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Investigando a Viabilidade de uma Versão do Good Behavior Game em Setting Domiciliar
Investigating the Prediction of a Version of the Good Behavior Game in a Home Environment
Acta Comportamentalia: Revista Latina de Análisis de Comportamiento, vol. 32, núm. 1, pp. 33-53, 2024
Universidad de Guadalajara


Recepción: 28 Julio 2023

Aprobación: 26 Septiembre 2023

Resumo: O presente estudo avaliou os resultados de uma variação do Good Behavior Game (GBG) combinada à técnica Diga-Faça-Relate (DFR) aplicadas em setting familiar. O GBG foi implementado por duas mães, no contexto da pandemia de COVID-19, visando aumentar a frequência de comportamentos apropriados de seus filhos. O delineamento experimental foi composto por uma fase de linha de base e três fases de intervenção. Na primeira fase de intervenção, o GBG foi implementado. Nas fases Desvanecimento 1 e 2, seus componentes foram removidos gradualmente. Os dados de observação dos comportamentos das crianças foram coletados pelas próprias mães. Dados relativos à aceitabilidade dos procedimentos do GBG foram obtidos através do Intervention Rating Profile-15 aplicado às mães e crianças, além de perguntas elaboradas pelos autores. Os resultados mostraram que a frequência de comportamentos apropriados aumentou gradualmente para todos os participantes durante o jogo, com exceção da classe permanecer sentado durante as refeições no caso de dois participantes, que apresentaram tendência crescente de engajamento nesta classe já na linha de base. As respostas aos questionários de validação social apontaram aceitabilidade máxima do GBG em setting familiar. Os resultados foram discutidos em termos do sucesso da aplicação do GBG no setting familiar, aumentando sua generalidade.

Palavras-chave: Good Behavior Game, Análise do Comportamento Aplicada, COVID 19, Diga-Faça-Relate, interações familiares.

Abstract: The Good Behavior Game (GBG) has been a behavioral strategy highly tested in school settings to foster academic and prosocial behaviors among pupils. In addition, evidence has shown the game implementation is correlated with outcomes regarding the prevention of serious emotional and behavioral problems later in life. Some studies have evaluated and compared the effects of delivering points contingently to expected behaviors rather than unexpected ones or even rule violations. However, data has shown no marked differences on outcomes regarding those different ways the game can be implemented, except that focusing on “good” behaviors may increase its acceptability. This study aimed to test a GBG version based on delivering points contingently to “good” behaviors and strategies to facilitate the generalization of its effects. In addition, it was carried out in two home settings targeting relationships between mothers and their children. Due to COVID-19 stay-at-home orders, GBG implementation was done by the mothers with remote assistance provided by the first researcher. Thus, and overall, this study can be seen as a case for the feasibility of GBG implementation in home settings. To initiate GBG implementation, mothers from two families (namely, A and B) defined children´ behaviors and situations in the home routine they would like to change. For Family A, the behaviors defined were remaining seated and eating independently during lunches and dinners; for Family B, they were remaining seated, talking about one’s own task, and using one’s own task materials. In order to facilitate generalization effects, two strategies were implemented. First, a Say- Do-Report procedure (SDR) was employed before and after each session of game playing; second, some components of the game were gradually removed over GBG conditions. The SDR, when used consistently, can establish a discrimination between what was said and what was done by a person, and changes the likelihood of occurrence of nonverbal behavior by means of reinforcement of related verbal behavior, which, in turn, can facilitate the generalization of intervention effects when it is removed. In addition, the gradual removal of certain components of an intervention – since the intervention relies upon stimuli occurring both within it and other contexts – supposedly would facilitate generalization as well. The experimental design consisted of one baseline and three intervention phases. In the first intervention phase, all GBG components were implemented and then faded throughout subsequent two fading phases, so that only low-cost consequences (e.g., praises, family plays, and desserts) and SDR were maintained. Overall, results showed two main effects on direct measures: (1) the frequency of targeted behaviors gradually increased for all participants – except for remaining seated, for which two participants exhibited increasing tendency already at baseline – (2) and the variability in fluctuations of targeted behaviors decreased throughout intervention phases. In addition, responses to social validation questionnaires indicated high acceptability scores. Although systematic measures on generalization were not gathered, anecdotal data showed the occurrence of targeted behaviors in other places and game implementation in other contexts.

Keywords: Good Behavior Game, Applied Behavior Analysis, COVID-19, Say-Do-Report, family interactions.

O Good Behavior Game (GBG) é uma estratégia derivada da Análise do Comportamento Aplicada (Baer et al., 1968; Barrish et al., 1969) que tem sido tradicionalmente utilizada por professores de Ensino Fundamental I para manejar os comportamentos de crianças no contexto de sala de aula, com evidências interculturais de efetividade (Nolan et al., 2014). Reunindo dados de mais de 50 anos de pesquisas, o GBG tem mostrado resultados positivos de curto prazo sobre o manejo de comportamentos desejados e indesejados (e.g., Donaldson et al., 2015; Pennington & McComas, 2017; Wahl et al., 2016) e efeitos preventivos de longo prazo sobre diversos problemas tidos como “de saúde mental”, como ideação e tentativa de suicídio, abuso e dependência de substâncias psicoativas e problemas emocionais (e.g., Kellam et al., 2008; Poduska et al., 2008; Wilcox et al., 2008), além de problemas de comportamento antissocial e violento (Petras et al., 2008), sendo classificado como uma vacina comportamental (Embry, 2002).

O GBG é baseado em uma contingência interdependente de grupo (Tingstrom et al., 2006) na qual as crianças em uma sala de aula são divididas em pequenas equipes e, durante alguma atividade, precisam evitar a emissão de comportamentos que sejam obstáculos para o o seu aprendizado (i.e., comportamentos disruptivos). Esses comportamentos podem ser definidos pela professora ou juntamente com as próprias crianças. Cada comportamento disruptivo emitido por uma criança e observado pela professora resulta em um ponto para a sua equipe; ao final do jogo, vencem as equipes que acumularam menos pontos ou que pontuaram abaixo de um determinado critério (e.g., 5 pontos). Assim, duas ou mais equipes podem vencer cada rodada do jogo.

Ainda que o GBG tenha sido implementado majoritariamente no contexto de sala de aula, alguns estudos investigaram a possibilidade de estender seus efeitos para outros espaços da escola, como o recreio (Galbraith & Normand, 2017), refeitório (McCurdy et al., 2009), quadra de esportes (Patrick et al., 1998) e biblioteca (Fishbein & Wasik, 1981). Há ainda uma versão comercial do jogo que, além de salas de aula de Ensino Fundamental I, tem sido implementada em períodos de contraturno escolar, em locais que oferecem atividades acadêmicas (e.g., aulas de reforço escolar), recreativas, artísticas, culturais etc. (e.g., Smith et al., 2018).

Swain et al. (1982) propuseram uma intervenção baseada no GBG que, pela primeira vez, envolveu o setting domiciliar, ainda que em conjunto com o escolar. O objetivo desse estudo foi melhorar a escovação dos dentes das crianças. As crianças de duas turmas foram divididas em duas equipes. Durante as manhãs, a higiene bucal de quatro crianças de cada equipe era avaliada na escola, mas esta avaliação ocorria após o café da manhã que as crianças haviam tomado em casa. Os resultados mostraram melhoras imediatas, visíveis na higiene bucal das crianças, que se mantiveram nove meses após o término da intervenção. Swain et al. sugeriram que pesquisas futuras deveriam envolver os pais no jogo e ensinar- lhes procedimentos de avaliação e reforçamento. Esse estudo foi importante porque envolveu o setting familiar nas contingências do jogo, ainda que não tivessem sido planejadas – nem investigadas – quaisquer contingências para a classe de escovar os dentes neste setting. Contudo, não seria de se negligenciar quaisquer possíveis influências dos adultos nos settings familiares.

Na mesma direção, Szabo et al. (2020), em artigo publicado no contexto da pandemia de COVID-19¹, avaliaram teoricamente a viabilidade da implementação de contingências de grupo como o GBG na família, sobretudo durante atividades que poderiam trazer alguma dificuldade para seus membros, como rotinas de cuidados pessoais e atividades escolares. Para tal, a família poderia ser dividida em equipes, sendo que pais e mães poderiam fazer parte delas e/ou fornecer pistas de como cada equipe estaria se desempenhando no jogo.

Algumas modificações na forma como o GBG tem sido implementado em salas de aula são observadas na literatura. Uma modificação importante é a forma como os pontos são atribuídos. Tanol et al. (2010) compararam os efeitos de duas versões do GBG, uma baseada em custo de resposta (i.e., perda de pontos em função da quebra do acordo) e outra baseada em “reforçamento” (i.e., ganho de pontos em função de seguir o que foi acordado). Os resultados mostraram que ambas foram efetivas para diminuir o não seguimento do acordo para a maioria dos alunos observados, com ligeira superioridade na efetividade da versão baseada em reforçamento. Uma possível explicação encontrada pelos autores para essa superioridade está na qualidade da atenção que era dada pelos professores: enquanto na versão baseada em custo de resposta esta atenção ocorria na forma de retirada de pontos e redirecionamentos para a tarefa, na versão baseada em reforçamento ela ocorria pelo acréscimos de pontos e elogios. Contudo, devido às alternâncias entre a implementação das duas versões e os possíveis efeitos “de arraste” de uma fase para outra, Tanol et al. recomendaram que seus resultados fossem vistos com cautela. Ainda assim, os professores relataram preferir a versão baseada em reforçamento, justificando que ela resultou em um ambiente “mais positivo para a sala de aula” (p. 352).

Wright e McCurdy (2011) também compararam os efeitos de duas versões do GBG: (1) aquela na qual pontos são atribuídos em função do engajamento em comportamentos disruptivos; e (2) outra na qual pontos foram atribuídos em esquema de intervalo variável quando todos as crianças da equipe eram observadas realizando a tarefa. Os resultados não mostraram diferenças na efetividade das duas versões. Com relação à aceitabilidade, professores e crianças avaliaram ambas como aceitáveis, não havendo diferenças significativas nas pontuações para esses índices.

Ainda em relação às modificações observadas em estudos que avaliaram o GBG, Ruiz-Olivares et al. (2010) implementaram o procedimento de correspondência entre Dizer-Fazer-Relatar (D-F-R, do termo em inglês say-do-report correspondence training) suplementarmente às contingências interdependentes do jogo. De acordo com os estudos citados por esses autores, a correspondência entre aquilo que uma pessoa faz (seu comportamento não-verbal) e aquilo que ela disse que faria (seu comportamento verbal) pode ser ensinada. A implementação do D-F-R envolve, basicamente, fazer uma série de perguntas a uma pessoa sobre o que ela disse que faria, o que de fato fez e se as respostas coincidem; caso coincidam, o reforçamento ocorre (ver Embry & Biglan, 2008). Quando o D-F-R é usado para evitar que algum comportamento ocorra (ver Ruiz-Olivares et al.), alguém inicialmente pode dizer que não se engajará neste comportamento, e o treinamento da correspondência entre dizer que não se engajará, não se engajar e relatar que não se engajou acontece. Como resultados esperados, o D-F-R estabelece uma discriminação entre o que foi dito e o que foi feito e altera a probabilidade de ocorrência do comportamento não-verbal através do reforçamento do comportamento verbal relacionado (Risley & Hart, 1968), o que pode facilitar a generalização dos efeitos de intervenção quando ela é retirada. Como na literatura do GBG os estudos de sujeito-único têm demonstrado sistematicamente que seus efeitos são visíveis apenas quando suas contingências estão presentes, colocando assim limitações para a generalização destes efeitos, Ruiz-Olivares et al. utilizaram o D-F-R e o desvanecimento dos componentes do jogo objetivando manter seus resultados após um ano.

No GBG de Ruiz-Olivares et al. (2010), a cada sessão de implementação do jogo, o D-F-R era implementado da seguinte forma: a primeira etapa (D) ocorria logo no início, quando a professora perguntava ao alunos se os comportamentos- alvo ocorreriam durante o jogo, fazendo referência às suas equipes (e.g., “Equipe 1, vocês irão interromper?”, “Equipe 1, vocês irão brigar”), ao passo que eles deveriam responder que não os fariam (e.g., “Não, não iremos interromper”, “Não, não iremos brigar”); a segunda etapa (F) começava quando a professora iniciava as atividade da aula, atribuindo pontos às equipes em função dos comportamentos disruptivos; na terceira e última etapa do treino de correspondência (R), a professora perguntava a cada equipe sobre se haviam se engajado nos comportamentos-alvo (e.g., “Equipe 1, vocês interromperam?”, “Equipe 1, vocês brigaram”), ao passo que os alunos poderiam responder “sim” ou “não”.

Com relação ao processo geral de desvanecimento dos componentes do jogo, a professora prosseguiu da seguinte forma: primeiramente ela aumentou o tempo de duração de cada rodada, diminuindo consequentemente o número de rodas; em segundo lugar, ela parou de apresentar reforçadores materiais e apresentou apenas reforçadores simbólicos; depois, passou a jogá-lo somente uma vez durante cada dia letivo; em seguida, começou a utilizar apenas o D-F-R; e por fim, as equipes foram desfeitas e a sala passou a ser a equipe. Ao término da pesquisa, permaneceram apenas o D-F-R, tendo a duração de todo o período escolar e os reforçadores contingentes aos comportamentos-alvo limitaram-se a elogios sociais e simbólicos no quadro escolar. Os resultados apresentam a redução de 80% dos comportamentos disruptivos após a implementação, e na fase de follow-up a redução atingiu aproximadamente 90% em comparação à linha de base.

A revisão aqui conduzida aponta quatro aspectos do trabalho com o GBG: (1) a sugestão de que implementar as contingências do jogo em ambiente domiciliar, ao menos em época de confinamento, é algo viável, (2) a possibilidade de atribuir pontos contingentemente a comportamentos socialmente esperados, visto que isto pode aumentar a aceitabilidade do jogo, (3) a utilização de um procedimento verbal suplementar às contingências clássicas do GBG, como o D-F-R, a fim de auxiliar a generalização dos efeitos do jogo ao longo do tempo, e (4) a retirada de contingências de reforçamento baseadas em reforçadores tangíveis, permanecendo contingências de reforçamento social. Sendo assim, o presente estudo avaliou o efeitos de uma implementação do GBG considerando esses aspectos, tendo mães como implementadoras do jogo, auxiliadas por um profissional de forma remota.

Método

Participantes e Ambiente

Um convite para participação no presente estudo foi elaborado pelo primeiro autor e divulgado em redes sociais. Nesse convite, havia a apresentação do referido pesquisador e do objetivo do estudo, a explicação sobre as orientações que ocorreriam por videoconferência e a disponibilização de um telefone para contato. O único critério de inclusão utilizado foi o de que pelo menos uma das crianças precisava ter entre 3 e 10 anos de idade.

Inicialmente seis famílias entraram em contato, mas uma delas não retornou o contato para o agendamento do encontro de apresentação do estudo. Durante o encontro inicial com as mães participantes, o pesquisador descreveu a elas a história do GBG, a proposta do jogo, pontos relevantes da aplicação, resultados encontrados na literatura e quais eram os objetivos do presente estudo, além de apresentar-lhes o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e responder quaisquer dúvidas em relação à pesquisa. Três famílias não permaneceram até o final do estudo apesar de terem iniciado o GBG, e relataram indisponibilidade para registrar os dados em razão da rotina experienciada durante a pandemia. Assim, as duas famílias que restaram foram as participantes do presente estudo, cada qual composta pela mãe e duas crianças. Por razões não investigadas, os pais não puderam participar. O presente estudo foi aprovado sob o número CAAE: 41994820.0.0000.5473.

A Família A era formada por um menino (P1A) e uma menina (P2A), com respectivamente 4 e 3 anos de idade. A mãe relatou que as crianças, em especial P2A, costumavam sair dos assentos e levavam cerca de 1h30 para finalizar as refeições; ela precisava insistir para que as crianças comessem, inclusive levando a colher com comida para suas bocas. A Família B era formada por dois meninos, P1B e P2B, com respectivamente 8 e 3 anos de idade. A mãe relatou que P1B costumava ter dificuldades para realizar as tarefas escolares, pois P2B costumava interferir durante as tarefas de seu irmão, resultando em baixo engajamento de P1B. O presente estudo ocorreu no ambiente domiciliar de cada família participante.

Os encontros entre o pesquisador e cada mãe ocorreram uma vez por semana, via videoconferências através de dispositivos eletrônicos, e tiveram o objetivo de esclarecer dúvidas em relação à intervenção e orientá-las durante as mudanças de fase da pesquisa. Além desses encontros, o pesquisador preparou um conjunto de documentos que foram enviados e discutidos com as mães, os quais orientavam as mães a como implementar as rodadas do jogo em função de suas fases experimentais (i.e., “roteiros de aplicação”) – incluindo as perguntas que deveriam ser feitas durante o componente D-F-R –, checklists dos componentes importantes da implementação e folha de registro. Esses documentos podem ser recuperados na íntegra em Cavalcanti (2021).

Definição das Variáveis Dependentes e Mensuração

Os comportamentos de interesse (i.e., variáveis dependentes) foram definidos em conjunto com cada uma das mães e em função de suas demandas – por isso, é importante lembrar que eles serão chamados de “apropriados” considerando as necessidades e percepções dessas mães. Na Família A, o comportamento definido foi o de permanecer sentado na cadeira durante todo o período da refeição (sem ser estabelecido previamente) e levar a colher à boca sem a ajuda do responsável, durante o almoço e o jantar. Na Família B, os comportamentos definidos foram: (a) permanecer sentado na cadeira, (b) falar com a mãe apenas assuntos relacionados à própria tarefa escolar; e (c) fazer a lição utilizando os próprios materiais.

Devido ao alto risco de contaminação por COVID-19, a observação direta dos comportamentos pelo pesquisador ou pessoas fora do núcleo familiar não foi possível. Apenas as mães realizaram o registro direto dos comportamentos das crianças. Para isso, o pesquisador elaborou um formulário de registro com os seguintes campos: comportamentos-alvo, intervalos, data e horário de início de cada rodada do jogo. O pesquisador instruiu as mães a como preencher o formulário. Devido a dificuldade de observação direta e a ausência de registro por vídeo, não foi possível realizar os cálculos de concordância entre observadores nesse contexto.

As mães observaram e atribuíram pontos às crianças em intervalos de 2 minutos ao longo de cada sessão de aplicação do jogo. Os intervalos para observação foram programados em um aplicativo para smartphones chamado Vibration Reminder. Por recomendação do pesquisador, comportamentos disruptivos foram ignorados.

As mães fizeram registros dos comportamentos dos filhos usando um procedimento de amostragem de tempo de 2 minutos (i.e., registrando a ocorrência dos comportamentos-alvos a cada 2 minutos transcorridos). Desse modo, os dados de comportamentos observados foram convertidos em amostras de tempo e a variável dependente principal do presente estudo foi a porcentagem de intervalos no qual os comportamentos-alvos foram observados pelas mães. A tabulação dessas porcentagens em um gráfico permitiu a inspeção visual da variabilidade e tendência desses comportamentos ao longo das fases de implementação do GBG.

Como não foi possível estabelecer previamente a duração das refeições na Família A (média de duração dos almoços: 19 min, variando entre 10 a 50 min; média de duração dos jantares: 18 min, variando entre 10 a 30 min), não se fixou uma quantidade de intervalos por sessão. Na Família B foram estabelecidos 10 intervalos por sessão, resultando em sessões de 20 minutos. Embora o pesquisador tivesse sugerido às mães que implementassem o jogo em três dias da semana, no mínimo, a Família A geralmente o implementou duas vezes ao dia (uma vez no almoço e outra no jantar) e a Família B apenas uma vez ao dia.

Delineamento Experimental e Procedimentos para a Implementação do GBG

O delineamento experimental utilizado foi um delineamento ABCD, com questionários de aceitabilidade respondido pelas mães e pelas crianças antes e após a intervenção. A Família A iniciou a aplicação do jogo antes da Família B. O estudo teve quatro fases: (I) Linha de Base, (II) Aplicação do GBG, (III) Desvanecimento 1 e mudança no critério de pontuação e (IV) Desvanecimento 2.

Definição do Nome Alternativo e Premiações

Posteriormente à assinatura do TCLE, outro encontro ocorreu entre o primeiro autor e cada mãe de forma individual, a fim de discutir os detalhes da implementação. Durante esses encontros, o pesquisador sugeriu possíveis premiações e discutiu a definição de um nome alternativo ao Good Behavior Game para maior compreensão das crianças.

Para a Família A, a mãe optou por nomear o GBG como “Jogo da Refeição” e as premiações escolhidas foram: dar sobremesa; imitar animais; jogo da memória; e morto-vivo. Para a família B, a mãe nomeou como “Jogo da Atividade” e as premiações foram: passear no parque; tomar banho de piscina ou mangueira; assistir filme; jogar no celular; dormir na casa do tio; cozinhar com a mãe; e desenhar e pintar usando tintas guache. A fim de tornar a apresentação das premiações menos previsível (e.g., mystery motivators), elas foram escritas em tiras de papel e depositadas em um frasco. Assim, a escolha das premiações após as rodadas do jogo permanecia ao acaso.

Linha de Base

Após a definição dos comportamentos-alvo, as mães começaram apenas a registrar as suas ocorrências. Nessa fase, ambas as mães foram orientadas a ignorarem problemas de comportamento e continuarem a coleta de dados

Variável Independente e Procedimentos para a sua Introdução

A introdução da variável independente do presente estudo (GBG) ocorreu logo após o término da linha de base. As mães informaram às crianças: (a) que elas participariam de um jogo que ocorreria durante o almoço e o jantar (Família A) ou durante a atividade acadêmica (Família B); (b) que para quem acumulasse quatro pontos ou mais por fazer “bons comportamentos”, um prêmio surpresa ao final do jogo seria dado; (c) os comportamentos esperados para que pudessem vencer, sendo que ambas as crianças poderiam ser vencedoras; (d) que pontuariam individualmente cada um dos filhos que estivesse apresentando os comportamentos definidos.

Após apresentarem as regras do jogo, as mães realizaram alguns procedimentos antes de iniciarem a aplicação da intervenção: (a) conceder alguns minutos para cada criança escolher um apelido a ser usado durante o jogo e um desenho que os representassem; (b) realizar avaliação de preferência de premiações junto às crianças e selecionar as que julgassem viáveis; (c) apresentar o quadro de pontuação, que continha os “apelidos” e desenhos escolhidos pelos participantes que os representavam, representações gráficas e/ou escritas de cada comportamento esperado e a quantidade mínima de pontos necessários para vencer.

Implementação do GBG

O passo-a-passo de aplicação descrito a seguir ocorreu a partir da segunda sessão de aplicação, já que para a primeira aplicação o passo (b) não foi planejado. Sendo assim, da segunda aplicação em diante, as mães retomavam o jogo da seguinte forma: (a) elas sinalizavam às crianças que o jogo iria iniciar; (b) por cinco minutos, conduziam uma reunião diária com as crianças sobre o seu desempenho na aplicação anterior do jogo, fazendo perguntas como: “Vocês fizeram o que disseram no jogo anterior?”, “O que poderíamos fazer melhor no próximo jogo?”; questionavam as crianças se determinados comportamentos ocorreriam durante o jogo a ser jogado naquele momento, fazendo perguntas como: “Vocês irão permanecer sentados durante a atividade?” e “Vocês usarão o seu próprio material durante a atividade?”, ao passo que era esperado que as crianças respondessem, respectivamente, “Sim, iremos permanecer sentados durante a atividade” e “Sim, utilizaremos o nosso próprio material durante a atividade” (nenhum procedimento para encaminhar a reunião foi planejado caso alguma criança respondesse “não” durante essas reuniões diárias); (d) as mães informavam que para ganhar cada criança teria que somar uma quantidade mínima de pontos correspondente à fase do estudo (e.g., quatro, seis ou oito pontos); (e) as mães diziam que observariam as crianças em alguns momentos durante o jogo e concederiam pontos caso estivessem apresentando os comportamentos discutidos na reunião. Ao término do jogo, (f) elas avisavam às crianças sobre o encerramento; e (g) implementavam o D-F-R, perguntando-lhes sobre cada um dos comportamentos discutidos durante as reuniões que precediam o jogo, fazendo perguntas como: “Participante 1, você permaneceu sentado durante a atividade?” e “Participante 1, você usou o seu próprio material durante a atividade?”, ao passo que era esperado que as crianças respondessem conforme havia acontecido (e.g., “Sim/Não permaneci sentado durante a atividade” e “Sim/Não utilizei o meu próprio material durante a atividade”). Por fim, as mães (j) sorteavam uma premiação caso as crianças atingissem o critério mínimo estabelecido.

As mães observaram e atribuíram pontos às crianças em intervalos de 2 minutos ao longo de cada sessão de aplicação do jogo. Os intervalos para observação foram programados em um aplicativo para smartphones chamado Vibration Reminder. Comportamentos disruptivos eram ignorados, segundo a recomendação do pesquisador responsável

Desvanecimento 1

O desvanecimento da intervenção começou com a retirada das reuniões diárias de discussão da rodada anterior. Nessa fase, houve também um aumento no critério mínimo de pontuação para cada família: oito pontos para Família Ae seis pontos para Família B e, sendo que a diferença de pontuação ocorreu devido a quantidade de intervalos serem diferentes, uma vez que a quantidade de intervalos para a Família A era variável, devido ao tempo de refeição ser instável, o que ocasionou em mais intervalos registrados em comparação à Família B, que conteve a quantidade de intervalos fixo. O procedimento de D-F-R foi mantido.

Desvanecimento 2

Nessa fase, reforçadores de maior custo (e.g., passeio para brincar no parque, usar o celular da mãe para jogar ou assistir vídeos), critérios de pontuação e os quadros de pontuação foram retirados. Permaneceram apenas os reforçadores sociais verbais (e.g., elogios) e de menor custo (e.g., brincadeiras em família em casa, sobremesa após a refeição), além do procedimento D-F-R.

Validação Social

Foram utilizados três instrumentos para coletar dados de validação social. O Intervention Rating Profile-15 (IRP-15; ver Carter & Wheeler, 2019; Martens et al., 1985) foi respondido pelas mães, antes do início da intervenção e após seu término. O IRP-15 foi desenvolvido para avaliar a aceitabilidade de intervenções em escolas, apresentando consistência interna de 0,98. Ele continha 15 afirmações a respeito da intervenção, às quais as mães responderam indicando o grau em que concordavam ou discordavam de cada afirmação através de escalas Likert de seis pontos, variando entre “discordo totalmente” e “concordo totalmente”. Em razão de seu uso para avaliar intervenções em escolas, a tradução do IRP-15 – feita livremente pelo pesquisador para uso no presente estudo – envolveu uma adaptação para torná-lo utilizável em setting domiciliar.

Com o objetivo de obter dados complementares de validação social, o pesquisador criou nove perguntas que foram aplicadas às mães ao término da pesquisa. Essas perguntas versaram, por exemplo, sobre mudanças na relação das mães com as crianças, sua capacidade de lidar com comportamentos indesejados de outra forma, a ocorrência dos comportamentos-alvo em outros settings e dificuldades observadas durante a aplicação do GBG.

Por fim, um questionário de validação social para as crianças foi aplicado pelas mães por solicitação do pesquisador. Esse questionário foi utilizado no estudo de Rubow et al. (2018) e foi também traduzido livremente pelo pesquisador. O questionário conteve seis questões fechadas (e.g., “Eu gostei de ter o jogo durante a minha rotina em casa”, “Eu gostaria de continuar usando o jogo na minha rotina em casa”, “O jogo ajudou a manter minha casa mais calma) – que também foram respondidas através de escalas Likert de três pontos (“não”, “às vezes” e “sim”) – e três questões abertas ao final, também criadas pelo pesquisador com o objetivo de obter dados complementares de validação, que investigavam aspectos do jogo que a criança havia gostado ou não, e que gostariam que tivessem sido diferentes. As respostas das crianças foram gravadas no telefone celular das próprias mães e enviadas por elas ao pesquisador. A íntegra dos instrumentos utilizados para obter dados de validação social também pode ser encontrada em Cavalcanti (2021).

Resultados

Dados de Observação Direta

As figuras a seguir mostram a porcentagem de intervalos de ocorrência dos comportamentos-alvos por sessão de aplicação do jogo. A Figura 1 mostra a frequência dos comportamentos de permanecer sentado (série superior) e comer independente (série inferior) de P1A durante os momentos de almoço e jantar. Os dados de linha de base mostram diferenças nas porcentagens de amostras de tempo nas quais ambos os comportamentos foram registrados. As porcentagens de permanecer sentado apresentaram variabilidade predominantemente entre 80% e 100% durante o almoço e 90% e 100% durante o jantar, sendo menores quando comparadas à variabilidade de comer independente, que permaneceu entre 17% e 100% durante o almoço e 50% a 100% durante o jantar. Além disso, pode-se observar tendência crescente dos comportamentos de permanecer sentado entre as duas primeiras sessões de linha de base, em ambas as condições de refeição (de 50% para 100% no almoço e de 68% para 75% no jantar), bem como entre as Sessões 4 e 5 (de 80% para 100%) e Sessões 6 e 7 (de 83 para 100%); nenhuma tendência foi observada na frequência de comer independente durante a linha de base.

Durante o jogo, a frequência de permanecer sentado obteve porcentagens com índice de 100% em 84,6% das sessões desta fase (comparados aos 61,5% da linha de base), quando analisamos o almoço; no jantar, a ausência de registro em algumas sessões não permitiu a avaliação momento a momento do aumento da resposta de permanecer sentado, mas a inspeção visual da série superior da Figura 1 permite constatar que os níveis deste comportamento também aumentaram nesta fase. As porcentagens dessa classe permaneceram próximas a 100% durante o resto do estudo, tanto no almoço como no jantar. A frequência de comer independente também aumentou com a implementação do GBG, alcançando no almoço escores de 100% em 69,2% das sessões, ante 30,7% nas sessões de linha de base; em ambas as fases de desvanecimento, escores de 100% foram prevalentes em 82,7% das sessões. No jantar, apesar da ausência de registro em algumas sessões, a classe alcançou escores de 100% em 63,6% das sessões de implementação do GBG, ante 45,4% nas sessões de linha de base; em ambas as fases de desvanecimento, escores de 100% foram prevalentes em 81,4% das sessões. Dado que comer independente apresentou maior variabilidade em relação a permanecer sentado, destaca-se a amplitude desta variabilidade, considerando o almoço e jantar: os escores para P1A ficaram entre 17% e 100% na linha de base e 69% e 100% durante a implementação do GBG e Desvanecimento 1, não sendo observada variabilidade alguma na fase de Desvanecimento 2.


Figura 1
Porcentagem de Intervalos com Ocorrência dos Comportamentos Desejados de P1A

Nota. Porcentagem de intervalos nos quais os comportamentos de permanecer sentado (série superior) e comer independentemente (série inferior) de P1A (Família A) foram observados. As linhas verticais tracejadas indicam as mudanças de fase do estudo. Ausências de pontos no gráfico indicam que não há dados disponíveis para a respectiva sessão

A Figura 2 mostra a frequência dos comportamentos de permanecer sentado (série superior) e comer independentemente (série inferior) de P2A durante os momentos de almoço e jantar. Os dados de P2A, da linha de base à última fase do estudo, apresentam um padrão semelhante ao de P1A para os dois comportamentos observados, exceto que para P2A, houve menos sessões em que as frequências atingiram 100%. Semelhantemente a P1A, a frequência de comerindependentemente durante o jogo, nos momentos de jantar, foi menor quando comparada à do almoço. Permanecer sentado obteve escores de 100% em 76,9% das sessões de GBG, (comparados aos 30,7% da linha de base), quando analisamos o almoço. Apesar da ausência de alguns registros durante o jantar, e da diminuição das porcentagens desse comportamento da metade para o fim da fase de implementação do GBG, os níveis de permanecer sentado não baixaram para além daqueles observados na linha de base, permanecendo entre 80% e 100%. Para P2A, também, as porcentagens dessa classe permaneceram próximas a 100% durante o resto do estudo, tanto no almoço como no jantar. Com relação ao comportamento de comer independente, os dados obtidos foram os seguintes: no almoço, não foram observados escores de 100% durante a linha de base, mas durante a implementação do GBG, estes escores foram observados em quatro sessões; em ambas as fases de desvanecimento, escores de 100% foram prevalentes em 34,4% das sessões; no jantar, apesar da ausência de registro em algumas sessões, foram observados escores de 100% em apenas duas sessões na linha de base, mas em nenhuma sessão nas fases de Implementação do GBG e Desvanecimento 1; escores de 100% voltaram a ser observados somente na fase de Desvanecimento 2, em 88,8% das sessões.

Dado que comer independente, no caso de P2A, também apresentou maior variabilidade em relação a permanecer sentado, destaca-se a amplitude desta variabilidade, considerando o almoço e jantar: os escores de P2A ficaram entre 15 e 100% na linha de base e 47% e 100% durante a implementação do GBG e Desvanecimento 1, permanecendo em 100% durante a maior das sessões de Desvanecimento 2. Vale ressaltar, ainda, que a inspeção visual da Figura 2 permite enxergar uma tendência crescente, e menor variabilidade, da classe comer independente ao longo das fases de Implementação do GBG e Desvanecimento 1.


Figura 2
Porcentagem de Intervalos com Ocorrência dos Comportamentos Desejados de P2A

Nota: Porcentagem de intervalos nos quais os comportamentos de permanecer sentado (série superior) e comer independentemente (série inferior) de P2A (Família A) foram observados. As linhas verticais tracejadas indicam as mudanças de fase do estudo.

A Figura 3 mostra a frequência dos comportamentos de permanecer sentado, falar sobre a própria tarefa e utilizar os próprios materiais de P1B (série superior) e P2B (série inferior). Os dados de linha de base mostram diferenças entre as duas crianças. Para P1B, todos os comportamentos mostram frequências altas, com exceção da Sessão 2 de falar sobre a própria tarefa. Ao longo do jogo, observamos que a frequência de permanecer sentado e utilizar os próprios materiais, para P1B, atingiu 100% na maioria das sessões; os efeitos do jogo sobre os comportamentos de falar sobre a própria tarefa foram menores ao longo da fase de GBG e Desvanecimento 1, mas ainda assim observamos que na última fase, estes também atingiram 100% dos intervalos. No caso de P2B, também observamos efeitos menores do jogo sobre falar sobre a própria tarefa; entretanto, se comparamos os níveis deste comportamento durante o jogo e a linha de base, observamos um aumento em sua frequência. Embora as frequências dos comportamentos de P2B tenham apresentado variabilidade, é possível observarmos uma mudança nos níveis de seus comportamentos ao longo da fase de GBG e Desvanecimento 1, atingindo, inclusive, 100% dos intervalos, o que não havia ocorrido na linha de base. Comparados também com a linha de base, observamos igualmente um aumento em suas frequências. Por fim, a última fase do estudo mostrou menor variabilidade dos comportamentos relevantes em ambas as crianças, os quais permaneceram entre 90% e 100%.


Figura 3
Porcentagem de Intervalos com Ocorrência dos Comportamentos Desejados de P1B e P2B

Nota. Porcentagem de intervalos nos quais os comportamentos de permanecer sentado, falar sobre a própria tarefa e utilizar os próprios materiais de P1B (série superior) e P2B (série inferior), ambos da Família B, foram observados. As linhas verticais tracejadas indicam as mudanças de fase do estudo. Ausências de pontos no gráfico indicam que não há dados disponíveis para a respectiva sessão.

Os resultaods obtidos no presente estudo mostram que a utilização do D-F-R combinado a incentivos sociais (Desvanecimento 2) foi capaz de manter altas frequências de todos os comportamentos relevantes para todas as crianças. As crianças da Família A venceram todos os jogos. Em uma das sessões – Sessão 31 –, P1 não atingiu a pontuação mínima porque terminou a refeição antes de somar os pontos necessários para vencer, mas a mãe concedeu-lhe a premiação por ter apresentado os comportamentos-alvo durante toda a refeição. As crianças da Família B venceram quase todos os jogos, exceto em duas sessões em que P2B perdeu por não ter somado os pontos necessários para vencer (Sessão 10 e Sessão 18).

A variabilidade encontrada nos dados durante a fase de linha de base, se deve ao fato de que embora ambas as mães tivessem relatado que apenas um dos filhos apresentava com maior frequência os comportamentos disruptivos, o outro irmão também poderia se beneficiar da intervenção, pois os disruptivos de um dos irmãos tendiam a influenciar o outro. Sendo assim, os participantes P1A e P1B participaram do estudo, mesmo não apresentando os disruptivos com a mesma frequência de seus irmãos durante a linha de base. Mas, conforme os gráficos, ambos também se beneficiaram com a redução dos disruptivos.

Dados de Validação Social

Ao término da intervenção, ambas as mães concordaram totalmente em quase todas as afirmações, sendo a somatória da pontuação referente a mãe de P1A e P2A de 89/90 e a mãe de P1B e P2B com a somatória de 90/90 pontos, o que indica um nível alto de validação social mensurado pelo IRP-15. Além disso, a partir das nove perguntas abertas, ambas as mães responderam da mesma forma as questões, sendo:

(1) os comportamentos-alvo ocorreram em outros lugares, (2) outros familiares observaram a diferença de comportamentos após o início das intervenções, (3) os contextos em que os jogos foram aplicados deixaram de ser estressantes, (4) houve mudança no relacionamento com os filhos, pois a família começou a ter mais momentos de brincar em grupo, (5) começaram a implementar o jogo em outros momentos (e.g., assistir televisão – P1A e P2A, refeição – P1B e P2B), (6) quando as mães não implementavam o jogo, os filhos pediam, (7) a maior dificuldade que tiveram durante a intervenção foi modificar a forma com que manejavam os comportamentos disruptivos antes do presente estudo (e.g., não “gritar”, evitar dar “bronca” e “ameaçar”), (8) aprenderam a lidar diante dos comportamentos disruptivos sem precisar aumentar o tom de voz, chamar a atenção constantemente e repetir diversas vezes as mesmas instruções e (9) a videoconferência foi suficiente para aprenderem a implementar o jogo durante as suas rotinas.

Os dados de validação social das crianças mostraram que após o término da intervenção, as quatro crianças responderam unanimemente as seis perguntas presentes no questionário na melhor pontuação possível. Além do questionário traduzido, três questões abertas foram respondidas, da seguinte forma: (I) o que mais gostaram da intervenção foram as premiações recebidas (P1A, P2A, P1B e P2B), visualização dos pontos ganhos (P2A) e passar mais tempo em família (P1B); (II) o que menos gostaram da intervenção foi não obter pontos (P2A) e ver um dos irmãos perder o jogo (P1A); (III) o que gostaria que tivesse no jogo seria mais tempo para brincar com a mãe (P2B).

Discussão

O presente estudo avaliou os efeitos de uma versão do GBG implementada por mães durante alguns momentos da rotina doméstica com seus filhos em casa, tendo como objetivo promover interações positivas durante a rotina domiciliar. O GBG teve combinada uma versão de ganho de pontos por executar os comportamentos desejados com o procedimento Diga-Faça-Relate (objetivo específico). Tomados em conjunto, os resultados de observação direta mostraram que as contingências do jogo adquiriram, gradualmente, influência sobre as classes de comportamento relevante para as mães durante os contextos por elas informados; a influência das contingências do jogo sobre os comportamentos das crianças organizou seus respectivos repertórios em função do contexto de jogo. Efeitos sobre a variabilidade também foram observados por Wright e McCurdy (2011), o que indica que os resultados obtidos no presente estudo replicam achados descritos na literatura do GBG.

Os dados mais nítidos de mudança foram obtidos comocomerindependentemente de P1A e P2A, falar sobre a própria tarefa de P1B e em todos os comportamentos de P2B. Essa organização pode ser entendida como uma mudança nas taxas absolutas e relativas dos comportamentos indicados pelas mães, sendo estas mudanças dois dos efeitos do reforçamento (Millenson, 1975). As mudanças nas taxas absolutas e relativas dos comportamentos relevantes puderam ser observadas pela alta prevalência desses comportamentos, tal como mostradas nas séries inferiores das Figuras 1 e 2 e em toda a Figura 3.

Embora o presente estudo não tenha empregado uma fase de follow-up como Ruiz-Olivares et al. (2010) fizeram, resultados obtidos através dos relatos das mães (resultados anedóticos) indicaram dois efeitos de generalização para outros contextos (Baer et al., 1968;Stokes & Baer, 1977): a ocorrência dos comportamentos relevantes em outros lugares (inclusive informação apresentada por outros familiares, conforme relatado pelas mães) e a implementação do jogo em outros contextos. Outros resultados obtidos e descritos pelas mães sugerem que melhoras foram alcançadas em seus relacionamentos com as crianças.

O desvanecimento da intervenção produziu resultados semelhantes aos observados no estudo de Ruiz-Olivares et al. (2010). Verificou-se o aumento na frequência dos comportamentos adequados para cada fase do presente estudo, mesmo havendo a retirada dos componentes da intervenção. Embora o uso dos reforçadores planejados pelas mãestenha sido diferente, os resultados mantiveram-se satisfatórios. Os resultados de validação social do presente estudo corroboram os resultados obtidos por Rubow et al. (2018), sugerindo aceitabilidade tanto com as crianças participantes, como também com as mães.

Uma questão saliente no presente estudo, que se traduz em uma de suas limitações mais importantes, é a presença de variabilidade acentuada nos dados obtidos. Essa variabilidade pode ter ocorrido em função de falta de controle dos estímulosapresentados durante o GBG (e.g., refeição reforçadora ou não reforçadora, atividade acadêmica preferida ou não preferida) e viés de integridade da aplicação. Uma vez controlada a epidemia de COVID-19 no Brasil, futuras replicações deste estudo poderão dispor de outros observadores além das mães, obviamente com a autorização e consentimento delas, inclusive dos demais familiares e assentimento das crianças (como fizeram Calegari et al. [2021] em contexto escolar), a fim de se promover maior consenso sobre os resultados diretamente observados do GBG em contexto familiar e aumentar a validade interna do procedimento. Outra opção é convidar outros familiares para atuarem como observadores independentes.

Outra limitação importante foi a ausência de uma avaliação de integridade da implementação do GBG, novamente devido o cenário de pandemia. A avaliação da integridade é importante para analisarmos se o aplicador aderiu e implementou todas as etapas do procedimento adequadamente (e.g., aplicação da técnica D-F-R a cada sessão). Além disso, sugere-se que replicações do presente estudo coletem dados de observação direta sobre os comportamentos das crianças em outros contextos a fim de complementar os dados sobre generalização obtidos através de relatos.

Conclusão

O GBG, em conjunto a estratégia D-F-R, pode ser incorporado como uma estratégia para auxiliar familiares no desenvolvimento de comportamentos positivos das crianças e estratégias de desvanecimento demonstraram-se efetivas tanto em manter os resultados alcançados, como também em aumentar a frequência dos comportamentos desejáveis.

Este estudo demonstrou-se efetivo do ponto de vista custo/benefício, aplicação simples, poucos recursos necessários, uso de reforçadores que já faziam parte do cotidiano, procedimentos para manejo de disruptivos menos aversivos, resultados satisfatórios para demandas diferentes e esforço das mães em se encontrarem semanalmente com o pesquisador para discutir dúvidas e receberem orientações. Essa é uma característica importante se o estudo pretende ser, de fato, um serviço que pode ser oferecido para diversas famílias em uma dada comunidade (Fawcett et al., 1980).

Vale pontuar que os resultados obtidos demonstraram efetividade da intervenção em contexto inédito de aplicação, uma vez que até o momento não se localizou estudos com a aplicabilidade em ambiente familiar. Os resultados positivos abrem a possibilidade de novos estudos serem conduzidos e a começarmos a ampliar o setting de aplicação do GBG para além do ambiente escolar e a relevância de trazermos os pais às práticas de intervenções comportamentais utilizadas em escolas para generalização em outros ambientes.

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Notas

¹ A pandemia de COVID-19 foi a propagação de uma nova cepa de coronavírus em nível global, levando a óbito, direta ou indiretamente, aproximadamente 14,9 milhões de pessoas entre os anos de 2020 e 2021. As primeiras notificações de pessoas infectadas pela cepa vieram da China em 31 de dezembro de 2019, sendo reconhecida a situação de pandemia, pela OMS, em 11 de março de 2020 (OPAS, 2022; 2023).


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