1 INTRODUÇÃO

A secularização da sociedade é um processo histórico decisivo na formação das sociedades modernas ocidentais, tendo contribuído para os processos de autonomia, racionalização e emancipação do sujeito, das instituições político/jurídicas e das atividades artísticas e culturais em geral. Para Peter Berger (2012) a secularização se configura objetivamente num processo social em que a religião e seus símbolos perdem a credibilidade e a capacidade de legitimação da realidade. O processo ocorre em face de alterações na concepção de mundo do indivíduo, uma vez que a religião perde o seu caráter determinante e evidente sobre a consciência humana.

O termo secularização assumiu características polissêmicas, sendo utilizado na definição de uma série de fenômenos sociais, culturais, econômicos e religiosos. O processo de secularização como fenômeno histórico e fenômeno subjetivo da consciência humana, se tornou objeto de pesquisa em diversas áreas do saber. Essa comunicação, entretanto, se limita à análise das teses e dissertações sobre o tema da secularização produzidas no âmbito das Ciências da Religião no Brasil.

Os primeiros programas de pós-graduação em Ciências da Religião (PPGCR) foram instituídos no Brasil no final dos anos 70, porém, a primeira pesquisa discente sobre a secularização surgiu apenas em 1999. A investigação da secularização na produção discente dos PPGCR foi centrada nos temas: biodança, teologia da secularização, análise histórica, filosofia da religião, sociologia da religião, filosofia do direito, análise estatística e campo axiológico das relações de mercado (SILVA, 2016).

Diante desse horizonte abrangente e polissêmico, buscando estabelecer a possibilidade de uma secularização à brasileira é que foi produzida a dissertação, a partir do método religiográfico, da qual destacamos essa comunicação (SILVA, 2016). As teses e dissertações dos PPGCR foram escolhidas a partir da presença do termo secularização nas palavras chaves. Após coletadas segundo o critério escolhido, foram identificadas 09 pesquisas (07 dissertações e duas teses)1.

A pesquisa religiográfica empreendida teve por objetivo estabelecer as principais tendências teóricas das pesquisas sobre a secularização, bem como estabelecer as seguintes relações de produção acadêmica: 1) produção em relação ao tempo; 2) espaço geográfico; 4) autores mais citados nas pesquisas; 5) autores mais citados por obras; 6) obra mais utilizada nas citações, 7) principais instituições produtoras de pesquisas, 8) tipo de instituição, e 9) confessionalidade das instituições.

2 LEVANTAMENTO RELIGIOGRÁFICO E RESULTADOS OBTIDOS

Para elaborar a pesquisa religiográfica das pesquisas sobre a secularização nas teses e dissertações dos PPGCR brasileiros, alguns passos foram seguidos. A pesquisa religiográfica, à semelhança das pesquisas estado da arte, busca obter dados seguros para o estabelecimento de análises e/ou diagnósticos da produção de determinado tema. No caso da pesquisa religiográfica, o tema deve ser relacionado aos estudos da religião. A pesquisa religiográfica seguiu basicamente cinco etapas: 1) pesquisa bibliográfica e escolha das pesquisas sobre a temática da secularização; 2) organização e sistematização dos dados a partir da ordem cronológica; 3) leitura das teses e dissertações selecionadas; 4) organização e sistematizações das pesquisas através de fichamento e cruzamento dos dados; 5) Demonstração qualitativa e quantitativa (estatística) dos dados obtidos através de gráficos, tabelas e colunas.

O primeiro resultado obtido diz respeito às principais tendências teóricas das teses e dissertações sobre o tema da secularização. Duas tendências emergiram das pesquisas: 1) a temática foi analisada nas pesquisas sob a ótica dualista de oposição entre secularização e religião. Essa constatação se dá em oito, dos nove trabalhos analisados, o que demonstra a influência de Peter Berger (influenciado por Max Weber) na conceituação da secularização; 2) as pesquisas foram elaboradas sob o viés da Sociologia, Teologia, Filosofia e História, evidenciando a polarização do interesse investigativo dos estudos da secularização nas Ciências Humanas e na compreensão.

A segunda questão (tabela 1) sobre a produção acadêmica em relação ao tempo constatou que a primeira pesquisa sobre a secularização foi concluída após vinte e um anos da institucionalização das Ciências da Religião no Brasil, de modo tardio, já que nesse mesmo ano Peter Berger (2001) voltou atrás em suas considerações sobre a secularização, além do fato de que temas como dessecularização, retorno do sagrado e reencantamento do mundo já estavam em pauta.

A terceira questão (tabela 2) diz respeito ao espaço geográfico das produções acadêmicas sobre o tema da secularização. As pesquisas ficam restritas aos PPGCR São Paulo com cinco pesquisas (PUC SP; UMESP; Mackenzie) e Minas Gerais com quatro (UFJF; PUC Minas).

A quarta questão (tabela 3) diz respeito aos autores mais citados por número de pesquisas. Peter Berger e Friedrich Nietzsche são os mais citados nas pesquisas. Rubem Alves aparece em terceiro lugar, ao lado de Max Weber.

A quinta questão (tabela 4) analisada apresenta determinado conflito em relação a questão anterior. Em relação aos autores mais citados por obras, Gianni Vattimo é o primeiro colocado com 43 citações (o autor é citado em apenas duas pesquisas) e, Jürgen Habermas o segundo, com 37 citações.

A sexta questão (tabela 5) faz jus a presença maciça de Peter Berger nas pesquisas. A obra mais utilizada nas citações das teses e dissertações foi O dossel sagrado, presente em seis das nove pesquisas. Apesar de Berger ter voltado atrás em diversos pontos presentes nessa obra, ela permanece a obra prima da secularização no Brasil. Em seguida vem A gaia ciência, de Nietsche, e Rumor de Anjor de Berger, ambas com 3 citações.

A sétima questão (tabela 6) analisou as instituições que mais produziram pesquisas sobre o tema da secularização. A Universidade Metodista do Estado de São Paulo (UMESP), liderou o ranking com 4 pesquisas (1 tese e 3 dissertações); seguida pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), com 2 pesquisas (1 tese e 1 dissertação) e a Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), também com duas pesquisas (2 dissertações); e por último a Universidade Presbiteriana Mackenzie, com 1 dissertação

A oitava questão (tabela 7) analisou a distribuição da pesquisa por tipo de instituição. Há predominância das instituições privadas que respondem por 77,78% da produção da produção acadêmica sobre o tema da secularização. Já as instituições públicas, respondem por 22,22%.

A nona questão (tabela 8) trata da confessionalidade das instituições. As instituições de confessionalidade protestante: UMESP e Mackenzie produziram cinco das nove pesquisas (1 teses e 4 dissertações), correspondendo a 55,56% das pesquisas. A PUC Minas, de confessionalidade católica, produziu duas pesquisas (2 dissertações), correspondendo a 22,22%, e a UFJF (1 tese e 1 dissertação), instituição leiga, também produziu duas pesquisas (1 tese e 1 dissertação) correspondendo também a 22,22%. Desse modo, foi possível constatar que as instituições confessionais (cristãs) responderam por 77,78% da produção acadêmica sobre a secularização, e a instituição pública e laica, respondeu por 22,22%.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma questão evidenciada através da pesquisa é que a investigação da secularização permaneceu restrita à esfera das Ciências Humanas. Esse diagnóstico possibilita a abertura do tema à análise investigativa de outras áreas do conhecimento. Concluímos também que as discussões sobre o tema da secularização são relativamente recentes, e que ficaram restritas geograficamente ao eixo Minas/São Paulo. Outra constatação é que as pesquisas foram construídas à partir de referenciais teóricos estrangeiros, não havendo espaço amplo e diálogo com os autores brasileiros, à exceção de Rubem Alves. De igual modo, nenhuma obra nacional foi citada de modo relevante. Em relação ao problema principal dessa pesquisa, baseado nos dados obtidos, afirmamos que há sim, uma secularização à brasileira, ainda que pouco explorada e compreendida, elaborada a partir de um referencial teórico importado, arraigado e enraizado em temáticas e em autores estrangeiros. O rigor na pesquisa científica, aliado ao ateísmo metodológico e a neutralidade axiológica em pesquisas produzidas nos PPGCR, especificamente nos Programas confessionais, é uma prova irrefutável de que a secularização está presente no Brasil, e em pleno vigor sob os auspícios da privatização e polarização religiosa.

REFERÊNCIAS

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