidade ou instinto interno, mas utilizava tal termo para explicar algumas variações comportamentais que o paradigma respondente não abarcava, considerando drive como uma lei dinâmica do reflexo (Pereira, 2013). Assim, alterações manipuladas no ambiente teriam efeito sobre o drive sexual: “é óbvio que algumas mudanças ocorrem quando mantemos um animal afastado de atividade sexual e que isso tem o efeito de aumentar o drive sexual” (Skinner, 1938, p. 375).

Já em Science and Human Behavior (1953), com a construção do paradigma operante, o uso do termo “sex drive” ainda é frequente, mas Skinner (1953/2005) busca substituí-lo pela noção de privação e saciação. Dessa forma, termos relacionados à privação e saciação de contato sexual aparecem majoritariamente nessa obra (e.g., “sexual deprivation”, “sexually deprived”, “sexual satiation”), voltando a ocorrer de maneira periférica em Verbal Behavior (1957), Contingencies of Reinforcement (1969) e About Behaviorism (1974). Segundo o autor, assim como no comportamento de comer e de beber, a probabilidade do comportamento sexual se torna muito alta sob privação severa de contato sexual e muito baixa sob saciação excessiva: “é razoável assumir que a probabilidade esteja sempre em algum lugar entre esses dois extremos e que, se a privação for alterada, ela simplesmente se moverá em direção a um ou outro” (Skinner, 1953/2005, p. 141). Além disso, “a saciação sexual parece ser o resultado do mero exercício do comportamento sexual, bem como da consequência especial conhecida como orgasmo” (p. 142).

Sexo biológico/gênero

Apesar de algumas discussões recentes acerca dos significados de sexo biológico e gênero especificarem diferenças entre esses dois conceitos, eles foram incluídos na mesma categoria por serem utilizados de maneira intercambiável por Skinner. Segundo Sant’Ana et al. (2019), o sexo biológico se refere àquele que é designado no nascimento do indivíduo e corresponde a características fenotípicas, fisiológicas e genotípicas que permitem a identificação de uma pessoa como “macho”, “fêmea” ou “intersexual”. Já o gênero é considerado por alguns autores como uma interpretação cultural do sexo e diria respeito aos papéis, atividades, atributos e comportamentos considerados adequados socialmente para diferentes indivíduos (i.e., homens, mulheres, pessoas não-binárias etc.). Nesse contexto, a identidade de gênero se referiria a como um indivíduo se identifica em termos de gênero, independente da correspondência com o sexo biológico; e a expressão de gênero diria respeito ao que é tido como masculino ou feminino pelas normas sociais em termos de vestimenta, características corporais, voz, interação social etc. (Fazzano et al., 2020; Sant’Ana et al., 2019)5.

Ao utilizar os termos que foram incluídos nessa categoria, pode-se interpretar que em alguns momentos Skinner está se referindo ao sexo biológico, quando utiliza “sex” para se referir ao sexo dos animais utilizados em experimentos (e.g., Skinner, 1987) ou quando o termo é utilizado como referência a uma característica anatômica (e.g., Skinner, 1974). Em um caso específico, o termo “sex” parece estar se referindo a gênero, pois Skinner (1957) afirma que nomes pessoais terminados em “a” indicam que o indivíduo é do “sexo feminino”. Como a prática de nomear os indivíduos é cultural e varia em diferentes sociedades, entende-se que Skinner (1957) estava se referindo ao gênero feminino nesse exemplo.

O termo “sexual identity” foi utilizado por Skinner (1978) em uma crítica à noção cognitivista da formação da identidade sexual, em que o autor afirma que são as contingências que selecionam os comportamentos relacionados ao que significa ser um menino ou uma menina. Sant’Ana et al. (2019) interpretaram que o termo seria referente à noção de identidade de gênero citada anteriormente, no entanto, Skinner (1978) parece ter tratado a identidade sexual em termos de comportamentos considerados masculinos ou femininos, o que possibilitaria também encaixar o termo na definição de expressão de gênero utilizada neste estudo. Pode-se considerar que essa descrição de Skinner (1978) contribui para uma interpretação comportamentalista radical de identidade ou expressão de gênero, que leva em consideração o papel das contingências sociais. Contudo, essa noção deve ser atrelada a visões recentes que considerem outras possibilidades para além da lógica binária de gênero, não focalizada apenas no masculino e feminino.

Ao fazer uso dos termos “sexes”, “opposite sex” e “same sex”, Skinner faz uma relação mais direta com o comportamento sexual. Ao tratar esse comportamento como passível de punição, o autor cita que uma técnica utilizada para evitar a emissão desse comportamento em instituições educacionais, por exemplo, era a segregação das pessoas por sexo ou a inacessibilidade do sexo oposto (Skinner, 1968/2003, 1971). Ademais, o autor descreve procedimentos terapêuticos que utilizam imagens do sexo oposto ou do mesmo sexo como parte de uma proposta de tratamento para a homossexualidade (Skinner, 1968/2003). Ambas as técnicas são criticadas pelo autor por não alcançarem os “resultados esperados”, mas Skinner (1968/2003, 1971) não levou em consideração aspectos éticos dessas propostas. A partir de estudos recentes, é possível afirmar que essas descrições de Skinner representam um contexto em que a lógica binária prevalecia e, atualmente, a própria utilização das expressões “sexo oposto” ou “gênero oposto” pode incitar discriminação e invisibilidade da população não-binária (Mizael et al., 2019). Além disso, uma vez que o autor não se posicionou eticamente em relação às técnicas de punição sexual ou de reversão da homossexualidade, pode-se questionar se o autor defenderia tais técnicas caso elas evitassem comportamento sexual ou revertes-sem a orientação homossexual. O que, do nosso ponto de vista, seria indefensável em uma proposta que preze pelos direitos da diversidade sexual.

Aspectos Biológicos

A categoria denominada de “Aspectos Biológicos” contemplou termos que remetem ao nível filogenético de seleção ou à características biológicas individuais e que não foram contemplados em outras categorias já citadas. Com um total de 10 ocorrências ao longo da obra e oito diferentes palavras e expressões, essa categoria não tem grande destaque nas discussões sobre sexualidade de Skinner. Um dos termos inseridos nessa categoria pode ser encontrado em The Behavior of Organisms (1938), quando o autor utiliza a expressão “sexual cycles” para se referir à interferência do ciclo sexual de ratas fêmeas na realização de experimentos (Skinner, 1938). Outros exemplos são observados emContingencies of Reinforcement (1969), nos quais o autor utiliza o termo “sexual competition” para se referir a comportamentos com valor de sobrevivência e termos como “oversexed” ou “sexually below normal” para se referir a condições herdadas de indivíduos com alta ou baixa suscetibilidade ao reforçamento por contato sexual, respectivamente.

Aspectos Sociais e/ou Culturais

Mesmo que Skinner tenha discutido questões sociais e culturais relacionadas ao comportamento sexual, que já foram exploradas tangencialmente na primeira categoria, os termos diretamente relacionados a esses aspectos não foram muito frequentes em sua obra. Essa categoria contempla nove ocorrências distribuídas em três obras: Science and Human Behavior (1953), Contingencies of Reinforcement (1969) e Reflections on Behaviorism and Society (1978). Destacam-se os termos “sexual control”, referente ao controle social do comportamento sexual (Skinner, 1953/2005), e “sex education”, utilizado por Skinner (1953/2005) para enfatizar que o comportamento sexual também depende da educação sexual, assim como do controle exercido por outras agências de controle. Além disso, Skinner (1969) se refere a “sexual displays” como performances ou apresentações sexuais e “sexual seduction” como uma prática cultural. Por fim, os termos “sexual code” e “sexual standard” são utilizados por Skinner (1978) como apontamentos sobre regras e normas sexuais estabelecidas socialmente.

Orientação Sexual

Com um total de seis termos ao longo de toda a obra analisada, essa categoria incluiu somente expressões diretamente relacionadas à orientação sexual, que foram tratadas por Skinner (1968/2003, 1969, 1971, 1974) especificamente em relação à heterossexualidade e homossexualidade. Na primeira obra em que o autor discute a questão, ele traz um exemplo de procedimentos experimentais para o tratamento da homossexualidade, indicando que o objetivo desse tipo de terapia seria alterar o comportamento operante do indivíduo, fazendo-o evitar certos tipos de relações com pessoas do mesmo sexo e se aproximar mais de pessoas do sexo oposto (Skinner, 1968/2003). Já na obra seguinte, Skinner (1969) cita como o “reforçamento homossexual era explícito na educação grega” (p. 62), para exemplificar a contingência entre reforçadores poderosos (i.e., contato sexual) e comportamento produtivo (i.e., educar, aprender).

Em Beyond Freedom and Dignity (1971), Skinner aborda esse assunto ao expor e criticar algumas formas tradicionais de evitar que comportamentos passíveis de punição (e.g., comportamento sexual) sejam emitidos. O autor afirma que “comportamento heterossexual é impossível quando os sexos são segregados” (p. 67), entretanto, “a segregação dos sexos pode levar à homossexualidade indesejada” (p. 68). Fica claro que Skinner (1971) está criticando a forma tradicional de se lidar com comportamentos passíveis de punição, mas não fica evidente quem está considerando o comportamento homossexual indesejado: o ponto de vista tradicional ou o próprio autor. Ainda assim, considerar que a mudança das contingências poderia levar à homossexualidade é considerar que esse comportamento pode ser aprendido, visão que vai ao encontro de alguns estudos analítico-comportamentais sobre a orientação sexual (e.g., Barreto, 2020; Mallot, 1996; Menezes & Brito, 2007; Menezes & Carvalho Neto, 2015).

Em outro momento, Skinner (1974) parece se aproximar ainda mais desses estudos ao afirmar que “o corpo que se comporta heterossexualmente na maior parte do tempo é o mesmo corpo que é ocasionalmente homossexual” (p. 150). Essa descrição, apesar de ainda estar pautada em uma lógica binária, abre à interpretação de que os indivíduos podem ser bissexuais, visão defendida por Mallot (1996), que afirma que todos nascemos suscetíveis a uma ampla variedade de estimulações sexuais (i.e., bissexuais ou multissexuais), e que é na história ontogenética que essas estimulações vão sendo restringidas por meio de controle social.

Evento Antecedente

A categoria que apareceu com menos frequência em toda a obra foi a que Skinner (1953/2005, 1969, 1974) explicita os possíveis eventos antecedentes de uma ação sexual. Nesse contexto, a arte sexual ou objetos sexuais (i.e., “sexual art” e “sexual objects”) são considerados como estímulos tanto para uma ação sexual mais explícita ou simplesmente para a ação de olhar para tais estímulos quando o indivíduo se encontra em extrema privação de contato sexual (Skinner, 1953/2005). Além disso, Skinner (1974) considera que o comportamento de imaginar um episódio sexual (i.e., “sexual episode”) pode, em um recorte mais específico, ser considerado um estímulo para comportamentos sexuais abertos (e.g., masturbação). Por fim, o último exemplo não se configura como um estímulo discriminativo para a emissão de comportamento sexual, mas sim como um evento manipulado para evitar tal comportamento. Skinner (1969) cita que uma das soluções tradicionais para os problemas de superpopulação, criticada pelo autor, seria a alteração química do organismo por meio do uso de algumas drogas que evitariam a emissão de comportamento sexual (i.e., “anti-sex drugs”), mas não especifica que drogas seriam essas.

Outros

Na categoria “Outros” foram incluídas quaisquer palavras ou expressões que não se encaixavam nas outras categorias ou que não eram suficientes para constituírem uma categoria adicional. Assim, alguns dos termos foram referentes a teses tradicionais que estavam sendo criticadas por Skinner (1953/2005, 1969, 1971, 1987), teses essas que se amparam em noções internalistas da sexualidade, representadas por termos como: “sexual impulses”, “sex complex”, “psychosexual functions”, e “possessing sexually”. Outros termos dessa categoria se relacionam com descrições de Skinner (1957, 1974, 1989) a respeito de sentimentos e emoções, como “sexually excited” e “sexual love”. Aqui também foi incluído o termo amplo “sexuality” que apareceu duas vezes na obra, sendo utilizado como sinônimo de drive sexual em Contingencies of Reinforcement (1969) e como sinônimo de comportamento sexual em Upon Further Reflection (1987).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao investigar as discussões sobre sexualidade na obra de B. F. Skinner, é possível identificar que, mesmo que esse tema não seja um foco principal de estudo, o autor discorreu sobre diversos aspectos desse fenômeno ao longo de sua obra. Contrapondo visões essencialistas, que mesmo nas ciências biológicas já estão sendo questionadas (cf. Senkevics & Polidoro, 2012), Skinner (1953/2005, 1969, 1971) descreve a importância de uma história de reforçamento e do controle social exercido pelo grupo ou por agências de controle na seleção do comportamento sexual. Diferente também de concepções construtivistas mais enfáticas, que consideram a cultura como única determinante do que é sexual (Heilborn & Brandão, 1999), Skinner (1938, 1953/2005, 1969, 1971) também enfatiza a importância do nível filogenético, em que suscetibilidades especiais ao reforçamento por contato sexual foram selecionadas e, assim, o comportamento sexual se tornou importante para a espécie. Dessa maneira, entender a sexualidade para Skinner implica em abdicar do debate inato versus aprendido e considerar que variáveis dos três níveis de seleção se entrelaçam e influenciam na explicação do comportamento sexual humano, visão que vai ao encontro de estudos analítico-comportamentais recentes sobre o tema (e.g., Menezes & Carvalho Neto, 2015).

Alguns autores têm apontado a necessidade de considerar aspectos biológicos, psicológicos e sociais na explicação da sexualidade (e.g., Senem & Caramaschi, 2017; Weeks, 2000), e uma visão analítico-comportamental sobre o tema parece trazer uma nova perspectiva que leva em consideração todos esses aspectos. É importante ressaltar que esta pesquisa teve como objetivo mapear as discussões sobre sexualidade em livros de B. F. Skinner para abrir a possibilidade de novos estudos serem desenvolvidos, não esgotando todos os pontos de discussão.

Novas pesquisas em Análise do Comportamento sobre sexualidade podem utilizar o mapeamento realizado no presente estudo para identificar as obras em que Skinner cita esse tema e desenvolver pesquisas mais específicas. Variáveis relacionadas à privação e saciação, por exemplo, já vêm sendo abordadas em diversos estudos analítico-comportamentais em termos de operações motivacionais (e.g., Michael, 2000; Haydu, 2004). A partir desses estudos, novas pesquisas podem se debruçar sobre as operações motivacionais especificamente relacionadas ao contato sexual. Outras pesquisas podem tomar como foco a investigação dos diferentes reforçadores sexuais condicionados ou especificar mais claramente a relação do afeto como um reforçador generalizado com o contato sexual como um reforçador primário. Ademais, pesquisas que tenham como objetivo descrever práticas culturais relacionadas à sexualidade e como é exercido o controle pelas diversas agências descritas por Skinner também podem encontrar neste estudo um ponto de partida.

Para além de pesquisas que se restrinjam à comunidade analítico-comportamental, este trabalho pode auxiliar no debate com outras áreas do conhecimento que já vêm se debruçando extensamente sobre o estudo da sexualidade. Temas como gênero e orientação sexual, que atualmente são alvo de muitos estudos em diversas áreas do conhecimento, inclusive na Análise do Comportamento, precisam ser estudados com cautela. Pode-se afirmar que as contribuições de Skinner para esses temas em específico não foram vastas e alguns de seus escritos não representam a diversidade sexual de maneira adequada. Nesse sentido, é preciso considerar que Skinner não teve a sexualidade como foco de estudo e que o avanço em termos de estudos e conquista de direitos foi extenso após as suas últimas publicações. Dessa maneira, é importante considerar tanto as contribuições de movimentos sociais, que lutam pela representatividade da diversidade sexual, quanto as contribuições que áreas como as ciências biológicas e sociais já realizaram; para que a Análise do Comportamento possa avançar em suas pesquisas sobre o tema de maneira consistente e compromissada com o respeito às diferentes sexualidades, considerando aspectos éticos e políticos que perpassam esse tema tão recorrente e controverso.

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