Qualidade do conselho de administração em companhias brasileiras de capital aberto
Quality of the board of directors in brazilian companies of open capital
Qualidade do conselho de administração em companhias brasileiras de capital aberto
Enfoque: Reflexão Contábil, vol. 39, núm. 3, pp. 37-53, 2020
Universidade Estadual de Maringá
Recepção: 17 Setembro 2018
Corrected: 08 Março 2019
Aprovação: 23 Maio 2019
Resumo: O Conselho de Administração é o principal órgão no sistema de governança corporativa que, deliberando sobre a continuidade da empresa, se tornou uma exigência de mercado. Os estudos que tratam do índice de governança corporativa trazem o Conselho de Administração como um órgão interno desse índice. O estudo inova metodologicamente ao construir o Índice de Qualidade do Conselho de Administração, elaborando uma métrica com 40 itens de acordo com as Melhores Práticas de Governança IBGC (2015), dividida em 4 categorias alicerçadas nos estudos de Zahra e Pearce (1990) que definem como atributos que afetam a performance do Conselho de Administração: (i) a estrutura que define a organização; (ii) a composição que trata do tamanho do conselho; (iii) as características que apontam informações sobre experiência profissional; (iv) os processos da tomada de decisão e os procedimentos de monitoramento das relações entre gestores e investidores. A amostra é composta por 85 empresas internacionalizadas, com país sede Brasil, em painel balanceado, distribuídas no período de 2012 a 2016, com informações coletadas nos Formulários de Referência. O Índice de Qualidade do Conselho de Administração foi validado internamente através do alfa de Cronbach por ano e categoria. Os resultados permitiram a elaboração de gráficos por categorias, setores e itens do índice, evidenciando a evolução ao longo dos anos das Categorias Características e Processos e o engessamento das categorias Estrutura e Composição. O estudo ratifica o Conselho de Administração como principal órgão da Governança Corporativa que delibera sobre a continuidade da empresa e representa uma solução de mercado para amenizar os problemas de agência nas organizações.
Palavras-chave: Teoria da Agência, Governança Corporativa, Conselho de Administração.
Abstract: The Board of Directors is the main body in the corporate governance system which, acting on the continuity of the company, has become a market requirement. The studies that deal with the corporate governance index bring the Board of Directors as an internal body of this index. The study innovates methodologically when constructing the Quality Index of the Board of Directors, elaborating a metric with 40 items according to the IBGC Best Practices of Governance (2015), divided in 4 categories based on the studies of Zahra and Pearce (1990) that define as attributes that affect the performance of the Board of Directors: (i) the structure that defines the organization; (ii) the composition that deals with the size of the board; (iii) characteristics that indicate information about professional experience; (iv) decision-making processes and procedures for monitoring relationships between managers and investors. The sample is composed of 85 internationalized companies, with Brazil headquarter, in a balanced panel, distributed in the period from 2012 to 2016, with information collected in the Reference Forms. The Quality Index of the Board of Directors was internally validated through Cronbach’s alpha by year and category. The results allowed the elaboration of graphs by categories, sectors and items of the index, evidencing the evolution over the years of the Characteristics and Process Categories and the plastering of the categories Structure and Composition. The study ratifies the Board of Directors as the main corporate governance body that deliberates on the company’s continuity and represents a market solution to soften agency problems in organizations.
Keywords: Agency Theory, Corporate governance, Board of Directors.
1 INTRODUÇÃO
Desde a obra de Adam Smith de 1776, se estuda o fenômeno da separação entre a propriedade e o controle nas organizações. Na ótica da Teoria da Firma, a propriedade pulverizada acarreta o fortalecimento do poder dos administradores Berle e Means (1932), induzindo-os a agirem em razão de seus interesses individuais possibilitando que escolham opções em detrimento dos interesses de acionistas e sócios proprietários.
Na Teoria da Agência, Jensen e Meckling (1976) analisam problemas decorrentes da separação da propriedade e controle, apontando que administradores e proprietários dos negócios possuem interesses e objetivos diversos, que existem conflitos de agência e que os custos de monitoramento decorrentes da separação entre a propriedade do negócio e o controle do capital originam assimetrias informacionais e riscos morais fomentando um ambiente conturbado.
Hermalin e Weisbach (2003) argumentam que os Conselhos de Administração representam uma solução de mercado que ameniza os problemas de agência das organizações, decorrentes da complexidade e do caráter defeituoso e incompleto dos contratos. Treiger (2009) relaciona características e atribuições do Conselho de Administração que denotam maior credibilidade à gestão e viabilizam o desenvolvimento da responsabilidade compartilhada, multiplicando a transparência corporativa. Assim, o maior comprometimento dos agentes internos e externos, contribui para adoção das melhores práticas de gestão que incrementam a governança corporativa.
Para Vafeas (2000) os Conselheiros assumem funções de decisão e controle, sendo a primeira por meio da escolha da estratégia adequada para investimentos financeiros de curto e longo prazos e a segunda para definir a contratação de administradores e o acompanhamento das decisões de direcionamento de capital, via acompanhamento de relatórios de informações financeiras e contábeis. Dessa forma, os Conselhos de Administração atuam como intermediadores entre os fornecedores de capital e os gestores, na busca por assegurar a proteção legal dos investimentos, o monitoramento dos contratos e o alinhamento dos interesses, visando minimizar conflitos de agência.
Mahoney (2007) afirma que as relações com investidores têm como função estabelecer comunicação para aproximar empresas e mercado, nas relações com investidores as empresas buscam reduzir desequilíbrios e problemas de assimetria da informação por meio da adoção de boas práticas de Governança Corporativa que tem como pilar estrutural o Conselho de Administração, que é tido como o elo entre a propriedade e os gestores, sendo que seus membros devem apresentar competências específicas para o desempenho das funções.
Lien, Piesse, Strange e Filatotchev (2005) comprovaram que a forma de controle exercida pelos conselheiros em relação aos diretores em função das características e as competências do Conselho de Administração apresentam relação positiva com o volume de investimentos. Barroso, Villegas e Calero (2011) constataram que características do Conselho de Administração representadas pelo potencial dos conselheiros, medido com atributos do capital humano como conhecimento, experiência, habilidade, expertise, são elementos essenciais da eficácia do Conselho de Administração.
Oxelheim e Randoy (2003) revelam que empresas norueguesas e suecas que possuem conselheiros estrangeiros de países anglo-americanos apresentam maiores valores de mercados e elevados mecanismos de governança, a nomeação de conselheiros americanos e ingleses atrai investimentos. Singh e Nejadmalayeri (2004) citam que conselheiros estrangeiros melhoram a governança nas empresas, principalmente em países com menor proteção legal, a presença de conselheiros estrangeiros tende a elevar o valor de mercado da firma. A experiência profissional e a formação do conselho definem políticas, estratégicas e códigos de governança nas organizações (ENACHE; PARBONETTI; SRIVASTAVA, 2015).
Para Bird, Buchanan e Rogers (2004) o desempenho das empresas pode estar atrelado a qualidade da atuação do Conselho de Administração, quando mensurada pela busca constante dos conselheiros em melhorar a própria eficácia, a partir dos hábitos quotidianos. Adjaoud, Zeghal e Andaleeb (2007), confirmaram os efeitos da qualidade do Conselho de Administração, a partir de características dos conselheiros. Os sócios e acionistas aspiram maximizar riquezas e a qualidade do conselho pode monitorar gestores e alinhar interesses.
Deutsch (2005) ressaltou que a responsabilidade do Conselho de Administração no desempenho da empresa é uma importante linha a ser investigada. No entanto, Rivas, Hamori e Mayo (2009) argumentam que apesar da crescente importância do Conselho de Administração sobre os principais resultados organizacionais, são escassos os estudos que discutem a qualidade da composição e a atuação dos Conselhos de Administração das empresas. Assim, o estudo ajuda a preencher uma lacuna provocada pela escassez de estudos no país, principalmente por inovar metodologicamente ao propor uma métrica para capturar a Qualidade do Conselho de Administração.
No Brasil empresas cada vez mais escolhem seus conselheiros a partir de motivações relacionadas a experiência profissional e interação com mercados globais. Leksell e Lindgren (1982) argumentam que os Conselhos de Administração, em empresas internacionalizadas, apresentam peculiaridades quando comparados aos Conselhos de empresas nacionais e tendem a ganhar em escala e aproveitar oportunidades em cada país.
Nesse contexto é possível que a credibilidade, a responsabilidade e o comprometimento dos agentes envolvidos em boas práticas de gestão, derivadas da experiência acadêmica e profissional dos membros dos Conselhos de Administração, potencializem as ações estratégicas das corporações, e que estas sejam refletidas em medidas de desempenho financeiro. O estudo tem como objetivo construir um índice de qualidade que apresente o Conselho de Administração como principal órgão da governança corporativa que delibera sobre a manutenção no curto prazo e a continuidade no longo prazo da empresa.
2 CARACTERIZAÇÃO E COMPETÊNCIAS DO CONSELHO ADMINISTRAÇÃO
Descrever as características e as atribuições do Conselho de Administração não são apenas formalismos, tampouco obrigações previstas em lei, a serem seguidas exclusivamente pelas empresas que possuem negócios em Bolsas de Valores. Existe uma série de vantagens, às companhias que optam por negociar em Bolsas de Valores para a organização, aos acionistas, colaboradores, mercado e aos stakeholders. Para Treiger (2009) são as características e atribuições alicerçadas em regulamentações que denotam maior credibilidade à gestão e fomentam o desenvolvimento da responsabilidade. Assim, o maior comprometimento dos agentes envolvidos contribui para o aumento do valor da empresa e a adoção de novas práticas de gestão que incrementam a governança corporativa.
Explicar a continuidade das organizações a partir da separação entre a propriedade e o controle despertou o interesse de estudos desde Adam Smith (1776). O problema essencial relacionado à estrutura de propriedade e controle foi pela primeira vez tratado na obra The Wealth of Nations que apontou negligências e imprudências por parte dos administradores, atitudes comuns àqueles que administram as empresas com recursos de terceiros e de proprietários. Nessa obra, Adam Smith parecia estar preocupado com aspectos teóricos sobre a separação entre a propriedade e controle, no entanto, o estudo não evoluiu para constatações e evidências empíricas que pudessem sustentar a veracidade das proposições.
Em oposição as ideias clássicas de Adam Smith (1776), Coase (1937) denunciou uma tendência na Teoria Econômica para se realizar análises a partir da empresa individual e não da indústria. Tornava-se, portanto, necessário uma definição de empresa que correspondesse ao mundo real, pois o mercado vê a empresa não como uma organização, mas como um organismo. Coase (1937) afirmou que os custos para se organizar a produção seriam determinados pelo mercado, e poderiam ser reduzidos, mas não eliminados. Nesse sentido, todos os fatores que movimentam a engrenagem da produção seriam regidos por estes contratos formais e informais para definir o montante da remuneração dos fatores de produção.
Hermalin e Weisbach (2003), argumentam que os Conselhos de Administração representam uma solução de mercado que ameniza os problemas de agência das organizações, decorrentes da complexidade e do caráter defeituoso e incompleto dos contratos. A atuação dos conselheiros ajuda a evitar escândalos corporativos e a destruição do valor da empresa, assim como a maximização da riqueza dos acionistas e agregação de valor à empresa. Desse modo, uma das atribuições do Conselho de Administração é avaliar os executivos e seu desempenho, atuando como órgão consultivo no processo de tomada de decisões.
Para Vafeas (2000) os Conselheiros assumem funções de decisão e controle, sendo a primeira por meio da escolha da estratégia adequada para investimentos financeiros de curto e longo prazos e a segunda para definir a contratação de administradores e o acompanhamento das decisões de direcionamento de capital, via acompanhamento de relatórios de informações financeiras e contábeis. Consequentemente, os Conselhos de Administração atuam como intermediadores entre os fornecedores de capital e os gestores, na busca por assegurar a proteção legal dos investimentos, o monitoramento dos contratos e o alinhamento dos interesses, visando minimizar os conflitos de agência.
Os membros do Conselho de Administração devem apresentar competências específicas para o desempenho das funções, alguns aspectos que podem ser elencados, de acordo com o IBGC (2015), como desejáveis para a adequada atuação do conselheiro: absoluta integridade pessoal; capacidade de compreender e analisar relatórios contábeis e financeiros; total ausência de conflitos de interesses; disponibilidade de tempo para exercer a função; motivação para interagir com as metas da empresa; relevante alinhamento com os valores e com a missão da organização perante o mercado e ainda o conhecimento e a predisposição de multiplicar as melhores práticas de governança corporativa.
As qualificações desejadas para o futuro conselheiro são aquelas relacionadas às experiências e conhecimentos adquiridos ao longo da vida, tais como: participação em Conselhos de Administração reconhecidos por sua excelência; experiência como executivo principal; destacada capacidade em administrar crises; entender de finanças corporativas e análise de riscos de investimentos; possuir profundos conhecimentos contábeis; deter amplos conhecimentos do ramo onde a empresa está inserida; conhecer o mercado nacional e internacional; ter visão estratégica e contatos de interesses da empresa na economia globalizada IBGC (2015).
Berle e Means (1932) defenderam que a propriedade se tornou mais dispersa em função da pulverização da propriedade das ações da empresa, ofertadas no mercado e distribuídas entre um número cada vez maior de acionistas, com participação minoritária, e de outro lado o poder estar mais concentrado, determinado pela aglutinação do poder econômico das grandes corporações. A separação entre propriedade e controle pode criar situações de conflito entre proprietários e administradores, pois os interesses destes, na maioria das vezes, são divergentes. Isto ocorre porque os proprietários tendem a almejar a maximização do valor da empresa, enquanto os administradores, por exercitarem o livre arbítrio, agem privilegiando seus interesses próprios.
Em 1937, no estudo intitulado The Nature of the Firm,o economista britânico Ronald Coase, estabeleceu uma crítica à noção clássica tradicionalista que considerava a firma uma função da produção, definindo as firmas como um conjunto de contratos formais ou informais organizados com o objetivo de diminuir os custos de transação e viabilizar a participação da empresa nos mercados. Nessa definição, os agentes econômicos individuais não atuariam diretamente no mercado, sendo as empresas as entidades que seriam idealizadas e estruturadas para esse fim, o que deu origem à Teoria da Firma, com o propósito de estudar o comportamento das unidades de produção e sua relação com o mercado em que atuam. Assim, a firma é responsável por estabelecer relações orgânicas entre os agentes econômicos, na medida em que, além dos custos de produção, existem custos de transação.
Já no estudo de Coase de 1960, intitulado The Problem of Social Cost, houve o aprimoramento do conceito de custos de transação, incorporando a preocupação com os conflitos de interesses universais, na figura dos custos sociais, que norteiam as incertezas entre a firma e os demais agentes do mercado. A princípio, pode-se mencionar todos os acordos contratuais, entre o empregador e o empregado, aqui entendidos como sindicatos ou o Estado e seus Governados. A firma enquanto fenômeno econômico permite centralizar e organizar a produção e diminuir os custos de transação (contratuais, informacionais, trabalhistas) além dos insumos da produção que recaem sobre o empreendedor, em razão das instabilidades e imperfeições do mercado.
Para Williamson (1988), a firma serve para minimizar os custos de transação frente aos oportunismos desencadeados pelos indivíduos. Consequentemente, o fluxo das transações entre os agentes econômicos na empresa requer mecanismos de incentivos, bem como formas para superar conflitos de interesse e atividades que buscam alcançar a continuidade das transações no mercado.
A concepção da firma enquanto Organização, nasce das ações coordenadas entre os indivíduos, transformando conflitos em cooperação, mobilizando recursos e coordenando esforços para sua sobrevivência. Do ponto de vista evolucionista, a firma e sua capacidade de responder às alterações do meio, dependem de quatro pontos: (i) aprendizagem e rotina; (ii) sentido de dependência; (iii) ambiente e seleção; (iv) competência central (CORIAT; DOSI, 1998). A evolução da firma se deu com a capacidade da mesma em responder as alterações do meio e transformar conflitos em cooperação, determinando sua sobrevivência, concentrando os esforços em aprendizagem com novas oportunidades comportamentais com ênfase em procedimentos que desenvolvam vantagens competitivas (CORIAT; WEINSTEIN, 1999).
Jensen e Meckling (1976) aprofundaram a Teoria da Agência a partir de problemas decorrentes da separação da propriedade e controle, apontando que os administradores das empresas e os proprietários dos negócios possuem interesses e objetivos muito diferentes: (i) os acionistas e proprietários buscam a maximização do valor da empresa e a partir dessa valorização, o aumento do retorno do capital investido; (ii) os gestores vislumbram estratégias baseadas nas suas preferências pessoais que não necessariamente coincidem com a dos proprietários e acionistas, e na inexistência de mecanismos e incentivos para monitorar as atitudes dos administradores, esses podem exercer seu livre arbítrio, inclusive em oposição aos interesses dos proprietários.
Fama e Jensen (1983a) explicaram que em organizações mais complexas, as reivindicações residuais são difundidas entre muitos agentes. O custo de monitoramento do controle de decisão é alto com muitos participantes, como consequência existe separação de risco residual, que geram problemas de agência entre demandantes residuais e os agentes de decisão. A separação do controle de decisão, em todos os níveis, ajudaria a equacionar os problemas por meio da limitação do poder de decisão de agentes individuais que possuem interesses residuais. O controle nas organizações complexas seria hierárquico e as iniciativas de decisão dos agentes de nível inferior repassadas aos agentes de nível superior, primeiro para confirmação e na sequência para o monitoramento.
Para Fama e Jensen (1983b) a empresa de capital aberto seria uma incrível invenção social, indivíduos voluntariamente confiam seus recursos aos cuidados de gestores profissionais, que a partir de um complexo conjunto de contratos definem os direitos das partes envolvidas num cenário de custos de agência. As empresas de capital aberto desenvolvem maior chance de sobreviver, em um cenário onde as ações são livremente negociadas e os acionistas exercem a liberdade plena em relação aos negócios da empresa e favorecem economias de escala, que envolvem grandes riscos e grandes demandas.
Dez anos depois, em 1994, houve uma nova roupagem da Teoria do Agente, quando no artigo The Nature of Man, Jensen e Meckling apresentam que a hipótese fundamental da Teoria da Agência, nasceu do fato de que os agentes e o principal são pessoas de natureza humana, por vezes diferentes e com interesses individuais diversos. Assim, os indivíduos são recursos e respondem com criatividade às oportunidades que o ambiente oferece, trabalham para eliminar os obstáculos que os impedem de realizar o que desejam. Portanto, não são movidos apenas por dinheiro, mas pelo respeito, honra, poder, amor e o bem-estar que passam a fazer parte de suas expectativas a serem alcançadas.
Nesse aspecto, compreender o comportamento humano é fundamental para entender as organizações e que muitos conflitos de agência florescem a partir das diferenças de pensamento e da própria condição da natureza humana. Para Jensen e Meckling (1994) a honestidade, o egoísmo, a inteligência, a ignorância, a generosidade são atributos da individualidade que podem cultivar os desacordos contratuais entre trabalhadores, acadêmicos, políticos, cientistas, profissionais, gestores e acionistas. Os indivíduos são seres por natureza engenhosos, maximizadores e acumuladores, mas que se adaptam e respondem de acordo com as oportunidades que o ambiente oferece, possuem necessidades ilimitadas e a sociedade, por sua vez, impõe custos às pessoas que violam as regras sociais. Esse comportamento se manifesta na vida cotidiana, nas relações contratuais e nas empresas.
Para Mahoney (2007) as empresas desenvolvem um plano para atender às necessidades de seus acionistas e os programas devem preservar elementos básicos. A qualidade da informação, é a chave para o sucesso no processo de avaliação da empresa, é a informação que estabelece as diferenças entre às decisões de investimento, alicerçadas nas boas práticas e na conscientização dos investidores e compreensão do mercado. Treiger (2009) argumenta que a Relação com Investidores seria uma espécie de departamento estratégico destinado a aproximar a companhia e seus investidores potenciais. Combinando atividades de relações públicas, contabilidade e finanças, marketing e sustentabilidade.
Entende-se que o Conselho de Administração apresenta atribuições que propiciam maior credibilidade e responsabilidade à gestão corporativa, maior comprometimento dos agentes envolvidos em adoção de boas práticas de gestão, se constituindo no pilar estrutural da governança corporativa interferindo nas ações estratégicas das corporações. Isto sugere que empresas com Conselhos de Administração que observam determinadas estruturas, composições, características e processos, apresentam maior qualidade na gestão.
3 METODOLOGIA
O estudo investiga empiricamente a Qualidade do Conselho de Administração sob o ponto de vista da Teoria da Agência, alicerçada nas Melhores Práticas de Governança Corporativa (IBGC, 2015). Quanto aos objetivos, a pesquisa é classificada como descritiva e causal, na medida em que mapeia e avalia as características de empresas brasileiras que negociam suas ações na B3 (Brasil, Bolsa, Balcão) em população finita. Nesse sentido, o estudo, ex-post facto, está delimitado às empresas que possuem política de internacionalização a partir de transações com o mercado externo.
As métricas representam o conjunto de informações agrupadas, a partir de indicadores previamente definidos que proporcionam medir o desempenho de determinado objeto. Segundo Zeller e Carmines (1988) medir é o processo de vincular conceitos abstratos a indicadores empíricos, a partir da definição de um plano para mapear, classificar e quantificar os dados disponíveis em relação aos resultados que se pretende atingir. Para Babbie (2005) a métrica é um resultado mensurável na forma de itens e as categorias da métrica são representações, na forma de agrupamentos, de itens selecionados para medir o que se pretende determinar. A relação entre categorias e itens refere-se a o que, como e onde medir.
A literatura aponta diversos atributos que fundamentam a atuação e o papel do Conselho de Administração e dos Conselheiros que podem impactar na continuidade das empresas. Zahra e Pearce (1990) definem como atributos que afetam a performance do Conselho de Administração: (i) estrutura; (ii) composição; (iii) características e (iv) processos. O índice proposto para mapear a qualidade do Conselho de Administração privilegiará todos os atributos sugeridos por Zahra e Pearce (1990) e são dispostos em forma de quatro categorias, conforme apresentado na Figura 1.

As quatro categorias que compõem a métrica estão fundamentadas nas recomendações do Código das melhores práticas de Governança Corporativa do IBGC na edição de 2015 e agrupam, por natureza de interesse, os assuntos abordados, com forma de direcionar a busca pelos objetivos da pesquisa. Os 40 itens que compreendem a métrica proposta, distribuídos em suas respectivas categorias são apresentados na Figura 2.
| Itens | Descrições | Fonte |
| ESTRUTURA DO CONSELHO | ||
| 1 | CEO e presidente do Conselho são pessoas diferentes | item 2.10 |
| 2 | CEO não participa do Conselho de Administração | item 2.10 |
| 3 | Conselheiros independentes representam 50% ou mais do Conselho de Administração | item 2.16 |
| 4 | O Controlador Acionário elege o Presidente do Conselho de Administração | item 5.2 |
| 5 | Renovação dos mandatos dos Conselheiros ocorre a cada 2 anos | item 2.7 |
| 6 | Eleição de todos os membros do Conselho de Administração ocorre na mesma Assembleia | item 2.7 |
| 7 | Conselheiros independentes não possuem vínculo empregatício algum com a companhia | item 2.16 |
| 8 | O Conselho Fiscal está instalado em caráter permanente | item 2.34 |
| 9 | Comitê de Gestão de Riscos Corporativos está estruturado e em funcionamento | item 2.3.1 |
| 10 | Comitê de Divulgação de Fatos Relevantes está estruturado e em funcionamento | item 3.3 |
| 11 | Estão bem definidas as atribuições dos Conselheiros Independentes | item 2.16 |
| 12 | Comitê de Compliance está estruturado e em funcionamento | item 3.3 |
| COMPOSIÇÃO DO CONSELHO | ||
| 13 | Conselho de Administração possui entre 5 e 11 membros | item 2.14 |
| 14 | Comitê de Remuneração é composto por Conselheiros Independentes | item 2.24 |
| 15 | Comitê de Auditoria é composto por Conselheiros Independentes | item 2.28 |
| 16 | Existem membros estrangeiros no Conselho de Administração | item 2.4 |
| 17 | Não existem conselheiros internos empregados da empresa | item 2.15 |
| 18 | Não há a figura de Conselheiros Suplentes | item 2.13 |
| 19 | Presidente do Conselho de Administração não possui sobrecarga (máximo 2 empresas) | item 2.8.1 |
| 20 | Membros do Conselho de Administração não possuem sobrecarga (máximo 5 empresas) | item 2.8.1 |
| CARACTERÍSTICA S DO CONSELHO | ||
| 21 | A maior parte dos conselheiros possuem especialização Lato Sensu | item 2.5 |
| 22 | A maior parte dos conselheiros possuem especialização Stricto Sensu | item 2.5 |
| 23 | Pelo menos um conselheiro possui experiência profissional em finanças e contabilidade | item 2.4 |
| 24 | Há um especialista no setor do negócio que pertence ao Conselho | item 2.4 |
| 25 | Há Conselheiros com comprovado conhecimento e experiência no mercado internacional | item 2.4 |
| 26 | Conselheiros já foram CEO’s de outras empresas | item 2.10 |
| 27 | O Comitê de Auditoria possui pelo menos um membro da área contábil | item 2.30 |
| 28 | Há programa de treinamento de membros do Conselho de Administração | item 2.2 |
| PROCESSO DO CONSELHO | ||
| 29 | O Conselho de Administração segue Código de conduta segundo os valores da empresa | item 6.3 |
| 30 | Existem mecanismos interno/externo de avaliação dos conselheiros | item 2.18 |
| 31 | Existem canais de atendimento aos minoritários para inclusão de propostas na Assembleia | item 2.32 |
| 32 | Há mecanismos para identificação de conflitos de interesse entre os conselheiros | item 6.2 |
| 33 | Há mecanismos para avaliação de projetos com impactos socioambientais | item 2.3.2 |
| 34 | Há alinhamento interno dos pronunciamentos públicos para divulgação aos investidores | item 2.3.3 |
| 35 | Há avaliação dos conselheiros com base no envolvimento ou participação nas reuniões | item 2.18 |
| 36 | Existe Ouvidoria ou Canais de Denúncia | item 2.32 |
| 37 | As reuniões do Conselho de Administração são presenciais | item 2.38 |
| 38 | As Assembleias Gerais Ordinárias são transmitidas por teleconferências | item 1.4.2 |
| 39 | O Conselho de Administração avalia o CEO | item 3.8 |
| 40 | Conselheiros são avaliados anualmente por especialistas externos independentes | item 2.18 |
Para codificação do Índice de Qualidade do Conselho de Administração foram atribuídos 2 (dois) pontos se a afirmativa proposta na métrica for “SIM”; 1 (um) ponto se a afirmativa for “NÃO”; e 0 (zero) quando a empresa NÃO DECLARAR as informações propostas para cada um dos itens do índice.
Em função desses critérios, as empresas receberam uma pontuação individual absoluta que variou entre 0 e 80 pontos (40 itens da métrica vezes a pontuação máxima dois pontos). Para o cálculo do Índice de Qualidade do Conselho de Administração (IQCA) divide-se a pontuação da empresa, pela pontuação máxima, resultando um índice entre 0 a 1.
Para verificar a confiabilidade interna do Índice de Qualidade do Conselho de Administração (IQCA) foi realizado o teste de Alfa de Cronbach, ex-post facto a coleta de dados. Conforme Cooper e Schindler (2003) a consistência interna de um instrumento mensurado pelo Alfa de Cronbach varia entre 0 e 1 representando a média de todos os coeficientes de correlação entre o score de cada item e o score total dos demais itens. Quando o índice for maior que 0,7 pode-se dizer que há confiabilidade interna nas medidas.
A amostra é composta por 85 empresas listadas na B3 (Brasil, Bolsa, Balcão) que apresentaram algum grau de internacionalização. A coleta de dados ocorreu por meio dos Formulários de Referências disponibilizados no website da Comissão de Valores Mobiliários. Na Tabela 1 apresentam-se os setores econômicos comtemplados pelo estudo, o nome das empresas e o código que a identifica nos gráficos e tabelas da pesquisa.
| Setor de Bens Industriais (27,06 %) | Códigos | Setor Consumo Cíclico (20,00 %) | Códigos |
| Contax | 21 | Alpargatas | 2 |
| Embraer | 24 | Arezzo | 5 |
| Eternit | 25 | Cambuci | 14 |
| Forjas Taurus | 29 | Cia Coteminas | 17 |
| Fras-Le | 30 | Cia Santanense | 18 |
| Gol | 32 | Hoteis Othon | 33 |
| Indústrias Romi | 34 | IMC | 35 |
| Invepar | 36 | Iochpe-Maxion | 37 |
| JSL | 40 | Karsten | 41 |
| Kepler | 42 | Kroton | 44 |
| Log-in | 45 | Mahle - Metal Leve | 48 |
| Marcopolo | 49 | Mundial | 55 |
| Metalfrio | 51 | Time For Fun | 71 |
| Metisa | 52 | Teka | 74 |
| Mills | 53 | Unicasa | 79 |
| Portobello | 61 | Vulcabrás | 83 |
| Randon | 65 | Whirlpool | 85 |
| Schulz | 67 | Setor de Consumo não Cíclico (12,94 %) | |
| Sondotécnica | 69 | Ambev | 4 |
| Tegma | 73 | BomBril | 10 |
| Tupy | 77 | BRF | 12 |
| Valid | 82 | Consevas Oderich | 20 |
| Weg | 84 | JBS | 39 |
| Setor Financeiro (7,06 %) | Marfrig | 50 | |
| B3 | 6 | Minerva | 54 |
| Bco Brasil | 7 | Natura | 56 |
| Bco BTGP | 9 | São Martinho | 66 |
| Cielo | 19 | SLC Agrícola | 68 |
| Itaú Unibanco | 38 | Terra Santa | 75 |
| Tarpon | 72 | ||
| Setor de Materiais Básicos (17,65 %) | Códigos | Setor Petróleo, Gás e Biocombustíveis (4,71 %) | Códigos |
| Braskem | 11 | Lupatech | 46 |
| Cia Ferbasa | 15 | Petro Rio | 62 |
| Cia Sid Nacional | 16 | Petrobrás | 63 |
| Duratex | 22 | Ultrapar | 78 |
| Elekeiroz | 23 | ||
| Eucatex | 26 | Outros Setores (10, 59 %) | |
| Fibam | 27 | Algar Telec | 1 |
| Fibria | 28 | Alupar | 3 |
| Gerdau | 31 | Baumer | 8 |
| Klabin | 43 | BRQ | 13 |
| Magnesita | 47 | Nortec | 57 |
| Paranapanema | 60 | Oi | 58 |
| Suzano | 70 | Ourofino | 59 |
| Usiminas | 80 | Positivo | 64 |
| Vale | 81 | Totvs | 76 |
4 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
O Índice de Qualidade do Conselho de Administração (IQCA) foi codificado a partir das informações disponibilizadas pelas 85 empresas da amostra nos Formulários de Referência nos anos de 2012 a 2016 no site da B3 (Brasil, Bolsa, Balcão) ou no âmbito da Central de Downloads das Relações com os Investidores da empresa. A pontuação alcançada pela empresa nos 40 itens da métrica, dividida pela pontuação máxima 80 pontos, permitiu a obtenção de um índice compreendido entre 0 (zero) e 1 (um), onde valores mais próximos de 1 (um) identificam empresas com maior qualidade do Conselho de Administração.
No presente estudo, o Alfa de Cronbach, medida de validação interna, calculado para a métrica de Qualidade do Conselho de Administração foi da ordem de (0,9036) para o ano de 2012; (0,8596) em 2013; (0,7066) para o ano de 2014; (0,8850) em 2015 e finalmente alcançou (0,8966) em 2016.Estes valores indicam que há uma boa consistência interna do instrumento. Além disso, não houve indicativo de que a exclusão de algum item específico do IQCA pudesse alterar significativamente a confiabilidade do índice. O Alfa de Cronbach médio para os dados coletados foi da ordem de 0,8503 para o período compreendido entre os anos de 2012 e 2016.
Na tabela 2 apresenta-se o alfa de Cronbach por categoria da métrica para o Índice de Qualidade do Conselho de Administração.
As categorias da métrica para IQCA apresentaram no período 2012-2016 os valores de alfa de Cronbach médio conforme segue: Categoria Estrutura 0,6137; Composição 0,5085; característica 0,5877; Processo 0,6919. O alfa de Cronbach total é da ordem de 0,8503.
Na Tabela 3 apresentam-se as estatísticas descritivas do IQCA – Índice de Qualidade do Conselho de Administração.
| Categoria / ano | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | 2012 - 2016 |
| Estrutura | 0,7194 | 0,6373 | 0,3905 | 0,6541 | 0,6672 | 0,6137 |
| Composição | 0,6292 | 0,5291 | 0,3028 | 0,5471 | 0,5345 | 0,5085 |
| Característica | 0,7054 | 0,6381 | 0,2771 | 0,6581 | 0,6600 | 0,5877 |
| Processo | 0,7231 | 0,6702 | 0,5996 | 0,7224 | 0,7441 | 0,6919 |
| Total | 0,9036 | 0,8596 | 0,7066 | 0,8850 | 0,8966 | 0,8503 |
| Medidas Estatísticas | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | 2012 - 2016 |
| Média | 0,6676 | 0,6843 | 0,7166 | 0,7241 | 0,7526 | 0,7091 |
| Desvio padrão | 0,1210 | 0,0968 | 0,0619 | 0,1005 | 0,1034 | 0,0787 |
| Coeficiente deVariação | 0,1813 | 0,1415 | 0,0864 | 0,1387 | 0,1374 | 0,1109 |
| Mínimo | 0,0000 | 0,0000 | 0,5375 | 0,0000 | 0,0000 | 0,0000 |
| Primeiro Quartil | 0,6500 | 0,6625 | 0,6875 | 0,7000 | 0,7250 | 0,6800 |
| Mediana | 0,6875 | 0,6875 | 0,7250 | 0,7375 | 0,7750 | 0,7225 |
| Terceiro Quartil | 0,7250 | 0,7375 | 0,7625 | 0,7625 | 0,8000 | 0,7500 |
| Máximo | 0,8250 | 0,8250 | 0,8250 | 0,8375 | 0,8625 | 0,8625 |
O coeficiente de variação do IQCA apresentou média de 0,1109, seu valor mais alto 0,1813 em 2012 e seu menor valor em 2014 na casa de 0,0864 que definem quanto o desvio padrão atinge a média. O desvio padrão foi de 0,0619 em 2014 e para todos os anos analisados essa tendência de proximidade da série estatística com a média se manteve. A média do IQCA se apresentou em 0,7091 para o período, sendo que os valores transitam entre 0,6676 em 2012 e 0,7526 em 2016.
Verifica-se o crescimento do IQCA ao longo dos anos e em relação as empresas quando analisadas individualmente, nota-se uma tendência de manutenção dos índices em torno de um valor médio, sem grandes alterações, também é possível visualizar o crescimento do índice com a passar dos anos do período estudado. O valor máximo 0,8625 ocorreu no ano de 2016. Na Tabela 4 apresenta-se a estatística descritiva do IQCA por Setor Econômico.
| Medidas Estatísticas | Bens Industriais | Consumo Cíclico | Consumo não Cíclico | Financeiro | Materiais Básicos | Petróleo e Gás | Outros |
| Média | 0,7183 | 0,6799 | 0,7323 | 0,7608 | 0,7117 | 0,7613 | 0,6503 |
| Desvio padrão | 0,0676 | 0,0656 | 0,0785 | 0,0559 | 0,1280 | 0,0705 | 0,1848 |
| Coef. Variação | 0,0941 | 0,0965 | 0,1072 | 0,0734 | 0,1799 | 0,0926 | 0,2842 |
| Mínimo | 0,5500 | 0,4750 | 0,5375 | 0,6750 | 0,0000 | 0,6125 | 0,0000 |
| Primeiro Quartil | 0,6750 | 0,6500 | 0,7000 | 0,7156 | 0,6875 | 0,7000 | 0,6500 |
| Mediana | 0,7250 | 0,6875 | 0,7375 | 0,7750 | 0,7375 | 0,7750 | 0,6875 |
| Terceiro Quartil | 0,7625 | 0,7250 | 0,7875 | 0,8094 | 0,7750 | 0,8250 | 0,7375 |
| Máximo | 0,8500 | 0,8250 | 0,8625 | 0,8500 | 0,8250 | 0,8500 | 0,8000 |
| Empresas | 23 | 17 | 11 | 6 | 15 | 4 | 9 |
| Observações | 115 | 85 | 55 | 30 | 75 | 20 | 45 |
Observa-se que o setor de Petróleo e Gás apresenta a maior média 0,7613 de IQCA. O setor de Consumo não Cíclico apresenta o valor máximo 0,8625 e o setor de consumo cíclico o valor mínimo 0,4750 para IQCA. Na Figura 3 apresenta-se graficamente a evolução do Índice de Qualidade do Conselho de Administração, que varia de 0 (zero) até 1 (um), sendo que valores mais próximos de 1 (um) representam maior qualidade do Conselho de Administração para as 85 empresas elencadas para o estudo.
Observa-se que índice IQCA aumentou ao longo do tempo para as empresas da amostra, no início da série em 2012 os valores dos índices são inferiores e com o passar do tempo, vão sofrendo representativo aumento, na medida em que as curvas que definem a tendência vão se distanciando em relação ao centro, evidenciando o aumento da qualidade do Conselho de Administração ao longo do tempo de acordo com as recomendações do IBGC.
No ano de 2016 verificam-se os valores mais elevados da série, tendo em vista que as empresas tendem a buscar melhorias contínuas em seus padrões administrativos para atender as crescentes demandas do mercado por responsabilidade social, ambiental e transparência nas relações da empresa com o mercado.

Nesse período o índice IQCA mínimo oscilou entre 0,4750 e 0,6750 em 2012. A média do índice apresentou valores que variaram de 0,6503 até 0,7613 no período de cinco anos, os valores máximos, por sua vez, se apresentaram entre 0,8000 e 0,8625 em 2016, evidenciado a crescente preocupação das organizações em atender as melhores práticas de governança corporativa. Os melhores índices IQCA foram alcançados em 2016, com destaque para a empresa JBS com 0,8625 seguida das empresas Embraer, Natura, Itaú-Unibanco, Petro Rio e Mills, todas alcançando o índice IQCA de 0,8500.
Na Figura 4 apresentam-se os 40 itens que compõem a métrica de IQCA, no período2012 e 2016, sendo que a pontuação máxima possível para cada item é de 170 pontos.

A Figura 4 demonstra que no ano de 2016 a pontuação da métrica é maior do que aquela conquistada no ano de 2012, evidenciando a evolução do Índice de Qualidade do Conselho de Administração ao longo do tempo. Essa tendência também pode ser verificada pela forma como as curvas que representam cada item, nos anos de 2012 até 2016, tendem a se afastar do centro (zero) e se aproximar da pontuação máxima (170 pontos). Vale destacar que para codificação do Índice de Qualidade do Conselho de Administração foram atribuídos 2 (dois) pontos se a afirmativa proposta na métrica for “SIM”; 1 (um) ponto se a afirmativa for “NÃO”; e 0 (zero) quando a empresa NÃO DECLARAR as informações propostas para os itens do índice.
Em função desses critérios para codificação, as empresas receberam uma pontuação individual absoluta que variou entre 0 e 80 pontos (40 itens da métrica vezes a pontuação máxima dois pontos). Para o cálculo do Índice de Qualidade do Conselho de Administração (IQCA) dividiu-se a pontuação absoluta de cada empresa, pela pontuação absoluta máxima da métrica que resultou em um índice que variou em uma escala de 0 a 1. Valores mais próximos de 1 representam melhor Índice de Qualidade do Conselho de Administração.
A categoria Estrutura envolve aspectos relacionados aos comitês e suas competências que dão suporte ao Conselho de Administração e que abrangem os diversos aspectos relacionados ao fluxo da informação entre os comitês e os conselheiros, diretores, empregados, acionistas e o ambiente institucional que possui vínculos com a empresa. Na Figura 5 apresenta-se o IQCA para os itens que compõem a categoria Estrutura do Índice de Qualidade do Conselho de Administração.

Na categoria Estrutura do Conselho, o item 12 foi o que apresentou maior evolução. Esse item trata do Comitê de Compliance, sua estruturação e seu funcionamento. No universo das empresas pesquisadas no ano de 2012 eram apenas 7 organizações ou 8,0 % da amostra que possuíam Comitê de Compliance, esse número subiu para 37 empresas ou 44,0 % da amostra no ano de 2016. Para Bielgelman (2008) as empresas passaram a adotar uma estrutura formal para assegurar o cumprimento da lei, conhecedoras das consequências que sofreriam se não a cumprissem, focados nas características pessoais e profissionais dos colaboradores, incluindo temas de ética empresarial e de Compliance. São responsabilidades do compliance assegurar o fortalecimento e o funcionamento do sistema de controles internos, diminuindo os riscos, disseminando a cultura do cumprimento das leis e normas que regulamentam as atividades da empresa (COIMBRA; MANZI, 2010).
Na categoria Composição do Conselho, que evidencia o tamanho do conselho, quantidade de membros e o tipo dos conselheiros internos, externos ou independentes, além de aspectos relacionados a participação e a representação dos acionistas minoritários.
O comportamento dos itens da métrica para IQCA da categoria Composição do Conselho de Administração são apresentados na Figura 6.
O comportamento dos itens da métrica para a categoria composição do Conselho de Administração demonstra que as empresas adotam uma postura caracterizada por poucas mudanças ao longo do tempo. O item 13 preconiza que os Conselhos devem variar entre 5 e 11 conselheiros. No ano de 2012, 50 empresas atendiam essa orientação e no ano de 2016 esse número subiu para 70 empresas. Lipton e Lorsch (1992) apontam que o tamanho do Conselho pode estabelecer a falta de diálogo dos conselheiros, quando um Conselho de Administração possui um número elevado de membros, torna-se difícil a expressão das opiniões e ideias no tempo limitado das reuniões.

Na categoria Característica do Conselho ressaltou-se a experiência e formação acadêmica dos conselheiros, a independência para o trabalho e o desempenho dos conselheiros em suas atividades e tarefas. A experiência foi refletida por meio da formação acadêmica, valores pessoais e estilo de trabalho que refletem a disposição para contribuir, demonstrando interesse pela empresa e em defesa dos acionistas e stakeholders. Na Figura 7 apresenta-se o IQCA para categoria Características do Conselho de Administração.
Nessa categoria, o item 28 da métrica apresentou maior variação. Esse item trata da existência dos programas de treinamento dos membros do Conselho de Administração, no ano de 2012 eram 24 empresas ou 28,0 % da amostra, esse número se elevou para 72 empresas que representavam 85,0 % no ano de 2016. Tracey, Tannenbaum e Kavanagh (1995) sugerem que a profissionalização nasce dos treinamentos, gerando homogeneização das organizações. Nesse sentido, é preciso desenvolver um ambiente organizacional de aprendizagem contínua, que propicie oportunidades e alinhamento dos interesses de proprietários e administradores.
A categoria Processo do Conselho que trata das atividades de tomada de decisões, realização das reuniões e aspectos relacionados à frequência e duração, a formalidade dos procedimentos, o monitoramento das relações entre os conselheiros e os executivos das empresas, o consenso entre as partes envolvidos, a resolução de conflitos de interesse e as avaliações dos conselhos, seus comitês e conselheiros. Na Figura 8 apresenta-se o Comportamento do IQCA para categoria Processos do Conselho de Administração.


A categoria Processo do Conselho apresentou vários itens com evolução ao longo da série, evidenciando a preocupação com a transparência das atividades e participação dos conselheiros. Destaca-se o item 29 da métrica, que questionou se o Conselho de Administração segue um Código de Conduta segundo valores da empresa. Em 2012 64,0% das empresas seguiram o Código de Conduta e no ano de 2016 esse percentual subiu para 85,0% da amostra. Essa evolução sinaliza a crescente preocupação das empresas com atitudes que repercutem no meio empresarial e na sociedade. Em estudos sobre Códigos de Ética, Helin e Sandstrom (2007) verificaram a forma de comunicação, identificando que a falta de conhecimento sobre Códigos de Ética afeta o comportamento nas organizações e que as empresas eticamente orientadas geram lucro, protegem o meio ambiente e melhoram a vida em sociedade. Para melhorar a imagem, empresas adotam Códigos de Ética, dessa forma tornam públicas suas virtudes e criam uma imagem de investidores conscientes, pelo fato de inserirem o aspecto humano nas práticas de governança corporativa, qualificando sua visão social com alto grau de transparência que repercute em toda sociedade (STEVENS, 2008).
O item 36 questiona a existência de ouvidoria e canais de denúncia, observa-se que no ano de 2012 o percentual da amostra era de 31,0% e ocorreu uma elevação para 87,0% da amostra em 2016.Para Cohen e Felson (1980) o canal de denúncia é um instrumento relevante que pode atuar no comportamento do potencial fraudador, dissuadindo-o do ato e reduzindo a ocorrência de delitos, é apontado como ferramenta eficaz no combate às fraudes. As fraudes, estão relacionadas ao ambiente organizacional, fato que dificulta sua detecção, tanto pela peculiaridade operacional, quanto pela singularidade dos colaboradores. Essa característica sistêmica das organizações determina demandas por esforços maiores para combater fraudes decorrentes das imperfeições dos controles (JOHANSSON; CAREY, 2016).
5 CONCLUSÕES
A separação das funções de proprietário do capital e de administrador do negócio, papéis defendidos na Teoria da Agência, aponta a dificuldade em monitorar as escolhas que permeiam as relações entre o agente e o principal. Os problemas decorrentes da separação da propriedade do capital e do controle da gestão e a complexidade das operações envolvidas, passou a exigir profissionais mais especializados, com a finalidade de equacionar conflitos de interesses e custos de monitoramento. Nessa relação, emergem problemas relacionados às divergências entre as decisões tomadas pelos administradores e as exigências dos proprietários em relação às remunerações do capital investido.
Os Conselhos de Administração representam uma solução e uma exigência de mercado que amenizam os problemas de agência das organizações, decorrentes da complexidade e do caráter defeituoso e incompleto dos contratos. A constituição do Conselho de Administração eficaz, com a adoção das melhores práticas de governança corporativa, em diferentes áreas da administração, contribui para a prosperidade do negócio. A delimitação do papel do Conselho de Administração tem por objetivo estabelecer uma ponte entre os direitos dos sócios e acionistas proprietários do negócio e os administradores gestores do negócio, visando a maximização dos interesses.
Estudos tratam o Conselho de Administração como mais um item do índice de governança corporativa. Como principal contribuição acadêmica o estudo inovou metodologicamente ao apresentar o índice de qualidade do Conselho de Administração com métrica de 40 itens divididos nas categorias: estrutura; composição; característica e processo. O alfa de Cronbach, foi apresentado por categoria e por ano para validação interna do instrumento, conduzindo o Conselho de Administração ao patamar de importância que ele representa no mundo corporativo, como principal órgão da governança, que delibera sobre a continuidade da empresa e não apenas mais um órgão interno da complexa estrutura de governança corporativa.
Os principais resultados alcançados pelo estudo estão alicerçados na elaboração do Índice de Qualidade do Conselho de Administração que apresentou Alfa de Cronbach médio para os dados coletados de 0,85036 indicando que há uma boa consistência interna do instrumento. A evolução do IQCA permite identificar a crescente preocupação das empresas no caminho das melhores práticas de governança em todas as categorias da métrica. Os resultados permitiram a elaboração de gráficos por categorias, setores e itens do índice, evidenciando a evolução das Características e Processos e o engessamento da Estrutura e Composição. O estudo ratifica o Conselho de Administração como principal órgão da Governança Corporativa que delibera sobre a continuidade da empresa. Todos os setores da B3 (Brasil, Bolsa, Balcão) estão representados, reforçando a relevância do estudo em função de que a preocupação com a qualidade do Conselho de Administração nas organizações, não está restrita a setores específicos.
A Contribuição empresarial do estudo está em sinalizar para o mercado, o potencial do Conselho de Administração na atração de investidores, em função da ilibada conduta pessoal de seus membros, aliada às características empresariais e profissionais, indicando que a empresa pretende continuar investindo na produção de bens e serviços de qualidade, agregando valor às ações e maximizando o valor da empresa. Também contribui para evidenciar que a transparência, o compliance e melhores práticas de governança, possibilitam que mensagens transmitidas pelas percepções do mercado em relação a companhia e seus administradores, em caminho de mão dupla, sejam recebidas e compreendidas.
O estudo contribui para o desenvolvimento da sociedade, na medida em que fomenta a discussão dos mecanismos internos de Governança Corporativa, representados aqui pela busca da excelência na atuação dos Conselhos de Administração, colaborando para a amplitude das discussões dessa temática, em função de que a crescente participação dos indivíduos no mercado investidor, têm exigido maior transparência para as transações e, na medida em que incorpora novos aportes de investimentos internos e externos, abre novos caminhos e diversifica o mercado de capitais, fomentando novas oportunidades que se espalham pela economia.
A subjetividade na seleção dos itens da métrica para qualidade do conselho de administração, com base nas melhores práticas de Governança Corporativa (IBGC, 2015) constitui uma limitação do presente trabalho. Nesse sentido, a construção deste trabalho produziu inquietações que se materializam na forma de propostas para pesquisas futuras. Ressalte-se que o Índice de Qualidade do Conselho de Administração pode ser ampliado e melhor avaliado com a identificação de pesos para cada categoria da métrica proposta.
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