Servicios
Servicios
Buscar
Idiomas
P. Completa
Educação inclusiva e seus desafios: uma conversa com David Rodrigues
Cássia Geciauskas Sofiato; Carla Biancha Angelucci
Cássia Geciauskas Sofiato; Carla Biancha Angelucci
Educação inclusiva e seus desafios: uma conversa com David Rodrigues
Inclusive education and its challenges:a conversation with David Rodrigues
Educação e Pesquisa, vol. 43, núm. 1, pp. 281-295, 2017
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
resúmenes
secciones
referencias
imágenes

Resumo: A educação inclusiva, no âmbito da educação especial, tem sido constantemente debatida por pesquisadores de diversas partes do mundo. Em 2015, ocorreu na Universidade de Lisboa o 8thInclusive and Supportive Education Congress: equity and inclusion in education, reunindo congressistas de 38 países, entre eles professores, pesquisadores, líderes políticos e representantes de instituições. A coordenação geral ficou a cargo do Prof. Dr. David Rodrigues, entre outros profissionais, dado o reconhecimento de sua vasta contribuição no campo da educação especial, especificamente com o tema educação inclusiva. Esse foi o contexto gerador da proposta de entrevista. O percurso da entrevista é organizado a partir das experiências de David Rodrigues como estudante, professor e ativista envolvido profundamente com a garantia do direito à educação para todos. Sua densidade biográfica revela o caráter que a educação inclusiva assume em sua vida. Não se trata de um objeto de estudo, que deve ser escrutinado desde fora, sem envolvimento. Trata-se de uma causa: a educação como direito universal, realizado na convivência, reconhecendo e se constituindo a partir das diferenças humanas. Assim é que o Prof. David discorre sobre a necessidade do redimensionamento do trabalho pedagógico para a inclusão de todos os alunos e da importância da formação de professores nesse contexto. Para tanto, analisa conceitos como inclusão e equidade à luz da Declaração de Incheon, documento organizado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, em 2015, durante o Fórum Mundial de Educação, na Coreia do Sul.

Palavras chave: Educação especialEducação especial,Educação inclusivaEducação inclusiva,Educação para todosEducação para todos.

Abstract: Inclusive education in the context of special education has been constantly debated by researchers from all over the world. In 2015, the 8th Inclusive and Supportive Education Congress: equity and inclusion in education was held at Universidade de Lisboa, bringing together delegates from 38 countries, including teachers, researchers, political leaders, and representatives of institutions. Professor David Rodrigues was one of the general coordinators of the congress, in recognition for his extensive contribution to the field of special education, and specifically to inclusive education. This was the context of the interview, which was organized taking into account the experience of Professor Rodrigues as a student, professor and activist deeply involved with the guarantee of the right to education for all. Its biographic content reveals the character that inclusive education takes in his life. Rather than an object of study – which should be scrutinized from outside, without engagement –, it is a cause: education as a universal right, performed living together, recognizing and constituting itself based on human differences. Thus Professor Rodrigues discusses the need for rethinking educational work to include all students and the importance of teacher education in this context. He analyzes concepts such as inclusion and equity in the light of the Declaration of Incheon, a document organized by The United Nations Educational, Scientific and Cultural Oragnization (UNESCO) in 2015, during the World Education Forum in South Korea.

Keywords: Special education, Inclusive education, Education for all.

Carátula del artículo

Entrevista

Educação inclusiva e seus desafios: uma conversa com David Rodrigues

Inclusive education and its challenges:a conversation with David Rodrigues

Cássia Geciauskas Sofiato
Universidade de São Paulo, Brasil
Carla Biancha Angelucci
Universidade de São Paulo, Brasil
Educação e Pesquisa, vol. 43, núm. 1, pp. 281-295, 2017
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
Apresentação


Figura 1.
Figura 1.
Fonte: arquivos pessoais do entrevistado.

Desde a tartaruga nada não era veloz.

Depois é que veio o forde 22

E o asa-dura (máquina avoadora que imita os pássaros, e tem por alcunha avião).

Não atinei até agora porque é preciso andar tão depressa.

Até há quem tenha cisma com a lesma porque ela anda muito depressa.

Eu tenho.

A gente só chega ao fim quando o fim chega!

Então pra que atropelar?

Manoel de Barros. A Tartaruga. 2013

Inclusão e equidade na e por meio da educação são o alicerce de uma agenda de educação transformadora e, assim, comprometemo-nos a enfrentar todas as formas de exclusão e marginalização, bem como disparidades e desigualdades no acesso, na participação e nos resultados de aprendizagem. Nenhuma meta de educação deverá ser considerada cumprida a menos que tenha sido atingida por todos.

O conjunto da obra de David Rodrigues é denso, exigindo-nos tempo e exercício constante da radicalidade. Professor na Universidade Técnica de Lisboa desde 1980, autor de mais de trinta livros sobre educação inclusiva, David Rodrigues já foi vice-presidente pela Europa da Sociedade Internacional para Estudos da Criança.

Em sua trajetória, não cabe distinguir ativismo, pesquisa e docência. Com o Prof. David Rodrigues, temos que a produção de conhecimento ocorre de maneira integral, a partir da imersão na realidade que, interpelando incessantemente os conhecimentos consolidados, convocando-nos a revisitar o sentido de e o compromisso com nossas escolhas. Provoca-nos a investigar o quanto temos sustentado afirmações tão simples quanto basilares como a determinação de educar todos os alunos e a educação sempre conviveu com a possibilidade de perder alguns alunos, para, em sequência, colocar em análise os aspectos socioculturais que constituem a vida diária escolar, a política educacional, a formação de professores.

Na entrevista, partimos do terreno da memória do estudante e do professor David para, então, solicitar reflexões a respeito de sua práxis. Ressaltamos a discussão sobre os desafios da educação inclusiva e o sentido ético-político da Declaração de Incheon (2015) desde seu ponto de vista.

David Rodrigues é formado em educação física, tendo produzido sobre psicomotricidade, atividades corporais e coordenado o curso de Terapias Expressivas (1999), na Faculdade de Motricidade Humana. Foi embaixador paralímpico em 1999, em Pequim. Recebeu o prêmio internacional de investigação União Latina, em 2007, e a medalha de mérito da Pró-Inclusão, em 2013.

Seu vínculo com a universidade se expressa, além das atividades docentes, pelos vários cargos ocupados e por sua contribuição como professor convidado em inúmeros países da Europa, das Américas e da África. Destacamos sua expressiva contribuição em países lusófonos, como Brasil e Cabo Verde, nos quais sua obra é difundida por meio de palestras e publicação de livros.

O Prof. David Rodrigues ainda colabora significativamente em órgãos supranacionais como iniciativas da Unesco, da Unicef e da Handicap International, tendo representado Portugal em vários projetos europeus, tais como Helios II e Tempus (na Ucrânia, Lituânia e Rússia). Integrou ainda o grupo de peritos sobre inclusão social junto ao Conselho da Europa. Atualmente, é membro do Conselho Nacional de Educação, em Portugal. Participa ainda do Centro de Investigação em Educação do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, do Conselho Consultivo da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação e das equipes da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior. É presidente da Associação Nacional de Docentes de Educação Especial.

Sua significativa contribuição para os estudos sobre educação inclusiva pode ser conhecida por meio de livros de sua autoria ou que contam com sua organização/ colaboração como autor de capítulos. Sua obra também pode ser conhecida por meio dos inúmeros artigos escritos para sites e para revistas de divulgação de debates sobre educação. Vem ainda compondo corpo editorial de revistas em Portugal, Brasil, Espanha, França e Reino Unido. É colunista regular de O Público, A Página de Educação e Plural & Singular.

No Brasil, seu livro Inclusão e Educação: doze olhares sobre a educação inclusiva (2006) tem sido amplamente utilizado. Trata-se de coletânea em que vários autores colocam em análise a educação inclusiva, seja refletindo sobre o lugar que a discussão sobre a diferença tem ocupado no cenário educacional, seja debatendo a produção das políticas educacionais, a formação de professores, a participação social. Nesse contexto, o capítulo do Prof. David Rodrigues “Dez ideias (mal) feitas sobre educação inclusiva” parte de algumas afirmações repetidas à exaustão por educadores nos últimos quinze anos para, então, explicitar a permanência de concepções que sustentam a escola como instituição excludente e a educação como privilégio de alguns, e não como direito de todos.

A EI [educação inclusiva] tornou-se assim um campo polêmico por várias razões. Uma das principais é sem dúvida a contradição entre a letra da legislação e a prática das escolas. O discurso da inclusão ou “a ideologia da inclusão” (CORREIA, 2003) não tem frequentemente uma expressão empírica, e por vezes fala-se mais da EI como um mero programa político ou como uma quimera inatingível do que como uma possibilidade concreta de opção numa escola regular. Tanto a legislação como o discurso dos professores se tornaram rapidamente “inclusivos”, enquanto as práticas na escola só muito discretamente tendem a ser mais inclusivas. Recentemente, afirmamos que “é preciso não invocar o nome da inclusão em vão”, tentando “mapear” esta distância entre os discursos e as práticas. (RODRIGUES, 2006, p. 302).

Já em livro organizado em 2011, Educação Inclusiva: dos conceitos às práticas de formação, David Rodrigues toma a questão das diferenças e do direito universal à educação para compartilhar olhares sobre aspectos da formação docente. É assim que podemos acompanhar discussões sobre aprendizagem cooperativa, experiências de inclusão, necessidades de reformulação da política de formação docente. A partir de pesquisa empírica realizada em Portugal, no capítulo “Formação de professores e inclusão: como se reformam os reformadores?”, Rodrigues e Lima-Rodrigues, apresentam as seguintes recomendações: atitude de investigação, práticas reflexivas, relação entre teoria e prática e contato com situações práticas.

A Educação necessita de uma reforma no sentido da Inclusão e, para isso, precisa de ter os seus próprios agentes, os seus próprios reformadores. Entretanto, em muitos sistemas educacionais – e, certamente, no sistema português – espera-se que os dinamizadores desta reforma a desenvolvam de uma forma, diríamos “metafísica”; isto é, que devem lutar por uma escola que, na verdade, nunca viram, que nunca experimentaram, e que sejam capazes de adotar métodos diferentes daqueles em que foram educados. É certo que os grandes promotores da Educação inclusiva da atualidade nunca experimentaram a Inclusão na sua vida escolar. Chegaram à premência da Educação Inclusiva através do seu próprio convencimento quanto à ética e à justiça da Inclusão. Não deixa de ser estimulante que impulso poderá sofrer a Educação Inclusiva quando esta deixar de ser desenvolvida por pessoas para quem ela não é mera opção ética, mas sim, o resultado de uma experiência pessoal e vivida (RODRIGUES; LIMA-RODRIGUES, 2016, p. 106).

Em 2016, é publicado Direitos humanos e inclusão, livro com um conjunto de textos do Prof. David Rodrigues, originados de suas palestras e demais atividades formativas. É a partir da discussão sobre a universalização da garantia de direitos, que o autor traz elementos para pensarmos as transformações possíveis e necessárias das várias dimensões da educação escolar, tais como a política, a arquitetura, a formação, o projeto da escola, a participação comunitária. O autor retoma, assim, o enfrentamento de uma antiga e emblemática questão: quais são as barreiras a serem superadas para que cada criança, para que toda criança possa permanecer na escola?

Com esta entrevista, procuramos conhecer, a partir da retomada de aspectos da trajetória de vida do Prof. Dr. David Rodrigues, experiências e valores fundantes para a defesa e a promoção do direito à educação inclusiva.

Material suplementar
Referências
BARROS, Manuel de. A tartaruga. In: BARROS, Manuel de. Tratado geral das grandezas do ínfimo. São Paulo: LeYa, 2013. (Biblioteca Manoel de Barros).
PERRENOUD, Phillipe. Ensinar: agir na urgência, decidir na incerteza: saberes e competências em uma profissão complexa. Porto Alegre: Artmed, 2001.
RODRIGUES, David. Direitos humanos e inclusão. Porto: Profedições, 2016.
RODRIGUES, David. Inclusão e educação: doze olhares sobre a educação inclusiva. São Paulo: Summus, 2006.
RODRIGUES, David; LIMA-RODRIGUES, Luiza. Formação de professores e inclusão: como se reformam os reformadores? In: RODRIGUES, David. Educação inclusiva: dos conceitos às práticas de formação. Lisboa: Instituto Piaget, 2011. p. 89-108.
SANTOS, Boaventura Sousa. Educação. Jornal de Letras, Artes e Ideias, Lisboa, n. 1185, 02 a 15 mar. 2016.
UNESCO. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Declaração de Incheon educação 2030: rumo a uma educação de qualidade inclusiva e equitativa e à educação ao longo da vida para todos. Brasília, DF: Unesco, 2015. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0023/002331/233137POR.pdf>. Acesso em: 19 ago. 2016.
Notas

Figura 1.
Figura 1.
Fonte: arquivos pessoais do entrevistado.
Buscar:
Contexto
Descargar
Todas
Imágenes
Visualizador XML-JATS4R. Desarrollado por Redalyc