Secciones
Referencias
Resumen
Servicios
Descargas
HTML
ePub
PDF
Buscar
Fuente


O SOCORRO DOS PADRES DO CANADÁ: redes missionárias católicas na América em meados do século XX1
THE HELP OF CANADIAN PRIESTS: catholic missionary networks in America in the mid-twentieth century
LA AYUDA DE LOS SACERDOTES CANADIENSES: redes de Misioneiros católicos en América a Mediados del siglo XX
Interações, vol. 17, núm. 1, pp. 133-154, 2022
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

ARTIGOS



Recepción: 10 Mayo 2021

Aprobación: 02 Diciembre 2021

Resumo: O artigo tem como objetivo principal analisar a empresa missionária católica da província de Québec (Canadá) em direção à América Latina e Brasil em meados do século XX. Concentra-se especificamente nos primeiros movimentos na década de 1950, reconstruindo em perspec-tiva histórico-descritiva a sua trajetória. Refletindo um deslocamento da missão católica em transformação na Igreja universal, as dioceses passaram a desempenhar naquele período um papel cada vez mais central nas missões intercontinentais. A partir deste chamado, partem da província de Québec, no Canadá, os primeiros missionários para a região nordeste do Brasil, Maranhão, mais precisamente. Além de estudos bibliográficos, o artigo se baseou principal-mente no estudo de fontes primárias, inéditas no Brasil, pesquisadas nos Arquivos do Semi-nário de Nicolet, na província de Québec, Canadá.

Palavras-chave: Missão, Missão católica, Redes missionárias católicas.

Abstract: The main objective of the article is to analyze the Catholic missionary company in the province of Québec (Canada) towards Latin America and Brazil in the middle of the 20th century. It focuses specifically on the first movements in the 1950s, reconstructing its trajectory in a his-torical- descriptive perspective. Reflecting a shift in the Catholic mission under transformation in the universal Church, dioceses began to play an increasingly central role in intercontinental missions at that time. From this call, the first missionaries to the northeast region of Brazil, Maranhão, leave the province of Canada, more precisely. In addition to bibliographic studies, the article was based mainly on the study of primary sources, unprecedented in Brazil, re-searched in the Archives of the Nicolet Seminary, in the province of Québec, Canada.

Keywords: Mission, Catholic mission, Catholic missionary networks.

Resumen: El objetivo principal del artículo es analizar la compañía misionera católica en la provincia de Québec (Canadá) hacia América Latina y Brasil a mediados del siglo XX. Se centra específicamente en los primeros movimientos de la década de 1950, reconstruyendo su trayectoria en una perspectiva histórico-descriptiva. Como reflejo de un cambio en la misión católica en transformación en la Iglesia universal, las diócesis comenzaron a desempeñar un papel cada vez más central en las misiones intercontinentales en ese momento. A partir de este llamado, los primeros misioneros de la región noreste de Brasil, Maranhão, abandonan la provincia de Canadá, más precisamente. Además de los estudios bibliográficos, el artículo se basó princi-palmente en el estudio de fuentes primarias, inéditas en Brasil, investigadas en los Archivos del Seminario de Nicolet, en la provincia de Québec, Canadá.

Palabras clave: Misión, Misión católica, Redes católicas misioneras.

1 INTRODUÇÃO

O artigo apresentado é resultado parcial de pesquisa como professor visitante na Faculté de Sciences Religieuses de la Université Laval (Québec, Canadá) realizada em 2015. O texto reflete parte de pesquisa desenvolvida nos arquivos do Seminário de Nicolet,[2] pequena cidade próxima à Québec city, e na biblioteca da Université Laval.

A pergunta que o norteia gira em torno da presença, ainda pouco explorada pela historiografia brasileira, das redes missionárias católicas que foram constituídas nos meados do século XX. A partir da década de 1950, milhares de missionários provindos do Canadá, particularmente da província de Québec, dirigiram-se para a América Latina. O Brasil foi aquele que recebeu o maior número, concentrando as missões contemporâneas no nordeste do país.

A presença dos missionários nos demonstra, a partir das crônicas escritas por eles, o choque cultural entre o nórdico e o brasileiro nordestino, as expectativas e questões que traziam, o choque entre o catolicismo oficial québécoise e o catolicismo popular e desinstitucionalizado local. O objetivo, destarte, é realizar uma aproximação desse contexto, buscando apontar alguns desenlaces dessa relação.

A investigação se concentrou no estudo de fontes primárias. Além das crônicas escritas pelos missionários, também se utilizou de revistas religiosas canadenses da época, que se dedicavam ao tema da missão, e outros documentos, como algumas correspondências.

Para alcançarmos o objetivo, dividimos o texto em três partes, além da introdução e conclusão. Na primeira delas trataremos brevemente das relações entre Canadá e Brasil e o lugar do intercâmbio cultural-religioso desse horizonte. Na segunda, buscamos compreender as mudanças no campo missionário católico no período e o lugar do Brasil. E, por fim, a presença dos missionários de Québec no nordeste brasileiro, particularmente o Maranhão, onde desenvolveram inúmeras atividades em duas pequenas cidades.

2 O DESENVOLVIMENTO DA PERSPECTIVA MISSIONÁRIA ENTRE CANADÁ E AMÉRICA LATINA

As relações entre Brasil e Canadá se dão pela perspectiva canadense, primeiramente no quadro das relações políticas e econômicas entre o país do norte e a América Latina como um todo. O interesse canadense em relação ao subcontinente foi se constituindo no início do século XX. Influenciado pela proximidade dos Estados Unidos da América, o país preocupou-se em estreitar as relações com o seu vizinho direto, não desenvolvendo uma política internacional mais específica e vigorosa para os vizinhos do sul. Pode-se afirmar que a América Latina não se tornou objeto de interesse real do país antes de 1930. Algumas missões oficiais governamentais de aproximação se deram em 1930, 1940-41, 1946, 1953 e 1958. A frase de Mitchell Sharp, na ocasião ministro das relações exteriores em viagem à região em 1968, expressa bem o nível das relações entre as regiões: “uma viagem de descoberta” (OGELSBY, 1976, p. 164, tradução nossa).[3] Isso não quer dizer que o país já não tivesse se dado conta da importância econômica e geopolítica do subcontinente, descoberto inúmeras vezes pelos gringos. Cuba, Guatemala, México e Brasil já haviam recebido empresas e investimentos em linhas férreas e energia elétrica, particularmente do banco da Nova Escócia, banco de Montreal e Banco Canadense de comércio (OGELSBY, 1976). Não apenas as empresas se envolviam na região em busca de negócios, mas também é notável o papel do próprio governo canadense.

Com a Segunda Grande Guerra em andamento e a conquista de países como a França pela Alemanha nazista, o Canadá, aliado natural e incondicional dos EUA, precisou rever seus interesses econômicos e estipular novas estratégias para sua inserção no mercado global. A América Latina aparecia como uma alternativa interessante na busca da diversificação comercial. No período do pós-guerra, a América Latina não era compreendida como de grande monta pelos canadenses, já que estavam envolvidos diretamente com o alvorecer da Guerra Fria e sua atuação na Organização do Tratado do Atlântico Norte - OTAN. A preocupação em torno da região se dava, especialmente, pela busca da consolidação de posições comerciais já estabelecidas. Somente em 1958 ocorreu a primeira visita oficial à região. O ministro das relações exteriores do Canadá, Sidney Smith, visitou o Brasil, Peru e México.

As relações do Canadá e América Latina não foram marcadas historicamente apenas por tentativas de aproximação econômica e política. Pode-se também perceber alguns ensaios de aproximação cultural. Nesse plano, a questão religiosa é evidente. Se podemos observar um fluxo missionário protestante dos EUA em direção à América Central e do Sul no final do século XIX e XX, notamos uma quantidade considerável de missionários católicos saídos do Canadá – podemos falar em centenas – particularmente da província de Québec, em direção à América do Sul e, especificamente ao Brasil, a partir dos anos 1950.[4]

Devemos lembrar que se o fluxo missionário canadense em direção à região tem início de maneira sistemática na década de 1950, a presença católica canadense na região data da metade do século XIX. Um primeiro grupo de religiosos canadenses chega ao Chile em 1853. Segundo relatos, o navio no qual cinco Irmãs da Providência viajavam para Montréal, depois de um período em British Columbia, no lado leste canadense, atracou no Chile naquele ano. [5] Sabendo da notícia da presença das irmãs, o Arcebispo de Santiago foi em direção a elas sugerindo que ficassem no país. Tendo a permissão de seu provincial, permaneceram em Santiago, onde começaram a trabalhar (OGELSBY, 1976, p. 201). A diferença fundamental em relação à missão contemporânea, ou seja, aquela que vai se realizar a partir da década de 1950, é que as Irmãs da Providência eram as únicas responsáveis pela sua própria missão. No século seguinte, a missão da Igreja canadense será resultado de uma política eclesial de grande envergadura, envolvendo bispos, ordens religiosas, congregações e também leigos.

O Canadá, com uma expressiva população católica, particularmente na província de Québec, e ampla presença de padres e religiosos, tornou-se pouco a pouco um fornecedor de missionários, particularmente para a América Latina, já que o subcontinente, historicamente, era marcado por número insuficiente de ministros ordenados. No Brasil, devido às condições geográficas e também geopolíticas, relacionadas com as estratégias de dominação colonial, a presença qualificada que viesse das estruturas próprias da Igreja não ocorreu, deixando à margem do controle eclesial grande parte da população. [6]

Foi em 1908 que ocorreu o primeiro envio à uma missão estrangeira por um instituto missionário fundado no Canadá. Os Missionnaires de l’Immaculée-Conception, primeira congregação québécoise missionária fundada em 1902, partem para a Ásia. Momento importante ocorreu em 1929, quando Pio XI confiou pela primeira vez a responsabilidade de uma prefeitura apostólica à Société de Missions Étrangères da província de Québec, fundada naquele mesmo ano, o que significou ficar encarregada, pela primeira vez, de um território de missão fora do continente americano.

A presença missionária canadense na América Latina naquele primeiro momento foi incipiente, já que não tinha sido planejada e coordenada. Além do Chile, essa presença também se deu no Brasil, Haiti, República Dominicana, Peru e Equador. De 207 comunidades onde trabalhavam canadenses em 1970, por exemplo, 154 tinham sido estabelecidas no final de 1957. E em comparação com outras regiões do globo, a América Latina recebera mais de 30% desses missionários. O ponto máximo da chegada desses missionários foi o final da década de 1960. Sinais de declínio já são observados, no entanto, nos últimos anos de 1970 (OGELSBY, 1976, p. 201). Atualmente o número desses missionários no Brasil é irrisório. São aqueles que se deslocaram para lá anteriormente e que não retornaram ao Canadá. Essa situação ocorreu, particularmente, pelo fato de que, hoje, o país nórdico vive uma crise de vocações religiosas, iniciada na década de 1970 sob o influxo da chamada Revolução tranquila e também dos efeitos não desejados da renovação conciliar.[7]

2.1 O Brasil no contexto das missões católicas contemporâneas

O tema da missão na Igreja católica transformou-se profundamente entre o século XIX e XX. A mudança da perspectiva missionária tem seu momento principal nas décadas de 1950 e 1960, especialmente, quando o Concílio Vaticano II (1962-1965) elaborou novos aspectos para sua compreensão.

No período moderno podemos apontar para o fato de que a missão cristã estava intimamente ligada ao poder político das metrópoles europeias que, num movimento de expansão, abarcavam todas as regiões do planeta: da África à Ásia e América. Os primeiros papados modernos tiveram papel relevante, inclusive na política internacional, na medida em que se tornavam praticamente um agente jurídico que delimitava e demarcava as conquistas europeias. [8]

No caso da América do Sul, observa-se o papel central da Igreja, ao conceder a prerrogativa da evangelização dos povos das terras conquistadas aos espanhóis e portugueses. Instituiu-se, assim, o chamado padroado régio, instituto que, no caso português, aprofundava-se, já que desde a unificação portuguesa tal prerrogativa já havia se delineado. Isso significava que as monarquias espanhola e portuguesa obtinham o direito de administrar as questões eclesiásticas, como por exemplo, a nominação de bispos e a organização do culto. A Igreja tornava-se partícipe da dominação europeia, e assim, sua fiadora religiosa.

Em 1622, com a fundação da Congregação para a Propagação da Fé, Roma passa a designar as congregações e ordens religiosas das respectivas metrópoles como aquelas que assumirão o front missionário. Com a centralização da Igreja no século XIX e a recepção ex officio do Concílio de Trento no Brasil, com a Proclamação da República (em 1889) e o fim do padroado, mantido pela coroa brasileira entre 1822 e 1890, a preocupação da Igreja se tornou cada vez mais a formação dos religiosos e padres que pudessem ir em missão ao país a fim de fazer frente ao avanço de diversas doutrinas religiosas e políticas, como o espiritismo, o protestantismo, a maçonaria e, posteriormente, o comunismo. Mesmo com profundas mudanças sociais, culturais e sobretudo políticas, uma questão de fundo continuou a marcar a história da Igreja, desde o Brasil colônia, passando pela época do Império e chegando à República: a falta de clérigos, o que a Igreja tenta contornar pela reforma clerical desde 1844, e, consequentemente, do controle da instituição das crenças e práticas das populações. Será principalmente esse problema que os missionários de Québec no país buscarão atacar a partir da década de 1950.

No que tange à Santa Sé e sua política missionária, é importante recordar que no pontificado de Bento XV (1914-1922) se observa uma espécie de revisão da questão. A perspectiva que se ligava ao poder temporal – aquele do padroado, que já não existia desde 1890, como esclarecido acima, resquício da política colonizadora que se utilizava do aval religioso –, foi entendido como limitado, especialmente pelo fato de que a evangelização se tornava muito mais um instrumento de interesses políticos nacionais do que religiosos propriamente. A carta encíclica Maximum illud (BENTO XV, 1919), de novembro de 1919, é paradigmática nesse sentido. Bento XV frisará a necessidade de compreender a missão de maneira supranacional, conduzida por Roma e pelo Propaganda fide. As missões deveriam se constituir a partir de institutos missionários estabelecidos em diferentes países, que deveriam objetivar, principalmente, a formação religiosa local com o intuito de se constituir Igrejas locais autóctones. Pio XI confirma o caminho da reforma missionária de Bento XV com sua encíclica Rerum Ecclesiae (PIO XI, 1926), de 1926. No pontificado de Pio XII, há dois documentos importantes que confirmam os novos caminhos da missão cristã: a encíclica missionária Evangelii praecones (PIO XII, 1951), de 1951, e a encíclica Fidei donum (PIO XII, 1957), de 1957, voltada particularmente sobre a questão da missão na África. Essa encíclica teve um impacto evidente nas missões católicas, sendo um dos momentos de destaque na marcha das novas dinâmicas transnacionais do mundo católico que se delineavam desde o século XIX. Isso devido ao fato de que Pio XII solicitava aos bispos que colaborassem de maneira direta na empresa missionária. Foi, então, “[...] a partir desse momento que os padres diocesanos enviados para a América Latina passaram a ser chamados de Fidei Donum.” (NERIS; SEIDL, 2015, p. 144).[9]

O contexto político mundial, como apontado brevemente acima, é assinalado pela Guerra Fria, a qual marca as posições dos atores internacionais entre o bloco norte-americano e o bloco soviético. A Santa Sé, como um dos importantes atores no xadrez internacional, passará a jogar um papel central na luta contra o comunismo, que na metade do século XX chega a tomar um terço dos países do mundo e a ser entendido como o seu principal inimigo. Fora as novas perspectivas missionárias que visam a constituição de Igreja locais autóctones, a consolidação do comunismo como importante força política no pós-guerra, levará a Santa Sé a enxergar as missões como um importante fator de contenção dessa doutrina política, condenada inúmeras vezes pelos papas desde o século XIX. Além disso, como sugerem Sappia e Servais (apud NERIAS; SEIDL, 2015), o incentivo da vinda de sacerdotes em vez de religiosos, poderia estar relacionada ao tipo de relação que passava a ser construída entre o bispo local e a congregação religiosa naquele determinado território: “[...] quando um religioso trabalhava com um bispo local, este último era confrontado não somente com as perspectivas pastorais da família religiosa em questão, como também com as linhas de comando que deveriam ser obedecidas por aqueles mesmos religiosos” (SAPPIA; SERVAIS apud NERIAS; SEIDL, 2015, p. 145). O que gerava frequentemente tensões e desentendimentos. A nova perspectiva missionária apontava para uma nova perspectiva de relação. Os padres Fidei Donum estabeleceriam uma relação direta “[...] com o bispo da diocese de destino, o que, na prática, raramente representou uma submissão imediata às visões pastorais das autoridades eclesiásticas que os recebiam.” (SAPPIA; SERVAIS apud NERIAS; SEIDL, 2015, p. 145).

Salta aos olhos, no entanto, como que a questão política atravessa o momento em que essa nova escolha de impacto eclesiológico se faz presente. No Bulletin de L’Entraide Missionaire, por exemplo, editada em Montréal, em seu número 3 de agosto de 1954,[10] dois anos, portanto, antes da promulgação da encíclica Fidei Donum, podemos sentir o tom que marcava o período. Em um dos textos publicados nesse número, consta, fazendo referência a um outro veículo de informação:

Um artigo no ‘The Shield’ lembra que os comunistas estão inundando a Ásia e a África com livros populares baratos. As mentes se envenenam com essa literatura. Livros católicos baratos poderiam ser lançados da mesma maneira para frustrar a ação nefasta das idéias marxistas. A guerra entre a ideologia marxista e a doutrina cristã é travada em grande parte no campo de batalha dos livros [...]. (BULLETIN, 1954, s.p., tradução nossa).[11]

Em outro texto do mesmo número do Bulletin, aponta-se algumas estatísticas em torno da quantidade de missionários católicos em diferentes regiões do globo, entre catecúmenos, padres, irmãos e freiras. Além disso cita três grandes obstáculos para a missão católica: o comunismo, o nacionalismo e o laicismo. O ponto mais interessante para nossa investigação é aquele que trata do futuro das missões: a formação do clero nativo (BULLETIN, 1954). No caso, cita-se África e Ásia. Porém, esse tema é também fundamental no caso dos missionários canadenses que se direcionam para o Brasil.

Na revista católica canadense dedicada ao tema missionário, Message, encontram-se também toda sorte de informações sobre a questão na América Latina. Em seu número 5, volume XIV, de 1958, Sylvestre Juergens (1958), antigo Geral dos maristas, faz um arrazoado que caminha na mesma direção, no entanto, marcado por um caráter premonitório sobre o futuro da América Latina caso a Igreja não agisse:

Além disso, embora o fundo do espírito do continente do sul esteja sempre fortemente ligado ao catolicismo - o protestantismo nunca poderia fazer uma conquista lá - em menos de duas gerações, a América do Sul pode se tornar o pró-reitor de um materialismo fácil e até mesmo do comunismo, se a Igreja não intensifica o recrutamento indígena e não forma um sólido clero local e, mais ainda, um vigoroso corpo de professores religiosos. (JUERGENS, 1958, p. 281, tradução nossa).[12]

As palavras de Juergens refletem o clima político que se desenrola no pós-guerra e o papel que a Igreja Católica deveria desempenhar no alvorecer da Guerra Fria: conter o avanço do comunismo conquistando almas e fortalecendo os cleros locais.

2.2 Missionários de Québec no Brasil: a experiência maranhense

O horizonte de missão da Igreja canadense, coordenada e planejada a partir de convocação pela alta hierarquia e chamada agora a uma nova perspectiva, será a América do Sul. Uma importante novidade do processo missionário, como visto, além de elevar o Canadá a um país que fornece missionários católicos para outras regiões do planeta, será que as dioceses também começarão a fazer parte do processo, ou seja, não mais apenas os institutos missionários participarão das novas iniciativas da missão.

O primeiro impulso missionário de Québec organizado em direção ao Brasil acontece em 1955 e parte de três dioceses da província eclesiástica de Sherbrooke (Nicolet, St- Hyacinthe[13] e Sherbrooke). Serão as primeiras a enviar seus missionários ao país. Seis padres diocesanos, assistidos por dez religiosos da Assunção de Nicolet fazem parte do primeiro grupo. O bispo de Nicolet, Mgr Albertius Martin, respondendo aos apelos da Santa Sé, funda duas missões no estado do Maranhão: Alcântara e Guimarães. Essas duas cidades pertenciam à prelazia de Pinheiro, fundada em 1939 e que tinha como o primeiro bispo Dom Afonso Maria Ungarelli, da Congregação dos Missionários do Sagrado Coração, da Itália. As duas cidades tinham uma população, respectivamente, em torno de 25 mil e 40 mil habitantes.

Entre os cinco padres que se apresentam como voluntários no início de 1955 ao bispo Albertius Martin para missão no Brasil, três são escolhidos: Jean-Baptiste Caya,[14] Georges-Émile Picard[15] et Omer Proulx,[16] que fundam a missão de Alcântara em 1955. Mais tarde, em 1957, juntam-se a eles as Soeurs de l’Assomption, as Soeurs Grises e também alguns leigos missionários. Uma associação é fundada para dar o suporte para a missão nicoletiana no Brasil com o nome Missionnaires nicolétains de Marie.[17]

Não era a primeira vez que a diocese de Nicolet se envolvia num projeto de envio de padres para regiões com carência deles. Entre 1920 e 1935, no momento da fundação da diocese de Mont-Laurier, cidade também localizada na província de Québec, Nicolet havia enviado mais de 30 padres para o local, assegurando a organização das obras e das paróquias, e também o próprio recrutamento sacerdotal.[18]

Mgr Ungarelli, bispo de Pinheiro (Maranhão), envia na primavera de 1954 uma carta endereçada ao Mgr Giovanni Panico, delegado apostólico do Canadá, solicitando a ajuda da Igreja do país com o envio de missionários. Depois de alguns contatos iniciais, o bispo de Pinheiro encaminhou uma nova correspondência, apontando para as comunidades em que missionários canadenses poderiam se encaminhar.

A prelazia, fundada em 1939, mas em real funcionamento a partir de 1946, devido à Segunda Grande Guerra, tinha nove municípios (Pinheiro, Alcântara, Bequimão, Guimarães, Cururupu, Santa Helena, Turiassú, Candido Mendes e Carutupera), e contava com uma população de 170 mil habitantes em área de 40 mil metros quadrados. A região também tinha uma presença indígena: por volta de 2 mil a 2 mil e quinhentos, falantes da língua tupi, ainda não evangelizados, segundo o bispo. As três maiores, Cururupu, Guimarães e Alcântara, tinham respectivamente por volta de 33 mil, 25 mil e 15 mil habitantes. Turiassú, Candido Mendes e Carutapera, por sua vez, tinha respectivamente por volta de 13 mil, 11 mil e 10 mil habitantes.

Contava com escolas primárias, e também com um champ de aviation (aeródromo), cada uma delas, o que facilitava a comunicação, já que antes só era possível via barco à vela ou a cavalo. O bispo chama atenção para o fato de que também começavam a aparecer barcos à motor, como também jeeps e caminhões, que precisam se aventurar em estradas bastante rudimentares.

A população da prelazia, de acordo como bispo, dividia-se entre brancos pouco numerosos (portugueses e libaneses, que enriquecem facilmente), muitos negros (descendentes de escravos africanos) e um grande número de mestiços. “A gente é boa mas ignorante e preguiçosa”, diz Ungharelli,[19] (ARCHIVES, F368, 195?, tradução nossa).[20], que completa: “O povo, que não tem recursos, permanece sempre na mais grande miséria”. [21] A terra é fértil, mas os meios e instrumentos de trabalho são primitivos, faltando instrumentos modernos. Há muito esforço e poucos benefícios. Quanto à religião, diz o bispo, “[...] os protestantes não faltam, mas a grande maioria é católica (90%)”. “No entanto”, continua, “se trata de uma religião bem superficial, que se limita quase exclusivamente ao batismo” [22] (ARCHIVES, F368, 195?, tradução nossa). Os casamentos religiosos são relativamente pouco numerosos, “uma média de 25%”. Segundo o bispo, o quadro religioso da região estava intimamente ligado com um fator específico: a falta de padres, que visitam os fiéis da zona rural uma ou duas vezes ao ano. O bispo grifa seu texto: não há mais que um padre para cada 16 mil almas.

Mesmo vivendo essa situação marcada por várias limitações, Ungharelli demonstra esperança. E ela vem dos missionários de Québec. Segundo ele, quando se estabelece em um centro grande ou pequeno uma residência missionária, é possível notar que “a vida religiosa começa a florescer” [23] (ARCHIVES, F368, 195?, tradução nossa). O exemplo que dá é de Pinheiro, que num espaço de trabalho de 7 anos, conseguiu reunir “[...] um grupo respeitável de seminaristas que dão boas esperanças” [24] (ARCHIVES, F368, 195?, tradução nossa).

De acordo com o bispo, havia 4 padres em Pinheiro (além de 4 irmãs de caridade que dirigiam a escola), 1 em Alcântara, 1 em Guimarães, 3 em Cururupu, 2 em Turiassú, 1 em Carutapera. Candido Mendes, Santa Helena e Bequimão insistiam continuamente para que fosse enviados padres residentes. Segundo o bispo, depois de 3 anos, e com a ajuda governamental (não esclarece se estadual ou federal), tinham começado uma grande obra de caráter educacional: a escola paroquial de Pinheiro contava com 1 mil alunos; as escolas paroquias de Alcântara, Guimarães e Cururupu, de Turiassú e Carutapera, eram também bem frequentadas, com 1600 alunos. Seriam abertas em breve mais 20 escolas. De acordo com o bispo, dois patrocínios ajudariam a fundar escolas de agricultura e artes.

Ungharelli sugeria duas regiões específicas para os padres canadenses que quisessem se dirigir à região: a zona de Cururupu e Guimarães, e a zona de Turiassú, Candido Mendes e Carutapera. Na primeira delas, segundo o bispo, além de uma igreja e uma capela, havia em Cururupu duas casas em boas condições, com uma salle-théatre (teatro de salão); em Guimarães, uma igreja e uma casa em boas condições; em Alcântara uma igreja e duas casas. Nos três municípios, vende a ideia o bispo, de que há muitas possibilidades para o futuro. Nesse território, em que Alcântara fica a uns 30 km de Guimarães, o bispo sugere a repartição dos padres: 3 ou 4 padres em Cururupu, 2 ou 3 em Guimarães e 2 em Alcântara. Na segunda zona, o bispo a interpretava como menos boa que a primeira, mas que poderia ter uma vantagem em relação à primeira: ali era aonde ainda se encontravam os indígenas. O bispo afirma: “Disse ainda por que daqui há uma dezena de anos eu creio que eles acabaram por desaparecer completamente, absorvido pelos outros” (ARCHIVES, F368, 195?, tradução nossa). Sugeria também uma divisão dos padres: 2 padres para Turiassú, 2 para Candido Mendes, 2 para Carutapera e, por fim, 2 para a catequese dos índios.

Por fim, Ungharelli dava notícias da situação econômica da prelazia. Recém-chegados na região em 1946, não se dispunha de nada. Em poucos anos conseguiram comprar e construir várias casas. Naquele momento eram 16 casas, entre residências e escolas. Os recursos financeiros eram escassos mesmo para a subsistência. Recebiam ajuda econômica da Propaganda Fide, e fazendo obras sociais, “[...] se podia receber ajuda financeira do governo” (ARCHIVES, F368, 195?, tradução nossa), diz o bispo. A demanda de Ungharelli por mais braços não demora a ser transmitida ao bispo de Nicolet, feita na primavera de 1955.[25]

O que estava para acontecer naquela região recôndita do Brasil – a chegada de missionários de dioceses canadenses – era um fato que entraria para a história da Igreja universal, interpreta o bispo, um evento que ficaria registrado nos anais da história eclesiástica.[26] Em alocução pronunciada na Igreja de Guimarães por ocasião da chegada dos três missionários, e que se encontravam entre os ouvintes, Ungharelli toca na questão que o impeliu a solicitar a ajuda dos missionários: a falta de padres, não só no Brasil, mas em toda a América Latina. Para ele, esse problema atenuava profundamente a vitalidade cristã na América Latina: “Como a Igreja pode se manter forte e vigorosa quando ela não tem padres em números suficientes?” (ARCHIVES, F368, 1955, tradução nossa), questionava.

O bispo relacionava a vida espiritual com a vida corporal: “um corpo que falta sangue vital enfraquece, definha e morre. Assim uma Igreja sem clérigos ou com um muito pouco número de padres é uma Igreja doente e destinada a morrer” (ARCHIVES, F368, 1955, tradução nossa). A esperança e entusiasmo que se vislumbra nas palavras do bispo com os missionários canadenses que chegam é evidente. Avançando em sua metáfora, afirma que anemia não é mais uma doença incurável, nem uma doença mortal:

[...] hoje se emprega um fácil tratamento para salvar um corpo anêmico e se salva assim milhares de vida todos os dias. Isso se faz por uma transfusão de sangue [...] Por que não fazemos assim quando a vida da Igreja se torna doente e anêmica, falta clérigos? Já faz muitos anos que nós preconizamos a transfusão de padres de dioceses mais ricas e mais vigorosas para as dioceses mais fracas e mais débeis. (ARCHIVES, F368, ANO, tradução nossa).[27]

O bispo chama atenção para as mudanças em torno da logística missionária que ocorrem de maneira universal. Sempre houve institutos dedicados ao apostolado missionário. No entanto, naquele momento era uma diocese que tomava para si a função do envio de pessoal para uma região específica. Segundo Ungharelli (ARCHIVES, F368, 195?), aquela região do Brasil era uma das que mais sofriam com a falta de padres, já que era uma dezena de padres para 170 mil habitantes.

Frente à situação de escassez de padres na região de Pinheiro, Ungharelli escreve em 1957 para o Mgr Jean Panico, Delegado Apostólico do Canadá, afirmando sobre a necessidade urgente de se estabelecer obras evangélicas na região. O bispo demandava a Panico se ele não achava possível o auxílio dos padres do Canadá na missão do Brasil (ARCHIVES, F368, 195?).

Esperando por uma resposta negativa, já que a necessidade de padres não era apenas um problema da Igreja do Brasil, Ungharelli recebeu uma resposta a contento. Uma diocese do Canadá, mais particularmente da província de Québec, a diocese de Nicolet, que tinha, segundo o bispo, 250 padres para uma população de 130 mil habitantes, aceita a demanda vinda do Maranhão. Esse número, recorda, não é também muito confortável, já que todos estão envolvidos com algum trabalho na diocese.

O bispo noticiava à assembleia reunida que Mgr Albertus Martin também assegurava que enviaria, se não houvesse contratempos, outros padres para a região, e também outros religiosos para realizarem obras educacionais e sociais (ARCHIVES, F368, 194?).

Naquele mesmo dia era instituído o primeiro Vicariat Forain de Notre-Dame du Rosaire, que compreenderia os municípios de Alcântara e Guimarães. Tornaria assim o primeiro Vicariat Forain da prelazia, sendo confiada aos missionários da diocese de Nicolet. Sobre os motivos que teriam levado o bispo a conceder essa região aos missionários e não a que englobava Turiassú, Candido Mendes e Carutapera, Ungharelli dizia que Alcântara e Guimarães ficavam no melhor território da prelazia, por causa de sua proximidade da capital São Luis e suas benesses naturais. Louvando o avanço econômico e cultural do Canadá, Ungharelli acha que a presença dos missionários canadenses naquela região poderia ajudar profundamente em seu desenvolvimento humano.

O bispo também não se esquece de agradecer a quem chama de Pe Luiz, um italiano que habitava e trabalhava em Guimarães desde 1951, e que sozinho, apenas com a ajuda dos locais, diz Ungharelli, havia conseguido num espaço de pouco menos de três anos construir uma escola paroquial, uma organização de voluntários, uma Ouvroir (sala de costura), entre outros feitos. Notre-Dame du Rosaire se tornava a patrona das terras de Guimarães e Alcântara e deveria ser invocada, apelava o bispo, para que a região pudesse progredir “audaciosamente e rapidamente no campo cultural e social, mas sobretudo no campo religioso onde as almas se reencontrem com Deus”. (ARCHIVES, F368, 195?, tradução nossa)

Em 3 de julho de 1955 acontece uma grande cerimônia na catedral de Nicolet. Ela conta com a presença de mais de 120 padres, grande número de religiosos e religiosas e uma multidão de fiéis. O bispo, em sua alocução, agradece aos diocesanos por seus esforços missionários no passado, e frisa que “com a experiência do Brasil é toda a diocese, o bispo ‘en tête’, que oficialmente se faz missionária” (ARCHIVES, F368, 195?, tradução nossa).[28] Os padres partem para as terras brasileiras no dia seguinte.

Entre agosto e outubro se dedicavam a estudar um pouco do português, o que não acontecia de maneira sistemática e regular. Como diz um dos padres numa carta às Soeurs de l’Assumption, conversavam e liam a fim de aprender a língua.[29] Já sabem o bastante depois desse período para começar o ministério da confissão e acompanhar o Pe Luiz, ex- cura e initiateur de Guimarães, nas visitas das missões interiores à região. Segundo o bispo, os padres “[...] se iniciam rapidamente nos usos e costumes brasileiros”. (ARCHIVES, F368, 1956, tradução nossa).[30]

Chegam à Guimarães em 28 de outubro daquele ano. Caya é nomeado cura de Guimarães e vicaire forain de Guimarães e Alcântara. Em 15 de outubro Picard é nomeado cura de Alcântara, e Proulx, vicaire coopérateur de Guimarães.

Segundo o bispo de Nicolet, a sua diocese dava apoio espiritual e material à missão. A oração para o sucesso da missão se realizava em todas as casas religiosas da diocese: “Em todas as escolas as crianças rezam pelo Brasil”, afirma. Em todas as igrejas o bispo solicitou um pedido anual de colaboração financeira para a missão. Em 12 meses, são enviados para missão de Nicolet no Brasil 15.500 dólares canadenses, “[...] sem a busca da Propagação da Fé, a Obra da Santa Infância e a Obra do Apóstolo São Pedro diminuíram.” (ARCHIVES, F368, 1956, tradução nossa).[31]

A ida ao Brasil pelos missionários canadenses era motivada pelo anúncio do Evangelho, todavia o objetivo específico era o de desenvolver vocações sacerdotais locais, a fim de responder às necessidades dos católicos da região, sem precisar recorrer à ajuda exterior. Assim, para além da busca de desenvolvimento cultural e social propalado por Ungharelli, é o desenvolvimento das vocações sacerdotais que é o foco, o grande problema que afetava historicamente a Igreja no Brasil.

Com pouca preparação em missiologia e parco conhecimento sobre a cultura e a religiosidade local, os padres chegam com esperança, esforçando-se em se adaptar à realidade tão diferente da qual proviam.

Pouco depois do início dos trabalhos pelos três padres na região, Pe Caya enviou uma carta à Madre Superiora Geral das Irmãs da Assunção – Soeurs de l’Assomption – de Nicolet. [32] O padre demandava uma "[...] participação ativa na obra missionária da diocese de Nicolet no Brasil com o envio de freiras para lá" (ARCHIVES, F368, 1955, tradução nossa).[33] Esperava-se que as irmãs fossem em 1956, aprendessem a língua, e começassem a lecionar nas escolas de Guimarães no início do ano escolar de 1957. Em 2 de janeiro de 1956 acontece uma sessão plenária entre as irmãs da Assunção. Discute-se sobre a solicitação dos padres missionários quebequenses no Maranhão para que enviassem algumas irmãs para o local. Com votação unânime, decide-se favoravelmente ao pedido. Em carta dirigida ao Pe Caya, a superiora geral, a irmã Sainte-Irène, comunica a aprovação com satisfação, dizendo que o padre deveria aguardar alguns trâmites, como o pedido formal das irmãs ao bispo de Nicolet e também à Sagrada Congregação Propaganda Fide, em Roma. Decidia-se que seriam enviadas quatro religiosas, e que o bispo de Nicolet escolheria se elas iriam para Alcântara ou Guimarães.

As crônicas de 1955 e 1960, que focamos inicialmente pelo fato de nos oferecer a visão dos padres em seus primeiros momentos no Brasil, deixa evidente o choque cultural que experimentam ao adentrarem pela primeira vez em território de missão. A questão da ignorância e indiferença religiosa, nome dado ao catolicismo sincrético e desinstitucionalizado da população da região, é o que mais chama atenção nas primeiras crônicas:

Nosso povo é muito ignorante quando se trata de religião. Eles ouvem facilmente os recém- chegados e repetem todas as bobagens ouvidas de protestantes, espiritualistas, feiticeiros, mágicos e fofoqueiros ... Eles vão à Igreja apenas para receber o sacramento do casamento. Eles não conhecem a Igreja ou sua doutrina porque “ninguém lhes distribui o pão da verdade” [...]. (CHRONIQUES, 2 de novembro de 1955, tradução nossa). [34]

Na 11a crônica, de 1 de fevereiro de 1956, noticia-se como exemplo dessa ignorância: “Uma mulher caminhou três horas esta manhã para assistir à missa. O padre Omero a confessa e depois da missa pergunta por que ela não comungou. Ela responde: Eu não sabia fazer isso.” (CHRONIQUES, tradução nossa).[35] Segundo os padres, “O maior sofrimento é a compreensão de tanta ignorância religiosa entre uma multidão simpática à religião católica” [36] (CHRONIQUES, 2 de novembro de 1955).

Outro ponto evidente, e que se liga ao primeiro, é a questão da concorrência religiosa. Rapidamente os padres de Nicolet se dão conta de que a denominada por eles ignorância religiosa é aprofundada pela presença de protestantes e espíritas na região. Afirmam que “É necessário fazer um esforço apostólico firme, constante e pronto para superar a indiferença e a afatia do povo e também para suplantar os protestantes e os espíritas que trabalham muito e com muito dinheiro. Alguns deles estão travando uma guerra aberta contra o catolicismo.”[37] (CHRONIQUES, 2 de novembro de 1955, tradução nossa).

Na 16a crônica, de 3 de agosto de 1956, os padres já demonstram intimidade com os inimigos que a Igreja no Brasil combate de forma contundente desde finais do século XIX: protestantes, espíritas, maçons e comunistas:

Durante o Congresso Eucarístico, os líderes espíritas, os líderes protestantes e os líderes da Maçonaria também realizaram um congresso no norte do Brasil para traçar um plano diabólico de luta contra a Igreja. Para essa merda estão faltando os comunistas que provavelmente não tiveram tempo de receber as diretrizes de Moscou antes do congresso [...] O Espiritismo e o Protestantismo estão fazendo esforços cada vez mais consideráveis para espalhar seus erros entre a população ignorante e analfabeta. Os Bispos do Brasil nos exortam fortemente a organizar obras sólidas, a pregar com frequência para desmascarar os erros e a convidar as pessoas a confiarem na Igreja. (CHRONIQUES, tradução nossa).[38]

A bruxaria, nome dado às expressões religiosas afro-brasileiras na região, também aparece nos relatos das crônicas:

Os bruxos nunca falam contra os padres. Eles são os maiores amigos do padre e, segundo eles, são os maiores católicos e dizem isso para quem acredita neles. No entanto, isso não os impede de serem impostores, homens que procuram impor por falsas aparências, não mentiras e que procuram fazer-se passar por grandes personagens ou mesmo profetas, milagres. (CHRONIQUES, tradução nossa).[39]

O combate a essa prática se daria pela “organização do ensino do catecismo que o padre João está instituindo. Para isso usa alto-falantes espalhados pela aldeia e discos religiosos etc.” (CHRONIQUES, tradução nossa).[40]

Nota-se com esses poucos exemplos que os padres refletiam e reproduziam perspectiva pastoral em que a figura do eclesiástico estava no centro desse imaginário e que os fiéis, afastados da sã doutrina, deveriam ser reinseridos na ortodoxia religiosa a fim de afastar os perigos, como entendiam, trazidos por outros grupos religiosos.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS: PERSPECTIVAS DE PESQUISA

A partir desta primeira descrição histórica da presença dos missionários de Québec no Brasil na década de 1950, buscou-se compreender um capítulo da história da Igreja católica contemporânea ainda pouco explorada: as redes missionárias globais estabelecidas no século XX entre a América do Norte e a América do Sul, particularmente entre Canadá e o Brasil.

O mundo que os padres de Nicolet encontram ao pisarem no Brasil é aquele em que a imagem de um catolicismo homogêneo e enquadrado jamais existiu. As religiosidades sincréticas brasileiras, manifestações do sagrado selvagem, para usar as palavras de Roger Bastide (2006), leva à perplexidade aqueles que têm a experiência do sagrado rotinizado, encapsulado em fórmulas e práticas específicas. E as respostas a elas estavam, como nos mostram as primeiras crônicas, na catequese e nos sacramentos, especialmente o batismo, a eucaristia e o casamento.

Depois de 5 anos de missão, em 1960, aparecem as primeiras críticas nas Crônicas às práticas pastorais (Chroniques de Prêtres Missionnaires du diocese de Nicolet au Brésil). que giravam em torno dos sacramentos. Pe. Caya e duas irmãs da Assunção foram até São Paulo e Rio de Janeiro a fim de fazer um curso e se informar sobre a catequese no Brasil, já que em 1961 se abriria uma escola de catequese na região da missão.

Na crônica de outubro de 1960, os limites da missão ficariam expostos. Lê-se:

Após cinco anos de trabalho, os missionários Nicoletanos de Guimarães - Alcantara realizaram um grande trabalho. Mas, a cada dia, descobrimos que, apesar de nossa boa vontade, nossa adaptação ainda não está pronta para o ambiente que temos que evangelizar. Na mesma situação, afirma-se: “O Cristianismo tornou-se para eles uma religião sentimental e tradicional onde existem muitas superstições, bruxarias e ritos pagãos. Queríamos trazer este povo de volta à verdadeira fé e prática religiosa, insistindo na liturgia e na frequência dos sacramentos. Este foi um erro grave. O encontro em São Paulo do R. Fr. François Lepargneur, O.P., missionário francês no Brasil há vários anos, foi inestimável para nós neste assunto. (CHRONIQUES, 1960, s.p., tradução nossa). [41]

Pe Marcelo Pepin, missionário que chega ao Maranhão em setembro de 1959, reelabora a perspectiva missionária em novos termos:

Portanto, antes de mais nada, devemos iniciar a evangelização em massa a partir dos fundamentos da vida cristã: primeiro, o sentido de Deus Criador, que nos falou em todo o Antigo Testamento; segundo, o significado de Cristo, Filho de Deus, nosso Salvador, enfatizando a lei divina, o amor misericordioso e nossa necessidade de salvação, conforme ensinado pelo Novo Testamento. Uma vez estabelecida esta base, podemos então falar dos sacramentos [...] Este primeiro ensinamento religioso só dará frutos na medida em que reúna na missa um núcleo de vida fraterna de caridade recíproca. (CHRONIQUES, tradução nossa).[42]

Este trecho, especialmente a última frase, nos aponta para a hipótese de que o missionário não deveria negar a base moral do povo, mas partir dele para o anúncio cristão. A hipótese que deve ser investigada é a de que há uma mudança progressiva na perspectiva missionária dos padres canadenses na passagem do tempo de sua experiência local. De uma compreensão unicamente marcada por ideia de recristianização (ou seria, na verdade, de cristianização?), para uma perspectiva de diálogo cultural e anúncio.

O desafio futuro da pesquisa sobre esses missionários está em esclarecer as relações entre o discurso, que vai se constituindo e aparecendo nas crônicas posteriores, e a prática desenvolvida. Até que ponto os encontros em São Paulo e do Rio de Janeiro já encontraram terreno fértil na consciência dos padres sobre os caminhos e descaminhos da missão? Nota- se que as interpretações trazidas por eles nas Crônicas, a partir de 1960 se transformam. Pelo menos nas crônicas daquele ano, a questão da ignorância religiosa permanece, mas passa a ser analisada a partir de outras chaves. Pe Caya, no final daquele ano, já parece trazer perspectiva que ressoa essas novas perspectivas: “O progresso é notável e rápido [...] O número de comunhões aumentou consideravelmente, mas não confiamos muito neste testemunho que pode refletir mais entusiasmo do que convicções em nosso meio” (CHRONIQUES, novembro 1961, tradução nossa). [43]

O encontro intercultural entre os padres de Nicolet e a população do Maranhão e a mudança na perspectiva missionária, assim sendo, é um dos desafios a ser encarado, buscando em outras fontes, além das Crônicas, dados que esclareçam sobre as transformações das práticas e de que forma a experiência missionária transformou, se isso aconteceu, a atuação da Igreja católica também na província canadense. De que maneira reverberam na consciência dos missionários, o cotidiano e o universo mental dos habitantes locais, suas representações coletivas e identidades sociais para além da constatação de ignorância religiosa, transformando-a? O que transmitem dessa experiência de encontro com uma religiosidade altamente porosa e sincrética?

Além disso, as relações entre o mundo do texto e o mundo do leitor, para usar os termos de Paul Ricoeur utilizados por Roger Chartier (1991), parece ser uma hipótese investigativa interessante. Como as Crônicas foram recepcionadas pela comunidade de Nicolet, pelo seu clero e laicato? Houve reações? Houve impactos nas práticas pastorais da diocese? Se sim, quais? Como? Quem foram seus principais agentes? Pergunta-se, portanto, se poderíamos falar num processo de intercâmbio cultural, ou mesmo de circularidade cultural, adaptado e ampliado, já que os padres que tinham como missão a pregação de Cristo, a partir de elementos e práticas advindas de uma região em que a cosmovisão católica romana domina, se veem de fronte à variedade cultural e de expressão religiosa que exige novas formas de pensar a sua prática pastoral.

As migrações católicas canadenses abrem um importante capítulo na história da Igreja brasileira, mas também para a história da Igreja no Canadá. O retorno de muitos missionários ao Québec impactou também as práticas pastorais da Igreja local, evento que merece um amplo estudo.

REFERÊNCIAS

ARCHIVE DU SÉMINAIRE DE NICOLET. Centre d’Archives Régionales Séminaire de Nicolet. Québec (Canadá). Consulta em fevereiro de 2015.

BASTIDE, Roger. O sagrado selvagem e outros ensaios. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

CALDEIRA, Rodrigo C. Redes missionárias católicas no século XX: a Igreja francófono canadense e os missionários de Nicolet no Brasil (1950-1960). In: MOREIRA, Alberto da Silva (org.) Religião, migração e mobilidade humana. Goiânia: PUC Goiás, 2017, p. 77-92.

CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Estudos Avançados, São Paulo, 11 (5), 1991, p. 173-191.

CHRONIQUES de Prêtres Missionnaires du diocèse de Nicolet au Brésil. 1955, 1956, 1959, 1960, 1961.

FANTTAPIÈ, Carlo. Santa Sé e o mundo em perspectiva histórico-jurídica. Almanack, Guarulhos, n. 26, 2020, p. 1-21.

GOUDREAULT, Henri. Les missionnaires canadiens à l'étranger au XXe siècle. Études d'histoire religieuse, v. 51, 1983, p. 361-380.

GREJA CATÓLICA. Papa (1914-1922: Bento XV). Carta Apostólica Maximum Illud. Roma, 30 nov. 1919. Disponível em: http://www.vatican.va/content/benedict- xv/pt/apost_letters/documents/hf_ben-xv_apl _19191130_maximum-illud.html. Acesso em: 06 maio 2021.

IGREJA CATÓLICA. Papa (1922-1939: Pio XI). Rerum Ecclesiae encyclical. Roma, 28 fev. 1926. Disponível em: http://www.vatican.va/content/pius- xi/en/encyclicals/documents/hf_p-xi_enc_28021926_rerum-ecclesiae.html. Acesso em: 06 maio 2021.

IGREJA CATÓLICA. Papa (1939-1958: Pio XII). Carta encíclica Evangelii praecones. Roma, 02 jun. 1951. Disponível em: http://www.vatican.va/content/pius- xii/pt/encyclicals/documents/hf_p-xii_enc_02061951_evangelii-praecones.html. Acesso em: 06 maio 2021.

IGREJA CATÓLICA. Papa (1939-1958: Pio XII). Carta encíclica Fidei donum. Roma, 21 abr. 1957. Disponível em: http://www.vatican.va/content/pius- xii/pt/encyclicals/documents/hf_p-xii_enc_21041957_fidei-donum.html. Acesso em: 06 maio 2021.

JUERGENS, S. L’Amérique Latine. Messages, n. 5, v. XIV, 1958, p. 281.

LEGRAND, Catherine. L’axe missionnaire catholique entre Québec et l’Amérique latine. Une exploration prélimminaire. Globe: revue internationale d’Études québécoises. v. 12, n. 1, 2009, p. 43-66.

L’ENTRAIDE MISSIONNAIRE. Bulletin. Montréal, v. 1, n. 3, août 1954.

NERIS, Wheriston Silva; SEIDL, Ernesto. Redes transnacionais e os padres Fidei Donum no Maranhão (1960-1980). História Unisinos, v. 19, n. 2, p. 138-151, maio-ago. 2015.

OGELSBY, J.C.M. Gringos from the Far North: Essays in the History of Canadian- Latin American Relations, 1866-1968. Toronto: Macmillan of Canada. Maclean-Hunter Press, 1976.

SANSCHAGRIN, Albert. La vocation missionnaire de l’Église de Saint-Hyacinthe, précédé de la presentation de Mgs Sanschagrin, o.m.i., par Mgr Léo Sansoucy. Sessions d’étude. Société canadienne d’histoire de l’Église catholique, v. 47, 1980, p. 63-74.

SANTIROCCHI, Italo Domingos. Questão de Consciência: os ultramontanos no Brasil e o regalismo do Segundo Reinado (1840-1889). Belo Horizonte: Fino Traço, 2015.

Notas

1 Este texto é baseado em capítulo de livro publicado em 2017: Redes missionárias católicas no século XX: a Igreja francófono canadense e os missionários de Nicolet no Brasil (1950-1960) (CALDEIRA, 2017, p. 77-92).
2 Os Archive du Seminaire de Nicolet são compostos por crônicas, cartas, e outros documentos, de diversos autores e datas, sem especificação de páginas, e serão aqui mencionados, nas referências, pela data da consulta, como ARCHIVE, 2015.
3 [...] a Voyage of Discovery.
4 Sobre algumas estatísticas da presença missionária canadense no mundo veja GOUDREAULT, 1983.
5 Lembre-se que não existia ainda o canal do Panamá, obrigando toda embarcação que desejasse passar do oceano Pacífico para o Atlântico, ou vice-versa, a atravessar o estreito de Magalhães, no extremo sul do continente americano.
6 No entanto, observa-se que, particularmente no século XIX, a preocupação da hierarquia sobre o controle eclesial da região foi refletida pela reforma ultramontana e sua preocupação na formação do corpo sacerdotal pelos seminários. A presença das ordens e congregações religiosas continuou importante, para o caso, mas passou a ser analisada por historiografia contemporânea com maiores matizes, problematizando a tese clássica da estrangeirização do clero desde aquele período. Cf. SANTIROCCHI, 2015.
7 A Revolução Tranquila é o nome dado ao momento da história contemporânea do Canadá francófano, que se caracterizou por processo de secularização acelerado de sua sociedade entre as décadas de 1960 e 1970, impactando profundamente a presença e atuação da Igreja Católica na região. Sobre a revolução tranquila e sua relação com a Igreja canadense, veja LEGRAND, 2009.
8 Fantappiè (2020), historiador italiano da história jurídica da Igreja Católica Romana, estudou as estratégias de concorrências e adaptação da Igreja ao novo contexto da emergência dos Estados modernos, concentrando-se sobre o uso instrumental do direito por Roma, adaptando o corpus juris canonicis aos contextos de cada espaço, entendendo assim o ultramontanismo como um processo diferenciado em múltiplos sentidos.
9 Como afirmam Neris e Seidl (2015), “O termo Fidei Donum era empregado para designar aqueles sacerdotes missionários vinculados a dioceses estrangeiras que, atendendo aos apelos de Pio XII (1939-1958) através da Encíclica Fidei Donum (1957), engajaram-se no apoio às Igrejas do Terceiro Mundo. A maior parte desses sacerdotes provinha da Espanha, Itália, Canadá e França, onde há pouco haviam sido fundadas organizações de cooperação internacional católicas estimuladas pelas redes do terceiro-mundismo católico e pelo aumento de importância das igrejas do Cone Sul na complexa rede pastoral, espiritual, institucional e doutrinal do catolicismo contemporâneo”. (NERIS; SEIDL, 2015, p. 141).
10 Aqui mencionado como BULLETIM, 1954.
11 Un article de ‘The Shield’ rappelle que les communistes inondent l’Asie et l’Afrique de livres popolaires à bon marche. Les esprits s’empoisonnent avec cette littérature. Des livres catholiques peu dispendieux pourraient être lancés de la même manière pour faire échec à l’action néfaste des idées marxistes. La guerre entre l’ideologie marxiste et la doctrine chrétienne se livre largement sur le champ de bataille des livres [...].
12 ussi, bien que le fonds de l’esprit du continent sud soit toujours fortement attaché au catholicisme, – le protestantisme ne put jamais y faire de conquête, – en moins de deux générations, l’Amérique du Sud peut devenir la proire d’um matérialisme facile et même du communisme, si l’Église n’intensifie pas le recrutement indigène et ne forme pas um solide clérge local et, plus encore, un vigoureux corps de religieux enseignants.
14 Nasce em 14 de maio de 1909 em Wickham. É ordenado em 9 de julho de 1933. Tinha grande experiência com obras da Ação Católica e social. Tinha sido capelão da Union Catholique des Cultivateurs, des Ouvriers agricoles da diocese de Nicolet e também capelão da Ouvre pour les Immigrants. Tinha 45 anos quando parte para a sua missão no Brasil, que dura de 1955 a 1983. Falece em 5 de abril de 2002.
15 Nasce em 13 de outubro de 1910 em St-Cyrille-de Wendover. É ordenado em 4 de julho de 1937. Tinha grande experiência na docência. Quando partiu para a sua missão no Brasil, que dura entre 1955 a 1966, era responsável pela formação dos professores do ensino primário da diocese de Nicolet. Falece em 29 de junho de 2002.
16 Nasce em 16 de julho de 1918 em Nicolet. É ordenado em 6 de janeiro de 1948. Era o mais jovem dos padres missionários, com 35 anos quando parte para a sua missão no Brasil, que dura de 1955 a 1960. Tinha experiência no seminário e também se ocupava das paróquias dos movimentos da Ação Católica operária e agrícola. Morre em 10 de dezembro de 2002.
17 Sobre a presidência de Giovanni Panico, Delegado Apostólico do Canadá, e com a presença de Mgr Georges Cabana, arcebispo de Sherbrooke, Arthur Douville, bispo de Saint-Hyacinthe, e Albertus Martin, bispo de Nicolet, e o Mgr Alfonso Maria Ungarelli, bispo de Pinheiro, no Maranhão, a reunião de 14 de julho de 1957, estipulava as diretrizes da missão quebequense no Brasil. Sete pontos foram estabelecidos: 1) Os padres da diocese de Nicolet se ocupariam das região de Guimarães e Alcântara, região em que o padre Caya já era o vigário forano; 2) Padres da diocese de Sherbrooke trabalhariam na região de Turiacu; 3) Padres da região e Saint-Hyacinthe trabalhariam na região de Curutapera; 4) Cada uma das três regiões da Prelazia de Pinheiro constituiria um vicariato forano. Mgr Ungarelli nomearia para cada uma das regiões um vigário, escolhidos entre os padres missionários; 5) Todos os padres canadenses responderiam jurídica e disciplinarmente ao bispo de Pinheiros. O financiamento das missões seria de responsabilidade das dioceses de origem dos padres; 6) O bispo de cada cidade canadense que enviasse missionários deveria dar uma permissão para o padre sair em missão, que deveria ser renovada de dois em dois anos. A diocese de origem pagaria todas as despesas da viagem e daria um salário de mil dólares por ano para cada missionário (caso de Nicolet); 7) Os leigos enviados para as regiões confiadas aos padres canadenses deveriam solicitar a aprovação do bispo da diocese da qual partiam, e deveriam ser “très sévèrement choisis”. (ARCHIVES, F368, 195?).
18 Memoire sur la mission nicoletaine du Bresil, assinada pelo bispo de Nicolet, Mgr Albertus Martius e datada em 5 de setembro de 1956. (ARCHIVES, F368, 1956).
19 Mgr Alfonso Ungharelli, bispo de Pinheiro.
20 La gent est bonne mais ignorante et paresseuse.
21 Le peuple, qui n'a pas de ressources, reste toujours dans la plus grande misère.
22 [...] Les protestants ne manquent pas, mais la grande majorité est catholique (90%)». "Cependant" [...] "c'est une religion très superficielle, qui se limite presque exclusivement au baptême.
23 La vie religieuse commence à s'épanouir.
24 [...] un groupe respectable de séminaristes qui donnent bon espoir.
25 Memoire sur la mission nicoletaine du Bresil, assinada pelo bispo de Nicolet, Mgr Albertus Martius e datada em 5 de setembro de 1956. (ARCHIVES DU SEMINAIRE DE NICOLET, F368).
26 Alocução do Mgr Alfonso Ungharelli, bispo de Pinheiro, na igreja de Guimarães, por ocasião da fundação do Vicariato Forano de Guimarães e Alcântara em 28 de outubro de 1955. O documento encontrado nos Archives de Nicolet está em francês, traduzido para o português.
27 [...] aujourd'hui, un traitement facile est utilisé pour sauver un corps anémique et ainsi des milliers de vies sont sauvées chaque jour. Cela se fait par transfusion sanguine [...] Pourquoi ne pas faire cela quand la vie de l'Église devient malade et anémique, le clergé manque? Depuis de nombreuses années, nous préconisons la transfusion de prêtres des diocèses les plus riches et les plus vigoureux vers les diocèses les plus faibles et les plus faibles.
28 Memoire sur la mission nicoletaine du Bresil, assinada pelo bispo de Nicolet, Mgr Albertus Martius e datada em 5 de setembro de 1956. (ARCHIVES, F368, 195?).
29 Carta, não assinada, dos padres missionários para as Soeurs de l’Assomption, 30 de dezembro de 1955. (ARCHIVES, F368, 195?).
30 Memoire sur la mission nicoletaine du Bresil, assinada pelo bispo de Nicolet, Mgr Albertus Martius e datada em 5 de setembro de 1956. F368, Archives du Seminaire de Nicolet.
31 [...] sans que quête faites pour la Propagation de la Foi, l’Ouvre de la Sainte-Enfance et l’Ouvre de Saint-Pierre Apôtre aient diminué.
32 Carta de Pe Caya para à Madre Superiora das Soeurs de l’Assomption, 11 de novembro de 1955. F368, Archives du Seminaire de Nicolet.
33 [...] participation active à l’ouvre missionnaire du diocese de Nicolet au Brésil en y envoyant des religieuses.
34 Nos gens sont très très ignorant en ce qui concerne la religion. Ils prêtent facilement l’oreille aux nouveatés et répètent toutes les sornettes entendeus des protestants, des spiritistes, des sorciers, de magiciens et des comméres [...] Ils vont à l’Église seulement pour recevoir le sacrement de mariage. Ils ne connaissent pas l’Église ni sa doctrine parce que ‘personne ne leur distribue le pain de la Veritè’ [...].
35 [...] une femme a fait ce matin trois heures de marche pour assister à la messe. Le Père Omero la confesse et aprés la messe, il lui demande pourquoi elle n’as pas communié. Elle répond: Je ne savais pas comment faire.
36 [...] la plus grande souffrance est la constatation de tant d’ignorance religieuse au sein d’une foule sympathique à la religion catholique.
37 Il est nécessaire de faire un effort apostolique ferme, constant et prompt pour vaincre l’indifférence et l’aphatie des gens et aussi pour supplanter les protestants et les spiritistes que travaillent avec ardeur et beaucoup d’argent. Quelques-uns de ceux-ci font une guerre ouvert au catholicisme.
38 Durant le Congrès Eucharistique, les chefs spirites, les chefs protestans et les chefs de la maçonnerie firent aussi un congrès dans le nord du Brésil pour mettre au point un plan diabolique de combat contre l’Eglise. A cette suce manquient les communistes que n’eurent probablement pas le temps de recevoir les directives de Moscou avant le congrès [...] Le spiritisme et le protestantisme font des efforts de plus en plus considérables pour répandre leurs erreurs au sein de la population ignorante et analphabétique. Les Evéques du Brésil nous exhortent fortement à organiser des ouvres solides, de fair ela prédication frequente pour démasquer les erreurs et inviter les gens à mettre leur confiance dans l’Eglise.
39 [...] les sociers ne parlent jamais contre les prêtres. Ils sont les plus grandes amis du prêtre et, selon eux, ils sont le plus grands catholiques et ils le disent aux gens qui y ajoutent foi. Ce que ne les empêche pas cependant d’être des imposteurs, des hommes qui cherchent à imposer par de fausses apparences, pas des mensonges et qui cherchent à se faire passer pour des grandes personnages voire des prophètes, des thaumaturges.
40 […] l’organisatioin de l’enseignement du catéchisme que le père João est en train de mettre su pied. Il utilize pour cela des haut-parleurs répandús dans tout le village et des disques religieux etc.
41 Aprés cinq ans de travail, les missionnaires nicolétains de Guimaraes – Alcantara ont realisé de belles ouevres. Mais tout les jours, nous constatons que, malgré notre bonne volonté, notre adaptation n’est pas encore à point pour le milieu que nous avons à evangeliser.” Na mesma crônica, afirma-se: “le christianisme est devenu pour eux une religion sentimentale et traditionnelle où sont entre beaucoup de superstitions, de sorciellerie et des rites païens. On a voulu ramener ce peuple à la vrai foi et à la pratique religieuse en insistant sur la liturgie et la fréquentation des sacraments. Ce fut là une grave erreur. La reencontre à Sao Paulo du R. P. François Lepargneur, O.P., missionnaire français au Brésil depuis plusieurs années, nous a été précieuse à ce sujet.
42 Donc, en tout premier lieu, il faut se lancer à l’évangélisation de la masse en partant des bases de l’a vie chrétienne: premier le sens de Dieu Créateur, qui nous a parle tout au long de l’Ancien Testament; deuxiéme le sens du Christ, Fils de Dieu, notre Sauveur, insistant sur la loi divine, l’amour miséricordieux et notre besoin de salut, tel qu’enseigné par le Nouveau Testament. Cette base posée, on peut alors parler des sacrements [...] Ce premier enseignement religieux ne portera fruit que dans la mesure où il reencontre dans la masse un noyau de vie fraternelle de charité mutuelle.
43 […] les progrés sont notables et rapide [...] Les nombre des communions a augmenté considérablement mais nous ne nous fions pas beaucoup à ce témoignage qui peut refléter l’enthousiasme plus que les convictions, dans notre milieu.


Buscar:
Ir a la Página
IR
Visor de artículos científicos generados a partir de XML-JATS4R por