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A Construção Política do “Eu” no Comportamentalismo Radical: Opressão, Submissão e Subversão
The Political Construction of the “Self” in Radical Behaviorism: Oppression, Submission, and Subversion
Acta Comportamentalia: Revista Latina de Análisis de Comportamiento, vol. 32, núm. 1, pp. 73-91, 2024
Universidad de Guadalajara


Recepción: 03 Octubre 2023

Aprobación: 12 Diciembre 2023

Resumo: De uma perspectiva comportamentalista radical, o eu é um repertório verbal complexo, que, como tal, tem uma gênese social. O reconhecimento da origem social do “eu” abre caminho para uma análise política, incluindo uma discussão do papel das relações de poder na constituição do eu. Entretanto, uma concepção radicalmente social do “eu”, como a proposta pelo comportamentalismo, suscita um problema político: se o eu é integralmente produto do ambiente social, de onde viria uma eventual “vontade” de romper com esse sistema? Parece que para reconhecer a possibilidade de ação política transformadora seria preciso preservar uma noção descontextualizada de “eu”. Considerando essa dificuldade, o objetivo deste artigo é propor uma interpretação política da constituição do “eu” no âmbito do comportamentalismo radical, mantendo no horizonte a possibilidade de uma ação política transformadora. Para tanto, destacamos como “eus” oprimidos são tornados submissos, mas também como de certas contingências podem emergir “eus” subversivos, que se opõem a um sistema social opressivo. Esse “eu” subversivo é caracterizado por um repertório de autoconhecimento mais amplo, que inclui a discriminação do papel das relações de poder e do controle promovido por instituições. Concluímos, com isso, que um “eu” socialmente constituído pode ser politicamente ativo.

Palavras-chave: comportamentalismo radical, política, eu, ação política, eu iniciador.

Abstract: Even though it is not a philosophy centered on the self, Radical Behaviorism can discuss this notion. From a behaviorist perspective, the self can be understood as a complex verbal repertoire composed of self-knowledge, self-control, and ethical self-government (in some cases, countercontrol). As it is a verbal repertoire, the self has a social genesis. This thesis allows a political analysis, recognizing that power relations permeate the social contingencies responsible for the constitution of the self. However, a radically social conception of the self, such as that proposed by Skinnerian behaviorism, raises a political problem: if the social environment entirely determines the self, where would the eventual “will” to break with this system come from, such as that displayed by “selves” engaged in political change? At first glance, the possibility of transformative political action seems to require maintaining a decontextualized notion of self, i.e., an initiating self. This conclusion seems to question the possibility of Radical Behaviorism accounting for a politically active self. Considering that difficulty, this paper proposes a political interpretation of the self in Radical Behaviorism, keeping the possibility of a transformative political action on the horizon. For that, we examine how oppressed “selves” are made submissive and how certain contingencies allow the emergence of subversive “selves,” which oppose the system of domination. The constitution of this disobedient self depends on contingencies different from those formally organized by powerful controlling agencies, such as government, religion, and, mainly, the economy. A subversive self also requires a “broader” repertoire of self-knowledge, including discrimination of the control these powerful agencies promote. Finally, the subversive self also exhibits a well-established repertoire of self-control, since acting against institutional control is very likely to produce immediate aversive consequences. We conclude that the analysis of the contingencies responsible for the constitution of a subversive self allows us to speak of a politically active self in Radical Behaviorism.

Keywords: Radical Behaviorism, politics, self, political action, initiating self.

O comportamentalismo radical é uma filosofia na qual o protagonismo é do comportamento (daí ‘comportamentalismo’), o que significa explicar as questões humanas no comportamento (daí ‘radical’) (ver Skinner, 1989a, p. 122). Uma dessas questões tipicamente humanas discutidas em termos de comportamento por essa filosofia é a noção de “eu” (Skinner, 1953/2005, 1974, 1989a). A “radicalidade” da discussão aparece na tese de que para o comportamentalismo radical o “eu” não seria a causa do comportamento, ou ainda, que o comportamento não é uma manifestação ou sintoma do “eu”. Em última instância, não haveria um “eu” atrás do comportamento (Chiesa, 1994).

De uma ótica comportamentalista radical, o “eu” pode ser entendido como um conjunto de repertórios verbais, composto por respostas em primeira pessoa, constituído no âmbito de comunidades verbais que reproduzem práticas culturais de uma dada sociedade (Lopes et al., 2018). Dessa perspectiva, a gênese do “eu” é social, o que é uma tese antitética à noção de um “eu” autônomo ou iniciador, entendido como um centro de onde emanariam as ações do indivíduo (Skinner, 1971).

A concepção comportamentalista radical de “eu”, bem como seu afastamento da noção de eu iniciador, tem sido alvo de diferentes estudos na área (Malacrida & Laurenti, 2018; Pimentel et al., 2012; Rubio, 2004; Tourinho, 2006). Com o intuito de contribuir com essas discussões, exploraremos aqui implicações do embate entre “eu iniciador” e “eu socialmente construído” em um contexto político, dando relevo ao papel das relações de poder vigentes em nossa sociedade.

Vivemos em uma sociedade marcada por práticas culturais que perpetuam iniquidades, em termos de classe, raça, gênero, etnia, orientação sexual, e outros parâmetros que caracterizam diferentes grupos (para alguns exemplos, ver Laurenti & Lopes, 2022). Tal constatação tem justificado o combate a essas práticas (classistas, racistas, machistas, homofóbicas etc.) na busca por uma sociedade mais equitativa. Nesse contexto de enfrentamento de práticas de opressão, a noção de um “eu” autônomo parece ganhar força, uma vez que essa autonomia explicaria a capacidade do “eu” resistir e, até mesmo, decidir rebelar-se contra esse sistema social desigual. O raciocínio subjacente é que o indivíduo é capaz de opor-se ao ambiente social justamente porque é dotado de “algo” que escapa aos condicionantes sociais. Desse modo, um “eu” autônomo daria respaldo a um “eu” ativo, capaz de ensejar transformações sociais, legitimando noções que dão relevo a essa atividade, como as de empoderamento e agência.

Em contraste, o reconhecimento da gênese social do “eu” poderia vincular o comportamentalismo radical à noção de um “eu” irremediavelmente passivo, sobretudo em um contexto de opressão que “condiciona” o indivíduo a essa passividade. O raciocínio aí implicado é o seguinte: se os repertórios verbais denominados de “eu” dependem de comunidades verbais, as quais reproduzem práticas culturais de uma sociedade permeada por iniquidades, como o “eu”, integralmente constituído por esse ambiente social opressivo, poderia insurgir-se? Um paradoxo, então, instala-se: ou se reconhece a possibilidade de uma ação transformadora por meio de uma noção descontextualizada de “eu” (eu iniciador), ou se reconhece a natureza social do “eu”, correndo o risco de impossibilitar a transformação social. Como o comportamentalismo radical critica a noção de eu iniciador, o desafio é duplo. Trata-se não apenas de ampliar a discussão da natureza social do “eu” abarcando o papel das relações de poder, como também garantir, nesse incremento, a noção de um “eu” ativo, capaz de agir contra um ambiente de dominação social. Considerando esse panorama, o objetivo deste texto é propor uma interpretação política do “eu” no escopo da filosofia comportamentalista radical, mantendo no horizonte a possibilidade de uma ação transformadora por parte desse “eu”.

Para tanto, iniciaremos desenvolvendo a tese comportamentalista radical da gênese social do “eu”. Na sequência, essa tese será politicamente adensada com o exame do papel das relações de poder na constituição de um “eu” oprimido. Sem a pretensão esgotar o assunto, mostraremos dois tipos de “eu” que podem surgir em ambientes de dominação social: um submisso e outro subversivo. Com a noção de um “eu subversivo” pretendemos ilustrar a possibilidade de a filosofia comportamentalista radical acomodar um “eu” ativo compatível com a transformação social.

A Gênese Social do “Eu” de uma Perspectiva Comportamentalista Radical

Acompreensão do “eu” no comportamentalismo radical volta-se para o conjunto de contingências responsáveis pelo estabelecimento de um repertório verbal “sobre si mesmo” (self) e, por conseguinte, da noção de identidade pessoal. A primeira contingência envolvida na constituição do “eu” tem uma raiz filogenética e diz respeito a uma identidade corporal (Lopes et al., 2018). Durante o desenvolvimento humano, o organismo passa a responder de modo diferencial aos limites do próprio corpo. Embora esses limites sofram mudanças com o tempo (o corpo muda suas dimensões com a idade do organismo), elas são bastante lentas, permitindo o estabelecimento de contingências suficientemente estáveis para a constituição de um primeiro sentido de identidade. Como descreve Skinner (1971):

Seu próprio corpo é a única parte do ambiente que permanece a mesma (idem), momento a momento, dia após dia. Dizemos que ela [a criança] descobre sua identidade à medida que aprende a distinguir entre seu corpo e o resto do mundo. Ela aprende isso muito antes que a comunidade ensine a nomear as coisas e a distinguir ‘mim’ de ‘isso’ ou de ‘você’. (pp. 198-199)

Essa identidade corporal é pré-verbal, no sentido de que, em sua gênese, ela independe da comunidade verbal, sendo regulada pelos limites físicos do próprio organismo. Justamente por isso, nesse momento, o corpo ainda não é um “eu”. No entanto, na medida em que outras contingências estabelecerem um repertório verbal autodescritivo, o corpo tornar-se-á uma das variáveis de controle para emissão das respostas que compõem esse repertório (Lopes et al., 2018).

A constituição do “eu” depende, inicialmente, de contingências sociais que envolvem o modo como outros respondem a um organismo em particular, identificando-o como “o mesmo” (Skinner, 1974). Um exemplo desse tipo de contingência surge quando se atribui a esse organismo um nome próprio, o que permite que os outros se comportem de maneira relativamente estável em relação a ele, ao mesmo tempo em que reforçam respostas desse organismo consistentes com um padrão. Nesse ponto, a atribuição de um “temperamento” ou mesmo de uma “personalidade” para esse organismo cria mais uma contingência social em que certos padrões de comportamento compatíveis com essa atribuição são sistematicamente reforçados. Essa contingência pode ser bastante prematura na vida do organismo, quando, por exemplo, se fala que um bebê é tranquilo, agitado, irritado, dorminhoco, ansioso, e assim por diante. Todas essas palavras descrevem e qualificam padrões de comportamento que são tomados pelos cuidadores como representantes de como a criança é. Em contrapartida, comportamentos que ocorrem apenas eventualmente, e que, por isso, diferem do padrão, são considerados transitórios ou acidentais (“hoje ele está irritado”, “ontem ele estava tranquilo”, “semana passada ele não dormiu bem”).

À medida que o organismo vai adquirindo um repertório verbal, a comunidade participa ativamente do ensino da autodescrição. Assim, no lugar de uma atribuição de identidade “de fora”, o indivíduo passa a se descrever e se reconhecer como tal. Este é o sentido mais comum da noção de “eu”: um relato em primeira pessoa, que envolve a descrição de modos de comportar-se e, principalmente, de condições corporais sentidas (ver Skinner, 1989b, p. 28). Do ponto de vista comportamentalista, esta é a forma mais simples de autoconhecimento, que consiste em saber que está se comportando e como está se sentindo. No entanto, o repertório de autoconhecimento geralmente avança, incluindo uma explicação do próprio comportamento e eventualmente dos sentimentos, ou seja, a discriminação de variáveis supostamente responsáveis pelo comportamento e sentimentos (ver Skinner, 1974, p. 141).

O repertório verbal sobre “si mesmo” ou autoconhecimento (composto pela discriminação verbal do comportamento, das condições corporais e de variáveis supostamente responsáveis por ambos) também pode controlar outros comportamentos do próprio indivíduo, dando origem a formas de autocontrole – um repertório que permite ao indivíduo mudar o próprio comportamento por meio da alteração de variáveis ambientais controladoras (Skinner, 1953/2005). Por exemplo, alguém que sabe que se envolverá em uma discussão improdutiva se encontrar certa pessoa, pode evitar deliberadamente ir ao bar frequentado por ela, mesmo deixando de encontrar amigos que também estarão lá. Para tanto, essa pessoa pode marcar um compromisso importante exatamente no mesmo dia e horário, como forma de autocontrole. Embora os reforçadores envolvidos no contato com amigos estabeleçam uma alta probabilidade de ir ao bar, o compromisso agendado evita a ocorrência desse comportamento e de eventuais consequências aversivas decorrentes do encontro com a pessoa indesejada. Se esse comportamento de esquiva envolver autoconhecimento, a pessoa será capaz de explicar que, se não tivesse um compromisso, acabaria indo ao bar, encontrando a pessoa, discutindo e se arrependendo depois. Justamente por isso, ela marcou o compromisso naquele dia e horário, como forma de não “cair na tentação” de ir ao bar.

Vale ressaltar que quando os repertórios de autoconhecimento e autocontrole são estabelecidos, as outras dimensões da identidade pessoal são modificadas. A identidade corporal, por exemplo, passa a ser influenciada pela descrição em primeira pessoa e não meramente pelos limites físicos do corpo. Não se trata mais de apenas distinguir entre corpo e mundo, mas de falar sobre o próprio corpo, atribuindo-lhe qualidades ou defeitos. Nesse ponto, o corpo também se converte em uma instância verbal, submetida a contingências organizadas e mantidas por comunidades verbais.

Todas essas contingências responsáveis pela constituição do “eu” estão em alguma medida subsumidas a práticas culturais que “regulam” e dão sentido e valor ao “eu”. Consequentemente, o indivíduo tende a se considerar mais ou menos ajustado, mais ou menos culpado, mais ou menos satisfeito em relação a padrões culturalmente estabelecidos. De uma perspectiva comportamentalista, o ensino do autoconhecimento deveria contemplar essa dimensão sociocultural, pois, “é a comunidade que ensina o sujeito a ‘conhecer-se’” (Skinner, 1953/2005, p. 261). O que o indivíduo pensa, sente e conhece sobre si emerge das interações com o ambiente social, o que dá sentido à afirmação skinneriana de que “consciência é um produto social” (Skinner, 1971, p. 192). Assim, uma compreensão adequada do “eu” exige uma análise mais cuidadosa da sociedade que ensina esses repertórios, o que envolve as relações de poder que participam desse processo.

As Relações de Poder na Constituição Social do “Eu”

No comportamentalismo radical, o “eu” pode ser entendido como um repertório autodescritivo complexo aprendido com (e mantido por) membros da comunidade verbal. Se o “eu” é construído e perpetuado na relação com os outros, uma pergunta que deve ser feita é: quem são esses “outros”?

A comunidade verbal que dá origem ao “eu” envolve diferentes grupos sociais, tais como família, escola, comunidades religiosas, amigos, desafetos etc. Esses grupos ensinam um repertório verbal autodescritivo porque isso amplia o acesso ao que o indivíduo faz, pensa e sente, facilitando o controle social (Skinner, 1974). Por exemplo, quando pais e cuidadores ensinam um repertório autodescritivo à criança, e ela aprende a identificar e falar de suas ações e de suas condições corporais (e.g., “sinto dor”, “estou com fome”), eles passam a ter um maior controle sobre o comportamento dessa criança, tornando o cuidado mais fácil e efetivo. Ao mesmo tempo, a própria criança aumenta suas chances de produzir reforçadores positivos e de eliminar ou evitar condições aversivas por meio da autodescrição, solicitando alimento, atenção, e alertando aos demais de eventuais perigos aos quais ela possa estar exposta. Desse modo, pelo menos em princípio, a autodescrição beneficiaria tanto o grupo quanto o indivíduo.

O ensino de repertórios verbais autodescritivos também envolve um controle ético por meio da valoração de comportamentos e condições corporais, gerando como efeitos colaterais sentimentos relacionados à autoestima e autoconfiança (Skinner, 1989b). Novamente, uma criança que aprende a se observar poderia ser beneficiada conquistando autoestima e autoconfiança; nesse caso, ela aprende não apenas a falar do comportamento e corpo próprios, mas a gostar de si e a confiar em si mesma. Paralelamente, ao garantir um ambiente mais reforçador à criança, o grupo familiar diminui as chances de emissão de comportamentos de contracontrole que ameaçariam o próprio grupo.

O exemplo anterior pressupõe pais e cuidadores amorosos e zelosos. Mas a aprendizagem do “eu” também pode ser predominantemente estabelecida por contingências aversivas, nas quais a criança aprende a se descrever como ruim, inútil, preguiçosa, incapaz. Nesse ambiente social, ela aprende, então, a desgostar de si mesma, do que faz, do que pensa e do que sente. Em contingências desse tipo há mais chances de emergirem comportamentos de contracontrole que atacam o grupo familiar ou, mais especificamente, os pais e cuidadores que são os controladores nesse grupo. No entanto, devido à diferença desproporcional com respeito ao controle e acesso a eventos reforçadores e punidores (i.e., uma diferença de poder), a criança, sem auxílio, dificilmente será capaz de contracontrolar de modo efetivo práticas aversivas de adultos – na verdade, o efeito pode ser um aumento da aversividade como forma de punir as tentativas da criança de contracontrolar.

Nesse caso, a manutenção do grupo familiar se dá por meio da constituição de um “eu” infeliz e ressentido, mostrando que nem sempre o ensino de repertórios que constituem o “eu” beneficia de modo igualitário o grupo e o indivíduo.

Agências controladoras poderosas, como Estado, economia e religião também são responsáveis pelo ensino e manutenção de repertórios verbais que compõem o “eu” (Skinner, 1953/2005). Comparativamente a outros grupos, essas instituições têm um maior acesso e capacidade de manejar eventos reforçadores e punidores sociais (i.e., mais poder). Na verdade, boa parte dos reforçadores e punidores empregados pelas agências no controle social são criados por elas. Por meio de práticas culturais, esses reforçadores e punidores passam a ser valorados como“bens” ou “bons”, sendo convertidos em modos de acessar outros reforçadores cruciais para a vida naquela sociedade (Lopes et al., 2018). A economia, por exemplo, cria não apenas bens de consumo, mas também títulos, moedas, ações e outros “papeis” que configuram uma rede de reforçadores artificiais que, em uma sociedade capitalista, dá acesso a reforçadores primordiais como alimentação, habitação, saúde, lazer, entre outros. Com isso, a economia amplia enormemente sua capacidade de controle social, na medida em que o acesso a reforçadores “primários” depende, quase que exclusivamente, da submissão às regras formuladas por essa agência. Simultaneamente, a ameaça constante de perda desses reforçadores, bem como de sofrer sanções legais por parte do Estado, reforça negativamente o comportamento de seguir essas regras, evitando comportamentos de contracontrole por parte dos membros da sociedade.

Por conta de seu amplo poder de controle social, as agências controladoras têm um papel decisivo na organização de contingências constitutivas do “eu”. Estendendo o raciocínio skinneriano ao controle institucional, é possível concluir que ao estabelecer contingências responsáveis por repertórios verbais autodescritivos, as agências controladoras ampliariam ainda mais o seu poder de controle sobre os indivíduos. A justificativa geralmente empregada pelas agências para regularem as contingências sociais constitutivas do “eu” é que os indivíduos também se beneficiariam desse controle discriminativo verbal de si.

O argumento não é propriamente novo, tendo sido invocado para descrever e, eventualmente, justificar a formação de indivíduos civilizados (autocontrolados) por agências controladoras na modernidade (Elias, 1982/1993; Tourinho, 2006). Contingências culturais organizadas nesse período foram responsáveis por mudanças nas relações interpessoais que estão na base da constituição de um “eu civilizado”, visando o convívio pacífico e, portanto, o bem comum. Para tanto, seria preciso o ensino ostensivo de um padrão de comportamento autocontrolado:

esse padrão, civilizadamente eficiente de comportamento social, exige de cada indivíduo uma rotina de auto-observação e vigilância sobre o próprio corpo, que em certo sentido resume-se ao ‘pensar antes de agir’, isto é, agir em acordo com uma avaliação preliminar dos possíveis impactos sociais da ação. (Tourinho, 2006, pp. 25-26)

Nesse “processo civilizatório”, sanções éticas punitivas para o comportamento impulsivo e reforçadoras para o comportamento autocontrolado se estabeleceram, permitindo a “observação do próprio corpo, pela reflexão permanente sobre cursos de ação e pela correspondente percepção dos eventos emocionais e cognitivos como ocorrências internas” (Tourinho, 2006, p. 29). O ensino em larga escala desse repertório de autocontrole, na forma de um autogoverno ético, foi crucial para a sobrevivência das próprias sociedades ocidentais modernas, que dependiam “... da previsibilidade do comportamento de cada um, de uma regulação mais acentuada e permanente do comportamento de cada um pelo comportamento de todos os outros” (Tourinho, 2006, p. 26).

Em princípio, o repertório de autocontrole, ou mais precisamente o autogoverno ético, seria compatível tanto com o bem do indivíduo quanto com o bem do grupo. Por mais que o indivíduo tivesse que lidar com eventos aversivos imediatos decorrentes do autocontrole, consequências reforçadoras positivas tardias, como o aumento da segurança na esfera pública, presumivelmente, seguir-se-iam (Elias, 1982/1993). Ao mesmo tempo, uma sociedade com indivíduos autocontrolados teria mais chance de se manter coesa. Em última instância, o ensino do repertório de autocontrole pelas agências controladoras na modernidade teria a justificativa política de promover a sobrevivência de uma cultura civilizada.

A história da modernidade, no entanto, mostra que o processo de constituição desse “eu autocontrolado” não teve os benefícios prometidos, favorecendo grupos específicos às custas da exclusão da maioria dos indivíduos, sobretudo em países periféricos (Souza, 2003). A própria crítica de Skinner (1987) às agências controladoras fornece pistas para se compreenderessaconclusão. De acordocomessa crítica, o modo de funcionamento das agências controladoras acaba convertendo-as em estruturas de poder estratificadas e burocráticas, voltadas prioritariamente para obtenção de privilégios (reforçadores) por parte dos controladores, o que geralmente se dá às custas dos controlados.

Considerando essa crítica skinneriana, parece razoável suspeitar que a constituição de repertórios verbais reflexivos (“eus”) possa ser entendida como mais uma forma de controle social que, ao fim e ao cabo, visa manter essa estrutura de poder e privilégios. Partindo de uma sociedade estruturada dessa maneira – como é o caso da brasileira –, destacaremos aqui os “eus” oprimidos, entendidos como aqueles que são excluídos por esse sistema social. Em seguida, analisaremos duas possibilidades: a de um “eu” que mesmo oprimido mantém-se ajustado às estruturas de poder (“eu” submisso), e a de “eus” que se opõem explicitamente a tal sistema (“eus” subversivos).

Os “Eus” Oprimidos

Uma vez que em nossa sociedade os representantes de agências controladoras poderosas são, geralmente, homens brancos, cis, heterossexuais, cristãos e ricos, contingências organizadas por essas agências para promover o ensino de repertórios verbais autodescritivos (“eus”), principalmente no que diz respeito à valoração do “eu”, são desiguais em termos de gênero, orientação sexual, raça, religião e classe social. Indivíduos que exibem as mesmas características dos controladores são classificados (e ensinados a se classificarem) como “eus” belos, inteligentes, morais; já aqueles que se afastam desse “padrão” são considerados (e ensinados a se considerarem) feios, burros, corruptos (ver Souza, 2021). Se o “eu” envolve como a “pessoa se sente” (Skinner, 1989b, p. 28), os sentimentos de uma pessoa em relação a si dependem também de contingências sociais verbais que se realizam de maneiras distintas entre diferentes grupos sociais. Alguns estudos sobre grupos oprimidos no Brasil amparam essa conclusão.

Citando um estudo de Paré sobre autoimagem e autoestima na criança negra, Fernandes e Souza (2016) destacam que “a criança branca desenvolve sentimento de autoestima e autoconfiança, enquanto na criança negra emerge sentimento de baixa autoestima e vergonha de ser negro” (p. 113). Com isso, as autoras destacam que o racismo “... impede o negro de desenvolver um sentimento de pertencimento racial e, paralelamente, de construir a autoestima baseada numa identidade racial positiva” (p. 112). Estudos transversais sobre transtornos mentais e raça, que incluíram variáveis socioeconômicas (e.g., escolaridade, renda), também sugerem “que a prevalência de transtornos mentais é maior na população negra que na população branca” (Smolen & Araújo, 2017, p. 4026).

Com respeito ao gênero, Ludermir (2008) discute uma série de estudos que têm mostrado a maior prevalência de depressão e ansiedade em mulheres em comparação aos homens, sendo que as práticas culturais responsáveis pela desigualdade entre gêneros seriam aspectos elucidativos dessas diferenças. Como exemplo, ela argumenta que a violência “tem um efeito devastador sobre a autoestima da mulher” (p. 460), comprometendo, igualmente, “sua capacidade de reação e perpetua[ndo] o sentimento de subordinação” (p. 461). A autora conclui que “as desigualdades sociais envolvem os principais sentimentos relacionados à depressão e a outros transtornos mentais, como humilhação, inferioridade, percepção de falta de controle sobre o meio e impotência” (p. 461).

Uma vez que o Brasil é o país que mais mata pessoas da população LGBTQIA+ no mundo (Mendes & Silva, 2020), indivíduos pertencentes a esse grupo lidam constantemente com fatores estressores específicos, decorrentes de um ambiente de intolerância, discriminação e violência. Esse ambiente hostil é o principal responsável pelos altos indicadores de iniquidades em saúde em travestis e mulheres transexuais, incluindo um “pior bem-estar psicológico” (Zucchi et al., 2019, p. 10). Uma passagem de Castañeda, citada por Toledo e Pinafi (2012), ilustra bem os efeitos nefastos da homofobia na constituição do “eu” em homossexuais:

Frequentemente acontece, por exemplo, que os homossexuais desconfiem de seus próprios desejos ou sentimentos: eles podem lhes parecer perversos, sujos ou até mesmo perigosos.... O fato de uma pessoa rejeitar sistematicamente seus próprios desejos ou sentimentos acabará, com o tempo, afetando suas relações com os outros e com ela mesma, sua vida sexual, e até mesmo sua saúde física. (p. 150)

A constituição do “eu” pode, portanto, ser um processo de opressão, na medida em que práticas aversivas estão na base da formação e da regulação daqueles “eus” distantes do padrão estabelecido por práticas culturais masculinistas, patriarcais, racistas e de ódio à população LGBTQIA+ (Butler, 2005/2015).

Considerando a formação de “eus” oprimidos, sobretudo em sociedades com altos índices de exclusão social, encontramos evidências mais concretas de que os repertórios verbais autodescritivos ensinados por agências controladoras não favorecem de maneira igualitária indivíduos e grupos. Consequentemente, ponderando as análises de Skinner (1974), dentre as possíveis razões para o ensino de repertórios verbais que compõem o “eu”, não se pode descartar a função de manutenção de um sistema social desigual por meio do estabelecimento desses repertórios.

O “Eu” Submisso

A constituição de “eus” oprimidos, permeada por contingências aversivas1, parece, em princípio, favorável ao contracontrole por parte desses indivíduos. Em outras palavras, a exclusão social massiva de certos grupos, que têm o acesso a reforçadores importantes negado ou bastante dificultado, teria como efeito esperado a revolta contra os controladores e até mesmo contra o sistema social que eles sustentam. No entanto, raramente esse é o caso, porque o ensino de repertórios de autoconhecimento, autocontrole e autogoverno ético por parte de agências controladoras está voltado para converter o oprimido em um “eu” submisso. Esse “eu” não apenas discrimina ações e condições corporais, como aprende a avaliá-las de acordo com o sistema de valores das agências:

Uma cultura elogia e recompensa os comportamentos de seus membros que são úteis ou fazem coisas interessantes, em parte chamando-o [o sujeito] e as coisas que faz [suas ações] de boas ou certas. No processo, o comportamento é positivamente reforçado e condições corporais são geradas e podem ser observadas e avaliadas pela pessoa de quem se fala. (Skinner, 1989b, p. 30)

Quando esse controle ético é institucional, ou seja, quando ele é promovido por agências controladoras, tanto o comportamento obediente quanto o próprio indivíduo que obedece às regras estabelecidas pelas agências são classificados como “bons”, “virtuosos”, “adequados”, “normais”. Semelhantemente, comportamentos de insurgência contra as agências, bem como os indivíduos que os emitirem são valorados como “maus”, “pecaminosos”, “desajustados”, “patológicos” (Skinner, 1953/2005).

Se o controle ético for bem-sucedido, o próprio indivíduo passará a avaliar os outros e a si mesmo de acordo com o sistema de valores aprendido com as agências: quando ele se comportar do modo “certo”, ele sentirá orgulho de si; quando ele se comportar de modo “errado”, incluindo respostas verbais encobertas (pensar), ele sentir-se-á culpado, envergonhado, arrependido. Nesse caso, o indivíduo se configura como um “eu” submisso e a presença física de um representante de uma agência controladora já não é mais necessária para que o indivíduo continue se comportando de acordo com o sistema de valores das agências. Como descreve Skinner (1953/2005): “ao estabelecer um comportamento obediente, a agência controladora prepara [o indivíduo] para ocasiões futuras que ela não pode antever e para as quais um repertório explícito não pode, portanto, ser preparado de antemão” (p. 338). O próprio indivíduo passa, então, a manipular variáveis ambientais de forma a diminuir a probabilidade de ele emitir comportamentos que seriam alvo de punição por parte das agências, como aqueles que contestam o sistema de poder e privilégios.

Agências controladoras podem garantir, de maneira ainda mais efetiva, “eus” submissos quando organizam contingências de reforçamento positivo imediatas, associadas a consequências aversivas tardias. Essa estratégia de priorizar o reforçamento positivo do comportamento de aquiescer, em vez de punir ostensivamente comportamentos “desviantes”, converte o “eu” submisso em um “escravo feliz” (Skinner, 1971).

Práticas de uma cultura mentalista favorecem a constituição desses “escravos felizes”, na medida em que restringem o autoconhecimento à descrição de condições corporais, ensinando o indivíduo a “confiar cegamente em seus sentimentos” (Skinner, 1971, 1974). Exposto a reforçadores positivos imediatos, o indivíduo sente-se livre e, com isso, contribui “voluntariamente” para a manutenção de um sistema de poder que, em última instância, o prejudica. Com essa forma de controle social, o indivíduo geralmente não experiencia qualquer conflito ao se comportar em benefício de agências, dispensando o repertório de autocontrole: “Quando o mesmo comportamento ‘bom’ é conseguido sem punição, o autocontrole . . . é desnecessário” (Skinner, 1964/1999a, p. 54).

Outro conjunto de práticas culturais que favorecem a constituição de “eus” submissos são aquelas que constroem e, sobretudo, valoram positivamente um “mundo interno”. Tourinho (2006) chama a atenção para esse ponto:

Na vida cotidiana nas sociedades modernas, os indivíduos aprendem a dispender uma boa parcela de tempo observando o que se passa com o próprio corpo e tomando isso como referência para muitos julgamentos sobre si mesmos e sobre a realidade à sua volta. Aquilo que observam vem a constituir um mundo interno, frequentemente tratado como sua “vida psicológica”. (p. 21)

Autores como Sennett (1974/1995) e Elias (1982/1993, 1994) mostram como práticas culturais estabelecidas durante a modernidade estão na base de contingências sociais verbais que não apenas constroem esse “mundo interno” sentido, mas passam a valorá-lo como mais importante do que o “mundo externo” observado. Essas contingências ganharam força no século XIX e se difundiram por diferentes contextos. Elias (1994), por exemplo, mostra que a literatura foi amplamente influenciada por esse processo de “voltar-se para dentro”:

Nos textos em prosa dos séculos anteriores [ao século XIX] – e, certamente, não apenas nos textos em prosa –, os escritores mostravam-se predominantemente preocupados em dizer ao leitor o que as pessoas faziam, o que acontecia. Gradativamente, a atenção passou a se concentrar não apenas na narração dos acontecimentos, mas em como as pessoas os vivenciavam. Os autores descreviam uma paisagem, por exemplo, e ao mesmo tempo a chamada “paisagem interior”, no sentido mais estrito ou mais amplo do termo – le paysage intérieur. Descreviam encontro entre as pessoas e, ao mesmo tempo, o “fluxo de consciência” delas ao se encontrarem. (p. 87)

Uma leitura comportamentalista radical da constituição da noção de “eu iniciador” destaca que, no âmbito de uma cultura mentalista, o ensino do autoconhecimento prioriza o reforçamento de respostas verbais descritivas daquilo que se passa “dentro” do indivíduo como um ponto de partida absoluto e, portanto, independente de relações sociopolíticas. Ao final do processo, o indivíduo não apenas aprende a dizer que emoções, sentimentos e pensamentos estão dentro dele, mas que são a causa de suas ações. Em última análise, ele é reforçado por dizer que o seu “eu”, completamente desconectado de contingências sociais, está na origem de tudo aquilo que ele faz, pensa e sente.

Holland (1978) já tinha alertado para as implicações políticas do mentalismo. Uma explicação mentalista pode converter problemas sociais em questões individuais, sustentando a defesa da meritocracia mesmo em condições sociais desiguais, e justificando a ascensão ou a estagnação social em termos estritamente pessoais. Algumas análises skinnerianas também chamam a atenção para os efeitos políticos da noção de “eu iniciador”. Por exemplo: “enquanto nos apegarmos à concepção de que uma pessoa é um executor, um agente ou um causador do comportamento, continuaremos, provavelmente, negligenciando as condições que devem ser modificadas para que possamos resolver nossos problemas” (Skinner, 1981, p. 504). Quando, então, práticas culturais mentalistas, perpetuadoras do “mito das causas internas”, participam do ensino e manutenção de repertórios verbais reflexivos, a noção de “eu” que emerge tende a ser consistente com a manutenção do status quo.

Em suma, diferente do que é propagandeado pelas agências controladoras, o ensino institucionalizado de repertórios verbais que constituem o “eu” dificilmente tem a função de promover o bem de todos ou mesmo do maior número de pessoas possível. As diferentes formas de controle social empregadas por essas agências (classificação de comportamentos, ensino do autogoverno ético, difusão do mito das causas internas e da noção de eu iniciador) visam prioritariamente constituir e manter “eus” submissos. Isso é potencializado por práticas culturais mentalistas, que ensinam o indivíduo a explicar suas ações recorrendo a um “mundo interno”, o que dificulta a contextualização sociocultural da opressão. O resultado é um indivíduo que busca respostas “nele mesmo”, culpando-se por sua exclusão social.

Um “Eu” Subversivo

As análises skinnerianas permitem uma descrição relativamente detalhada de contingências responsáveis por um “eu” submisso, mesmo em contextos em que isso desfavorece o indivíduo (e.g., Skinner, 1953/2005, 1961/1999b, 1971, 1974). Resta, então, examinar as possibilidades de um “eu” que rompe com a submissão. Em outras palavras, trata-se de sondar as condições para o surgimento de um “eu” subversivo, que não apenas é “desajustado” em relação ao contexto atual, mas valora esse desajustamento de modo diferente daquele ensinado pelas agências controladoras. Como seria possível, então, explicar o indivíduo que age contra o controle institucional e não se sente culpado, corrompido, errado, mesmo que as agências o classifiquem assim?

Em primeiro lugar, um contexto social e cultural complexo dificulta o controle hegemônico por parte de uma única agência (Skinner, 1953/2005). Nesse tipo de contexto, a competição entre diferentes agências, visando o aumento de poder, pode dar ensejo a uma situação conflituosa, na qual proliferam uma diversidade de valores, nem sempre consistentes entre si (o que é desejável na economia pode ser considerado pecaminoso pela religião, e ilegal pelo governo, e assim por diante). Um indivíduo exposto a treinamentos éticos diferentes e divergentes emerge como um “eu” conflituoso que pode, em algum momento, romper com alguns dos valores aprendidos, voltando-se contra uma das agências.

Em segundo lugar, por mais poderosa que seja uma agência controladora, sempre há “brechas” que não são cobertas por ela. Como destacou Skinner (1953/2005), “em qualquer grupo grande não existem contingências de controle universalmente observadas” (p. 419). Em governos ditatoriais, por exemplo, pode haver espaços de subversão; em famílias autoritárias pode haver membros libertários; em escolas rígidas pode haver docentes afetuosos. Isso quer dizer que em uma sociedade complexa, que conta com diferentes formas de relação social, o indivíduo estará exposto a um ambiente social com algum grau de heterogeneidade em relação às práticas de controle dominantes. Assim, quanto maior for essa heterogeneidade, maiores as chances de desenvolvimento de um “eu” desobediente, que pode surgir de relações não institucionalizadas, em contatos informais e cotidianos.

Em terceiro lugar, a difusão de práticas culturais institucionalizadas ostensivamente aversivasaumentaaschances de ações de contracontrole político, que podem ensejar transformações sociais. Mesmo quando essas ações são individuais, ainda há a possibilidade de que elas mobilizem e sensibilizem outras pessoas, dando origem a um movimento político transformador. Um exemplo emblemático desse tipo de ação ocorreu em dezembro de 2010, quando Mohamed Bouazizi ateou fogo em si mesmo na frente da sede do governo regional na Tunísia, depois de ter sido humilhado ao tentar apresentar uma queixa contra agentes públicos que o impediram de continuar vendendo frutas nas ruas da cidade. O ato acabou dando origem a uma onda de manifestações em diferentes países do Oriente Médio e do Norte da África, que ficou conhecida como Primavera Árabe (Levs, 2011). A ação desesperada do jovem foi uma variação de um repertório de contracontrole político colocado em extinção: ele enfrentou agentes públicos que tentaram extorqui-lo; ele tentou apresentar uma queixa formal; ele pediu uma audiência com o representante político; ele levou uma cópia da lei à sede do governo. A autoimolação pública foi a última tentativa de contracontrole a um sistema opressor e corrompido2.

Em quarto lugar, algumas peças artísticas no campo da música, literatura, cinema, poesia podem incluir variações com potencial social transformador. Isso acontece quando tais atividades explicitam contextos de exploração, segregação, silenciamento, ou quando rompem com a “realidade”, projetando mundos melhores com uma literatura utópica. Contingências específicas de reforçamento e, principalmente de punição, podem estar na base dessas produções artísticas, controlando o comportamento do artista de escrever, compor, pintar, mas seu efeito pode se difundir conduzindo a mudanças culturais. O contato com diferentes produtos de atividades artísticas, que exploram o inconformismo político, pode ser uma contingência favorável para que indivíduos fiquem sob controle de variáveis socialmente relevantes, tornando-se “eus” subversivos.

Todas essas contingências que constituem um “eu” subversivo, aquele que não se ajusta passivamente aos controles opressivos promovidos por agências, operam em nível individual. Mas no caso desse “eu”, o autoconhecimento contempla dimensões políticas relacionadas à discriminação das relações de poder e o papel das agências controladoras na explicação de como o indivíduo age, percebe-se e sente a si próprio.

Desse modo, autoconhecer-se, em um sentido político, é ser capaz de discriminar não apenas o que se faz e como se faz, mas por que se faz, o que remete à descrição da função do comportamento (e dos sentimentos) na manutenção ou transformação de um sistema social. Sob controle dessa descrição, o indivíduo pode mobilizar repertórios de autocontrole e autogoverno com uma função social transformadora, o que significa manipular variáveis relevantes para alterar seu comportamento visando contracontrolar práticas culturais de dominação e exploração.

No entanto, dado o poder das agências controladoras, dificilmente ações individuais são formas efetivas de contracontrole político, ou seja, atos isolados dificilmente são capazes de alterar o status quo. Por exemplo, depois de discriminar que o controle social da Igreja envolve a disseminação de práticas preconceituosas contra homossexuais, a condenação do aborto, a subordinação de mulheres em relação a homens, um indivíduo pode decidir pela apostasia. Contudo, essa ação de desobediência não afeta em nada o poder da agência religiosa, pois perder um fiel não faz diferença.

Assim, a constituição de um “eu” subversivo é o primeiro passo em uma luta política contra instituições assentes em sistemas de privilégios. O segundo passo é situar esse “eu” em um contexto coletivo, promovendo uma “identificação coletiva” entre oprimidos. Depois de discriminar os controles opressivos de agências que incidem sobre ele, o indivíduo precisa discriminar que isso o situa em um grupo, ou seja, que ele não está sozinho. A ação política individual deve, portanto, se conectar com uma causa coletiva, que, como tal, tem mais chances de enfrentar agências controladoras. Retomando o exemplo anterior, em vez de individualmente optar pela apostasia, um indivíduo pode promover uma campanha que reúna pessoas dispostas a abandonar oficialmente a Igreja. Uma ação desse tipo foi realizada na Argentina em 2018, depois que o senado derrubou a lei que permitia que qualquer mulher interrompesse a gravidez até a 14a semana de gestação. A mudança foi resultado de uma pressão direta de grupos religiosos e da própria Igreja católica no país. Como forma de protesto, grupos de feministas uniram-se a um movimento de defesa do Estado laico e encaminharam em um único dia mais de mil pedidos oficiais de apostasia à Igreja católica argentina (Alamillos, 2018).

Isso é bem diferente da valorização individualista e descontextualizada do discurso em primeira pessoa, tal como se verifica em suas nuances neoliberais mais recentes com a ideia de “empresário de si mesmo” (ver Chaui, 2020), que não “empodera” politicamente o sujeito3. A desconexão da noção de “eu” de seu entorno social, característica de um individualismo mentalista, atrela ações potencialmente transformadoras a um eu iniciador, convertendo a mudança social em uma tarefa estritamente individual. Com isso, tais “iniciativas” perdem de vista suas conexões e ressonâncias coletivas, que poderiam ser capazes de ensejar um contracontrole mais efetivo. Isso explica porque a retórica individualista de “defesa da liberdade” difunde-se com facilidade em um sistema de dominação: assentada em um eu iniciador, a topografia contestadora ou rebelde de práticas verbais individualistas tende a deixar incólume o sistema de poder e privilégios das agências.

Por fim, vale ressaltar que a descrição de contingências sociais responsáveis por “eus” subversivos apresentada aqui certamente não esgota a explicação das possibilidades de emergência de indivíduos inconformados no âmbito de práticas culturais opressivas que favorecem a submissão. Ainda assim, essa descrição ilustra a possibilidade de compreender comportamentos de insurgência sem recorrer à noção de um eu iniciador. Nessa proposta, também é possível preservar noções caras à tarefa política de enfrentamento de opressões, como as de “resistência” e “agência”, que talvez sejam melhor compreendidas pela designação de “repertórios resistentes e agênticos” que, como tais, dependem de contingências específicas (Ruiz, 1998). Tais repertórios configuram um “eu” subversivo, que pode emergir de contingências sociais marginais presentes nas “brechas” dos controles institucionais.

Considerações Finais

Com o propósito de enriquecer as reflexões sobre a noção de “eu” no comportamentalismo radical, este texto examinou um desafio que se apresenta quando tais reflexões são deslocadas para o campo político: como explicar a possibilidade de um eu oprimido tornar-se subversivo e insurgir-se contra o ambiente opressor que o constituiu?

À primeira vista, a noção de “eu iniciador” parece acomodar mais facilmente a possibilidade de um eu engajado em transformações sociais, pois o caráter ativo desse “eu” não se explicaria pela relação do indivíduo com o contexto social opressor. Contrastando com essa visão, o comportamentalismo radical entende que o “eu” não é o início absoluto da ação transformadora, mas um tipo de repertório complexo que emerge na relação do indivíduo com o mundo social verbal, permeado por relações de poder. Sem abandonar a tese da gênese social do eu, foi possível vislumbrar a possibilidade da constituição de “eus” subversivos mesmo em ambientes opressores. Essa possibilidade surge com o reconhecimento da heterogeneidade do ambiente social, do caráter parcial e nem sempre conciliável do controle social promovido por cada agência, de práticas culturais linguísticas descritoras de controles sociais opressores, do potencial transformador do contracontrole, sobretudo, quando ele é favorecido e amparado por práticas coletivas de grupos marginalizados e subversivos.

Após essa análise, o comportamentalismo radical é que coloca desafios à noção de “eu iniciador”. Considerando o poder de agências controladoras, o enfrentamento de práticas opressivas tem mais chances de ser efetivo se for coletivo e não apenas individual; e se a subversão não é socialmente construída, o enfrentamento coletivo parece depender exclusivamente da sorte de encontrarmos vários “eus” espontaneamente subversivos em uma sociedade. Por outro lado, a indicação de contingências responsáveis pela constituição de um “eu” subversivo indica a possibilidade de fomentar deliberadamente o surgimento desse tipo de “eu”, catalisando, assim, a transformação social.

Como antecipado, este texto não teve o propósito de exaurir as possibilidades de emergência de um eu subversivo de uma perspectiva comportamentalista radical. É uma reflexão preliminar que suscita a necessidade de inserirmos de modo mais sistemático as relações de poder no exame da gênese e manutenção social do eu. As análises aqui apresentadas podem e devem ser aprimoradas e ampliadas por outros estudos, investigando-se aspectos não discutidos, como, por exemplo, a constituição de eu opressores, e as possibilidades de coexistência de eu opressores e oprimidos em um mesmo indivíduo, o que configuraria um ponto de partida para uma perspectiva interseccional dessa temática.

Referências

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Notas

1 Nem todo “eu” oprimido é constituído por contingências que contam com condições aversivas imediatas. Como o próprio Skinner (1971) indicou, a opressão também pode se dar por contingências de reforçamento positivo, com efeitos aversivos atrasados. Indicaremos essa possibilidade mais adiante, quando tratarmos da noção de “escravo feliz”.
2 Vale ressaltar que a autoimolação é uma prática cultural relativamente comum em países pobres da Ásia e África (Levs, 2011). Assim, o caso de Bouazizi não é uma variação individual desconectada do contexto cultural, o que torna mais provável a interpretação do caráter político de sua ação. Essa interpretação supõe a presença de um repertório de autoconhecimento que situa o indivíduo em relações de poder (ele se vê em uma posição social específica) e inclui o papel das agências controladoras na explicação de como ele se comporta, se percebe e se sente (a “culpa” é de um sistema social e não de indivíduos específicos). Na ausência desse tipo de autoconhecimento, ações de contracontrole não deveriam, portanto, ser consideradas políticas. Uma discussão pormenorizada sobre uma noção politizada de contracontrole, assim como os limites de uma concepção de contracontrole sem essa conotação, pode ser encontrada em Sá (1985).
3 As relações entre neoliberalismo e esse “descolamento” do meio social por parte do indivíduo vêm sendo discutidas por diferentes autores e autoras. Na base dessas discussões está a compreensão de que o neoliberalismo não é apenas um modelo econômico (gestado na Sociedade Mont Pèlerin), mas uma proposta “totalizante” da sociedade que tem como meta a completa subordinação de outras esferas sociais (política e cultural) à economia capitalista – justamente por isso, Chaui (2020) classifica o neoliberalismo como uma nova forma de totalitarismo. Não se trata, no entanto, de abandonar ou eliminar o Estado (esfera política) e, claro, o indivíduo (esfera cultural), mas sim de recrutá-los nessa tarefa de subordinar tudo à economia. Para isso, a noção de liberdade é fundamental: o Estado tem o dever de garantir a liberdade econômica e proteger o capital financeiro; o indivíduo tem o direito (que graças ao poder ideológico da mídia, tende a se converter em dever) de desfrutar de suas escolhas sem quaisquer obstáculos “externos”. Nosso ponto aqui é que entre essas escolhas individuais pode estar o uso de um vocabulário igualitário e progressista, com termos como “justiça social”, “luta contra a iniquidade”, “defesa da sustentabilidade” e assim por diante (Sardoc, 2022), desde que isso seja inócuo em termos de redistribuição de recursos e mudança de rumo na organização social. Nancy Frazer alerta para o fato de que essa permeabilidade do neoliberalismo não se restringe ao indivíduo, incluindo, por exemplo, a cooptação de grupos defensores de políticas de identidade, dando origem ao que ela denomina como “neoliberalismo progressista” (Brenner & Fraser, 2017). Infelizmente, uma discussão pormenorizada sobre essa “neoliberalização” das sociedades, bem como a devida fundamentação do argumento sobre o papel da liberdade no projeto totalizante dessa ideologia, fogem ao escopo deste texto. Para isso, além dos artigos mencionados nesta nota, sugerimos a leitura de Drive (2017).


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