Resumo: A experiência de ter um familiar internado em uma UTI é desencadeadora de stress, mobilizando na pessoa a busca de recursos para suportar tal situação. Este estudo buscou compreender especificamente os recursos espirituais utilizados por familiares no enfrentamento da situação de internamento de um parente em UTI de um hospital de emergência e trauma. Foram entrevistados 40 familiares. Destes, 24 (60%), reportaram apoiar-se na religião como principal forma de enfrentamento e 13 deles (54,1%) modificaram suas práticas religiosas. A oração foi a estratégia mais utilizada por 20 participantes (83,33%). Decorridos 6 meses, a maioria manteve ou até aumentou sua prática religiosa. O estudo indica que a espiritualidade/religiosidade é um fator importante no enfrentamento de situações em que a vida é ameaçada, sendo relevante sua integração nas práticas de cuidado pela equipe multidisciplinar hospitalar. Destaca-se ainda, que assim como outros aspectos do cuidado na unidade intensiva, a colaboração interdisciplinar é fundamental quando se trata da integração da espiritualidade nos cuidados em saúde.
Palavras-chave:Coping religiosoCoping religioso,Espiritual. Espiritual. ,Interdisciplinaridade. Interdisciplinaridade. ,Bioética. Bioética. ,Psicologia. Psicologia. ,Teologia PráticaTeologia Prática.
Abstract: The experience of having a family member hospitalized in an ICU is stressful, leading the individual to search for support to deal with such a situation. This study aimed to understand specifically the spiritual resources used by families in facing the situation of a family member hospitalization in an ICU of an emergency and trauma hospital. Forty family members were interviewed. Of these, 24 (60%) reported using religion as the main coping method and 13 of them (54,1%) changed their religious practices in such a situation. Prayer was the most used strategy by 20 participants (83,33%). After 6 months, the majority of participants had maintained or even increased their religious practices. The study indicates that spirituality/religiosity is an important factor in facing situations in which life is threatened, being relevant its integration into the care practices by the multidisciplinary hospital team. It also highlights that as with other aspects of intensive care, interdisciplinary collaboration is essential when it comes to the integration of spirituality into the health care.
Keywords: Spiritual, Religious Coping. , Interdisciplinary. , Bioethics. , Psychology. , Practical.
ARTIGOS
COPING RELIGIOSO/ESPIRITUAL NA ANTESSALA DE UTI: REFLEXÕES SOBRE A INTEGRAÇÃO DA ESPIRITUALIDADE NOS CUIDADOS EM SAÚDE
SPIRITUAL/RELIGIOUS COPING IN AN ICU: reflections on the integration of spirituality into health care
Recepção: 14 Fevereiro 2017
Aprovação: 20 Dezembro 2017
Qualquer vivência de internação em um hospital já traz consigo a experiência de sofrimento, para o qual concorrem vários fatores, entre eles, o próprio ambiente hospitalar, que remete o paciente e seus familiares à representação de dor e insegurança. Se durante este internamento o indivíduo necessitar de uma permanência em uma Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), a ansiedade frente ao internamento e a vivência da doença podem se intensificar e agravar. Trata-se, pois, de um evento potencialmente estressor que demandará a escolha de estratégias de enfrentamento no manejo de uma situação que se impõe como incontrolável.
Essa experiência é estressante não apenas para a pessoa internada, em razão das várias mudanças que são desencadeadas por esse contexto (ANGERAMI-CAMON, 1994; MOFFATT, 1987), mas também para os familiares.
Diversos estudos apontam que as rotinas dos familiares do paciente são rompidas, podendo eliciar sentimentos de vulnerabilidade, em que a possibilidade de morte da pessoa amada passa a ser a preocupação mais constante. Assim, demanda-se da equipe multidisciplinar atenção à saúde mental tanto do paciente quanto dos familiares, levando em conta que a família é um importante fator de apoio emocional durante o tratamento da pessoa enferma (MARTINS FARIA FADDUL ALVES, et al., 2013; FREITAS; MUSSI; MENEZES, 2012; KUBLER-ROSS, 2008; SIMONI; SILVA, 2012; STUMM; WINKELMANN; UBESSI, 2013).
É comum, nesse contexto, que a família experiencie sentimentos de desamparo. Consequentemente, buscará medidas de apoio para suportar a recente fragmentação sofrida na estrutura familiar. Torna-se urgente a construção de um sentido/significado para que a experiência dolorosa seja suportada e compreendida (MOSQUERA in TEIXEIRA; MULLER; SILVA, 2004).
Existem diferentes formas de o familiar lidar com a situação do internamento, sendo que uma delas é a utilização de recursos religiosos/espirituais. Os estudos sugerem que em situações quando a saúde é significativamente afetada, comumente as pessoas recorrem à religiosidade/espiritualidade, na tentativa de controle da situação ameaçadora à continuidade da vida. (KOENIG; KING; CARSON, 2012; KOENIG; MCCULLOUGH; LARSON, 2001; PARGAMENT, 2007). O psicólogo da religião, Kenneth Pargament (1997) percebeu, inclusive, que a utilização de estratégias de caráter religioso/espiritual é tão diversa e tão presente nas situações de estresse, que ele desenvolveu uma teoria específica sobre o tema, definindo tal comportamento como “coping religioso/espiritual”.
Tendo essas considerações iniciais como pano de fundo, o presente artigo tem como objetivo apresentar os resultados de um estudo realizado junto a familiares de pessoas internadas em uma Unidade de Tratamento Intensivo, buscando identificar se os familiares utilizaram estratégias de coping religioso/espiritual para o enfrentamento desse momento estressante, bem como a frequência de utilização dessas estratégias. A pesquisa verificou, também, o relato de comportamento religioso a respeito de práticas religiosas antes, durante e depois do internamento do familiar em uma UTI.
Ressalta-se que o estudo está relacionado às discussões atuais sobre a integração do cuidado espiritual no campo da saúde. Neste sentido, o presente artigo inicia apresentando as definições de espiritualidade e religiosidade aqui utilizadas e o conceito de coping religioso/espiritual. Em seguida, apresenta-se a pesquisa propriamente dita: métodos e procedimentos, resultados e discussão. A última seção traz uma breve reflexão sobre a importância da integração da religiosidade/espiritualidade nas práticas de cuidado em saúde em contexto hospitalar, apontando, principalmente, a necessidade de fazê-la em perspectiva interdisciplinar. Particularmente, aponta-se a contribuição de três áreas do saber que fazem interface com o tema: a Bioética, a Psicologia e a Teologia Prática. Conclui-se o estudo apresentando algumas sugestões para futuras pesquisas sobre espiritualidade e saúde.
Para se ter uma ideia do rápido crescimento da pesquisa sobre esse tópico, Harold Koenig, psiquiatra americano e um dos maiores pesquisadores desse tema, publicou dois grandes volumes com o levantamento dos estudos quantitativos de qualidade sobre religiosidade/espiritualidade e saúde. No primeiro volume, publicado em 2001, Koenig e colaboradores listaram mais de 1.200 estudos originais publicados no período entre 1.872 e 2.000 (KOENIG et al., 2001). No segundo volume, o número de trabalhos publicados no período entre 2000 e 2010 saltou para 2.100 estudos quantitativos (KOENIG et al., 2012).
Religião, por conseguinte, diz respeito a um fenômeno social definido por limites particulares, expressos num corpo de doutrinas assumidas pela comunidade de fé que partilha das mesmas crenças. Tendo como base essa perspectiva epistemológica, o binômio espiritualidade/religiosidade pode ser um fator chave para compreender o modo como as pessoas lidam com situações que ameaçam a continuidade da existência. Como bem observam os vários pesquisadores do tema (EXLINE in PALOUTZIAN; PARK, 2005; KOENIG, 2012; CUMMINGS; PARGAMENT, 2010), é comum às pessoas que enfrentam situações de enfermidade voltarem-se para a espiritualidade/religiosidade, tanto como um meio de construir sentido para aquela experiência, quanto como tentativa de obter controle sobre uma situação que parece incontrolável.
Coping é uma palavra inglesa que significa “enfrentamento”, “modo de lidar com”, e tem sido utilizada para designar um conjunto de estratégias usadas pelos indivíduos com vistas à adaptação em situações ou eventos considerados adversos ou estressantes. Os psicólogos que elaboraram a teoria do coping (enfrentamento do estresse), Lazarus e Folkman (1980; 1984), afirmam que, diante de um evento estressor, o indivíduo faz uma primeira avaliação para definir suas consequências, por exemplo, se a situação requer uma resposta imediata ou não. Em caso positivo, tenta-se determinar se o evento representa uma ameaça, um desafio ou uma perda. Definida a categoria do estressor, uma segunda avaliação é feita com vistas a uma decisão entre duas opções de enfrentamento: usar estratégias com foco no problema ou com foco nas emoções. O coping focado no problema refere-se aos esforços voltados à solução da situação estressante. Por exemplo, a pessoa enferma decide buscar tratamento médico. Já o coping focado nas emoções envolve a tentativa de mitigar as consequências emocionais negativas do evento estressor. Por exemplo, conversar com um amigo sobre a situação causadora de estresse. Em outras palavras, coping refere-se aos esforços comportamentais e cognitivos para dominar, reduzir ou tolerar as demandas internas e/ou externas que são criadas por operações estressantes.
Aproveitando-se do modelo de coping de Lazarus e Folkman, desenvolvido no campo da Psicologia Cognitiva, o psicólogo da religião, Kenneth Pargament (1997) aplicou-o à esfera da religião, criando assim, a noção de coping religioso/espiritual. Para esse autor, coping religioso/espiritual diz respeito à introdução de elementos sagrados na forma de responder aos eventos estressores. Por exemplo, pode-se orar para a solução de um problema, pode-se engajar em atividades religiosas como forma de solução do problema e/ou minimização de sentimentos de ansiedade, etc. Há diversas formas de coping religioso espiritual e nem todas elas são positivas ou favoráveis à superação do estresse, sobretudo em situações envolvendo ameaça à saúde física ou mental.
Sabe-se, por meio de diversos estudos (ANGERAMI-CAMON, 1994; DIAS; RESENDE; DINIZ, 2015; ROMANO, 1999; SILVA et al., 2013), que o internamento de um parente próximo em UTI é um evento potencial para desencadear intensas respostas de estresse nos familiares, (uma vez que uma das situações mais estressantes é a internação de um parente próximo, em uma UTI), fato este que requer a mobilização de uma estrutura psíquica forte o suficiente para o enfrentamento dessa realidade. Um dos recursos utilizados pelos indivíduos nesses momentos é a espiritualidade/religiosidade. Busca-se um sentido espiritual/religioso para a vivência do sofrimento; empregam-se estratégias religiosas/espirituais para o enfrentamento da mesma, como por exemplo, reza, oração, meditação, grupos de oração de comunidades religiosas, etc.
Com base, pois, nas premissas explicitadas acima, serão apresentados a seguir, os resultados do estudo que buscou identificar a utilização da religiosidade/espiritualidade no enfrentamento de situações de stress experienciadas no internamento de um familiar em uma UTI.
O presente estudo é de natureza qualitativa, exploratória. De acordo com Gil (2002), é um tipo de pesquisa que busca familiarizar determinado tipo de problema, tornando-o mais explícito, facilitando a construção de hipóteses sobre uma dada situação. A finalidade desse tipo de pesquisa é aperfeiçoar e refinar determinadas ideias.
Os dados foram coletados por um dos pesquisadores por meio de uma entrevista semi-estruturada, realizada na antessala da UTI junto a 40 familiares de pacientes internados na Unidade de Tratamento Intensivo, em um hospital de emergências e traumas da cidade de Curitiba.
Buscou-se evidenciar, entre os participantes da pesquisa, suas concepções e práticas religiosas anteriores ao enfrentamento da situação estressante e também durante a mesma. Decorridos seis meses após o evento do internamento, os participantes foram novamente contactados com a finalidade de verificar, junto aos mesmos, se houve ou não mudança em seu comportamento religioso, e quais seriam essas mudanças.
A amostra foi selecionada por conveniência, sendo que os colaboradores do estudo deveriam ser maiores de 18 anos, de ambos os sexos, que fossem familiares de parentes internados na UTI e que se encontrassem, no momento da pesquisa, em espera na antessala da Unidade. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Foram excluídos do estudo os familiares que não relatassem utilizar como recurso de enfrentamento alguma estratégia de coping religioso/espiritual. A pesquisa obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade do Paraná (PUCPR), Parecer no. 1.111.775, de 17/06/2015.
A entrevista semi-estruturada continha sete perguntas, sendo três fechadas e quatro abertas. Foram coletados também, os dados sócio-bio-demográficos dos participantes e registrado um telefone para contato futuro, caso o/a participante do estudo concordasse em fornecer uma nova entrevista, seis meses depois. A entrevista semi-estruturada continha as seguintes perguntas:
2) Por quê? O que espera alcançar?;
3) Você segue alguma religião? Sim; Não. Qual? Desde Quando?;
4) O que o/a levou a escolher essa religião?;
5) Quais práticas religiosas você comumente utiliza na sua religião? a) Orações, b) Meditações, c) novenas, d) frequência a missas/cultos, e) sacrifícios, f) Outras;
6) Com que frequência você realiza essas práticas religiosas? a) Orações, b) Meditações, c) novenas, d) frequência a missas/cultos, e) sacrifícios, f) Outras; 7) Sua prática religiosa alterou desde a estada de seu parente em uma UTI? Sim; Não; Como? Com que frequência?
A primeira pergunta objetivou investigar os recursos de enfrentamento que o familiar estava utilizando na ocasião do internamento de seu parente. Caso o sujeito não indicasse a religião/espiritualidade como um dos recursos de enfrentamento, a entrevista era encerrada. Em caso positivo, dava-se continuidade às demais perguntas que estavam relacionadas à posição do pesquisado quanto a alguma crença religiosa, tais como: a motivação para a adesão da religião reportada, a frequência com que praticava atividades religiosas, e se a prática se modificou após a internação do familiar. O indivíduo, em todas as perguntas fechadas, poderia assinalar mais de uma alternativa.
Uma nova entrevista, previamente contratada e por telefone, foi efetuada após 6 (seis) meses, contendo 3 perguntas abertas, com o intuito de saber o estado do familiar que havia sido internado e identificar o posicionamento atual do entrevistado frente às questões da primeira entrevista, verificando, desse modo, a presença ou não de mudanças, após esse intervalo de tempo. As perguntas foram:
2) Sua prática religiosa alterou desde a estada de seu parente em uma UTI? Sim? Não? Como?
3) E hoje, como está a sua prática?
Das 40 entrevistas iniciais, 24 participantes (60%) mencionaram que utilizavam a religião como estratégia de enfrentamento, enquanto os outros 16 (40%), referiram utilizar outras estratégias não religiosas de coping. As estratégias de coping não religioso empregadas pelos entrevistados foram: amigos (n=6), família (n=13), ciência (n=2) e outros (n=2), demonstrando assim, as várias formas de coping disponíveis. Por não citarem espontaneamente o uso do coping religioso/espiritual, não nos aprofundaremos na análise dessas respostas, por se distanciarem dos objetivos da pesquisa. Destacaremos aqui os 24 participantes (60%) que responderam positivamente ao uso do coping religioso/espiritual.
Em termos de afiliação religiosa, 14 (58,4%) se identificaram como católicos, e 10 (41,6%) como evangélicos. De acordo com o último censo demográfico do IBGE, em 2010, a população brasileira era composta majoritariamente por católicos, representando 64,6% da população seguidos dos evangélicos, representando 22,2% da população brasileira. O censo notou uma redução progressiva do catolicismo e um aumento progressivo de grupos evangélicos. Este estudo reflete os dados do censo, pois a maioria ainda se identifica como católica, mas a diferença entre católicos e os evangélicos se apresenta mais reduzida.
Ao responderem sobre o tempo de seguimento de uma determinada religião, 19 (79,2%) deles reportaram fazê-lo desde a infância, dois deles (8,3%), a partir da adolescência e três (12,5%) no começo da idade adulta. A respeito do que os influenciou na escolha de determinada religião, 15 (62,5%) apontaram a ‘família’ como sendo a maior influência. Os nove (37,5%) restantes mencionaram: ‘fé” (5 deles); “identificação” (2); “amigos” (1) e “obediência” (1).
Os familiares foram questionados sobre as práticas religiosas/espirituais mais utilizadas no enfrentamento daquela situação de sofrimento, e o que esperavam alcançar com seu uso. Os participantes mencionaram diferentes práticas religiosas, e cada familiar relatou utilizar entre uma e duas práticas em seu processo de enfrentamento do estresse do internamento em UTI (média = 1,9). Assim, as orações foram citadas por 20 familiares (83,3%), 16 participantes mencionaram frequentar missas/cultos (66,7%), a realização de novenas foi mencionada por 7 pessoas (29,2%), 2 participantes relataram praticar meditações (8,3%). O sacrifício foi mencionado por uma pessoa (n=1; 4,2%), assim como o voluntariado na Igreja (n=1; 4,2%). Entre os 24 participantes, 10 (45,8%) deles reportaram esperar a mudança na situação do parente internado, quer através de um milagre (n=9; 37,5%) ou pela fé na “vitória” (n=1; 4,1%. Quatro respondentes afirmaram a utilização da religião como exercício de fé (16,6%). Dez participantes utilizaram as práticas religiosas/espirituais como recurso para lidar com as emoções: busca de conforto (6), tranquilidade (2), meio de “desabafo” (1) e de "esperança" (1). Quanto à frequência de realização das práticas reportadas, 18 (75%) as realizam sempre, 5 (20,8%) quase sempre e 1 (4,2%) raramente as realiza.
Ao se investigar se o comportamento religioso havia sido modificado em razão da experiência de internamento do parente na UTI, 13 (54,2%) participantes reportaram alguma mudança, enquanto 11 (45,8%) deles relataram nada ter mudado. Uma das mudanças mais apontadas pelos familiares foi em relação à frequência das práticas religiosas após a internação do parente na UTI. A esse respeito, 11 (45,8%) familiares relataram ter aumentado a frequência de suas práticas e dois deles diminuíram. Os católicos foram os que mais alteraram suas práticas (n=7; 50%) enquanto que apenas três, 3, 33% dos evangélicos referiram mudanças.
Na retomada do contato, seis meses após a entrevista realizada, das 24 pessoas, 18 (75%) atenderam à ligação telefônica. Em relação à evolução do estado de saúde do parente internado, 9 (50%) deles haviam sobrevivido ao internamento, enquanto 9 (50%) foram a óbito. Referindo-se à alteração das práticas religiosas no momento da internação até o presente, entre os 18 respondentes, 7 (38,9%) relataram que aumentaram a frequência, 2 (11,1%) diminuíram, e 9 (50%) reportaram não ter havido qualquer mudança.
Em seus estudos sobre a psicologia do desenvolvimento, o psicólogo russo radicado nos Estados Unidos, Urie Bronfenbrenner (2011) apresenta dois importantes conceitos a respeito do desenvolvimento da pessoa: experiência e fenomenologia. O conceito de experiência diz respeito a como o sujeito se sente em seu meio. O conceito fenomenológico refere-se ao modo como o ser humano percebe e modifica o ambiente em que vive ao longo das etapas de seu ciclo vital. Os dados mostram que a maioria dos sujeitos segue sua religião graças à influência da família, sugerindo um continuum da influência cultural no desenvolvimento. Aqueles que não relataram a influência da família referiram os amigos, fé em Deus, amor a Deus, identificação e obediência. São palavras que remetem tanto ao conceito de experiência, ou seja, à forma subjetiva de sentir determinado evento em relação a algo, quanto ao conceito de fenomenologia, pois aponta formas de se relacionar a partir sentimentos que emergem da interpretação das experiências vivenciadas (BRONFENBRENNER, 2011). Assim, as estratégias de caráter religioso/espiritual são empregadas pelos sujeitos como expressão da experiência subjetiva (como o sujeito se sente em seu meio) e/ou mesmo da forma como os sujeitos interpretam a situação, tentando modificar o cenário do qual (que) se vêem participantes (BRONFENBRENNER, 2011).
A perspectiva do psicólogo Bronfenbrenner pode ser aliada à teoria do coping de Lazarus e Folkman, desenvolvida no arcabouço das Psicologias Cognitivas, incluindo a Psicologia Cognitiva da Religião. A reflexão de Bronfenbrenner vai ao encontro da teoria cognitiva do coping, em que Lazarus e Folkman (1980; 1984) afirmam que diante de uma situação de estresse os sujeitos avaliam e decidem o tipo de estratégia a ser empregada, dependendo dos recursos internos de cada indivíduo. É notável que um número significativo de sujeitos, 60%, lança mão de formas religiosas/espirituais como meios de enfrentamento do sofrimento vivenciado no internamento de um familiar na UTI. As práticas religiosas expressam formas, tanto de coping voltado à solução do problema (utilizam a oração na espera de que o parente internado melhore), quanto de coping voltado às emoções (reportam a utilização de práticas religiosas a religião como fonte para obtenção de conforto, tranquilidade, desabafo, esperança).
Evidencia-se que as estratégias reportadas pelos familiares participantes no presente estudo podem ser caracterizadas como CRE Positivo (PARGAMENT, 1997). O coping religioso/espiritual positivo refere-se, segundo Pargament et al (1998, p. 712), ao sentido de espiritualidade, a um relacionamento seguro com Deus, à crença de que existe um sentido na vida para ser buscado e senso de conexão com outros. O autor e seus colaboradores observam que compõem um padrão de coping positivo, métodos de enfrentamento tais como: posição positiva frente a Deus; coping religioso colaborativo; busca de suporte espiritual, transformação de vida, etc (PARGAMENT et al., 1998, p. 712).
Evidências de CRE positivo são exemplificadas pelas práticas descritas de oração, novenas, frequência à missa e cultos, atividades voluntárias na igreja, etc. Ao mesmo tempo, os métodos de CRE utilizados também expressam tipos específicos de “orientação religiosa”, caracterizados pelo psicólogo da religião, Gordon Allport (1967), como Extrínseca ou Intrínseca. De acordo com Allport, a religiosidade extrínseca está associada a comportamentos religiosos utilitaristas, ou seja, com vistas a benefícios. Isso pode ser ilustrado, por exemplo, com a prática de sacrifícios e realização de novenas para alcançar a melhora do parente internado, ou mesmo para “desabafo”. Já a religiosidade intrínseca está mais integrada à vida do sujeito. As práticas religiosas não aumentam ou diminuem dependendo do que se quer alcançar como favor de Deus. A religiosidade intrínseca está associada a um sentimento de sentido último, de propósito na vida, onde o indivíduo busca uma relação com o sagrado como vivência espiritual, como caminho de conexão e desenvolvimento espiritual. Poderia ser ilustrada com os 4 sujeitos que reportam a utilização da religião como exercício da fé, e não necessariamente como estratégias de coping.
O presente estudo confirma os achados de várias pesquisas que afirmam que aoração é o método comumente mais utilizado de CRE (ESPERANDIO; LADD, 2015;ESPERANDIO, 2014; KOENIG et al. 2012; ZENEVICZ, 2009). Por outro lado, háestudos que apontam a oração não apenas como métodos de CRE, mas também comocanal de conexão com o sagrado, como acesso à dimensão espiritual. Em outraspalavras, a oração pode ser evidência tanto de uma religiosidade extrínseca quantointrínseca. Depende do objetivo com o qual ela é empregada. Como já observado por Esperandio e Ladd (2015, p. 681),
[...] mesmo em situações quando a oração do tipo petição é usada, mais importante para o praticante não é a resposta divina ao pedido feito, mas ela possibilita uma conexão consigo, com o outro e com o que o sujeito considera como sagrado. Em outras palavras, oração é um meio de transcender o mundo físico, e não necessariamente de ‘consertá-lo’ (ESPERANDIO, LADD, 2015, p. 681).
Essa observação sobre o uso da oração remete à comparação que Allport (apud ARGYLE et al., 2004) faz sobre a religiosidade extrínseca e intrínseca. Ele afirma que os extrínsecos usam sua religião, enquanto os intrínsecos a vivenciam.
Em relação à alteração do comportamento religioso/espiritual, a única afirmação que se pode fazer sem o perigo de interpretação parcial ou preconcebida é que os dados sugerem que em situações de estresse tais como a descrita, de um familiar internado na UTI, há mudança no comportamento religioso em termos de frequência. Os resultados, porém, com base na amostra utilizada nesse estudo, não indicam mudança significativa no estilo de religiosidade, propriamente. Pelo contrário, as mudanças sinalizadas parecem confirmar o estilo de religiosidade intrínseca ou extrínseca dos sujeitos individualmente, e parecem determinar, também, as escolhas que tais indivíduos fazem quanto às estratégias de CRE, se voltadas para a solução de problema ou se voltadas para as emoções. De qualquer modo, os resultados sugerem que a espiritualidade/religiosidade tem um papel importante no processo de coping em situações de sofrimento no campo da saúde e aponta, portanto, para a necessidade de se considerar com mais sensibilidade a importância da integração dessa dimensão nas práticas de cuidado em saúde.
O internamento em uma Unidade de Tratamento Intensivo é uma experiência potencialmente estressante para o paciente e para seus familiares, uma vez que “cuidados intensivos” destinam-se àquelas pessoas que apresentam uma condição de saúde cuja continuidade da existência encontra-se ameaçada. De acordo com Oliveira et al. (2010, p. 250), a UTI “é sinônimo de gravidade e apresenta taxas de mortalidade entre 5,4 a 33%". Esse dado é semelhante ao informado por Truog et al. (2008, p. 953) de que nos Estados Unidos, a taxa de mortalidade em UTIs é de 22%, sendo, inclusive, um lugar comum de morrer. A porcentagem da amostra do presente estudo é de 50% (9 dos 18 pacientes cujos familiares foram contactados após a primeira coleta). Dado o número pequeno da amostra não se podem generalizar os resultados. É sabido, entretanto, que os familiares de pacientes internados em UTI têm consciência da gravidade que caracteriza a situação, sendo esperada, entre os parentes, a presença de um alto nível de angústia e sensação de incontrolabilidade sobre os fatos.
Embora os estudos sobre espiritualidade e saúde venham ganhando centralidade nas discussões sobre os cuidados em saúde, mostrando um cenário novo em relação aos estudos sobre essa temática (KOENIG, 2012), a maioria dos estudos focaliza o cuidado individual do paciente, sendo poucos os estudos sobre o cuidado aos familiares (WALL et al., 2007, p. 1084). Tal fato também foi apontado no estudo de Schleder et al (2013), no qual avaliaram o uso do CRE por 45 familiares de pacientes internados em UTI. As autoras constataram que os familiares utilizaram CRE Positivo mais frequentemente do que o CRE Negativo, e a maioria mencionou que a espiritualidade lhes ajudava a enfrentar a hospitalização. A partir dos dados, Schleder et al. (2013) alertaram sobre a necessidade de que a assistência espiritual fosse inserida efetivamente como prática de cuidado a pacientes e familiares de UTI.
Twohig et al. (2015, p. 281) observam que a necessidade de cuidado intensivo não só é altamente estressante para o paciente e para os familiares, como também se exacerba quando os pacientes não são capazes de tomar suas próprias decisões. Ou seja, ao sofrimento que advém da consciência da gravidade da situação, soma-se o estresse de, muitas vezes, ter de tomar decisões em lugar do familiar internado. Destaca-se que no contexto de cuidados intensivos em um hospital de urgência e trauma, a família é tomada de surpresa. Ela está diante de um evento inesperado que surge interrompendo a rotina de todos os envolvidos, interferindo na dinâmica familiar e ameaçando a continuidade da existência da pessoa internada. Assim, é natural a irrupção de questionamentos de natureza espiritual, de busca de sentido que ajude a enfrentar um evento de difícil elaboração: "Por que isso aconteceu?"; "Por que Deus permitiu que isso acontecesse?"; "Por que agora?"; "Será que Deus está me punindo por alguma coisa?"; "Como será a vida daqui por diante?". São questionamentos existenciais e espirituais/religiosos, pois em tais momentos, é comum a pessoa buscar também um sentido religioso para a experiência de sofrimento.
Assim, considerando o contexto de vulnerabilidade familiar e a necessidade de construção de sentido da experiência pela qual se está vivenciando, torna-se fundamental um olhar interdisciplinar, pois tal perspectiva leva em conta várias facetas que escapam à prática biomédica de cuidado, dominante no espaço hospitalar. O cuidado holístico é, pois, fundamental no contexto da saúde, e a colaboração interdisciplinar é essencial quando se fala na integração da espiritualidade nas práticas de cuidado em saúde (HEFTI; ESPERANDIO, 2016; PUCHALSKI et al., 2009).
A interface composta pela Bioética, Psicologia e Teologia está na promoção da saúde. Comum a essa perspectiva interdisciplinar, está a relevância da integração do cuidado espiritual na assistência ao paciente e seus familiares. O estudo de Wall et. al. (2007) mostra que as famílias que obtiveram assistência espiritual durante o internamento do familiar com doença grave na UTI, nas últimas 24 horas, relataram maior satisfação com o cuidado recebido do que as famílias que não obtiveram cuidado espiritual.
A Bioética, enquanto campo de conhecimento que reflete sobre a ética aplicada às ciências da vida em geral, e na área da saúde, em particular, contribui na discussão do tema ao reforçar duas noções caras a esse campo: vulnerabilidade e autonomia. Ao reconhecer a vulnerabilidade das famílias e a limitação da autonomia do paciente internado, a Bioética aponta a responsabilidade da equipe multidisciplinar sobre possíveis decisões éticas que se colocam nessas circunstâncias e a necessidade de que, a despeito da vulnerabilidade, os familiares sejam tratados como sujeitos autônomos e com poder de decisão.
A Bioética compreende vulnerabilidade em dois patamares de significado: o ontológico, que diz respeito à condição existencial de vulnerabilidade essencial, inerente ao desenvolvimento de todo o ser humano, e a vulnerabilidade contextual, associada aos fatores próprios de um contexto específico, onde há um aumento significativo dos riscos de danos a indivíduos ou grupos. Nesse sentido, ela chama a atenção para as vulnerabilidades próprias da área dos cuidados em saúde, sobretudo no que diz respeito ao modo como indivíduos e grupos em situação de vulnerabilidade precisam ser tratados.
A Psicologia, por sua vez, em suas várias vertentes e abordagens teóricas, seja a Psicologia Cognitiva da Religião, a Psicologia da Saúde e a Psicoterapia Sistêmica, dentre outras, contribuem com a ênfase na consideração dos processos cognitivos de coping e de coping religioso/espiritual, e com a importância de se levar em conta não apenas o paciente, mas também a família. O cuidado-centrado-na-família na qual o paciente está integrado, juntamente com a estrutura social e as relações interpessoais, emergem como elementos que não podem ser desconsiderados na situação de internamento em cuidados intensivos. O paciente, muito provavelmente será representado pela família nas questões relativas às decisões médicas. Quando a autonomia do paciente é perdida, a família toma esse lugar de decisões. A concretização prática do princípio da autonomia, no contexto da UTI, pode ser problemática, uma vez que cerca de 95% dos pacientes pode não ser capaz de exercer sua autonomia decisória em razão de seu estado de saúde ou de sedação, cabendo, assim, à família, a tomada de decisões sobre o direito de recusa de tratamentos, incluindo os procedimentos de manutenção da vida (TRUOG et al., 2008, p. 954) e/ou mesmo decisões sobre doação de órgãos em caso de óbito. Sabe-se que as crenças religiosas/espirituais influenciam as tomadas de decisões frente a situações críticas em saúde (PUCHALSKI et al., 2009; TRUOG et al., 2008; WALL et al., 2007)
Os psicólogos hospitalares podem acessar o sistema de crenças e valores dos familiares e dos pacientes, suas angústias e necessidades espirituais e trabalhar em colaboração com o capelão hospitalar. A Teologia, principalmente na figura do capelão hospitalar, contribui com o conhecimento sobre formas de acessar os recursos, as necessidades e os conflitos espirituais do paciente e de suas famílias e como tais demandas de cuidado podem ser atendidas.
Reconhece-se que a ansiedade, bastante presente em tal cenário, pode prejudicar percepções, impactar tomadas de decisões e retroalimentar ainda mais os níveis de ansiedade das famílias. A equipe multidisciplinar, a partir de um olhar holístico e que integre a dimensão da espiritualidade nas práticas de cuidado, pode contribuir de modo mais humano e compassivo no enfrentamento dos desafios de tal situação de sofrimento.
Tendo em mente que os dados foram levantados em um hospital de emergência e trauma, e que em 50% da amostra os pacientes foram a óbito, é de se supor que tal experiência tenha trazido um grau de sofrimento importante aos familiares dos pacientes. Durante as visitas na sala de espera na UTI para coleta dos dados, um dos autores deste estudo observou que em nenhum dos muitos momentos que lá esteve, encontrou algum profissional da psicologia ou capelão hospitalar prestando assistência às famílias. Não significa, entretanto, que os familiares não tenham recebido cuidados psicológico e espiritual nesse período, pois, a pesquisa não levantou esse dado. O que se quer é chamar a atenção para a necessidade de provisão de um cuidado integral, o que implica também em cuidado aos familiares e na integração da dimensão espiritual em tais cuidados, sobretudo em um momento particularmente estressante.
Em um estudo americano sobre cuidado espiritual de familiares de pacientes em UTI, os autores fazem as seguintes recomendações: 1) que haja no Departamento de Emergências do hospital, um capelão responsável em prover cuidado pastoral e espiritual aos pacientes e familiares; 2) O departamento de cuidado pastoral/espiritual deve prover treinamento e recursos aos médicos e residentes sobre crenças religiosas de várias tradições e o impacto de tais crenças nos cuidados em saúde e nas decisões éticas; 3) Os médicos devem estar familiarizados com as pesquisas e com a literatura sobre a relação entre religiosidade (crenças e práticas religiosas), por exemplo, oração e saúde e cura; 4) Os médicos do Departamento de Emergência e a equipe multidisciplinar devem ter um entendimento básico sobre a necessidade de se fazer uma anamnese espiritual, no sentido de cuidar para que seja simples e de modo não intrusivo, com a finalidade de determinar se o paciente está experienciando alguma necessidade espiritual específica, ou mesmo angústia e/ou conflito espiritual, a fim de fazer o encaminhamento devido à pessoa capacitada para fazer um atendimento espiritual adequado (BEST et al., 2016).
Era interesse dessa pesquisa, constatar se as mudanças nas práticas religiosas semanteriam nos meses seguintes à alta hospitalar. Apenas 6 pessoas perceberammudança nas práticas após os 6 meses por motivos de: 1) O parente já estar em casa emelhor, diminuindo a prática (sujeitos 11 e 13); 2) Com a melhora do parente,diminuiu o excesso de responsabilidades, o que permitiu aumentar a prática (sujeitos9 e 10) e 3) Pelo fato de o parente ainda estar sem mobilidade, foi necessárioaumentar a prática (sujeitos 5 e 8).
Considerando que a maioria dos familiares, 60%, fez uso das estratégias de coping religioso espiritual, torna-se bastante evidente a necessidade e relevância de uma assistência espiritual efetiva aos familiares de pacientes em UTI.
Os dados sugerem que a religiosidade é uma forma de enfrentamento muito utilizada em situações estressantes. Contudo, não se pode reduzir o comportamento religioso/espiritual ao efeito que ele promove em relação ao alívio das tensões no contexto de ameaça à vida. A espiritualidade/religiosidade é um elemento constituinte da subjetividade daquele que crê e é uma força definidora/determinante dos traços de caráter, de personalidade e de estilo existencial. Nesse sentido, a desconsideração dessa dimensão humana na compreensão do sofrimento e nas propostas de cuidado coloca em evidência uma prática de cuidado que se distancia de um olhar integral/holístico do sujeito que sofre e distancia-se também de um cuidado centrado-no-paciente, nas suas necessidades físicas, emocionais e espirituais.
Apesar da existência de outros recursos como amigos, familiares e ciência, a maioria dos participantes desta pesquisa indicou a utilização de práticas e/ou fé religiosa para suportar os momentos de incerteza e sofrimento na espera pela melhora de um parente internado em UTI.
Observou-se que os familiares, na sua maioria, ou mantiveram sua prática religiosa, ou, inclusive, aumentaram a frequência de algum comportamento, como orações, novenas ou frequência à missas/cultos. Isso, mais uma vez, dá indicativos de como a questão coping religioso é um elemento importante na abordagem dessa clientela em condições de adoecimento grave e de limites entre a vida e a morte.
Incluir a observação e manejo do coping religioso mostra-se uma ferramenta ou estratégia muito importante para os profissionais de saúde, principalmente em hospitais. Com os dados obtidos, sugere-se que o profissional psicólogo se prepare para abordar tais questões com o paciente de UTI e seus familiares, uma vez que esse tipo de enfrentamento auxilia no desenvolvimento de respostas emocionais relativas à esperança e possível redução de ansiedade em situações estressantes dessa clientela. Além disso, a presente pesquisa indica a necessidade de interdisciplinaridade entre o psicólogo e os serviços de apoio espiritual/religioso como as capelanias dos hospitais, ou seja, estimular a atuação dos campos da ciência e da fé. O trabalho conjunto só pode, dessa maneira, beneficiar mais ainda o bem- estar ou conforto dos familiares e pacientes, dentro de uma perspectiva contemporânea dos processos de saúde-doença. Além disso, toda a equipe multidisciplinar estará mais equipada para melhor atender aos pacientes e familiares das Unidades de Tratamento Intensivo ao integrar conhecimentos de Bioética em seus referenciais teórico-práticos.
Por fim, crê-se que uma melhor compreensão sobre o modo como os familiares integram a espiritualidade/religiosidade no enfrentamento da situação do familiar internado em UTI favorecerá não apenas uma maior integração dos profissionais da saúde com a perspectiva dos familiares, mas também possibilitará um cuidado mais integral ao paciente internado. Os resultados abrem questionamentos diversos acerca do cuidado exercido no contexto hospitalar, incluindo aí, as novas demandas de cuidado espiritual pela equipe multidisciplinar e do papel do capelão hospitalar.
Quanto ao avanço dos estudos, destaca-se a necessidade de investigações que levantem o modo como a variável espiritualidade/religiosidade funciona nos processos de saúde/doença, sob quais condições os resultados são mais positivos; as decisões éticas que são mais impactadas pelas crenças religiosas/espirituais, e os limites e desafios no processo de integração da espiritualidade nos cuidados em saúde. Essas são apenas algumas sugestões. As pesquisas sobre espiritualidade e saúde, no Brasil, ainda têm um longo caminho a percorrer.