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Direito e Religião: abordagens específicas
Interações: Cultura e Comunidade, vol. 13, núm. 24, 2018
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Resenhas



Aprovação: 24/12/18

Direito e Religião: abordagens específicas

A obra Direito e Religião: abordagens específicas, organizada pelo Prof. Dr. Marcio Henrique Pereira Ponzilacqua, cuja formação de graduação é Direito, apresenta a compilação de artigos elaborados por doutores(as) graduados(as) em Direito e com formações em pós-graduações variadas, sobretudo em Direito, Sociologia do Direito e Sociologia da Religião. Essa obra é decorrente do Projeto de Pesquisa FAPESP (2013-15) USP, dada a importância da religião na sociedade e nas normatividades vigentes. Os(as) autores(as) trazem abordagens temáticas que se assentam sobre as relações entre direito, religião, Estado e sociedade.

O primeiro capítulo intitulado Direito e religião no Brasil, da autoria de Marcio Henrique Pereira Ponzilacqua, também organizador da obra, se propõe a expor um panorama do que denomina o direito religioso no Brasil. Para tanto, aborda a relevância sociojurídica do tema, com aprofundamento nas escolas jurídicas e na jurisprudência brasileira, especialmente a partir do Superior Tribunal Federal (STF) e dos Tribunais Regionais. As principais temáticas apontadas são: consciência e convicção pessoal e coletiva; convicção religiosa e a ordem jurídico-administrativa; ordem tributária; bioética e biodireito, bem como casos emblemáticos envolvendo dízimos, acústica das igrejas, relações trabalhistas e a liberdade de imprensa em relação às igrejas. Essa demanda social religiosa compele o Estado brasileiro, mesmo sendo laico.

Aliás, sobre a laicidade, no segundo capítulo intitulado Organizações religiosas no Brasil da autoria de Gustavo Saad Diniz, a abordagem é sobre a separação entre religião e Estado brasileiro. O autor traça uma síntese histórica das Constituições brasileiras e a relação com a religião, destacando a Constituição de 1988 por consolidar a liberdade religiosa. Discute também o associativismo e a associação (arts. 2.031 do Código Civil vigente), com fundamentos Constitucionais (art. 5º, inciso XVII, da CF). Nesse cenário, reflete sobre a imunidade tributária aplicável às ‘organizações religiosas’ (termo utilizado por vários pesquisadores de Direito). Há várias discussões sobre a plausibilidade ou não da continuidade da imunidade tributária como parte da liberdade religiosa no Brasil.

Nesse esteio tributário face à religião, o terceiro capítulo denominado O financiamento de organizações religiosas no sistema tributário alemão, da autoria de Karoline Marchiori de Assis, esclarece o imposto eclesiástico previsto no ordenamento jurídico alemão. A autora aduz que nos diferentes ordenamentos jurídicos, há vários modos de financiamento das ‘organizações religiosas’, relacionados à forma pela qual Estado e Igreja interagem.

Sobre a relação entre membros e Igreja, outro aspecto atualmente muito debatido é o tema Relação de emprego dos ministros de confissão religiosa, da autoria de Jair Aparecido Cardoso e Amanda Barbosa, proposta no quarto capítulo. A controvérsia sobre as relações trabalhistas ocorre, sobretudo, em relação aos ministros religiosos. O texto indica que as decisões judiciais apontavam para a não configuração da relação de emprego. No entanto, há recentes reconhecimentos de vínculo de emprego aos ministros religiosos no exercício de suas funções – Tribunal Superior do Trabalho – TST.

Diante de decisões judiciais que se diferem sobre a mesma temática, o quinto capítulo A Constituição e jurisprudência comparada, da autoria de Jonathan Hernandes Marcantonio, foca em delinear os desdobramentos e alcances normativos das três liberdades que compõem a liberdade religiosa, demonstrando como a Constituição Federal a recepcionou. Para tanto, o autor apresenta a jurisprudência constitucional comparada e o estado da arte da proteção jurisdicional da liberdade religiosa pelo STF no Brasil.

A liberdade religiosa é um direito fundamental, resultado da laicidade. Nesse sentido, o sexto capítulo Religião e Estado na filosofia hegeliana: desafios de uma ética global, da autoria de Cristina Godoy Bernardo de Oliveira, considera que Hegel visa estabelecer as características da religião na modernidade a partir da secularização do Estado e a presença da religião para estabelecer os contornos da política, o que permitiria uma atmosfera de tolerância e de reconhecimento entre os cidadãos, numa eticidade global. Nesse objetivo, os cultos religiosos de uma comunidade seriam os pilares da construção do Estado e da eticidade. Por fim, a autora pontua que a identificação coletiva na ordem internacional se refere à elaboração de um ethos global que viabilizará a preservação do princípio fundamental presente nas relações internacionais: o reconhecimento mútuo.

Não obstante, esse mesmo preceito de reconhecimento mútuo, traz consigo a liberdade de convicção. Por isso, o sétimo capítulo Liberdade de convicção e crença na América Latina: horizontes e desafios, da autoria de Marcio Henrique Pereira Ponzilacqua e Lucas Massoni Costa, aponta a dificuldade de conceituar o termo religião e sua respectiva liberdade, na América Latina e Caribe. As reflexões focam na proteção da liberdade religiosa; no paradoxo da tolerância; nas retroações com ameaça ao princípio da neutralidade e da confessionalidade, ditos laicidade estatal; nas ameaças crescentes à liberdade religiosa de grupos diversos, sobretudo, dos sem crença e a supressão de símbolos religiosos em espaços públicos; nos não filiados que se vinculam a múltiplas matrizes religiosas; no biodireito e os respectivos conflitos com algumas crenças.

A judicialização de temas decorrentes das religiões é latente, logo, a relação religião e Estado são frequentes. Desta forma, o oitavo capítulo Religião e Estado: A Ostentação de Símbolos Religiosos nos Espaços Públicos, da autoria de Gabriel José Bernardi Costa, aborda a laicidade sob o viés dos símbolos religiosos nos espaços públicos e cita o posicionamento do Conselho Nacional de Justiça em 2007 ao rejeitar os pedidos de remoção dos símbolos religiosos dos respectivos tribunais brasileiros. Semelhante interpretação constou na decisão da Ação Civil Pública nº 2009.61.00.017604-0 oferecida pelo Ministério Público Federal. Cumpre citar o posicionamento da Juíza Federal Maria Lucia Lencastre Ursaia: “a laicidade não poderia se expressar na eliminação dos símbolos religiosos, mas em sua tolerância.” (ACP 2009.61.00.017604-0).

Essa tolerância do Estado face às religiões é abordada no nono capítulo Laicização, secularização e o desafio do islamismo na França, da autoria de Matheus Duarte Silva Pinho. O autor trabalha com a Constituição americana de 1787 que é laica, pois separa as instituições políticas das religiosas. Trata da Alemanha, como democracia laica, na qual a autonomia do político frente ao religioso não teve de ser conquistada por meio de um conflito com uma religião dominante. Cita a Declaração de Independência israelense, de 14 de maio de 1948, pois mesmo havendo conflitos relativos ao tema a Suprema Corte, tem sido garantidora de um direito laico. Por fim, aborda a laicidade ideológica francesa, cujo modelo de laicização encontra suas raízes na Revolução Francesa e nesse cenário destaca a questão do véu islâmico, discutido na França a partir de meados de 1990. Por fim, questiona a relação do Estado com a religião.

Parece-nos que esta obra denota importância para os estudos das Ciências da Religião e de Teologia, pois apresenta um cenário de análises que envolve a relação Direito e Religião, sem se desviar da relação entre laicidade e liberdades religiosas. Ademais, propõe a reflexão da temática na perspectiva do Estado Brasileiro e seu ordenamento jurídico, assim como também lança luzes sobre as tratativas de outros Estados e suas Constituições, ampliando o escopo de conhecimento. Além disso, importa-nos refletir sobre a interdisciplinaridade entre Direito e Religião, percebida como profícua. Ademais, há questões dos fenômenos religiosos e das organizações sociais proposta pelas religiões, que demandam questões jurídicas normativas, mas também estudos das Ciências da Religião e Teologia. Nesse aspecto, apontamos como oportuno, que os pesquisadores do Direito, das Ciências da Religião e da Teologia, utilizem dessa interdisciplinaridade para enriquecimento dos estudos e pesquisas cuja abordagem exija um escopo teórico que relacione o Direito, as Ciências da Religião e a Teologia.

Direito e Religião: abordagens específicas

PONZILACQUA, Marcio Henrique Pereira (Organizador). Direito e Religião: abordagens específicas. Ribeirão Preto: SDDS/ FDRP USP, 2016. 175 p. ISBN (e-book) 978-85-62593-18-5



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