Dossiê
Recepción: 16 Noviembre 2021
Aprobación: 18 Agosto 2022
Resumo: O artigo tem por objetivo identificar as representações sobre as paisagens, sujeitos e práticas sertanejas do norte do Brasil, dadas a ler pela pena romanesca de Bezerra de Menezes. Trata-se como fontes os folhetins doutrinários A Casa Assombrada, A Pérola Negra e Evangelho do Futuro publicados no jornal espírita Reformador entre janeiro de 1888 a dezembro de 1911 (com o intervalo de publicação entre 1891 e 1901). Assim sendo, buscaremos compreender sobre qual sertão o romancista se refere em sua escrita, além dos possíveis diálogos constituídos com a produção intelectual até então existente sobre os sertões nortistas. Com isso, situamos seus romances doutrinários na literatura regionalista, emergida em fins do século XIX – transbordando sua função primeira, de divulgação do Espiritismo Kardecista.
Palavras-chave: Bezerra de Menezes, Espiritismo, Literatura doutrinária.
Abstract: The article aims to identify the representations of landscapes, people, and countrymen’s practices in northern Brazil, provided by the novelistic oeuvre of Bezerra de Menezes. We used as sources the doctrinal novels A Casa Assombrada, A Pérola Negra, and Evangelho do Futuro published in the spiritist journal Reformador between January 1888 and December 1911 (with a publication interval between 1891 and 1901). Therefore, we will seek to understand which sertão (scrubland) (backland) the writer refers to in his writing, in addition to the possible dialogues constituted with the intellectual production hitherto existing on the northern backlands. In the end, we place his doctrinal novels in regionalist literature, which emerged at the end of the 19th century – in addition to its primary function, the dissemination of Kardecist Spiritism.
Keywords: Bezerra de Menezes, Spiritism, Doctrinal literature.
Resumen: El artículo tiene como objetivo identificar las representaciones de paisajes, sujetos y prácticas rurales en el norte de Brasil, dadas a leer en la novela escrita de Bezerra de Menezes. Las fuentes son las novelas doctrinales A Casa Assombrada, A Pérola Negra y Evangelho do Futuro publicadas en la revista espiritista Reformador entre enero de 1888 y diciembre de 1911 (con intervalo de publicación entre 1891 y 1901). Por lo tanto, buscaremos comprender a qué sertão se refiere el novelista en su escritura, además de los posibles diálogos constituidos con la producción intelectual hasta ahora existente en los sertões del norte. Con esto, ubicamos sus novelas doctrinales en la literatura regionalista, surgida a fines del siglo XIX – además de su función primordial, la difusión del Espiritismo Kardecista.
Palabras clave: Bezerra de Menezes, Espiritismo, Literatura doctrinal.
1 INTRODUÇÃO
Há um consenso na produção acadêmica que o termo sertão possuí conceito multifacetado. Entre as reflexões mais clássicas e habitualmente citada nas produções sobre o tema, temos a historiadora Janaína Amado, em Região, Sertão e Nação (1995). A partir de referências bibliográficas produzidas, grande parte, na segunda metade do século XX, Amado (1995) realiza um balanço historiográfico da categoria sertão desde o período colonial. Isso tudo, para pontuar o quão intrínseco o conceito está para o processo de construção da nação brasileira, como também situá-la enquanto uma experiência histórica dos sujeitos desde então.
Termo originário de uma corruptela de certão ou desertão, advindo do latim, foi utilizada no período colonial, pelos portugueses, na constituição de uma contraposição entre o litoral e o interior do território a ser dominado (AMADO, 1995, p. 146-147). Perpassou uma diversidade de sentidos, do negativo ao positivo. Todavia, não se restringe apenas ao território brasílico, mas também, por exemplo, para com as possessões portuguesas no continente africano. A historiadora Eugénia Rodrigues (2007) como também o antropólogo Carlos Almeida (2014), para citar alguns, tem pensado, através dessa categoria, o processo de invasão e colonização portuguesa na África.
No Brasil, apesar do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)[1] atrelar, na contemporaneidade, o sertão a uma zona da região do semiárido nordestino – fruto de construção histórica pelo qual comentaremos a seguir – pesquisadoras como, por exemplo, Júnia Furtado e Neil Safier (2006), em Minas Gerais; Marina Ertzogue, Ana Zagallo e Dernival Ramos Júnior (2018), com Goiás, assim como Leonardo Santos (2007) – além do contexto do sertão carioca –, extrapolam essa delimitação institucional do conceito. Aliás, para o historiador Leonardo Santos, o sertão da então capital brasileira começava ao fim da famosa Avenida Brasil. Isso denota o quão móvel se tornou essa conceituação, dependendo, para seu entendimento, segundo Janaína Amado (1995, p. 149), da localização da posição espacial e social do enunciante.
Apesar de Amado (1995) não fazer referência direta ao historiador Michel Foucault, podemos construir uma relação entre os vastos conceitos concebidos historicamente sobre a palavra sertão e o pensamento foucaultiano. A partir dos enunciantes observa-se a formação de um arquivo, entendendo-o enquanto um conjunto de acontecimentos discursivos que não apenas constroem, mas também atuam na manutenção dos significados. Com o capítulo O enunciado e o arquivo, da obra A Arqueologia do Saber – publicada originalmente em 1969 – compreendemos ainda o arquivo como toda a possibilidade do dizer (FOUCAULT, 2008, p. 147), no nosso caso, sobre o sertão. Encontra-se tanto na dimensão do real e material (ou seja, todo o arcabouço histórico transposto em produções escritas, objetos, monumentos), como no atual e virtual (tudo que virá a ser pensado, dito e escrito perpassa por esse arquivo). O arquivo rege a produção dos enunciados, considerado também enquanto um conjunto de discursos, provendo a construção de significados a partir da prática discursiva, definida por Foucault (2008) como: “[...] um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiram, em uma dada época e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da função enunciativa.” (FOUCAULT, 2008, p. 133).
Portanto, o arquivo construído em torno da palavra sertão, diz respeito às práticas discursivas de diferentes recortes de tempo, espaço e contextos históricos. Logo, a partir disso, compreende-se o porquê de ser um conceito multifacetado. A exemplo, a literatura apresenta-se como produtora de discurso, de construção de enunciados sobre a realidade. Dessa forma, quando Bezerra de Menezes produziu representações sobre os sertões nortistas em seus folhetins doutrinários, em fins do século XIX, se submeteu ao arquivo existente sobre esse enunciado. Assim como também o atualizou e, em alguns casos, elaborou desvios dos sentidos já existentes.
Desde o período em que os europeus desembarcaram nas terras brasílicas, há uma relação de contraposição entre o litoral e o interior do território, este último a ser invadido e colonizado para a coroa. Obras como Tratado descritivo do Brasil em 1587, de Gabriel Soares de Souza (1851), ou Hans Staden: suas viagens e captiveiro entre os selvagens do Brasil (1900), são fontes possibilitadoras para um primeiro entendimento da construção dessa divergência geográfica.
Assim como na escrita de Gabriel de Souza, o interior (que torna-se ao longo da história sinônimo de sertão), é situado enquanto lugar de passagem, de refúgio dos nomeados selvagens. Staden (1900) apresenta aos leitores os conflitos entre os povos Tuppin Ikin, Carios e Tuppin-Iuba. Esses conflitos, anteriores ao desembarque dos europeus em Pindorama, são incentivados por franceses e portugueses, com seus respectivos interesses econômicos. Logo, em ambos os autores, o sertão caracteriza-se enquanto uma expressão do dominador. Em seu ato de nomear e representar o Outro aqui encontrado, produziu a dicotomia entre o civilizado e o incivilizado. O sertão é a morada dos bárbaros. Colonizar o sertão significaria levar a civilização.
Ao avançarmos na temporalidade, observamos que não há uma ruptura com essa noção de um vazio a ser conquistado e civilizado. Nas primeiras décadas do século XIX, temos viajantes como Henry Koster e sua obra Travels in Brazil, de 1816, que foi traduzido em 1842 por Câmara Cascudo, ganhando novo título Viagens ao Nordeste do Brasil[2]. Tal modificação, em sua justificativa publicada no prefácio da obra, corresponderia a uma tradução mais fiel. Ora, Koster havia morado em Pernambuco, o Brasil dos seus relatos dizia respeito apenas às províncias setentrionais: “[...] morou e viu Pernambuco, Paraíba. Natal, Aracatí, Fortaleza, S. Luiz do Maranhão, Alcantara. É Sertão. Sertão legitimo, com sêca, leguas sem fim, gado morrendo, solidão, resistencia, heroísmo, primitividade (sic)”. (KOSTER, 1942, p. 10).
O sertão legítimo, nesse caso, é uma intervenção do Cascudo, que não é apenas um tradutor, mas coautor da obra, sobretudo pelas intervenções na criação de significados por meio das notas explicativas. Chamamos atenção para as representações mobilizadas para denotar esse sertão legítimo. Trata-se, para ele, de um lugar longe, seco, solitário, primitivo, onde se resiste em meio à morte. Noção aproximada dos escritos do já mencionado viajante Gabriel de Souza (1851), no século XVI. Na obra, Koster (1942) escreve suas impressões sobre o trajeto a cavalo entre o Recife à Fortaleza, capital cearense.
Esses olhares estão conectados, apesar do tempo e espaço, por construírem representações semelhantes acerca desse Outro. Para além desses relatos dos viajantes, temos a partir da segunda metade do século XIX, a literatura brasileira como centro produtor e reprodutor dos enunciados até então concebidos sobre o sertão. Entre as primeiras obras regionalistas, cujo sertões do norte aparece como tema, ou espaço de desenvolvimento da narrativa, temos O Sertanejo, de José de Alencar, publicado em 1875. Nessa obra destaca-se a manutenção da contraposição entre interior e litoral, o sertanejo e o citadino, na compreensão do sertão, que não é estático, mas móvel, estaria em contínuo processo de domesticação.
Outra obra importante de fins do século XIX foi do, também cearense, Rodolfo Teófilo. Trata-se de A Fome, publicado em 1890 (2002), cuja narrativa romanesca centra-se na fuga de Manuel de Freitas e sua família da seca de 1877. Ou seja, utiliza-se da literatura como mecanismo de denúncia, sobretudo do abandono do Estado para com os sertanejos. Assim como, esse abandono, acarretou tragédias para os centros urbanos, como Fortaleza. Essa obra soma-se a outros escritos, como Os Retirantes, do fluminense José do Patrocínio, publicado em 1879 (1973), na construção do discurso da seca atrelado aos sertões nortistas. Isso ocorreu, segundo Albuquerque Júnior (1994, p. 117), com auxílio das elites locais, por meio da imprensa e dos parlamentares. Inclusive com contribuições do próprio Bezerra de Menezes e seu ensaio Breves considerações sobre a seca do Norte, de 1877, que nos aprofundaremos em tópico posterior.
As obras apresentadas até aqui foram importantes na construção de um mosaico sobre o arquivo discursivo acerca dos sertões. Posteriormente, tivemos outras importantes contribuições, como Euclides da Cunha e sua obra Os Sertões (1902), Capistrano de Abreu, com Caminhos antigos e povoamento do Brasil (1930) e Guimarães Rosa com Grande Sertão: veredas (1956). Produções intelectuais importantes para o entendimento do sertão não apenas enquanto categoria linguística ou mera construção narrativa, mas também um conjunto de mitos, símbolos, imagens, representações e enunciados, que dão sentido a esse conceito, reinventando-o constantemente.
De modo geral, aqui buscamos nos ater ao uso do sertão em referência ao interior da região norte brasileira, afetada ciclicamente pelo fenômeno da seca. Quando utilizado por citadinos pertencentes a esse território, o sertão apareceu, em resumo, como nostalgia: puro, livre da contaminação advinda do cosmopolitismo, enquanto fronteira civilizacional. Realizamos esse exercício de sobrevoo acerca do arquivo constituído até fins do século XIX acerca do sertão, para auxiliar nas análises sobre as representações dessa região presentes nos romances doutrinários de Bezerra de Menezes: A Casa Assombrada, A Pérola Negra e Evangelho do Futuro. Obras escritas nas últimas décadas de sua vida, apesar de apenas a primeira ter sido publicada antes da sua morte, em 1900. Aliás, nosso recorte temporal de 1880 a 1900, corresponde ao período em que localizamos a escrita das obras.
2 O SERTÃO PARA BEZERRA DE MENEZES
O sertão não aparece na produção intelectual de Bezerra de Menezes apenas a partir dos seus romances. Aliás, ele foi um dos sujeitos que atuaram na apresentação da histórica seca de 1877-1879 à capital do Brasil. Para o historiador Paulo Gonçalves (2018, p. 516-51), Menezes soma-se a André Rebouças, José Américo dos Santos, Thomaz Pompeu de Souza Brasil, Viriato de Medeiros e Henrique de Beaurepaire Rohan. Esses intelectuais foram produtores de importantes obras sobre esse fenômeno climático, que aterrorizou as elites nortistas na década de 1870. A maioria desses homens da ciência, discutiram largamente essa seca em debates no Instituto Polytechnico Brazileiro (Paulo Gonçalves utiliza apenas o termo Instituto Politécnico).
É importante situar que Adolpho Bezerra de Menezes é natural do interior cearense, nasceu em agosto de 1831, na freguesia do Riacho de Sangue, especificamente na fazenda Santa Bárbara. Desde a tenra idade, a política perpassava sua vida. Sua família, em grande parte, militava pelo Partido Liberal. Os conflitos locais com a corrente conservadora, o levou a residir na serra do Martins no ano de 1842, especificamente na vila da Maioridade, mais tarde foi nomeada como Imperatriz e depois, em 1890, para o atual nome de Martins, região oeste do Rio Grande do Norte. Em 1846, Bezerra de Menezes retornou para a capital cearense, terminando seus estudos. Em 1851 chegou à capital do império para estudar medicina, concluindo o curso em 1856, mas não retornando ao Ceará. No Rio de Janeiro permaneceu até sua morte em 1900, após uma longa carreira dedicada à medicina e ao Partido Liberal da corte. Enquanto político, ocupou o cargo de vereador – chegando a tornar-se presidente da Câmara Municipal – como também deputado. Nas últimas décadas de sua vida tentou, por diversas vezes, chegar ao senado, objetivo não alcançado (GONÇALVES, 2018).
Foi ainda nos primeiros meses de 1877 que Bezerra de Menezes, enquanto agente político, se manifestou publicamente sobre a tragédia prestes a acontecer (novamente) no Norte. Em um ensaio intitulado Breves Considerações Sobre a Seca no Norte, publicado em três edições do jornal O Globo[3], buscou não apenas definir o fenômeno natural, mas também apresentou prováveis soluções para esse problema histórico, ocorrido ciclicamente em uma área específica dessa região. Aliás, essa maior projeção nacional do fenômeno ocorreu, segundo Durval Albuquerque Júnior (1994, p.118) por fatores como a crise econômica do algodão, a decadência do trabalho escravizado, somando ainda com a intensificação da imigração dos fugitivos da seca para os centros urbanos do litoral. Tudo isso foi reportado pela imprensa, parlamentares e intelectuais, contribuindo assim para o reconhecimento nacional do problema.
Segundo o historiador Albuquerque Júnior (1994, p. 120), o discurso da seca produzido nesse período tinha intenções eminentemente políticas: de recolocar as elites regionais no cenário político nacional. Ao se colocarem para gerir os recursos estatais enviados para sanar a seca, esses grupos reafirmaram a dominação e seu poderio econômico. Aliás, recursos que também vieram de iniciativas privadas; jornais sulistas, sobretudo da capital imperial, possuem diversos anúncios de comissões para arrecadação de doações. Inclusive o próprio Bezerra de Menezes realizou diversas doações[4].
O ensaio Breves Considerações Sobre a Seca no Norte, para a nossa pesquisa, situa-se como o primeiro momento em que Bezerra de Menezes descreveu e se debruçou sobre a região utilizada para compor, mais tarde, seus romances doutrinários. Ao buscar um diagnóstico da seca do Norte, especifica geograficamente o problema, ocorrido de maneira mais agravante: “[...] entre os rios S. Francisco e Parnaíba, no imenso território que compreende parte das províncias da Bahia, de Pernambuco e do Piauí, e a totalidade das que lhes ficam no centro – o Ceará, o Rio Grande do Norte e a Paraíba.” (MENEZES, 1986, p. 196).
A Seca do Norte é evidente quando as chuvas são irrisórias dentro de um ano e meio na região. Bezerra de Menezes (1986) destaca que os danos ultrapassam os grupos sociais:
[...] quantas famílias ricas e felizes não se viram, em 1845, reduzidas em suas fazendas por não terem um grão de farinha; e forçadas pela fome a deixarem o lar; e, sem meios de condução, fizeram a pé, velhos, donzelas e crianças, o longo caminho para uma cidade marítima; e nesse caminho comeram, como cães, ossos e couros de animais mortos; e, no termo de tão horrenda viagem, depois de terem apertado aos seios os cadáveres dos inocentes e caros filhinhos, vítimas da inanição, passaram por dor maior: a de verem suas caras filhas, educadas com todo o zelo e amor, prostituídas à . . . fome! (MENEZES, 1986, p. 199-200).
Há elementos autobiográficos nesse ensaio. Durante a forte estiagem de 1845, Menezes ainda morava no sertão, entre as províncias do Ceará e do Rio Grande Norte. Para construir seu diagnóstico do fenômeno, evocou suas lembranças de quando residiu na serra de Martins:
Em 1845, última seca que tivemos, e da qual guardo triste memória, a vila da Maioridade, hoje cidade da Imperatriz, no Rio Grande do Norte, foi sempre suprida de gêneros alimentícios, vindos dos portos de Açu e de Mossoró, distantes daquela vila cerca de 40 léguas, de completo sertão. (MENEZES, 1986, p. 206).
Enquanto homem que residiu no completo sertão, Bezerra de Menezes (1986) visou legitimar e diferenciar sua análise. Ora, “[...] só quem, viu, como o que escreve estas linhas, o quadro lúgubre e aterrador de uma seca, é que poderá fazer juízo do que é esse flagelo.” (MENEZES, 1986, p. 200). A sua escrita também deixa evidente sua relação com os moradores daquela região, pois o apelo contido no ensaio se situaria como um alerta diante das “[...] notícias que nos chegam do Norte, vemos: que o pânico é geral, mas que a fome apenas começa a fazer sentir seus estragos.” (MENEZES, 1986, p. 201). Entre as suas preocupações, estava a de fornecer subsídios para os sertanejos e sertanejas permanecerem no sertão, sobretudo, para evitar aglomeração nos grandes centros urbanos do litoral – ou “[...] cidades marítimas [...]” (MENEZES, 1986, p. 202) – havendo por consequência surtos de epidemias. Essas temáticas serão retomadas nas representações dadas a ler em seus romances doutrinários. A sua escrita caracteriza-se por comunicações diretas aos leitores, em uma constante apresentação dos sertões nortistas aos leitores. Isso ocorre tanto na construção das paisagens e dos personagens, como também em apelos ao longo das tramas.
3 PAISAGENS E SUJEITOS SERTANEJOS NA LITERATURA ESPÍRITA DE BEZERRA DE MENEZES
Os folhetins A Casa Malassombrada (1888-1891), A Pérola Negra (1901-1905) e Evangelho do Futuro (1905-1911) foram publicados por Bezerra de Menezes, os dois últimos sob o pseudônimo Max no jornal Reformador[5], com fins primeiros de divulgação da doutrina Kardecista. Importante salientar que as versões utilizadas para as análises a seguir correspondem às edições impressas em formato de livros, publicados pela editora Camille Flammarion e pela Federação Espírita Brasileira na primeira década do século XXI. Ao realizarmos uma comparação entre as versões em folhetins e as republicadas pelas editoras, verificamos irrisórias modificações do texto original. De modo geral, apenas A Casa Malassombrada possui alterações na organização dos capítulos, como também uma atualização no título, passando ao nome A Casa Assombrada.
Justificamos a utilização desses três romances por uma característica em comum: o sertão nortista é um elemento central dessas narrativas, apesar de que, olhando para as publicações originais, apenas A Casa Malassombrada é apresentada enquanto “[...] romance de costumes sertanejos.” (MENEZES, [1888-1891] /2001, p. 04).[6] Aliás, a partir disso, situamos essas produções no primeiro movimento regionalista da literatura brasileira. Fato este, que tem entre seus precursores o também cearense Franklin Távora, a começar pelo folhetim romanesco Os Índios do Jaguaribe (1870) no ano de 1862, no Diário de Pernambuco. Nesse sentido, Antonio Candido (2000b, p. 268) caracterizou o regionalismo dos escritores nortistas a partir de três elementos presentes em suas escritas: (1) senso da terra, (2) patriotismo regional e a (3) reivindicação da preeminência do Norte. Para tanto, o recurso da memória apresenta-se como o grande arsenal[7] dos romancistas.
Nesse sentido, Bezerra de Menezes denota por meio da sua escrita um sofisticado conhecimento dos locais escolhidos para seus romances. Esse mundo desenvolvido para as tramas tratava-se, em grande parte, do seu mundo, vivenciado e experimentado antes de mudar-se para a capital cearense e depois para a corte. Destaca-se uma descrição atenciosa dos elementos geográficos e topográficos do sertão nortista. Esse exercício, por si só, produz representações socioespaciais importantes na composição do arquivo sobre o sertão, unindo-se aos demais romancistas nortistas do regionalismo surgido no século XIX. Para a geógrafa Ana Regina Bastos:
[...] a representação do espaço no discurso literário não deve estar condenada a um processo exclusivo de descrição da paisagem, considerada como o aspecto mais visível do espaço. É possível e necessário apreender e revelar aspectos e traços humanos essenciais. Trata-se de, em outras palavras, ultrapassar a mera aparência da natureza para dar conta dos aspectos sociais. (BASTOS, 1998, p. 12).
Portanto, o caráter socioespacial, e não meramente espacial, diz respeito ao uso da ambientação em complementação com a caracterização dos personagens, como também suas posturas morais. Compreendemos que há uma fusão entre os elementos da narrativa (Personagens, ambiente, tempo e espaço) na produção via romance, por parte de Menezes, das representações interessadas por essa pesquisa.
De modo geral, os três romances têm por ponto de partida o interior – ou sertão, entendido como oposição a região litorânea – da província do Ceará e do Rio Grande do Norte. Em A Pérola Negra temos Riacho de Sangue, lugar do seu nascimento, o Evangelho do Futuro a Vila da Maioridade, segundo lugar que residiu antes de ir para Fortaleza – CE, e por último A Casa Assombrada, pelo qual inicia a narrativa nas proximidades de Caicó, região central do Seridó Norte-rio-grandense.
Portanto, a ambientação dos romances é repetida, pelo menos no início das narrativas. Trata-se dos “[...] inóspitos [...]” (MENEZES, 2011b, p. 294), “[...] ínvios [...]” (MENEZES, 2011b, p. 308) mas também “[...] aprazíveis [...]” (MENEZES, 2011b, p. 90) sertões que correspondem, sobretudo, ao interior das províncias do Ceará, do Rio Grande do Norte e da Paraíba do Norte. Os personagens desenvolvidos sempre trilham os caminhos dos “[...] vastos sertões [...]” (MENEZES, 2001, p. 18), que desaguam o comércio de fazendas e molhados para os centros comerciais litorâneos. Aliás, o Riacho do Sangue, sua terra natal, é mencionada nos três folhetins, reforçando sua homenagem ao lugar. Podemos utilizar ainda dessas constantes referências, para denotar o exercício minucioso de descrição da fauna e da flora de algumas ribeiras.
Na contínua construção de uma contraposição entre o sertão e o litoral, o norte e o sul, Bezerra de Menezes constituiu representações pelas quais o sertão apresenta-se como território selvagem, no qual a paisagem se modifica entre os períodos de crise hídrica e chuvoso:
[...] passado o período do inverno, em que os campos se vestem de galas, cobrindo-se as árvores de rica folhagem, bordada de variegadas flores, tudo muda – toda aquela beleza se esvai, como se sepultam na escuridão da noite os quadros mais encantadores da Natureza que brilharam à luz do astro do dia. (MENEZES, 2011b, p. 308).
Resumindo em uma expressão, Bezerra de Menezes define o fenômeno como se fosse um sopro de um vento de morte na região: as árvores aparentavam estarem mortas, seria como se cinzas cobrissem todas as campinas, onde pássaros não entoavam mais seus alegres gorjeios, restando ao acauã – uma das aves símbolos do sertão – cantar poéticas melodias, já o gado ficava cabisbaixo, andavam em penosas romarias. Seriam esses, “[...] em largos traços, fraco esboço de quem ensaia a pena, são estes os quadros que se desdobram à vista do observador, nos ínvios sertões.” (MENEZES, 2011b, p. 307-308).
A seca enquanto fenômeno natural da região é mais aprofundado no folhetim Evangelho do Futuro, em diversas comunicações diretas ao leitor, pausando o desenvolvimento da narrativa. Seria esse fenômeno o modificador dos humores da região:
Nos sertões do Norte, ricos de todos os dons da Natureza, como a terra de Canaã, só há, pode-se dizer, uma preocupação, que altera a paz e a felicidade de seus habitantes: é a seca, fantasma horrível que concentra em seu hediondo ser todos os horrores por que possa passar a mísera humanidade, desde a fome, de comer couro seco e roer ossos, até a morte por inanição – desde a nudez da donzela até o sacrifício de sua pureza, em troca de um punhado de farinha. (MENEZES, 2011b, p. 331).
Logo, esse fantasma horrível não se tratava de escassez de chuvas entre dois a seis meses no ano, pois isso era natural. E nessas descrições é possível observar aproximações com seu ensaio Breves considerações sobre as secas no Norte (1986, p. 197-198), publicado originalmente em 23 de maio de 1877, por exemplo:
[...] suponhamos que, passando a estação seca de um ano, de 6 a 8 meses sem chuva, como foi dito, chega o tempo próprio destas para a renovação da colheita e dos pastos; e que, em vez dessa estação, ansiosamente esperada, prolonga-se a seca por todo o tempo que devia ser de inverno, e vai emendar com a seguinte estação seca, que devia seguir-se à das chuvas, que não houve. Suponhamos, mesmo, que o inverno não foi completamente sem chuvas, mas que estas não foram suficientes, nem para criar o novo pasto, nem para fazer vingar a nova lavoura. Temos, então, que, durante três estações seguidas, isto é, por ano e meio, deixará de cair chuva, ou só cairão insuficientes. (MENEZES, 1877a, p. 01).
No Evangelho do Futuro temos:
[...] imaginem que, num dado ano, aos seis meses de seca natural, em vez de seguirem-se os seis de natural verdura, pelas chuvas, passam estes, como aqueles, sem uma gota d’água do céu. São assim ligadas três estações secas, de seis meses cada ano: a que termina em dezembro – a chuvosa, que começa em janeiro, mas que falha – e a outra, que é naturalmente seca, e que começa em julho. São dezoito meses sem chuva, o tremendo flagelo! (MENEZES, 2011b, p. 332).
Bezerra de Menezes (2011b) entende que o fato da escassez normal de chuvas não constituiria um problema, pois não prejudicaria o curso normal da vida dos habitantes. O flagelo, uma das principais representações utilizadas em sua escrita, ficaria evidente quando a ausência de chuva se aproximava do décimo oitavo mês. Aliás, o período com poucas chuvas contribuía para o movimento dos transportes, sobretudo comercial, pois “[...] quando não cai gota d’água do céu [...]” (MENEZES, 2001, p. 12), ficava mais fácil atravessar os rios, travessia esta facilitada pela ausência de corrente.
Nesse contexto as regiões serranas são apresentadas como oásis, apesar de também ser afetada por “[...] loura plumagem [...]” (MENEZES, 2011b, p. 11-12) em tempos de seca, situa-se como lugar menos tortuoso em relação aos campos. Para exemplificar, Menezes apresenta a Vila da Maioridade – lugar central na primeira parte do romance Evangelho do Futuro, onde residiu na juventude – situa-se na serra do Martins. Essa, que segundo Menezes (2011b), seria a princesinha dos sertões:
[...] goza-se de uma temperatura amena, mesmo no verão, quando nos campos que a cercam os raios do sol canicular abrasam e requeimam até as árvores, que perdem as folhas, até as águas, que se afundam pelo seio da terra, transformando-se os rios em longas e mais ou menos largas cintas de alvíssima areia. (MENEZES, 2011b, p. 11).
É representada como um lugar de abundância e fertilidade, com um clima doce quando comparado às ardências insuportáveis das regiões baixas do sertão. Dentro da noção de que o espaço influenciaria o social, Menezes (2011b) ainda acrescenta o fato de a população da vila ter uma “[...] índole branda e sociável, como não se encontra igual por todo o sertão.” (MENEZES, 2011b, p. 12). Essa sociedade se aproximava dos costumes de qualquer capital. Por exemplo, diferente do observado na região, em 1810, pelo viajante Henry Koster – sobre as mulheres serem recolhidas e não fazer uso do espaço público (KOSTER, 1942, p. 148) – o romancista pontua “[...] que a parte feminina da sociedade não se isola, como é uso geral por toda a vasta extensão do interior de nossas províncias.” (MENEZES, 2011b, p. 12). Assim sendo, conclui sobre essas representações: “[...] fenomenal era por certo encontrar-se, num recanto perdido em meio de povos ignorantes e cheios de prejuízos, uma sociedade polida, de pouco desmerecer na comparação com as mais adiantadas do país.” (MENEZES, 2011b, p. 12).
Portanto, a Vila da Maioridade, hoje correspondente a cidade de Martins – RN, é representada no romance como um oásis, em uma construção de caráter socioespacial. Esse povoado seria a prova da possibilidade de uma sociedade avançada, que surpreenderia os transeuntes civilizados dos sertões “[...] ao ver tão longe dos grandes focos da civilização os usos e costumes das mais adiantadas sociedades [...]” (MENEZES, 2011b, p. 13), tudo isso em meio aos povos ignorantes e bárbaros. Buscando, em diálogo direto ao leitor, denotar essa faceta civilizada dos sertões nortistas, associando as questões climáticas favoráveis.
Para compor o quadro das representações sobre o sertão, o romancista acrescentou as paisagens físicas, elementos primordiais para lhe dar vida: os sertanejos. Nos três romances são apresentados personagens de distintos grupos sociais (mulheres, homens abastados, trabalhadores livres e escravizados), cuja experiência de vida no sertão é situada como traço em comum. Mesmo tratando-se de produções ficcionais, entendemos o contínuo diálogo da sua escrita com a matéria social e histórica do autor, que segundo Sena Júnior (2010, p. 06), é uma das bases centrais do trabalho intelectual durante seu processo de escrita.
Assim sendo, entendemos os personagens desenvolvidos a partir das compreensões de Antonio Candido (2002, p. 62-63), pelo qual, de modo geral, são entes reproduzidos. Isso significa dizer que são construídos a partir de “[...] elementos transpostos da vida.” (CANDIDO, 2002, p. 62-63). E por isso essas representações dialogam bastante com a literatura, ou o arquivo, produzido até o momento de sua escrita.
No exercício de cruzamento dos três romances temos, pelo menos, três eixos principais no que tange a produção dos personagens e seus significados nas obras: (1) a relação de alteridade entre os sertanejos e os habitantes da corte, (2) os sertanejos mediante os fenômenos das secas nortistas e (3) as práticas socioculturais encontradas na região, caracterizando os sertanejos enquanto grupo coeso, independente das fronteiras provincianas do Norte brasileiro.
Nas obras, a construção do sertanejo, como sujeito típico dos sertões, é feita a partir da contraposição aos moradores da Corte. Uma síntese pode ser encontrada no folhetim Evangelho do Futuro, pelo qual entender-se o sertanejo ou:
[...] o habitante dos sertões, onde casualmente nos achamos, vive em geral da indústria criadora. Seus gostos são rudes, mas simples, como o meio em que vive. Suas ambições não ultrapassam o estreito, porém alegre, círculo da família. Criar os filhos nos princípios do dever e da honra, do amor de Deus e do próximo e no da pátria é tudo o que preocupa a mente do obscuro matuto. Não reina ali a inocência, em que foi criado o primeiro par humano, porque esta foi rota no Paraíso e é guardada pela espada flamejante do arcanjo da pureza; mas encontra-se, generalizada, a que se pode chamar “inocência culposa” do homem. Entretanto, há entre os habitantes dos sertões corações maus, rebeldes a todo sentimento moral; porque há uma escala infinita nas vias do progresso humano. (MENEZES, 2011b, p. 308-309).
A simplicidade seria uma marca dos sertanejos, que, apesar das transgressões, teria uma inocência equivalente a Adão e Eva (existe uma frequência no uso de referências bíblicas). A maldade se apresentava como algo natural dos seres humanos. O fenômeno da presença do perverso – essa parte obscura de nós mesmos (ROUDINESCO, 2008), foi justificada a partir da escala evolutiva dos espíritos, proposta pelo Espiritismo de base Kardecista. Porém a existência do mal no sertão era “[...] repudiada por todos [...]” e “[...] motivo a sensatas e moralizadas dissertações dos velhos para instruir os moços.” (MENEZES, 2011b, p. 309). Em mais uma referência bíblica, aponta que os sertanejos viviam como “[...] os primitivos povos da Betânia [...]”, sem a ambição por fortuna e prestígio dos “[...] habitantes da cidade [...]” (MENEZES, 2011b, p. 309).
A oposição entre os sujeitos urbanos e sertanejos fica bastante evidente, para exemplificar nosso argumento, com o encontro do protagonista Leopoldo Dantas e o José Patrício em A Casa Assombrada. Bezerra de Menezes (2001) situa Patrício como um sujeito que apresenta os usos e costumes “[...] simples [...]” do sertão ao curioso Leopoldo (MENEZES, 2001, p. 188). É possível compreender a construção de distinções entre ambos os personagens, não apenas pelas frequentes comunicações diretas com os leitores, mas também por meio dos diálogos:
Leopoldo: Julgava então que eu era do Recife ou da Corte? – perguntei ao meu hospedeiro, logo que me levantei da mesa, no intuito de saber alguma coisa a respeito de meu irmão.
Patrício: Vosmecê me perdoe o meu juízo, mas lhe vi vestido fora da nossa moda e me entrou cá dentro a suspeita.
Leopoldo: E são maus os tais filhos daquelas paragens?
Patrício: Maus, não digo; mas têm uns modos que acanham a gente. Só dizer: é da Corte, faz vontade de fugir.
Leopoldo: Fugir de quê e por quê?
Patrício: Não sei, senhor. A gente da Corte é civilizada, e nós de sertão somos uns brutos. Qual o animal que não foge do homem? (MENEZES, 2001, p. 180).
Logo, reforça-se, mais uma vez, o sertanejo enquanto incivilizado, bruto, como uma representação frequente na literatura de Bezerra de Menezes. Em sua escrita existem raras exceções a essa regra em suas representações. De modo geral, a relação entre o sertão e a Corte estabelecida pela escrita de Bezerra de Menezes é perpassada por paradoxos. Ao mesmo tempo que o sertão é representado enquanto bruto e incivilizado, também é o lugar puro, da simplicidade, ora, naquelas paragens: “O espírito de rebeldia, a chamada filosofia do século [...], em flagrante discordância com o do Cristo, ainda não penetrou na alma daquela gente, rude, mas devotada ao bem.” (MENEZES, 2011b, p. 311).
Bezerra de Menezes (2011b) ainda apontou que na Corte a mocidade estaria “[...] imbuída de doutrinas perigosas, principalmente a de Comte.” (MENEZES, 2011b, p. 343). É importante enfatizar que o romancista foi um importante político do Partido Liberal. Aliás, outro paradoxo, pois quando deputado admitiu em plenário não ter contato com obras liberais, como Do Contrato Social do Jean-Jacques Rousseau (MENEZES, 1986, p. 89). Na coluna Inquérito[8] no jornal espírita Reformador, na edição de 15 de julho de 1892, ainda afirmou sua quase adesão ao ceticismo, salvo pela leitura de uma bíblia traduzida pelo padre António Pereira de Figueiredo, presente de um colega do consultório[9]. Ao que parece, analisando a trajetória do romancista, seria ele próprio também o sertanejo que passou pela experiência de contaminação das doutrinas perigosas.
Portanto, temos a representação do sertanejo, enquanto um sujeito próximo ao primitivo, caracterizado pela simplicidade, não deturpado em sua natureza pela vida citadina. Todavia essa inocência culposa, pelo qual Menezes associa os moradores do sertão, estaria em risco. Tirando alguns pontos civilizados, a Vila da Maioridade (região serrana, como principal exemplo), os costumes são representados por um certo purismo, aproximando-os constantemente de Deus. Ainda quando os personagens Leopoldo e o sertanejo José Patrício conversam sobre suas vivências, o último atenta para as deturpações da tal civilização:
[...] A tal história da Civilização – de uma moça solteira conversar livremente e até passear de braço sozinha com um rapaz – tem dado e há de dar bons burros ao dízimo. Dizem que levam o desaforo até a dançarem abraçados pela cintura, mesmo na cara dos pais! Ah! Eu, às vezes, tenho pena dessas coisas não serem, comigo, porque largava tão bem pregado tabefe no patife, que nunca mais em sua vida de lembrar-se de olhar, quanto mais de abraçar, a minha Raimundinha.
Olhe, nós aqui também fazemos folia no dia de Natal e na noite de São João; mas nossas danças são sérias; dança o moço e atira na moça; dança a moça e atira no moço sem se tocarem, fazendo mesuras de longe. É verdade que o demônio já vai entrando na pele dos sertanejos, pois eu vi, outro dia, em Coroaci, uma dança chamada “rilho”, que antes fosse relho, em que os moços seguram nas mãos das moças. (MENEZES, 2001, ano, p. 183-184).
A modificação dos costumes é simbolizada pelo avanço do demônio nos sertões, significando a aproximação dos ritos sociais aos observados na civilização, em referência às regiões urbanas do litoral. Além disso, Bezerra de Menezes também alude sobre a modificação dos sertões como consequência das mudanças econômicas em curso e a seca.
Aliás, a seca produz outro sujeito importante na literatura sobre os sertões nortistas: o retirante. Na escrita de Bezerra de Menezes, essa união – seca e retirantes – está presente especialmente em Evangelho do Futuro e A Pérola Negra. Importante ainda ressaltar que essa questão já se fazia presente em suas considerações no ensaio Breves considerações sobre as secas no Norte (MENEZES, 1877a, 1877b, 1877c). Na oportunidade, alertou sobre os riscos sanitários das aglomerações urbanas ocasionadas pelos retirantes, fugitivos da falta de recursos em meio a seca. Nos folhetins, essa preocupação se deslocou para outra questão: o esvaziamento nas províncias nortistas atingidas pela seca, causado pela migração em direção ao norte amazônico.
No Evangelho do Futuro, Menezes (2011b) anuncia narrar ao leitor fatos do ano de 18..., como pano de fundo para o desenvolvimento do seu romance. Dedicou-se a narrar a emigração das manadas humanas vindos dos “[...] ressequidos desertos, onde não se encontra nem pão nem água [...]” (MENEZES, 2011b, p.332) em direção aos portos do mar, na busca por gêneros alimentícios. Os que não morriam nas estradas, acabavam vagando pelas ruas das cidades: “[...] imagine-se um acampamento de duzentas ou trezentas mil pessoas naquelas condições, e calcule-se o turbilhão de desgraças que referve naquele meio!” (MENEZES, 2011b, p. 332-333). Denotando, assim como em seu ensaio de 1877, a preocupação com os riscos sanitários decorridos de tais aglomerações.
A presença desses fugitivos da seca, modificava o cenário urbano, ora, eram “[...] cardumes de crianças, esqueletos ambulantes [...]” (MENEZES, 2011b, p. 333), como também: “[...] são moças que viveram embaladas em castos pensamentos, sonhando as delícias de um amor angélico, agora reduzidas a venderem a honra por um pouco de farinha, com que matarem a fome, que lhes vai levar o caro pai – a mimosa mãe!” (MENEZES, 2011b, p. 333).
Portanto, a seca é entendida como um vetor de transformação de diversos aspectos que não estava restrita aos sertões, mas também nas áreas litorâneas, alvo da migração sertaneja, represada em grande parte nas urbes. Menezes (2011a) recorre novamente à temática para justificar a migração dos personagens para o norte amazônico em A Pérola Negra. Para além da questão da venda de escravizados para o sul, decorrente dos problemas econômicos locais, o autor registra a “[...] febre da emigração para o Amazonas.” (MENEZES, 2011a, p. 325). Com a economia da borracha em ascensão e a requisição de mão de obra, em comunicação direta ao leitor, o nosso autor enfatiza não haver “[...] vapor da companhia que não saísse do Ceará cheio de retirantes.” (MENEZES, 2011a, p. 325).
Ao longo do romance, se coloca explicitamente contra essa migração, pois os riscos do lugar não compensavam os possíveis benefícios econômicos: “[...] O que mais repugna, mais do que condói ver a massa ignorante correr para o abismo, é haver almas de breu que, ciente do mal, vêm seduzir, com descrições aparatosas, seus irmãos que vivem felizes na condição em que nasceram.” (MENEZES, 2011a, p. 195).
A felicidade apontada por Bezerra de Menezes a qual vivia os sertanejos corresponde a todos os benefícios existentes na vida nos sertões, representados em seus romances pelas paisagens, comida, costumes e abundância da natureza. Essa migração, segundo ele, seria movida pela ambição, sentimentos materialistas, ora: “[...] os habitantes do sertão do Ceará estão sujeitos à lei geral: vivem pobremente, mas vivem bem; isso, porém, não impede que, ouvindo falar das riquezas do Amazonas, se precipitem em busca de adquiri-las.” (MENEZES, 2011a, p. 195).
Claro, as crises hídricas eram um empecilho a ser resolvido e ele atuou apontando caminhos para tal. Como escreveu mais tarde no Evangelho do Futuro: “[...] se não fosse esse indescritível contratempo, que de anos em anos passa como um vento de morte por aquelas regiões, a vida do sertanejo era para ser invejada pelos reis da Terra.” (MENEZES, 2011b, p. 333). A simplicidade e a originalidade são elementos importantes nas representações elaboradas por Bezerra de Menezes acerca dos sertões nortistas. Todavia, é possível entendermos o exercício de associar o sertanejo como o verdadeiro modo de viver cristão; pautado na renúncia, na simplicidade, que são elementos doutrinários centrais no Espiritismo. Enfim, em uma última comunicação direta ao leitor sobre a temática, temos o seguinte apelo:
[...] filhos dos belos campos do Ceará, perdei essa ambição que vos devora cem por um, resisti aos que vêm, com seu exemplo, arrastar-vos ao abismo, que por bem rara felicidade não os tragou; contentai-vos com essa vida modesta e sóbria que vos logaram vossos pais, para que os nossos rios, nossos bosques, os nossos prados, toda a natureza sertaneja tinham encantos, que não trocariam por um trono, se fosse preciso deixarem tudo aquilo.(MENEZES, 2011a, p. 195).
A partir disso, é possível que possamos entender o fato de o romancista tecer representações do norte amazônico enquanto um lugar inóspito, selvagem e perigoso. Uma espécie de alerta aos aventureiros. Local onde, inclusive, Honorina, a pérola negra, morre em sacrifício, no lugar da Nhazinha, em meio aos indígenas juburis. Essa oposição à migração tomada pelo autor, ao que tudo indica, era contrária à dos grupos políticos e econômicos do Ceará. A historiadora Maria Secreto, denota um sistema de migração desenvolvido como mecanismo de mitigação dos efeitos da seca e esvaziamento da cidade dos “[...] flagelados, esfarrapados, famintos, sujos e doentes.” (SECRETO, 2020, p. 39). Fato presente na literatura, também comentado pela historiadora, como em A Normalista, de Adolfo Caminha, publicado em 1893, pelo qual apresenta-se o Norte amazônico enquanto lugar de transformação econômica.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Bezerra de Menezes situa-se, portanto, como sujeito importante, desde a década de 1870, na apresentação do norte à Corte brasileira; tanto por via das discussões técnicas, no seio da ciência da época, como também literária. Participou efetivamente no fornecimento de elementos discursivos para a invenção da seca, segundo Durval Albuquerque Júnior (1994), como um problema nacional. Todavia, urge agora situarmos as rupturas e permanências desse conceito nos romances doutrinários, entendendo como o sertão nortista é representado. Automaticamente, isso nos levará também a compreensão das contribuições históricas do autor a literatura regionalista e confessional em fins do século XIX. Ou seja, suas contribuições para a divulgação do Espiritismo no Brasil, através dessa ferramenta, não focaram exclusivamente nas temáticas doutrinárias – como a transcendência da vida após a morte –, mas em problemáticas concretas de seu tempo, em diálogo com suas pautas e preocupações políticas.
De modo geral, Bezerra de Menezes representa o espaço nortista a partir das regiões pelo qual a seca apresenta-se enquanto fenômeno natural. Apesar disso, a paisagem seca não é hegemônica, principalmente por conta dos oásis representados pelas regiões serranas, mas também das transformações causadas pela chuva. Pelas condições climáticas amenas, esses lugares possibilitavam a existência de focos civilizacionais de igual forma encontrados nos centros urbanos litorâneos. Nesse sentido, a compreensão do autor sobre os sertanejos (as) é contraditória. Mas são entendidos sempre a partir da alteridade com os sujeitos urbanos, ou gente da corte. De modo geral, são representados como brutos, ignorantes e bárbaros. Isso não impede de toda uma admiração do romancista pelo caráter humilde e desprendido de interesses materiais desses sujeitos.
Enfatizamos ainda que o espaço escolhido para ser cenário dos seus romances lhe é familiar. Compreendemos isso se cruzarmos sua escrita com seu itinerário pessoal de vida, antes de mudar para a zona litorânea (Fortaleza e, posteriormente, Rio de Janeiro). Todavia, as representações físicas da região podem ser melhor entendidas se associarmos aos sujeitos e suas práticas culturais, que compõem assim um quadro representativo dos sertões nortistas.
Pensar a escrita de Bezerra de Menezes e sua intrínseca relação com os sertões e seus sujeitos, portanto, é entendermos que as representações não eram, necessariamente, uma novidade para os leitores da capital do Brasil. O autor não apenas bebeu, mas, também, contribuiu na consolidação do arquivo sobre essa temática. Para seu exercício de escrita mobilizou uma produção intelectual própria, assim como suas próprias experiências de vida. Ora, ele, como afirmou, viveu no completo sertão, e isso o legitimaria na apresentação de um retrato representativo da região por via da sua escrita, auxiliando na interpretação da realidade de um determinado espaço-tempo.
Assim sendo, o romancista espírita elabora representações socioespaciais da região, pelo qual o sertão é situado ao leitor como um lugar inóspito, eventualmente modificado radicalmente pelo vento da morte (crises hídricas). O agravamento dos problemas sociais identificados na região e incorporados em sua criação imagética, que estão para além das crises hídricas, são devidos a um problema: a configuração política do país. Bezerra de Menezes se utiliza da literatura confessional espírita para pensar e realizar críticas ao centralismo político característico do Brasil Imperial. Além disso, denotando a continuidade do seu engajamento político após sua conversão ao Espiritismo em 1886, o romancista utilizava-se da plataforma espírita Reformador e do sertão nortista para participar do debate público-político da nação em construção.
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Notas