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MARKETING EXISTENCIAL: a produção de bens de significado no mundo contemporâneo
Interações, vol. 14, núm. 25, 2019
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

RESENHAS


. PONDÉ, Luiz Felipe. Marketing existencial: a produção de bens de significado no mundo contemporâneo. São Paulo: Três Estrelas, 2017, 182 p.. 2017. São Paulo. Três Estrelas

Recepção: 30 Janeiro 2019

Aprovação: 24 Julho 2019

Resenha

Escrito por Luiz Felipe Pondé, filósofo e professor da Pontifícia Universidade Católica em São Carlos (PUC São Paulo), o livro visa tanto problematizar a natureza do olhar contemporâneo acerca dos bens de significado, como colocar em relevo as questões mais profundas da condição humana, na relação com o consumo no século XXI. Consiste em examinar a possível interação entre os fenômenos estáveis e instáveis das estruturas da vida e dos processos de constituição de significados, a partir dos pressupostos da Filosofia da Existência, especialmente, do pensamento filosófico de Kierkegaard. Neste sentido, apontam-se subsídios fenomenológicos que visam contribuir para levar o sujeito à consciência de si mesmo no mundo. Nesta direção, para que o leitor tenha, em primeira mão, um breve panorama da proposta, destacamos, sumariamente, cada um dos temas arrolados.

A estrutura da obra compreende três partes: a primeira, intitula-se Os fundamentos do marketing existencial e é composta por cinco capítulos, a saber: O primeiro capítulo, Filosofia da Existência: os modos de enfrentamento da crise de sentido da vida, ou a raça de abandonados de Horkheimer. Apontam-se os pressupostos da própria existência humana, a experiência de um ser que não se deixa determinar pela noção de essência, mas que encontra na angústia do abandono do eu, a sua sorte e contingência. O segundo capítulo denomina-se As condições de possibilidade da marketização do significado no mundo atual. De caráter mais sociológico, esta parte procura problematizar a relação entre o marketing religioso e as condições históricas que o possibilita. A forma como a experiência religiosa reforça a visão narcísica, à medida que provoca o surgimento de um novo mercado produtor de pseudossignificados e ilusórias seguranças. O terceiro capítulo tem como título Marketing como ontologia: Capitu traiu Bentinho? O escritor questiona a criação de um novo tipo de self que, sucumbido pelo direito à felicidade, sente-se, cada vez mais, na razão de afirmar a realização absoluta dos seus anseios e expectativas, em todos os planos da vida psicológica e social. Uma forma de existência pragmática que, calcada em um viés utilitarista de resultados, visa a otimização do bem-estar e a eliminação do mal-estar a qualquer custo. No quarto capítulo, O self narcisista consumidor de significados e o contrato utilitário como modelo de sociedade avançada de direitos, fala-se de um eu narcísico como fenômeno psicossocial, um ente que recusa toda e qualquer forma de vida que se opõe ao seu anseio utilitarista e forma de produção de sentido. O quinto capítulo, O marketing e os estágios da existência: estético, ético e espiritual, descreve como a estrutura psicossocial do consumidor afirma-se através de viagens, planejamento significativo das atividades quotidianas e busca por espaços de cultivo espiritual e desenvolvimento da consciência interior.

A segunda parte do livro denomina-se As diferentes formas de marketing existencial e seus produtos, contendo 17 capítulos. No primeiro, Bens de significado de luxo e de massa: o que é uma personalidade luxuosa? O texto explora a dimensão ontológica e a natureza dos comportamentos de luxo e glamour; o momento em que a simples necessidade de sentido é estranhamente substituída por uma busca de significado fáustico para a vida. No capítulo segundo, Religião e espiritualidade de consumo, analisa-se como a espiritualidade traduz-se em commodities. Comenta-se, por exemplo, sobre a emergência do mercado evangélico neopentecostal, a segmentação protestante e a reação da Igreja Católica frente à perda de mercado na América Latina, diante das antigas e novas formas de espiritualidade de consumo. O capítulo três, Qual o significado de uma viagem? O gosto do vulcão na alma, volta-se às questões práticas. Ou seja, ao modo como a burguesia enxerga-se enquanto classe social, esteticamente administrada e existencialmente tediosa. No quarto capítulo, aponta-se para O estilo como o futuro da personalidade: o marketing do comportamento. As maneiras como roupas, restaurantes, viagens, exercícios espirituais e sexualidades passam a funcionar como agentes constituidores da construção do eu e marcos fundantes e diferenciadores das identidades individuais. Algo que, no quinto capítulo, aparece na forma de um Mal ou a indiferença como significado e estilo, isto é, a recusa de vínculos que considera a autonomia como forma máxima de afirmação social e justificativa moral para o descarte do outro, do fraco e do diferente. O capítulo sexto, discute A moda do bem: o risco de você virar um idiota. Aqui estão listados bancos, produtos, igrejas, programas de televisão e pessoas, que ao sentirem-se parte de uma cadeia ancestral de cuidados são levadas a um estado de autopromoção, que tenta redimi-las da conflitante consciência que representa o vazio das suas próprias almas. O capítulo sete, volta-se à Comida como statement. Quando o ato de comer está condicionado à preservação dos animais, a presença em um determinado restaurante, o preparo da comida por um importante chef e a marca do alimento, exposto na embalagem, demonstra respeito à natureza e a coisas do gênero. O oitavo capítulo, destaca o Amor como sentido. A forma como a construção de vínculos permanentes afirma-se na sociedade líquida, a partir do suporte real dos bens materiais como casa própria, viagens, hotéis, restaurantes, joias, entre outras. Atos através dos quais a relação eu-tu converte-se em uma memória do eu-isso.

Em um mundo gerador de múltiplos sentimentos, como o do capitalismo contemporâneo, onde, cada vez mais, se fala que desejos são direitos, Valores negativos como significado: inveja e ressentimento na alma em busca de reconhecimento, são tendências emocionais que se justificam como plausíveis. Ao refletir sobre esta temática, no capítulo nove, o autor convida-nos a pensar como a competição pode se tornar uma fonte inesgotável de inveja e ressentimento. Ressentimento e demanda por reconhecimento são ideias-chave exploradas pelo marketing existencial. No décimo capítulo, ao analisar a ideia de Significado para pobres, questiona-se: que bens de significado as classes menos favorecidas consomem? Sua intenção é afirmar que para o marketing existencial, o significado da vida encontra-se na construção de um mundo melhor para a humanidade no futuro. Partindo, então, desse horizonte é que, no capítulo onze, comenta-se acerca dos Significados para pobres de espírito. Pobre de espírito é alguém com uma alma mesquinha, pequena e desfigurada. Indivíduos que precisam, encarecidamente, de significados capazes de gerar sensações de segurança, vistos como necessários à própria condição humana. No capítulo doze, a discussão se volta para o Consumo humanista: o capitalismo criou corvos que comerão os próprios olhos. Onde comenta-se sobre as contradições humanas e sociais. A prática que faz do discurso corporativo um marketing de propagação de “valores” que pretendem ressignificar a vida, tornando-a capaz de suscitar no homem sua condição mais sensível: o eu narcísico. Em contraposição ao consumo humanista, no capítulo treze, defende-se a Desconexão como estilo de vida. Desconectar-se, significa liberdade, autonomia e capacidade de escolha e decisão. Uma espécie de estoicismo contemporâneo que, denunciando a efemeridade do mundo, escolhe isolar-se com o fim de alcançar profundidade e verdade do ser. No décimo quarto capítulo, o tema é o Business do bem. Uma novidade do mercado de palestras corporativas que advoga a favor da busca humana por significados éticos. Um campo lucrativo do marketing existencial que oferece consultorias que visam a promoção de “valores” e não, simplesmente, de produtos e marcas. Neste sentido, surge, no capítulo quinze, a nova Geração milênio. Os Milênios são seres solitários, extremamente focados na vida profissional e autossuficientes. Gente que faz da comida orgânica, das viagens e do próprio estilo radical de viver um “Ethos” existencial que, em geral, é fluído, volúvel e narcisista. A geração dos “Milênios” é ávida, capítulo dezesseis, por Produtos niilistas: a elegância de não crer em nada. Dizer que não se crê em nada, passa a imagem de alguém que é forte, independente e bem resolvido: o resgate moderno, consumista e equivocado do mito do super-homem. Seu habitat natural é o mundo das mídias digitais e os sites de redes sociais. Ao tratar sobre o Marketing existencial e as mídias sociais, no capítulo dezessete, o autor fecha a segunda parte da obra, fazendo uma crítica aos processos de massificação que se segmentam nas redes sociais.

Na terceira parte do livro, intitulada Desafios e impasses do marketing existencial, no capítulo primeiro, problematiza-se: Existe alguma verdade possível no marketing existencial? No mundo do marketing, a verdade é só mais um produto, porque nunca se sabe qual é a fronteira entre a realidade e aquilo que é mera projeção mercadológica. Neste contexto, a verdade se confunde tanto com uma mera sensação midiática, como com o sentimento de pura construção contingente. Na ambivalência entre marketing e verdade, dificilmente saber-se-á o limite entre a realidade e o que fazemos com ela. Ao falar da relação entre verdade e autenticidade, o autor nos lembra, no capítulo dois, A autenticidade como herança romântica, que no Romantismo existe a crença que pessoas verdadeiras agem a partir do que sentem, e não de resultados pragmáticos. Algo que, no marketing existencial, é visto como a capacidade humana de transformar o mal-estar da solidão em um processo de mercantilização da alma. No terceiro e último capítulos, Desespero, medo e ressentimento como fundamentos da vida em sociedade na época atual, resgata-se a ênfase da problemática da infelicidade e do desamparo do self na sociedade de consumo.

Sob este prisma, tão oportuno quanto fecundo, a presente obra representa uma relevante contribuição não somente para os estudiosos do marketing em geral, mas para leitores afeitos à rica tradição fenomenológica-existencial. Trata-se de uma discussão que provoca inúmeras reflexões. Primeiro, é possível fazermos uma crítica sobre a própria estrutura da obra, considerando seus limites quanto às diferenças de organização, tematização e construção do pensamento. Segundo, existem algumas notas e afirmações que não encontram justificativas no conjunto das obras de certos autores. Como exemplo, destaca-se a classificação reducionista do Karl Jaspers como um “filósofo existencialista cristão” (p. 25); algo que o próprio Jaspers refuta em algumas de suas obras e produções, entre outras, destacamos: Iniciação Filosófica. Lisboa: Guimarães Editores, 1949. Terceiro, destaca-se a forma compactada de muitos capítulos. Um tipo de elaboração em que as construções de alguns parágrafos nem sempre são coesos e progressivos em relação à formatação das principais ideias anunciadas, suas representações e aplicabilidades. Estas considerações não pretendem estabelecer um conceito qualitativo e/ou valorativo acerca da obra, mas, visam apenas, chamar a atenção para o modo como a proposta é apresentada, desenvolvida e, possivelmente, analisada. Assim, suas apreciações expressam um caminho de pensamento acerca de problemas que envolvem não só a produção do próprio marketing, como também um modo do homem moderno produzir bens que sejam traduzidos em significados duradouros e profundos para sua existência. Sob este prisma, tão oportuno quanto fecundo, o livro é entendido como um convite não só aos leitores da Filosofia da Existência, mas a todos aqueles e aquelas que, comprometidos com o processo de formação humana, estão engajados tanto na busca pelo esclarecimento de si mesmos, como pela prática de um agir coerente. Deste modo, acrescentamos que a amplitude e diversidade da produção, desta obra, acenam para uma gama de temas, ideias, discussões e elaborações que poderão mostrar-se fecundas e promissoras dentro do cenário da sociedade atual. O livro abre, ainda, pontos de partida para outros estudos e pesquisas via abordagens existenciais.

Marketing existencial: a produção de bens de significado no mundo contemporâneo

PONDÉ, Luiz Felipe. Marketing existencial: a produção de bens de significado no mundo contemporâneo. São Paulo: Três Estrelas, 2017, 182 p.



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