Filosofia

Auto-Organização: uma pequena revisão e rápida proposta de utilização

Self-Organization: a small review and quick proposal for use

Kleber Cecon
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Brasil

Auto-Organização: uma pequena revisão e rápida proposta de utilização

Acta Scientiarum. Human and Social Sciences, vol. 42, núm. 3, 55191, 2020

Universidade Estadual de Maringá

Recepción: 11 Agosto 2020

Aprobación: 30 Noviembre 2020

Resumo: A auto-organização é um processo que tem sido largamente discutido em diversas áreas de estudo e articulado com um número cada vez maior de áreas do conhecimento. O foco deste artigo é realizar uma revisão dos principais conceitos de auto-organização como auto-organização primária, secundária, atratores e elementos formadores, além de outros conceitos relacionados a esses como, por exemplo, determinismo e autopoiesis. Para isso, será revisada, rapidamente, a proposta de autores clássicos no que diz respeito à investigação do tema, como Ashby e Von Foerster, com uma atenção especial para a posição de Michael Debrun. Um ponto secundário deste artigo, que está mais disposto, concisamente, no final do texto, consiste em refletir sobre a possibilidade de aplicação dos conceitos de auto-organização aos estudos da prática científica. Quando é avaliada a potencialidade de se estudar a ‘ciência’, a partir de uma abordagem auto-organizacional, é possível perceber como ela parece ser frutífera e versátil.

Palavras-chave: Auto-organização primária, auto-organização secundária, atratores, determinismo, autopoiesis.

Abstract: Self-organization is a process that has been widely discussed in several areas of study and has been articulated with an increasing number of areas of knowledge. The focus of this article is to carry out a review of the main concepts of self-organization such as primary, secondary self-organization, attractors and forming elements, in addition to other concepts related to these, for example, determinism and autopoiesis. To this end, the views of classic authors on the subject, such as Ashby and Von Foerster, will be quickly reviewed, with special attention to Michael Debrun’s position. A secondary point of this article, which is more concisely disposed at the end of the text, is to reflect on the possibility of applying the concepts of self-organization to studies of scientific practice. When assessing the potential of studying ‘science’ within a self-organizational approach, it is possible to see how it seems to be fruitful and versatile.

Keywords: Primary self-organization, secondary self-organization, attractors, determinism, autopoiesis.

Introdução

Auto-Organização

Auto-organização é um processo que tem sido largamente discutido em diversas áreas de estudo como biologia (Witzany, 2014), química (Lehn, 1990), física (Ansari & Smolin, 2008), computação (Asaro, 2007), economia (Krugman, 1996), sociologia (Leydesdorff, 1993), linguagem (De Boer, 2011), computação (Lynn et al, 2016) e até mesmo em tópicos muito específicos como organização social de insetos (Bonabeau, Theraulaz, Deneubourg, Aron, & Camazine, 1997) e tráfego de veículos (Kerner, 1998). Este tema parece articular-se progressivamente e tornar-se foco de um número cada vez maior de áreas do conhecimento.

O termo ‘auto-organização’ surgiu pela primeira vez no contexto da cibernética (Pessoa Jr., 2001), em um artigo de autoria de William Ross Ashby (1903-1972) (Ashby, 1947), médico, matemático e neurologista inglês, também um dos pioneiros da cibernética e da teoria da complexidade (Ashby, 2004, p. 102). Na época em que o artigo havia sido escrito, em 1946, Ashby ainda era um psiquiatra (Pessoa Jr., 2001, p. 26). O artigo se inicia da seguinte forma:

Tem sido amplamente negado que uma máquina pode ser ‘auto-organizada’, ou seja, que possa ser determinada e, ainda assim, passível de sofrer mudanças espontâneas de organização interna. A questão de que se tal coisa pode ocorrer não é de interesse puramente filosófico, pois é também um problema fundamental da teoria do sistema nervoso. Existem muitas evidências que o sistema é tanto (a) um sistema físico-químico estritamente determinado, e (b) que ele pode sofrer reorganizações internas ‘auto-induzidas’, resultando em alterações de comportamento. O que tem sido assumido é que esses dois requisitos são mutualmente exclusivos (Ashby, 1947, p. 125, grifos do autor).

Ashby basicamente escreveu o artigo para demonstrar que é possível mostrar que uma máquina pode ser estritamente determinada em suas ações e, ao mesmo tempo, realizar em si mesma uma mudança de organização interna. Ashby consegue resolver esse problema afirmando que bastaria que não fosse observável ou conhecida alguma variável do sistema, dessa forma ele pareceria espontâneo, porém, não o seria de fato. Caso todas as variáveis do nosso sistema nervoso fossem computadas e consideradas (o que dada sua complexidade seria praticamente impossível) ele não pareceria mais espontâneo (Pessoa Jr., 2001). Não seria incorreto afirmar que a visão de Ashby parece ser de um determinista. É até irônico notar o termo ‘auto-organização’ ser usado inicialmente em um panorama deste tipo, visto que seu significado mais atual (em pensadores como Michel Debrun, por exemplo) parece não coadunar muito bem com o determinismo estrito (salvo em um caso em que se suponha uma criatividade determinista), como será visto mais adiante.

O austro-americano Heinz Von Foerster (1911-2002) parece ter sido outro personagem importante na história da auto-organização. É atribuído a ele o desenvolvimento da cibernética de segunda ordem. Entre suas contribuições relevantes está a sua famosa distinção entre máquinas ‘triviais’ e ‘não triviais’ que é um ponto de partida para reconhecer a complexidade do comportamento cognitivo (Von Foerster, 1996). Do ponto de vista da auto-organização, Von Foerster parece privilegiar o ambiente e seu papel nos processos auto-organizacionais. É possível confirmar isso nestes trechos de uma palestra ministrada por ele em 1959:

Já que você indubitavelmente observou que em minha filosofia sobre sistemas auto-organizados o ambiente de tais sistemas é uma conditio sine qua non, eu sou primeiramente obrigado a demonstrar em qual sentido nós podemos falar sobre a existência de tais ambientes [...].

[...] Deixe-me brevemente sumarizar os pontos que eu expus até o momento: (1) Por sistema auto-organizado eu entendo aquela parte do sistema que consome energia e ordem de seu ambiente. (2) Existe uma realidade do ambiente num certo sentido sugerido pela aceitação do princípio de relatividade. (3) O ambiente tem estrutura (Von Foerster, 1960, p. 34; 36).

Von Foerster parece dar muita ênfase ao ambiente e sua estrutura, pois atribui a ele a organização de um sistema auto-organizado. Daí a ênfase em seu artigo, inclusive, de tentar provar, via reductio ad absurdum, que o ambiente realmente existe, minando uma suposta posição solipsista (Von Foerster, 1960). Von Foerster parece considerar que existe auto-organização quando há um aumento da redundância do sistema ou quando ocorre ao mesmo uma diminuição de sua entropia. Daí perguntas relevantes como quanta ordem um sistema consegue assimilar de seu ambiente e a importância de entender a relação do sistema e seu ambiente. Von Foerster parece ter sido o primeiro a relacionar auto-organização com conceitos termodinâmicos de ordem e entropia. Dessa forma, parece não haver um sistema auto-organizado propriamente dito, mas sim organizado pelo meio. Conforme explicado por Osvaldo Pessoa Jr., Von Foerster acredita que não existe um sistema auto-organizativo no sentido estrito da palavra, pois ele está pensando em sistemas isolados, e de acordo com a segunda lei da Termodinâmica a entropia de tais sistemas tende a aumentar. A auto-organização estaria restrita apenas a sistemas abertos (Pessoa Jr., 2001).

Para Von Foerster, então, o ambiente seria o agente fornecedor de ordem para o sistema. Além disso, também afirmou que o sistema se alimentaria de ruído. Usando um engenhoso experimento, ele dispôs aleatoriamente uma série de cubos magnéticos dentro de uma caixa. Fornecendo ruído para a caixa, ou seja, agitando-a veementemente, ele verificou após a agitação uma clara diminuição de entropia dentro da caixa (Von Foerster, 1960). O novo agregado de cubos formado seria mais estável do que as partes (cubos) separadas. Uma vez formado, ele teria uma tendência termodinâmica de permanecer estável, não retornando para a situação das partes (cubos) separadas, mesmo depois de ter cessado o ruído. Tudo isso parece perfeitamente de acordo com sua ideia de que o ambiente é que fornece ordem a um sistema aberto. Essa ideia de ordem a partir do ruído e o papel do ambiente em sistemas ‘auto-organizados’ parece ter influenciado Henri Atlan (Pessoa Jr., 2001).

Ashby em um novo artigo, de 1962, discutindo sobre auto-organização, afirmou que a mesma pode ser caracterizada de, pelo menos, duas maneiras. A primeira e mais simples consistiria na união de partes que antes estavam separadas.

Dizer que um sistema é ‘auto-organizado’ deixa em aberto duas interpretações muito diferentes. Existe um primeiro significado que é simples e inquestionável. Isso se refere ao sistema que começa com suas partes separadas (de forma que o comportamento de cada parte é independente do estado das outras) e elas então agem em direção a uma mudança formando conexões de algum tipo. Tal sistema é ‘auto-organizado’ no sentido que ele muda de ‘partes separadas’ para ‘partes juntas’ (Ashby, 1962, p. 266, grifos do autor).

Esta descrição parece dizer respeito a uma etapa de formação, ou surgimento, de uma determinada estrutura organizada que é oriunda de partes independentes. Na realidade, ocorre um processo de união de partes, em que um estado de baixa integração passa a um estado de alta integração. O exemplo dado por ele seria a formação do sistema nervoso de um embrião. Parece que ocorre uma auto-conexão, ou seja, a organização das partes seria, na verdade, o estabelecimento de uma comunicação entre elas.

O tratamento da ‘condicionalidade’ (seja ela em função de muitas variáveis, por análise de correlação, análise de incerteza, ou por outros meios) nos faz perceber que a ideia essencial é que existe primeiro um espaço tangível – aquele das possibilidades – dentro do qual alguns subconjuntos de pontos indicam as atualidades. Este modo de olhar a ‘condicionalidade’ nos faz compreender que ela é relacionada com o de ‘comunicação’ e, é claro, muito plausível que nós deveríamos definir partes como sendo ‘organizadas’ quando a ‘comunicação’ (em algum sentido generalizado) ocorre entre elas (Ashby, 1962, p. 257, grifos do autor).

Ashby também parece estabelecer que a organização não é algo adicionado ao sistema, não é algo cuja existência real independa do sistema e ambiente, mas é uma expressão relacional das partes que depende, inclusive, do observador. As partes independentes possuem possibilidades de comunicação entre si e essa comunicação é atualizada e o que se tem é uma estrutura mais complexa. Logo, esta atualização é uma restrição dos campos de possibilidades de interações, o que leva Ashby a considerar a organização mais como uma restrição do que uma adição.

Eu enfatizo esse ponto porque enquanto, no passado, biólogos tendiam a pensar organização como algo ‘extra’, algo adicionado às variáveis elementares, a teoria moderna, baseada na lógica da comunicação, vê organização como restrição ou limitação [...] A peculiaridade vem com o espaço tangível que eu me referi. De onde vem esse espaço tangível? Sua principal peculiaridade é que ‘ele contém mais do que atualmente existe no mundo físico real’, pois é este último que nos dá o efetivo, limitado subconjunto. O mundo real dá o subconjunto do que é; o espaço tangível representa as incertezas do ‘observador’. O espaço tangível pode então mudar se o observador mudar; e dois observadores podem legitimamente usar diferentes espaços tangíveis dentro dos quais registram o mesmo subconjunto de eventos efetivos em alguma coisa efetiva. A ‘limitação’ é então uma ‘relação’ entre o observador e a coisa; as propriedades de quaisquer limitadores vão depender da coisa real e ‘do observador’. Segue-se que uma parte substancial da teoria da organização irá se preocupar com as ‘propriedades que não são intrínsecas a coisa, mas que são relacionais entre o observador e a coisa’ (Ashby, 1962, p. 257-258, grifos do autor).

Os quatro argumentos usados por Ashby para mostrar que a organização é relativa ao observador são: (1) A realidade é diferente da organização, pois o sistema em um dado momento apresenta apenas um estado e não todos os estados possíveis. (2) Caso a organização envolva um conjunto de possibilidades, então ela carrega também as incertezas do observador. (3) O observador tem acesso apenas aos estados dos sistemas e como dois observadores podem inferir diferentes organizações para o mesmo estado, isso prova que a organização depende do estado do observador. (4) A organização depende de como o sujeito divide o sistema em partes (Pessoa Jr., 2001).

Ashby também estabelece uma segunda definição de auto-organização em seu artigo de 1962, que é basicamente similar à primeira apresentada em seu artigo em 1947. Uma estrutura organizada de partes não é, simplesmente, um agregado qualquer. Uma mera junção aleatória de partes no espaço não parece configurar ‘organização’, exceto se algum critério, como o de funcionalidade, por exemplo, for considerado. Dentro desta perspectiva que Ashby parece estabelecer o segundo sentido de auto-organização, baseado numa suposta diferença entre ‘boa organização’ e ‘má organização’: “‘Organização’ pode ter o primeiro significado, que acabamos de discutir, de ‘mudando de não organizado para organizado’. Porém, também pode significar ‘mudando de uma má organização para uma boa organização’” (Ashby, 1962, p. 267, grifos do autor).

Nesse cenário, Ashby associa a ideia de boa e má organização com a de funcionalidade, mais especificamente, com funcionalidade biológica. Ele deixa claro que não se trata de ‘bom’ e ‘mau’ em termos absolutos (Ashby, 1962), mas apenas em relação a um ou outro ambiente específico, de forma a possibilitar a funcionalidade (a sobrevivência no caso de um agente biológico), que parece ser o critério subjacente para a boa ou má organização.

Boa parte das opiniões desta curta apresentação retrospectiva da auto-organização não parece muito otimista em relação à existência efetiva de um processo que surge de si e atua sobre si mesmo. Ou ele é negado como sendo fruto de uma organização externa que alimenta o sistema via ruído (Von Foerster, 1960), ou ele é negado em termos de algo lógico-matematicamente contraditório dentro de um panorama determinista (Ashby, 1962). Estas posturas com relação à auto-organização parecem, inicialmente, até apropriadas e voltadas para análises de casos dentro das ciências naturais, como a física, química e biologia. Posteriormente, muitos estudos sobre auto-organização buscaram exemplos de sistemas auto-organizados dentro das ciências da natureza, tentando descobrir, na própria natureza, um potencial criador, embora despojada de entidades metafísicas que evocassem a noção de sujeito (Debrun, 1996). Uma abordagem mais recente da auto-organização, de caráter ‘auto’ efetivo, mais adequada ao sujeito (que é quase auto por definição), apesar de não excluir necessariamente o artefato, pode ser encontrada em Michel Debrun.

Auto-Organização em Michel Debrun

Michel Maurice Debrun (1921-1997) nasceu na França. Cursou a École Normale Supérieure de Paris. Licenciou-se em Filosofia pela Sorbonne em 1944. Foi radicado no Brasil em 1956. Obteve o título de livre-docente em Filosofia Política na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) em 1982. Foi membro fundador do Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência (CLE), órgão da UNICAMP, onde nesse mesmo ano coordenou no CLE o Seminário de Epistemologia das Ciências Humanas. Além disso, realizou pesquisas no CLE sobre os conceitos de ‘ocultação ideológica’ e ‘dissociação ideológica’. Em 1986, o professor Michel Debrun passou a coordenar um grupo de pesquisadores da UNICAMP e de outras instituições, os quais estudavam problemas relacionados com as noções de ‘ordem’, ‘desordem’, ‘crise’, ‘caos’, ‘informações’, ‘autopoiese’, ‘auto-referência’ etc. A partir de 1992, o debate dos seminários centralizou-se em torno da auto-organização, informação e das suas inter-relações[1]. Debrun faleceu em Campinas em 1997 e até hoje é o mais influente pensador a respeito de auto-organização no Brasil e um dos mais influentes no mundo.

Para Michel Debrun, auto-organização é um processo que contém seu próprio início e que age sobre si mesmo, organizando os elementos que estão contidos dentro desse processo. Obviamente isso não é uma definição, apenas uma mera e pequena descrição de um ponto, entre muitos, das características do que é auto-organização em Michel Debrun. Um bom resumo e compilação dos temas centrais consubstanciais a ideia da auto-organização podem ser encontrados no texto do próprio Debrun que data de 1996a:

Resumamos os temas centrais que consubstanciam a ideia de auto-organização. 1. Temos, na base, uma pluralidade de elementos ‘irredutíveis’, realmente distintos – e não apenas analiticamente distintos, isto é, ‘redundantes’ uns em relação aos outros [...] 2. Havendo uma distinção real, a relação entre tais elementos será um ‘encontro’ – eventualmente seguido de uma interação fundada no encontro. [...] 3. Por sua vez a interação fundada no encontro entre elementos realmente distintos tem que ser mais do tipo ‘ajuste’ do que no tipo ‘equilíbrio de forças’. [...] 4. Tentemos fixar melhor as interrelações entre ‘elementos distintos’, ‘encontro’ e ‘interação’. Temos na verdade uma sucessão de dois encontros: a) Um encontro de ‘aproximação’ pela qual os elementos já ficam perto uns dos outros ou caminhando uns rumo aos outros. [...] b) O encontro de interação que começa com a interação, e se desdobra em seguida em inúmeros outros encontros, ao longo do processo até o eventual (mas não mecânico nem fatal) ajuste final. 5. As coisas se complicam um pouco quando temos, no início do processo de auto-organização não uma pluralidade de elementos distintos e ‘soltos’ (em relação ao passado de cada um deles), mas um organismo. Nesta situação – que corresponde ao que chamamos de auto-organização secundária – os elementos, que são as próprias partes do organismo [...], só podem estar entre si e em relação ao eventual centro [...] numa situação de ‘semi-distinção’ [...] Aparece desta vez uma ideia de funcionalidade no sentido corrente, que não está necessariamente presente na auto-organização ‘primária’ (Debrun, 1997, p. 33-37, grifos do autor).

Este resumo dado por Debrun parece estabelecer os pontos centrais que ele acreditava configurar a auto-organização. Provavelmente uma descrição específica e mais minuciosa de cada ponto possa ajudar a compreender melhor esse complexo panorama.

Os elementos formadores

Uma forma é auto-organizada quando produz a si própria dentro de um processo. Isso é um tipo de criação, porém, não é uma criação do nada. Não temos aí um processo ex nihilo. Inicialmente é necessária para o processo de auto-organização a existência, em sua base, de elementos soltos e livres. Essa pletora de entidades individuais realmente distintas será a base dessa futura forma a ser criada e ponto de partida do processo. É muito difícil que esses elementos, base do processo, sejam distinguidos do próprio ambiente, pois ainda não existe algo para se contrapor a ele nesse momento. Esses elementos não devem guardar entre si nenhum tipo de interação prévia e já existente com outros elementos (é um elemento solto), e sua distinção não pode ser apenas analítica, mas deve ser real (pelo menos na auto-organização primária). Talvez seja importante definir o que se entende aqui por um elemento ‘solto’ e por ‘realmente distinto’.

Um elemento é entendido como ‘solto’ no sentido de que seja qual for o conjunto de fatos ou circunstâncias que causaram o encontro com outros elementos distintos, ele corta ou ignora seu passado de forma a tornar possível que sejam estabelecidas novas conexões (Debrun, 1996). Seria muito difícil um elemento não ter conexão com nada de forma absoluta. Mesmo que sejam distintos em certos aspectos os elementos pertencem em geral a um ou vários campos comuns, como o psicológico, psicossocial, semântico, significacional, etc. Na prática, elementos absolutamente soltos são passagens de um tipo ideal. Resíduos de conexões anteriores, ou potencialidades anteriores de conexão, podem existir, mas terão de dar lugar a novas interações (Debrun, 1996). Logo, estes elementos não necessitam estar absolutamente livres e, provavelmente, nunca estarão. Porém devem estar disposicionalmente livres para iniciar o processo base da nova forma que virá a ser. É possível então que eles já compartilhem algo mesmo antes do início do processo e, mesmo assim, sejam considerados soltos. Debrun usa o exemplo de um jogo de futebol para ilustrar esse caso:

Se, por exemplo, dois jogadores têm um pelo outro certa simpatia herdada do passado, esse sentimento há de ser esquecido ou colocado entre parênteses uma vez que os times estão reunidos em campo. Um elemento solto é um elemento sem memória, desconectado do contexto de modo geral, e que só vai adquirir uma nova memória (isto é, participar da elaboração de uma curta memória coletiva, sedimentada ao longo do jogo) em decorrência da sua interação com outros elementos distintos e soltos (Debrun, 1996, p. 7).

Elementos livres, nesse sentido, estariam dispostos a reiniciar suas interações com os outros elementos. Situações em que existem estruturas excessivamente rigorosas não são boas fornecedoras de elementos livres, pois as ligações entre eles podem ser fortes demais para permitir uma reestruturação.

Outro conceito importante de ser explicado aqui seria o que é um elemento realmente distinto. Um elemento é realmente distinto de outro quando o elemento A não esteja de alguma forma inserido no elemento B, seja em termos causais, lógicos ou de significação. Eles não podem ser redundantes um em relação ao outro. Eles não podem, por exemplo, possuir uma afinidade tal que dado o encontro de ambos segue-se uma consequência determinada e inevitável. Não pode ser um caso como o de dois teoremas que estão conectados de antemão entre si por axiomas, ao passo que elementos que não se condicionam entre si só podem se encontrar e esse encontro comporta algum grau de acaso. Na verdade, não deve existir entre eles oposição ou complementaridade estrutural (Debrun, 1996a). Obviamente que isso não implica que a redundância é proibida ou que não possa existir em elementos de um processo de auto-organização. É até mesmo esperado algum tipo de redundância mínima entre os elementos (seja ela psíquica, biológica, social etc.), pois isso parece ser indispensável ao processo auto-organizacional para que ele possa se efetivar. Caso não houvesse afinidade alguma entre os elementos, eles não poderiam se combinar. (Debrun, 1996a). Porém, é importante deixar claro que de acordo com Debrun, caso o que ocorra seja apenas a mera efetivação das afinidades dos elementos, ou seja, a interação de ambos decorra única e exclusivamente devido a um acoplamento de suas estruturas por causa de uma espécie de harmonia inerente aos elementos, então não está ocorrendo um processo de auto-organização.

Vimos (seção 8.1) que pode haver afinidades prévias em certos elementos. Se houvesse apenas isso, a atualização dessas afinidades seria mais uma ‘reunião’ do que um ‘encontro’ (já que elementos afins têm entre si, de certo modo, uma ‘harmonia pré-estabelecida’) e não havendo verdadeiro encontro, não haveria verdadeira interação, logo não haveria verdadeira auto-organização (Debrun, 1996a, p. 44, grifos do autor).

Isso quer dizer que em sistemas em que a união se dá meramente por uma atualização de afinidade natural e pré-estabelecida não há verdadeira auto-organização. No caso, por exemplo, de uma reação de síntese química (apresentada isoladamente) ela dificilmente poderia ser considerada como um processo de auto-organização. Imagine os elementos A e B como as moléculas dos gases hidrogênio H2 (g) e oxigênio O2 (g). Em uma situação energética favorável, como a presença de ambos num ambiente com uma chama, eles irão se unir em um processo de síntese, atualizando suas afinidades e formando o líquido que chamamos de água.

(1)

As estruturas envolvidas não guardam lugar para diferentes caminhos, nem para criatividade ou liberdade. O resultado e a trajetória da união desses elementos estão completamente inseridos na adequação das estruturas já dadas pelos elementos envolvidos. Não existe nenhum corte em relação à situação anterior. O próprio processo aqui citado é um desdobramento ou prolongamento da situação prévia, como a adequação pré-estabelecida das estruturas atômicas devido à quantidade de prótons, elétrons e nêutrons de cada elemento, a disposição dos elétrons na nuvem eletrônica, o estado de energia dos orbitais, a estabilidade energética gerada pelo acavalamento (entanglement) do par eletrônico etc. Esse processo previamente determinado pelas estruturas dadas, tomado em si mesmo e isoladamente, é um caso em que os elementos não são realmente distintos e possuem redundância excessiva para permitir a auto-organização como Debrun a compreende. Uma maneira talvez de considerar uma reação química como um processo auto-organizado seria integrá-la a um conjunto mais amplo de elementos e operações (Debrun, 1996a). De qualquer maneira é importante uma boa proporção entre os elementos afins e os indiferentes de forma a se obter um processo auto-organizado.

O encontro e a interação dos elementos

Esses elementos soltos e realmente distintos citados no item anterior estão, nessas condições, prontos para interagir. Porém, eles devem primeiro se encontrar. As condições de partida são relevantes para a autonomia do processo de auto-organização. Esta aproximação pode acontecer de forma casual ou por diversas séries causais entre vários elementos como, por exemplo, uma sequência de eventos econômicos em consonância com outra série de eventos políticos. Também é possível que isso aconteça por uma simples decisão de um indivíduo, grupo ou instituição como, por exemplo, a decisão da FIFA em que tal jogo vai ocorrer em tal dia em determinado lugar. São essas situações casuais que fazem com que os elementos distintos e soltos estejam reunidos em um determinado momento dentro de um contorno específico (Debrun, 1996). Uma vez dispostos nesse contorno, os elementos irão interagir, mas não em exclusiva decorrência de afinidades prévias. Não possuindo mais ‘memória’ de eventuais conexões anteriores, eles estabelecem entre si novos vínculos relacionais. Essas novas interações entre esses elementos é que configuram o verdadeiro motor da auto-organização. É importante frisar que isso estabelece necessariamente uma ‘quebra’ com a situação anterior. Nesse processo não tem um agente externo que interfira na organização desses elementos (isso iria configurar uma hetero-organização). Mesmo internamente, ele sequer tem um centro organizacional absoluto. As partes interagem ‘espontaneamente’ de forma descentralizada, formando paulatinamente ao longo do processo uma separação entre o dentro e o fora, estabelecendo a ‘coisa formada’ como algo interno e o ambiente como algo externo. Esse processo é chamado de endogenização.

Conforme a endogenização vai acontecendo, o processo é cada vez mais responsável pelo seu próprio desenrolar. A interação mútua dos elementos vai assumindo um caráter emergente diferente da mera soma das partes. O acaso, que inicialmente pode ter sido muito importante para o processo, é progressivamente absorvido. No caso de uma auto-organização psicológica, social, econômica, política e social, as finalidades iniciais dos participantes (elementos) são também absorvidas, sendo então neutralizadas, subordinadas ou redefinidas em função do movimento geral do processo (Debrun, 1996a). Novos objetivos, metas e aspirações são gerados conjuntamente ao longo da gestação da nova forma. O todo que vai emergindo não é um mero efeito, porém, instaurada sua crescente autonomia, afeta as partes praticamente como um ser distinto. Uma hierarquização pode se desenvolver caso o processo não seja abortado por qualquer razão, e existe uma tendência de se estabelecer uma identidade.

Esses elementos que interagem podem ser tanto indivíduos sujeitos na constituição de uma sociedade, como artefatos e objetos na constituição de um organismo ou, até mesmo, um sujeito. Foi afirmado previamente (Introdução) que trabalhos anteriores, como os de Ashby e Von Foerster, teriam um foco e seriam mais apropriados para exemplos de auto-organização nas chamadas ciências duras da natureza (física, química, biologia), pois estas incluiriam a matéria morta no estilo cartesiano. Enquanto isso a auto-organização de Debrun incluiria o sujeito e, portanto, poderia se pensar que ela seria mais adequada a ter um enfoque com exemplos das ciências humanas (sociologia, história, psicologia, esportes etc.). Essa dicotomia não é necessária. O artefato pode ser englobado pela auto-organização de Debrun. Basta que exista relação entre elementos e que eles configurem um ser e, dessa forma, até mesmo o puramente inerte pode ser, de alguma maneira, englobado.

Logo: se a ‘aceitação/antecipação’, indispensável ao ajuste organizacional, implica uma dose mínima de subjetividade, teremos que recusar a possibilidade de auto-organização a elementos que seriam todos inertes, inanimados, como a matéria numa concepção cartesiana ou vizinha. Mas isso não exclui que coisas radicalmente inertes possam ser ‘englobadas’ num processo auto-organizado: da mesma maneira que os elementos ‘indiferentes’ [...] podem ser ‘arroladas’ como ponto de apoio, ‘paredes’, dispositivos capazes de assegurar uma estanqueidade relativa entre duas regiões relativas e assim por diante (Debrun, 1996a, p. 49, grifos do autor).

Esse tipo de abordagem auto-organizacional de Debrun poderia servir até mesmo para exemplos da área de físico-química (Debrun, 1996a) e não exclusivamente para casos e exemplos das ciências humanas.

Determinismo criativo e autopoiesis

O processo auto-organizado como concebido por Debrun não coaduna muito bem com a ideia de um determinismo pré-estabelecido. Esse processo efetua de forma muito clara, como já foi visto, uma quebra com a situação anterior. Apesar disso, Debrun afirma que existe lugar para uma espécie de determinismo em uma situação muito específica. A auto-organização é sempre uma criação e o advento de uma nova forma ao longo do processo deve-se basicamente ao próprio processo e, apenas em menor grau, às condições de partida ou intercâmbio com o ambiente. Quanto maior a diferença entre a complexidade da forma final e a complexidade da soma das influências das condições de partida e outros condicionantes, maior o caráter de auto-organização. Elementos excessivamente redundantes, como no caso visto da síntese química tomada isoladamente, não dão margem a uma liberdade do processo e, portanto, diminuem muito o caráter auto-organizacional. Elementos distintos possuem potencialidades muito maiores de associação. Porém, Debrun afirma que:

A Auto-Organização é sempre em algum grau uma criação. Isso não significa necessariamente que ela seja incompatível com o princípio do determinismo. Se ela for compatível (mediante talvez uma flexibilização ou redefinição da ideia de determinismo), isso nos obrigará a falar em ‘criação determinística’, um pouco no sentido em que alguns falam em ‘caos determinístico’. Mas essa questão não será examinada aqui (Debrun, 1996, p. 5, grifos do autor).

Difícil dizer exatamente ao que Debrun se refere quando fala em criação determinística. Porém, é possível imaginar uma situação em que o determinismo possa ter lugar em sua visão de processo auto-organizado. Talvez o determinismo seja compatível com a auto-organização quando a determinação é alterada devido às novas interações formadas pelos elementos. Talvez seja possível considerar uma suspensão parcial do determinismo no início do processo de auto-organização. Ele é suspenso devido à formação de novas conexões entre os elementos e, à medida que essas novas ligações se sedimentam ao longo do processo, o determinismo pode ser progressivamente reintroduzido, porém, ele é diferente do determinismo inicial (Debrun, 1996a).

É realmente curioso imaginar um processo que opera sobre si mesmo, modificando assim de forma tão autônoma a determinação de seus elementos. A auto-organização contém até mesmo o seu próprio começo, porém, é importante frisar que ela não o produz. Este seria mais o caso de uma autopoiese, algo indivisível e quase atemporal, que consiste em declarações ou definições que acarretam a existência imediata do objeto ou ato ao qual se faz referência. No caso de uma declaração, seria como quando se faz a afirmação ‘Eu prometo’. O agente da sentença, quando a emite, efetivamente está prometendo. Nisso, a declaração imediatamente acarreta a existência do objeto: a promessa. No caso de um conceito, seria mais ou menos como Espinosa defende ser o caso do conceito de Deus. Para Espinosa, o conceito de Deus como uma “[...] substância constituída por uma infinidade de atributos, cada um exprimindo uma essência eterna e infinita [...]”, imediatamente implica a existência de Deus (Debrun, 1996, p. 5). Caso a auto-organização fosse uma decorrência imediata de seu próprio começo, ela seria exatamente autopoiese. Ela possui mais controle do que a auto-organização, pois efetiva-se de forma transparente, engloba seu referente e não prolonga nem herda elementos anteriores. Ela se faz de ponta a ponta. Da mesma forma como ações simples, como abrir uma porta, a autopoiese é auto-concentrada, pois nelas (autopoiese a ações simples) as dimensões de tempo tendem a coincidir. A auto-organização é esticada no tempo, não decorre de seu início e nem se efetiva de forma transparente (Debrun, 1996a).

Atratores

O atrator pode ser pensado como sendo o ponto guia ou de convergência dos elementos, que os levam ao ajuste organizacional, cristalizando, assim, a forma. Não é necessário que exista apenas um atrator. É possível que existam atratores fracos, definitivos, temporários e que ajam em sucessão. O atrator é gerado pela própria interação dos elementos (Debrun, 1996a); ele é o motor da auto-organização.

Como já foi citado anteriormente, o processo auto-organizacional representa um corte com o passado. Mesmo que exista uma determinação anterior e outra posterior elas não podem ser a mesma determinação, ou o caráter auto-organizacional seria nulo. Como esse novo caminho, que o processo irá tomar, não é dado de antemão, ele deve ser construído com o processo. Esse caminho é dado pelo atrator. Porém, ele deve se constituir ao longo do processo. Pela própria interação de seus elementos, um atrator vai tornar cada vez mais ‘provável’ a evolução do processo numa certa direção. Essa sedimentação nem sempre acontece e muitos processos auto-organizados abortam (Debrun, 1996a), pois o atrator é sujeito aos fluxos e refluxos que o sistema pode experimentar enquanto não estiver suficientemente sedimentado. Quando, por exemplo, algumas pessoas se associam visando formar um grupo (ou em torno da decisão de elaborar um projeto), isso se torna o ponto de amarração da vontade geral dos envolvidos. Contudo, isso não é o suficiente, pois não garante, por si só, que houve ou vai haver auto-organização. As vontades podem se revelar instáveis e contraditórias. O que conta é a sedimentação de alguma coisa, que pode ser até o projeto ou algo do gênero, mas que terá de ter recebido o aval da interação (Debrun, 1996).

Não existe no início do processo de auto-organização um atrator esperando o desenvolvimento do processo. O atrator é forjado, ou melhor, vai se forjando, à medida que o processo vai passando de um ‘amontoado’ de elementos a um ‘sistema’ formado por eles. Ou seja, o processo se consolida em um sistema quando ele desenvolve aos poucos um atrator que representa, a cada passo, um caminho mais claro (Debrun, 1996a). A inexistência ou indefinição do atrator no início de um processo de auto-organização decorre do caráter esparso dos elementos que não participam deste processo e é precisamente esse aspecto que ajuda a definir a auto-organização, contrapondo-a à evolução de um sistema dinâmico comum, cujos componentes estão ligados entre si de antemão e onde, por consequência, já existe um atrator previamente estabelecido (Debrun, 1996a).

A maneira como esses atratores são formados é complexa e depende de muitos fatores. Inicialmente é possível que se desenvolva um atrator temporário e caso esse atrator seja bem sucedido e se estabeleça, ele passa a ser um atrator definitivo. Demanda tempo a constituição eventual desse atrator através de tropeços e refluxos, pois o processo não é imediato. O êxito do processo de auto-organização se decide nisso e não está contido virtualmente num conjunto prévio de elementos, parâmetros e variáveis articuladas entre si, visto não ser um processo puramente mecânico (Debrun, 1996a). A formação de atratores temporários decorre, pelo menos na interação humana, de uma antecipação baseada na memória. Esta seria de curta duração que se sedimenta durante um evento específico e não uma memória longa de processos anteriores (se assim fosse, o elemento não seria solto). Um resultado parcial memorizado é transformado em uma expectativa, esboçando-se assim um atrator como consequência (Debrun, 1996a) e, à medida que o processo prossegue, vai se estabelecendo em uma ‘memória real’. Memória real é o termo técnico usado por Debrun para descrever uma memória que não é apenas a estabelecida pelo observador, mas vivida pelo próprio sistema em vias de constituição. Antecipações baseadas em memória real podem fazer com que o processo se cristalize em uma forma. Ou seja, é como se o processo estivesse inventando aos poucos um atrator e, logo em seguida, agindo de acordo com ele, seja obedecendo-o ou, inversamente, contestando-o até o amadurecimento de um atrator definitivo (Debrun, 1996).

O comportamento de um time de futebol mediante o placar que vai se desenvolvendo ao longo de uma partida é um exemplo bem ilustrativo da formação de um atrator temporário e sua eventual sedimentação em atrator definitivo, baseado nos fatores de memória curta durante um evento e expectativa baseada nessa memória.

Tomemos o exemplo de um jogo de futebol, evocado acima, suponhamos que um time tenha marcado dois gols em seguida, e o outro nenhum. É evidente que isso vai orientar, ou melhor, ‘atrair’ os passos subsequentes. Os dois gols agora pertencem à memória coletiva (que vem se sedimentando ao longo do jogo) dos dois times, da torcida, dos telespectadores etc. E essa memória se transfere para o futuro sob a forma objetiva de um resultado inapagável e sob a forma subjetiva de uma expectativa global, comum a todos os participantes, mas que vai ser ‘modulada’ de forma diferente conforme as categorias. Essa expectativa diz grosso modo o seguinte: é mais provável, talvez muito mais, que A (que fez os gols) ganhe do que B. A partir disso o complexo ‘resultado + expectativa’ passa a se constituir em um esboço de atrator, face ao qual os diferentes participantes vão reagir de acordo com suas disposições do momento. Numa primeira eventualidade, é possível que o atrator suscite no time A um redobramento dos esforços, para forçar uma vitória fulgurante, na suposição que o time B está fraquejando. Ao passo que esse mesmo atrator vai justamente suscitar esse desânimo no time B. Com isso o time A marca novos gols. [...] Numa segunda eventualidade, os dois gols marcados por A podem, projetados para o futuro, suscitar pelo contrário o relaxamento de A e um sobressalto de B. Num primeiro momento, logo após os gols, o atrator é o mesmo que na primeira hipótese, embora suscite reações diferentes, de acordo com as disposições subjetivas dos jogadores. Só que, num segundo momento, esse atrator vai ser remodelado, dando passagem ao esboço de novo atrator. Ou, simplesmente, vai ruir a partir de uma ‘fenda’ na memória que o sustentava: não haverá mais atrator, durante o resto, ou parte do resto, do jogo, e o processo de auto-organização se anulou, cedendo lugar a uma situação caótica (Debrun, 1996a, p. 38-39, grifos do autor).

Esse exemplo parece descrever muito bem como o processo pode gerar, de forma gradual, um atrator provisório, baseado numa complexa relação entre memória curta dos elementos (no que se refere ao jogo e nada antes dele, como por exemplo, uma eventual amizade com um dos jogadores adversários), que é vivida pelo próprio processo (existente enquanto passado e ainda, de certa maneira, atuando no presente) e expectativa, que vai se desenhando como um atrator temporário que pode sedimentar e se estabelecer como atrator definitivo, e definir a partida. Como isso não é definitivo, devido a fluxos e refluxos do processo, e sujeito a perspectivas subjetivas, é possível que se dê passagem a um novo atrator ou que, simplesmente, o atrator desapareça, dando margem ao caos, abortando o processo auto-organizacional.

Auto-Organização primária e secundária

Já foi visto que o processo de auto-organização se difere de outros processos como, por exemplo, os processos hetero-organizados e autopoieses, além das ações diretas[2]. Porém, mesmo a auto-organização pode ser separada em dois tipos de processo muito distintos entre si. Esses dois tipos são a auto-organização primária e a auto-organização secundária, já mencionadas anteriormente.

A auto-organização primária, basicamente, é a que foi descrita majoritariamente até o presente momento. É um processo que age sobre si mesmo, contendo sua origem e que não possui um agente organizador externo. É iniciado por elementos distintos, irredutíveis e soltos entre si, distribuídos em um determinado espaço que acabam tendo um encontro que pode ser devido, por exemplo, a questões casuais. Estes elementos no ato do encontro logo estabelecem uma espécie de ajuste mútuo entre eles. Essas interações geram atratores temporários que podem se cristalizar, tornando-se um atrator definitivo e, então, finalizar o processo ao estabelecer uma forma. No final deste processo já temos uma nova forma cristalizada com uma possível identidade estabelecida a qual reproduz, de certa maneira, uma autonomia do mesmo em relação às condições de partida (Debrun, 1996). Inicialmente, não existe hierarquia entre as partes e nem mesmo um atrator. O processo, inicialmente, é sem sujeito, sem elemento central e sem finalidade imanente (as finalidades se encontram apenas potencialmente no nível dos elementos) (Debrun, 1996). Não é possível que exista algum tipo de finalidade, visto que ainda não há forma estabelecida. Nas próprias palavras de Debrun: “O que chamamos de auto-organização primária ‘não serve para nada’, pelo menos de início” (Debrun, 1996, p. 29). Da mesma maneira, o atrator também é inexistente. Segue-se uma das definições de auto-organização dada por Debrun, que foca na questão específica do atrator.

Chamaremos de auto-organização primária todo processo de integração de elementos realmente distintos que, ao invés de tender para um atrator já dado, sedimenta progressivamente seu próprio atrator e, portanto, se cria a si próprio enquanto sistema (Debrun, 1996, p. 49).

A partir desse atrator segregado, descrito no trecho acima, é possível sedimentar uma identidade ou uma forma global, que seria uma espécie de ponto de chegada do processo de auto-organização primária. Essas mesmas estruturas, identidade e forma global tornar-se-ão pontos de partida no caso de uma auto-organização secundária.

A auto-organização secundária é um pouco mais complexa, pois ela parte de uma estrutura já formada. O início do processo é totalmente diferente. Nesse caso, já se tem um organismo pronto e o que se observa nesse processo não é a criação da forma, mas sim o seu desenvolvimento ou mudança com o passar do tempo. Ela não parte de elementos soltos, mas de um ser ou sistema já constituído. Esse ser já constituído, lançando mão de operações de reestruturação, atinge uma nova estrutura diferente da inicial. Seus elementos iniciais não estão esparsos (distinção real das partes), mas talvez possam ser considerados semi-esparsos (distinção semi-real das partes) na medida em que já estão unidos na formação do organismo, porém, estão abertos a alterações de suas conexões para a alteração que está para vir. Já existe aqui, no início deste tipo de auto-organização, uma hierarquia do corpo constituído. Porém, no processo de reestruturação, as partes hierarquicamente superiores agem como uma parte entre as outras, cujo papel pode ser realmente mais importante, mas não de ordem completamente distinta de outros papéis.

A ideia é a seguinte: devido à combinação, no organismo, da autonomia relativa das partes (em partículas das macro-partes: mente, cérebro e ‘resto do corpo’) e do seu ‘acavalamento’ mútuo (cada parte ‘sabe das outras’, da possibilidade ou não da troca de papéis etc.), as partes diretoras só podem exercer sobre as outras - de modo geral e, em especial, durante a constituição de novos patamares de atividade – um papel hegemônico, mas não dominante (Debrun, 1996, p. 11-12, grifos do autor).

Então, o que se tem são partes semi-distintas sob a direção hegemônica, mas não dominante, de estruturas hierárquicas já dadas no início do processo. Obviamente, essas partes hegemônicas podem se exteriorizar em relação ao processo e caso isso ocorra, o que se tem é um processo de hetero-organização. Pode-se afirmar que a identidade ou a forma global, antes pontos finais do processo de auto-organização primária, agora se torna o ponto de partida da auto-organização secundária. É essa mesma estrutura já hierarquizada que irá orientar as reestruturações do próprio ser, visando um desenvolvimento, num trabalho do ser sobre si mesmo, em que ele é agente e paciente ao mesmo tempo. Este desenvolvimento pode ser um alcance de novos níveis ou patamares de atividades, que pode implicar um aprimoramento, aprendizagem, criação artística ou literária, conversão existencial etc. (Debrun, 1996a). Aqui já se encontra uma possível finalidade desde o início e a hierarquia de uma parte sobre as outras que, apesar de não ser dominante e absoluta, orienta o processo.

É importante frisar que essa alteração ou reestrutura da forma global ou identidade dentro do processo de auto-organização secundária é apenas parcial. A forma não deixa de ser, ela apenas se modifica parcialmente. O organismo vai tender a manter e insistir em sua existência, e talvez seja exatamente essa uma das razões possíveis da reestruturação[3].

Ciência e Auto-Organização: uma possibilidade de abordagem

Existiria alguma relação entre a ciência e os processos auto-organizacionais? Existiria então alguma relação entre a auto-organização e a produção do conhecimento científico? Osvaldo Pessoa Jr. (2005) considera que, em certo aspecto, é possível dizer que parte da história da filosofia da natureza contém elementos de auto-organização, seja em Empédocles, nos atomistas clássicos e até mesmo no mecanicismo do século XVII (Pessoa Jr., 2005). No caso específico do conhecimento científico, seria ele auto-organizado? Pessoa afirma que caso se considere “[...] que a ciência consiste da aplicação de um conjunto fixo de métodos racionais para o desvelamento objetivo de uma realidade pré-existente, a resposta seria ‘não’!” (Pessoa Jr., 2005, p. 44, grifo do autor).

O enfoque da ciência, enquanto dependente de um único método racional para sua determinação, parece perder cada vez mais espaço para interpretações sociológicas do conhecimento científico. Talvez o que se tenha seja uma pluralidade de métodos e que eles mesmos não sejam nem historicamente tão fixos e nem tão racionais assim. Sendo os métodos criações humanas, abandonados e modificados, devido às atividades humanas, não seria então possível uma abordagem auto-organizacional dos mesmos? O enfoque plural e múltiplo com o qual olhamos o que é chamado de ‘ciência’ nos permite englobar essas perspectivas? Osvaldo Pessoa Jr. diz que sim e apresenta três diferentes perspectivas. A primeira é que:

A ciência é uma atividade social e criadora dos seres humanos, sujeita a negociações em várias de suas instâncias, especialmente no tocante à escolha de seus fins, na quantidade de dinheiro investida, na concatenação com ideologias dominantes etc. Nesse sentido, com relação a esse aspecto social, podemos dizer que a atividade científica é auto-organizada, assim como o são as atividades sociais em geral (Pessoa Jr., 2005, p. 44-45).

Além disso, de um ponto de vista que Osvaldo afirma internalista, a segunda perspectiva é a de que sempre é possível existir um distinto grupo de teorias que pode dar conta de um mesmo fenômeno ou corpo de conhecimentos empíricos. Sendo assim, a escolha de uma dessas teorias, em detrimento das outras, envolve um elemento arbitrário. Dado essa arbitrariedade, o elemento auto-organizacional poderia em hipótese ser considerado como fator do processo. A terceira perspectiva é uma mistura das duas primeiras: a ciência poderia ter se desenvolvido por caminhos históricos diferentes, ou seja, a história da ciência poderia ter sido outra (Pessoa Jr., 2005). Um ponto muito interessante da argumentação é a clara associação da atividade científica como empreitada essencialmente coletiva.

Cada cientista tem uma visão apenas parcial da atividade de toda comunidade científica. De maneira análoga a um cupim que executa tarefas limitadas que resultam na ‘emergência’ do cupinzeiro (sem que qualquer cupim tenha uma representação global do cupinzeiro (Camazine et al., 2001, cap. 18), a ciência como um todo também emerge da ação coletiva dos cientistas individuais (tomo ‘emergência’ aqui no sentido ‘fraco’ de Stephan, 1998) [...] não existe um método fixo que reja o desenvolvimento da ciência (Pessoa Jr., 2005, p. 48, grifos do autor).

Logo, deduz-se que os caminhos históricos que a ciência percorre emergem de um processo essencialmente coletivo e a própria ciência parece emergir da atividade dos cientistas individuais. O historiador da ciência Paolo Rossi é categórico em afirmar que a ciência nasceu na Europa durante a chamada ‘Revolução Científica’ do século XVII:

Aquela realidade histórica complexa que nós chamamos hoje de ‘ciência moderna’ não nasceu em nenhum lugar específico na Europa. Seu local de nascimento foi toda a Europa. Nós precisamos nos lembrar de que Copérnico era polonês; Bacon, Harvey e Newton eram ingleses; Descartes, Fermat e Pascal franceses; Tycho Brahe dinamarquês; Paracelso, Kepler e Leibniz eram alemães; Huygens holandês, e Galileu, Torricelli e Malpighi eram italianos. Os argumentos de um estavam conectados com os de outro em uma realidade imaginária ou artificial sem fronteiras; numa República das Ciências que operava, contra todas as probabilidades, em difíceis, frequentemente dramáticos, e em algumas vezes até mesmo trágicos contextos sociais e políticos (Rossi, 2001, p. 1, grifo do autor).

A interação entre esses filósofos da natureza acarretou a formação de pequenos grupos e comunidades específicas que se comunicavam umas com as outras. Essas foram as chamadas academias científicas. Ao longo do Século XVII foram criadas diversas por toda a Europa, impulsionando a atividade coletiva de investigação da natureza. Provavelmente tais sociedades científicas seguiram um padrão auto-organizado, visto serem atividades de agregação humana. Uma investigação interessante, nesse sentido, seria analisar seus padrões de formação para conferir se eles são de auto-organização primária, assim como se seus padrões de desenvolvimento são de auto-organização secundária.

Considerações finais

As possibilidades de utilização dos conceitos de auto-organização para analisar a ciência são imensas. Os agentes de investigação da natureza podem ser considerados elementos soltos de um sistema. Uma perspectiva de auto-organização primária poderia abordar a questão do surgimento da ciência na forma de suas sociedades científicas. As aspirações dos agentes envolvidos, assim como seus objetivos, crenças, condições sócio econômicas entre diversas outras coisas podem ser consideradas como atratores do processo. O desenvolvimento histórico das sociedades científicas pode ser abordado como um fenômeno de auto-organização secundária. Considerando ainda aspectos de sistemas complexos, sociedades científicas inteiras (resultantes de processos de auto-organização primária) poderiam ser consideradas novos elementos livres, cujas interações, mediantes novos atratores, poderiam resultar na formação de uma Sociedade Científica maior, cujo desenvolvimento também está sujeito a regras de auto-organização secundária. As possibilidades de aplicação dessa abordagem para a análise da ciência são tamanhas e tão enriquecedoras que não podem e não devem ser ignoradas.

Referências

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Notas

[1] Dados biográficos obtidos pelo site dos arquivos históricos do Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência da Unicamp recuperado em 29 mar. 2017 de https://www.cle.unicamp.br/atom/index.php/michel-debrun
[2] Para mais processos que diferem e são contrapostos à auto-organização, ver quadro 2 da obra de Debrun (1996, p. 21).
[3] Para ver um quadro esquemático interessante a respeito da auto-organização secundária, consultar o quadro 2 da obra de Debrun (1996a, p. 57).

Notas de autor

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