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A política de identidade do documento curricular do Estado do Pará

Joyce Otânia Seixas Ribeiro *
Universidad de Playa Ancha/Valparaíso/Chile, Brasil

A política de identidade do documento curricular do Estado do Pará

Estudios sobre las Culturas Contemporáneas, vol. XXVI, núm. 52, pp. 11-38, 2020

Universidad de Colima

Recepção: 10 Fevereiro 2020

Aprovação: 02 Julho 2020

Resumo: Este artigo tem como objetivo rastrear a política de identidade do Documento Curricular do Estado do Pará/DCEPará. O aporte teórico é do giro decolonial e dos estudos curriculares, sendo a etnografia multilocal, a arte do fazer. O DCEPará intenciona formar o ser-cidadão apto a participar do mundo atual modificado; porém, ao criticar a compartimentação, mas organizar o conhecimento em uma lógica disciplinar, arbórea e canônica, e reconhecer a diversidade cultural e os povos tradicionais da Amazônia, mas silencia-los durante o processo de elaboração do documento, apresenta discursos dissonantes. Neste ponto, a trama política fica evidenciada, o que gerou conflitos, resistência e insurgência. Quanto as metáforas, algumas são manuseadas para reforçar o discurso, como mundo em mudança, quebrar o olhar, construção do sujeito e pilar fundador. Concluo que esta política curricular, constituirá o empreendedor de si, competitivo, consumista e racista demandado pelo sistema-mundo moderno/colonial. É possível resistir e praticar a desobediência epistêmica para interromper a colonialidade do ser da política curricular do Pará, orientando o currículo por uma ética outra, para a restituição do ser.

Palavras-chave: Colonialidade do ser, DCEPará, Política de Identidade.

Abstract: This article aims to trace the identity policy of the Curricular Document of the State of Pará/DCEPará. Theoretical contribution is of the decolonial turn and of curricular studies, being multilocal ethnography, the art of doing. The DCEPará intends to train the citizen-being able to participate in the current modified world; however, when criticizing the compartmentalization, but organizing knowledge in a disciplinary logic, arboreal and canonical, and recognizing the cultural diversity and traditional peoples of the Amazon, but silencing them during the process of preparing the document, he presents discordant discourses. At this point, the political plot is evident, which generated conflicts, resistance and insurgency. As for the metaphors, some are handled to reinforce the discourse, as a world in changing, breaking the gaze, building the subject and founding pillar. I conclude that this curricular policy will constitute the competitive, consumerist and racist self entrepreneur demanded by the modern/colonial world-system. It is possible to resist and practice epistemic disobedience to interrupt the coloniality of the being of the curriculum policy of Pará, guiding the curriculum by another ethic, for the restitution of being.

Keywords: Coloniality of Being, DCEPará, Identity Policy.

Resumen: Este artículo busca rastrear la política de identidad del Documento Curricular del Estado de Pará/DCEPará. La contribución teórica proviene del giro descolonial y los estudios curriculares, siendo la etnografía multilocal el arte de hacer. DCEPará tiene la intención de capacitar al ciudadano para que pueda ingresar en el mundo modificado actual; sin embargo, cuando critica la compartimentación, pero ordena el conocimiento en una lógica disciplinaria, arbórea y canónica, y reconoce la diversidad cultural y los pueblos tradicionales de la Amazonía, pero los silencia durante el desarollo de preparación del documento, presenta discursos discordantes. En este punto, la trama política es evidente, lo que generó conflictos, resistencia e insurgencia. Acerca de las metáforas, algunas se manejan para reforzar el discurso, como un mundo cambiante, rompiendo la mirada, construyendo el tema y fundando el pilar. Concluyo que esta política curricular, constituirá el emprendedor, competitivo, consumista y racista exigido por el sistema mundial moderno/colonial. Es posible resistir y practicar la desobediencia epistémica para interrumpir la colonialidad del ser de la política curricular de Pará, conduciendo el currículo por otra ética, para la restitución del ser.

Palabras clave: Colonialidad del ser, DCEPará. Política de Identidad.

Traçandorotas

Neste artigo, apresento para o debate um dos aspectos do projeto de pesquisa pós-doutoral que problematizou o Documento Curricular do Estado do Pará/DCEPará, entretecendo uma análise a partir do eixo cultural. O problema de pesquisa parte da consideração de que o DCEPará visualiza o mundo em mudanças, critica a compartimentação do conhecimento e reconhece a diversidade cultural, contudo, está alinhado a BNCC privatista, que almeja formar o empreendedor de si. Considerando isso, indago sobre o tipo de sujeito que a política curricular do Pará almeja constituir. Assim, o objetivo é rastrear a política de identidades no documento curricular em tela. Para cumprir tal intenção, analiso o DCEPará a partir dos estudos curriculares e do giro decolonial, mais precisamente por meio de uma de suas ferramentas analíticas centrais, a colonialidade do ser. Nesta tarefa conto com Silva (1999), Costa (1998), Lopes (2004), Macedo (2014), Moreira (1990); Maldonado Torres (2007, 2008a, 2008b, 2017), Fanon (2008), Mignolo (2005, 2008), Palermo (2014), respectivamente.

Quanto ao método de pesquisa, considerei vários procedimentos para analisar documentos como a análise de conteúdo e a análise do discurso. Porém, como transito no campo dos Estudos Culturais desenvolvendo pesquisa de terreno por meio da etnografia, vasculhei a cena metodológica em busca de um procedimento etnográfico apropriado. A busca foi satisfatória, pois logo encontrei o artigo Etnografía en/el sistema mundo: el surgimento de la etnografia multilocal de George Marcus (2001), o que me levou a decidir pela etnografia multilocal que, apesar de contestada, se mostrou bastante produtiva.

A etnografia multilocal surgiu na década de 1980 no mapa de uma dupla crise, a crise da ciência moderna e a crise sociocultural, como resposta às demandas epistêmicas e contextuais contemporâneas (Marcus, 2001). Aqui, manuseio uma de suas modalidades, precisamente aquela que se ocupa de outras linguagens como a dos filmes, da comunicação e dos arquivos, adotando marcos teóricos macro para decifrar as conexões entre experiência e sistema-mundo.

A arte do fazer da etnografia multilocal consiste em rastrear documentos seguindo o discurso, a metáfora e a trama. Lamentavelmente, neste aspecto, debates metodológicos são escassos (Marcus, 2001), bem como reduzidos os exemplos de pesquisa bem sucedidas; porém, é importante se dar conta da necessidade de rastrear e mapear diferentes cenários de um complexo fenômeno cultural. No processo de rastreamento e mapeamento, outro aspecto importante a reter é que a etnografia multilocal é móvel e contingente, sendo possível acionar técnicas variadas para lograr as conexões almejadas.

Como o objeto observado está situado no âmbito do discurso, como é o caso aqui, é preciso esclarecer o sentido do termo. Marcus (2001) aciona o termo discurso para se referir a linguagem, ao texto de um filme ou documento. Ao sugerir que o discurso pode indicar conflitos e relações de poder, o autor se aproxima da analítica foucaultiana, na qual o discurso é um conjunto de práticas que, articuladas ao poder-saber, produz os objetos e sujeitos dos quais fala. Desse modo, nesta modalidade de trabalho de campo, é preciso atentar para a metáfora e a trama para traçar relações políticas. Se necessário, é recomendado acionar outros meios impressos ou virtuais, tudo para identificar o discurso, registrar metáforas constitutivas e interpretar os impulsos estatais (Marcus, 1991).

O terreno de pesquisa é o Documento Curricular do Estado do Pará, um entre a infinidade de documentos que constituem parte do Estado moderno. Um documento é um espaço social definido por interesses políticos específicos na condução da instituição estatal e, por condensar um rol de experiências, constitui-se em fonte privilegiada de informação (Zarias, 2004:1). Em razão da linguagem formal, enigmática e polissêmica, os documentos possuem diferentes níveis de hermetismo, contudo, são passíveis de decodificação e interpretação. Por conta da multiplicidade de sentidos, um documento não é a verdade sobre certo tema ou problema, mas a expressão dos compromissos e interesses de quem o elabora.

Na análise etnográfica de documentos é imperativo proceder a uma leitura atenta para examinar o que dizem tais textos. É fundamental ainda: estranhar as condições de sua produção, relacionando passado e presente; considerar o Estado em suas relações internas e externas; e evitar a interpretação literal, manuseando-o para rastrear a identidade do espaço (Muzzopappa; Villalta, 2011).

A dinâmica particular desta pesquisa se desenrolou iniciando com a verificação de disponibilidade do documento a ser analisado; encontrei o DCEPará está disponível na página da Secretaria de Estado de Educação – Seduc/Pará, e, em seguida descarreguei e arquivei em uma pasta. A primeira leitura foi flutuante, mas atenta ao discurso sobre a identidade. Após este contato inicial, percebi a necessidade de uma segunda leitura e, desta vez, o fiz em material impresso. Neste segundo momento, identifiquei a trama – relações políticas e interesses – e notei que mais detalhes precisariam ser encontrados em outro lugar. Assim, rastreei entrevistas e reportagens sobre o processo de elaboração do DCEPará ocorrido no ano de 2018, e encontrei um material esclarecedor em portais de jornais locais, em blogs diversos e portais de entidades científicas como o da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação - Anped, do Conselho Estadual de Educação – CEE/Pará, entre outras. A partir daqui, desenhei o mapa com as informações produzidas, para traduzi-las e iniciar a escritura. Dois aspectos merecem atenção: a autoridade etnográfica e a tarefa do etnógrafo. A autoridade etnográfica clássica é dada pela experiência desde Malinowski, mediante o ter estado lá. Porém, na etnografia multilocal a autoridade etnográfica é interpretativa, autorizada pela experiência de interlocução entre a pesquisadora e quem elaborou o documento, independente da presença destes últimos.

Quanto a tarefa do etnógrafo, esta se assemelha a do artesão, que se põe construir objetos úteis, ao mesmo tempo em que se compromete com a construção de uma sociedade outra. Sua postura no trabalho de campo é orientada pelo ethos “o pessoal é político”, o que reverbera em uma agência ativista, singular e circunstancial, com compromissos pessoais, políticos e epistêmicos que constituem de modo volátil sua identidade e subjetividade. Esta é a postura de uma pesquisadora-viajante em outro tempo-espaço, que estranha o trivial (Zabala, 2010) ao se manter atenta às relações de poder. Este movimento também reverbera na tradução e na escritura, momentos potentes que re-conectam diferentes espaços, tempos cindidos, sujeitos fragmentados, memórias efêmeras e discursos dissonantes (Marcus, 2001).

Em geral, uma política curricular oficial para a escola básica se destina a formar crianças e jovens, logo, guarda uma política de identidade que dissemina significados – valores, ideias, crenças, teorias, atitudes – para constituir a identidade almejada (Woodward, 2000). A seleção de conhecimentos é um processo intencional, planejado, capaz mobilizar tanto as identidades hegemônicas quanto as identidades de resistência, encenando o jogo das identidades nas instituições e nos demais espaços sociais.

Atentando para a dinâmica da escritura etnográfica, organizei o artigo iniciando pela descrição do DCEPará. Em seguida, rastreio a política de identidade do documento em tela, e faço um exercício analítico acionando a colonialidade do ser, atenta, ainda, a metáfora e a trama política envolvidas na política curricular. Encerro argumentando sobre o imperativo de pensar um currículo capaz de restituir o ser.

O Documento Curricular do Estado do Pará:breve descrição

O DCEPará é o documento que contém a política curricular do Estado do Pará. Foi elaborado por uma equipe de especialistas da Secretaria de Estado de Educação – Seduc/Pará, e aprovado no mês de dezembro de 2018. O documento é apresentado em 462 páginas, contendo na capa várias imagens em alusão a multiplicidade da cultura paraense.

O DCEPará está organizado em cinco partes:

  1. 1 - O processo de construção do documento curricular do estado do Pará;

    2 - A concepção de currículo, com destaque para os princípios que orientam o documento, como o Respeito às Diversas Culturas Amazônicas e Suas Inter-Relações no Espaço e no Tempo, Educação para a Sustentabilidade Ambiental, Social e Econômica e A Interdisciplinaridade no Processo Ensino-Aprendizagem;

    3 - Etapas de ensino às quais a base é destinada e as Bases legais das duas etapas de ensino: a educação infantil e o ensino fundamental;

    4 - Parte diversificada;

    5 - Modalidades de ensino: Educação especial (a escola comum na perspectiva da inclusão escolar e educação hospitalar); Educação de Jovens e Adultos; Educação para sujeitos privados de liberdade; Educação indígena, Educação do campo; Educação das relações étnico-raciais e quilombolas; A consciência política e histórica da diversidade; O fortalecimento de identidades e de direitos e ações educativas de combate ao racismo e a discriminações, encerrando com a indicação das Referências. O documento informa que o processo de elaboração contou com muitos momentos, encontros e reuniões, com a participação da comunidade educacional paraense, sendo aprovado em audiência no Conselho Estadual de Educação/Pará, realizada no dia 20 de dezembro de 2018.

Imagem da capa do DCEPará
Imagem da capa do DCEPará
http://www.seduc.pa.gov.br/site/seducAcesso: 25/04/2019.

Agora, é preciso conhecer o terreno no qual o documento curricular foi gestado. Desse modo, apresento suscintamente o estado do Pará, dando destaque à política de educação. O Estado do Pará começa a ser criado com a fundação de Belém no ano de 1616, por ocasião da ocupação ibérica do rio Amazonas, com a finalidade de defender o território das invasões holandesas, francesas e inglesas que já ocorriam no Nordeste do Brasil (Tavares, 2008). A denominação Estado do Pará passa a vigorar a partir de 1889. Hoje, é um dos sete estados – Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins – localizados na Amazônia brasileira; conta com 144 municípios, as “cidades da floresta” (Trindade Jr., 2013), e com 8.602, 865 habitantes, um povo constituído do encontro interétnico - indígenas, lusitanos, africanos e muitos outros.

Apesar de ter vivido um período representado como áureo, marcado pela economia da borracha, o Pará não chegou a enriquecer em razão do valor produzido ser deslocado para as grandes capitais como Manaus e Belém, bem como para o exterior, a Europa e os EUA (Tavares, 2008). O resultado disso, é que hoje, sua participação no Produto Interno Bruto1 brasileiro está em 11º lugar, considerando a classificação dos estados que mais contribuem. Sua economia é marcada pelo extrativismo (látex, açaí, madeira, castanha, entre outros), pela mineração – a Serra dos Carajás, tem grande destaque em razão da maior quantidade de extração de minério de ferro no país –, e pela indústria que adquire grande importância na produção de receitas financeiras, como é o caso dos Distritos Industriais de Ananindeua, Barcarena, Icoaraci e Marabá. No plano cultural, a diversidade da Amazônia e o encontro interétnico produziram múltiplas e particulares culturas, resultando em um caleidoscópio com uma infinidade de cores e sons, que reverberam na linguagem, na arte (Literatura, dança, música, artefatos culturais), na culinária, na religiosidade, nos costumes e nas tradições. Apesar da violência da colonização lusitana, houve resistência e as comunidades tradicionais seguem preservando sua história e seu modo de vida. No Pará existem 62 comunidades quilombolas,2 58 povos indígenas3 e muitas comunidades ribeirinhas que vivem nas margens dos rios e nas florestas.

No plano educacional, historicamente, o Pará tem seguido as determinações do poder central do Brasil, que desde o período colonial vem usando a instrução como um mecanismo de controle do ser por meio do combate a heresia e da docilização do indígena (Ribeiro, 1992). No Pará, a Companhia de Jesus representou os nativos como preguiçosos, indolentes, comilões, sujos e perigosos, devido sua forte resistência ao trabalho missionário. Com o plano de estudos e método do Ratio Estudiorum (Damasceno; Santos; Palheta, 2018:273), os Jesuítas se tornaram agentes de aculturação dos povos indígenas da região norte, tornando-os presa fácil para os colonos, ao ensinar a catequese, os “bons costumes” e instruir por meio do ensino da língua portuguesa.

O cenário republicano reverbera no Estado do Grão-Pará por meio de uma cruzada em favor da alfabetização, que previa instrução primária em vilas, aldeias e povoações, com a finalidade de extirpar a ignorância e garantir a entrada do país no círculo das nações civilizadas (França; Nery, 2015). A cruzada pela alfabetização no campo foi vista uma necessidade, uma vez que a população do campo era representada como inculta e doente, precisando ser ensinada a amar o campo e a se fixar nele (Damasceno, 2015). Ainda no contexto desta cruzada alfabetizadora, outra medida para combater hábitos não-civilizados foi a criação de escolas primárias agrícolas, nas quais eram ensinados a leitura, a escrita e os hábitos modernos aplicando métodos pedagógicos franceses e estadunidenses. Enfim, a instrução foi privilegiada na formação de uma nova mentalidade marcada pela consciência cívica, pela integração social, para o desenvolvimento da nação (Sousa; Rosário, 2011).

No período da Ditadura Militar, a relação educação-economia foi estreitada, com o objetivo de eliminar os obstáculos à expansão capitalista. Neste período, a reforma educacional no país foi orientada por teorias psicológicas americanas4 que advogavam ser função da escola a preparação de recursos humanos para a indústria nascente, por meio do ensino de habilidades, atitudes e conhecimentos úteis. Assim, seguindo esta lógica instrumental para a formação do ser por meio da educação, no Pará foram construídas escolas técnicas.

Na Nova República, final do século XX, o estado seguiu replicando a política nacional, sob orientação da Lei de Diretrizes e Bases n. 9394/96, dos Parâmetros Curriculares Nacionais e demais medidas educacionais, chegando até o recente apoio a implementação da BNCC. Porém, por um breve período – 1997-2204 – houve uma experiência educacional alternativa na capital do estado, Belém, a Escola Cabana, uma proposta que vigorou durante o mandato do então prefeito Edmilson Rodrigues, do Partido dos Trabalhadores.

Nesta retrospectiva em largas linhas, é possível perceber que a organização do ensino no Pará, dos Jesuítas à BNCC, se processou de acordo com o que Costa (1998) avalia como subordinação a política do conhecimento oficial a episteme europeia, objetivando transmitir conhecimentos supostamente objetivos que tem efeitos cruéis nas identidades. Moreira (1990), destaca que durante o processo de reconstrução democrática do Brasil, houve intensos debates em torno da noção de currículo e da necessidade de superar a transferência educacional, porém, ao final, resultou que a reforma educacional foi marcada pelo ideário neoliberal.

No item a seguir, rastreio a política de identidade do documento curricular, buscando refleti-la a partir da colonialidade do ser.

Rastreando a política de identidadedo DCEPará

Penso ser necessário um breve esclarecimento sobre o que estou considerando política curricular. Acompanho Lopes (2004), em seu argumento de que esta detém um duplo sentido, sendo tanto seleção de conhecimento quanto política cultural, ambos processos conflituosos, devido as relações de poder que envolvem disputas em torno de questões teóricas, culturais e políticas. As disputas em torno do currículo se devem ao fato de este ser um dispositivo de poder central de subjetivação no mundo contemporâneo, tanto que as nações imperiais tem imposto reformas curriculares às nações periféricas e semi-periféricas. Dito isto, apresentarei as intenções do documento.

Seguindo o discurso sobre a identidade almejada pelo DCEPará, observei que para circunscrevê-la, inicia situando o contexto atual, tanto global quanto local, como no texto abaixo:

Na sociedade contemporânea vivemos um tempo de intensas mudanças: a dinâmica do trabalho, a maneira como as pessoas interagem, a vida cotidiana e até mesmo o pensamento estão num apelo que solicita aos sujeitos expandirem sua maneira de ver e atuar no mundo e quebrar o olhar padrão sobre as coisas (DCEPará, 2019:13 – grifos meus).

Como é possível notar, o documento considera as mudanças ocorridas na sociedade contemporânea, o que tem afetado a dinâmica do trabalho, a interação social, a vida cotidiana, e os modos de pensar, exigindo que homens e mulheres expandam seu modo de ver e de atuar no mundo. Porém, para atuar neste mundo modificado, o documento curricular afirma que é preciso “quebrar o olhar padrão” sobre as coisas, o que demanda pensar e agir de outro modo.

Assim, considerando a necessidade de formar uma nova identidade para novos tempos, o documento curricular informa que a educação e o currículo precisam ser, também, pensados de outro modo. Neste sentido, a educação é considerada como um processo de humanização com a finalidade inserir os indivíduos no processo civilizatório (DCEPará, 2019), e o currículo, um construto social que resulta de relações de poder, da intersecção entre o local-global e da seleção de conhecimentos tanto do saber científico, quanto das experiências cotidianas.

A partir deste ponto, o documento curricular passa a indicar os objetivos da educação infantil e do ensino fundamental. Para ambos os níveis de ensino, considera as exigências do mundo atual, o contexto Amazônico, bem como as habilidades definidas na Base Nacional Comum Curricular/BNCC. O objetivo para a educação infantil, é formar para “[...] a autonomia, o protagonismo e a poética inerente das [sic] crianças no contexto da Amazônia paraense, com todas as suas diversidades e especificidades” (DCEPará, 2019:22).

As crianças são consideradas “[...] sujeitos históricos e de direitos, com uma vivência primeira na sua cultura e sociedade’ (DCEPará, 2019:22 – grifos meus). Ao considerar as crianças como sujeitos históricos e sujeitos de direitos em processos de interação e dialogismo, o documento indica que a função da escola é propiciar seu protagonismo, para que se tornem co-participantes de suas construções. Neste sentido, cabe a educação infantil “[...] erguer os pilares fundadores do Ser-Cidadão: político, ético e estético” (DCEPará, 2019:22 – grifos meus). A criança é, portanto, um sujeito plural: cidadã, sujeito de direitos, protagonista, produtora de cultura e de sua própria identidade, tanto na cidade quanto no campo.

É imperiosa a garantia de escolas de Educação Infantil às populações do campo, dos povos da floresta e dos rios, indígenas, quilombolas respeitando e garantindo assim essa etapa de ensino nos diferentes contextos amazônicos, privilegiando a constituição diversificada das crianças que neles habitam, respeitando, portanto, suas identidades, os seus aspectos socioculturais, étnicoraciais, de gênero, corporal, entre outros (DCEPará, 2019:32).

No trecho acima, destaquei a realidade da cidade e do campo, das águas e da floresta, assim como as múltiplas identidades da população amazônida formada por agricultores, ribeirinhos, quilombolas, indígenas, pescadores, extrativistas, assentados, caiçaras, acampados da reforma agrária, e muitos outros. Neste sentido, o DCEPará (2019) se coloca como um ponto de partida para a construção de um país em que a pluralidade seja considerada. Para garanti-la, a política curricular do estado do Pará anuncia que a Educação do campo, a educação indígena e a educação quilombola devem possibilitar aos sujeitos o pensamento crítico sobre o país a partir de seu próprio lugar, afirmando seus saberes e identidades para que não sejam estereotipados ou inferiorizados.

Sobre a educação indígena, considerando as peculiaridades históricas e culturais dos povos tradicionais, o documento compreende que a escola não deve impor a cultura ocidental, como já ocorreu no período colonial (DCEPará, 2019), mas assegurar o bilinguismo e a interculturalidade, previstas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Indígena na Educação Básica. Em relação a educação quilombola, considera as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Escolar Quilombola, como um dos marcos de luta do Movimento Negro e do Movimento Quilombola, que resultou em sua consolidação como uma modalidade de ensino da Educação Básica.

No que concerne à organização curricular da Educação Infantil Quilombola esta deve se dar de forma democrática e horizontal, visto que todos devem ter direito a voz e escuta, rompendo com a tradição de silêncio imposta a esse povo. Logo, o atendimento educacional das crianças que vivem nessas comunidades precisa estar pautado nos saberes ora pertencentes a esse povo. O conhecimento tradicional de cada comunidade deverá ser expresso a partir da participação das famílias e dos anciãos que são os especialistas nas tradições do seu povo (DCEPará, 2019:42 – grifos meus).

Apesar de não esclarecer a noção de interculturalidade acionada, o DCEPará anuncia os objetivos do Ensino Fundamental. Atento as demandas do mundo atual e as habilidades definidas na BNCC, destaca a necessidade de observar a integração e os direitos de aprendizagem, pois o que for ensinado terá efeitos nas práticas sociais e nas identidades. Por conta disso, o

[...] fundamental é o desenvolvimento da oralidade e dos processos de percepção, compreensão e representação, que são centrais para o que realmente importa, a apropriação do sistema de escrita alfabética, dos signos matemáticos, os registros artísticos, midiáticos e científicos e as formas de representação do tempo e do espaço (DCEPará, 2019:95 – grifos meus).

No ensino fundamental o que realmente importa é a instrução e a apropriação dos conhecimentos disciplinares como a leitura, a escrita e os códigos da cultura tecnológica contemporânea, com vista ao alcance das habilidades previstas na BNCC – duramente criticada por ser padronizada, minimalista e formar o empreendedor de si.

Assim, a seleção de conhecimentos objetiva formar sujeitos de direitos que, além de serem capazes de aprender certas habilidades para participar do processo civilizatório, respeitem sua cultura e a do Outro, como um cidadão produtivo, autônomo e protagonista da sociedade que se quer. Tanto na educação infantil quanto no ensino fundamental, na cidade e no campo, o conhecimento oficial deve considerar a organização das comunidades, suas contribuições sociais, econômicas, políticas, e culturais pois tudo o que é aprendido constrói identidades (DCEPará, 2019).

A política curricular do estado do Pará:uma análise a partir da colonialidade do ser

Para refletir o sujeito que o DCEPará almeja constituir para a sociedade que se quer neste século XXI, segui o discurso, a metáfora e a trama, buscando entretecer a análise com o apoio da colonialidade do ser. Durante o processo, precisei considerar tanto a experiência da colonização quanto as mudanças globais em processo, tanto a episteme ocidental quanto os conhecimentos dos povos tradicionais, buscando rastrear as conexões existentes.

Como indiquei antes, os objetivos da educação infantil e do ensino fundamental deixam claro o tipo se sujeito a ser formado: o ser-cidadão, sujeito de direitos, autônomo, emancipado, protagonista e plural, capaz de construir a sociedade que se quer5. Para constituir esta identidade, considera a realidade sócio cultural da cidade e do campo, das águas e da floresta, e anuncia que a Educação humaniza o indivíduo e o insere no processo civilizatório, com a decisiva contribuição de conhecimentos oriundos tanto do saber científico quanto os da experiência.

Apesar do discurso sedutor que agradou a comunidade educacional paraense, estes são dissonantes, pois a trama política e algumas metáforas desconectam contexto-conhecimento-sujeito. Entre os discursos dissonantes, o primeiro se refere ao contexto atual, caracterizado como um mundo modificado pelas novas tecnologias e pelo avanço científico. Ao afirmar que este panorama demanda um novo sujeito adequado ao mundo globalizado, expõe seu compromisso com as demandas da economia-mundo, levando o documento curricular a assumir um tom colonizador. O segundo, conceitua a educação como processo humanizador, o currículo como constructo social, almeja o Ser-cidadão, mas no fim, o documento cede as habilidades previstas na BNCC minimalista, privatista e homogeneizadora, e seu objetivo de formar o empreendedor de si requerido pelo sistema-mundo moderno/colonial. O terceiro, critica a compartimentação do conhecimento, mas prioriza a instrução organizando o conhecimento na lógica disciplinar, arbórea e canônica clássica.

Sobre o contexto e sua relação com a experiência, Dussel (1993) afirma que o sujeito que se movimenta no espaço-tempo contemporâneo – o ser-cidadão – se originou na modernidade colonial, na Europa, quando esta concretizou a experiência de constituir o outro como dominado e controlado pelo conquistador, consolidando o domínio do centro sobre a periferia.

Assim, não é possível compreende-lo sem historiciza-lo desde a conquista das Américas, levada a efeito por um processo militar violento que garantiu o domínio das terras, do trabalho, a inferiorização das culturas e a subordinação dos povos colonizados. O outro foi incluído como ‘o mesmo’, já que a diferença foi negada e o nativo subsumido, obrigado a incorporar a cultura branca (Dussel, 1993). Várias táticas foram usadas na colonização de identidades e subjetividades, entre as quais a imposição da língua (espanhol e português), do cristianismo e dos costumes ocidentais, em um empreendimento brutal que sepultou as culturas ancestrais, para que os nativos assimilassem a cultura da metrópole e se identificavam com o colonizador europeu, negando suas origens, branqueando seus corpos e seus pensamentos. Concretizando este intento, os europeus constituíram os povos colonizados segundo sua própria imagem, produzindo um novo modo de ser amputado, que se envergonha de si, despreza sua cultura e endeusa a cultura da metrópole, em um modo particular de assujeitamento.

[...] as formas modernas de assujeitamento o impede de escapar desta prisão, na medida que a sociedade branca destruiu a cosmovisão ancestral sem lhe possibilitar uma nova. Ao destruir as bases tribais tradicionais de sua existência, erigiu uma barreira para o futuro (Fanon, 2008:157).

Nesta agonizante relação existencial, tanto o colonizado quanto o colonizador experimentam a desgraça existencial, o primeiro por ter sido assujeitado e morto, o segundo por ter subjugado e matado (Fanon, 2008). Por isso, na contemporaneidade, há a necessidade de pensar a colonialidade do ser. Porém, não se trata unicamente de reparação retroativa, mas, sim, de afastar as vozes desumanas do passado, na direção de promover uma autêntica comunicação. A comunicação depende de uma retomada de si, o que não apaga certa tensão em torno da liberdade, mas cria condições existenciais para um mundo mais sensível. Tal sensibilidade brota do se dar conta de que o mundo do outro – sua língua, seus deuses e seus costumes – foi excluído do mundo ocidental, levando-o ao desaparecimento ou a aculturação por meio do domínio de seu território, da subordinação de sua cultura, de seus conhecimentos, e do controle de seus corpos.

O conceito de colonialidade do ser é de Walter Mignolo (2005, 2008), semiólogo argentino, que o delineou para explicar os efeitos da aventura colonial nos modos de ser dos povos nativos. Esta dimensão ontológica da colonialidade tem sido ampliada e aprofundada por Nelson Maldonado-Torres.6 No que segue, explorarei alguns pontos que considero cruciais para a compreensão da colonialidade do ser e do sujeito requerido pelo sistema-mundo moderno/colonial contemporâneo. Da perspectiva de Maldonado-Torres (2008a), a colonialidade do ser se refere aos efeitos da colonização na experiência vivida, na constituição do outro pelo projeto civilizatório europeu na contemporaneidade. Nessa agenda, para analisar as relações de poder entre colonizador-colonizado, o poder é definido na lógica foucaultiana, mas aplicado globalmente para a compreensão do poder imperial – uma forma de poder biopolítico que cria o poder disciplinar e tem obsessão pelo controle (Maldonado-Torres, 2008a).

Desse modo, neste século XXI, uma das medidas da globalização é a criação de muralhas de contenção entre as nações periféricas e semi-periféricas. No cenário sócio-político e cultural pós-11 de setembro de 2001, os Estados Unidos se tornaram aquilo que a Europa imperial foi no passado. Tal mudança de status exterioriza que a finalidade da atual nação imperial é a expansão de conhecimentos requeridos pela globalização da cultura, porem, estes conhecimentos têm sido orientados por ideais truncados da economia-mundo, requerendo subjetividades individualistas, consumistas e racistas (Maldonado-Torres, 2008a).

Nesta cena atual, o pânico e paranoia dos EUA em relação a suposta ameaça terrorista do Oriente Médio têm promovido a reformulação geopolítica do mundo, manifesta no alargamento da diferença imperial entre NortexSul. Além de intensificar a ocupação militarizada nos países do Sul global, ampliou práticas de vigilância, de controle, e, para justificá-las tem engendrado discursos para garantir sua hegemonia mundial, relegando a Europa a irrelevância. Tais ações e discursos se constituem em linhas divisórias, em fronteiras marcadas por diferenças coloniais e diferenças imperais que afetam a experiência e produzem prisões subjetivas.

Como é possível notar, a complexidade deste cenário exige se dar conta do brutal e desenraizador processo de globalidade moderno-colonial em curso, uma particularidade do poder imperial que precisa ser visibilizada com vista a implosão das prisões subjetivas (Maldonado-Torres, 2008b). O processo de construção de prisões subjetivas é concretizado por ações segregacionistas que estabelecem as hierarquias entre o eu e o outro, manifestas na divisão do mundo entre brancos e pessoas de cor do Norte, e distintos tipos de mestiços excluídos do Sul. É assim em razão da globalidade imperial precisar da racialização da experiência, pois não existe império sem raça. A racialização da experiência cria uma zona do não-ser destinada aos nativos, um espaço devastador que nega ao nativo peso ontológico diante do branco − para Fanon (2008) este processo é patológico. Por isso, para Maldonado-Torres (2008b) é imperativo libertar o ente, o que só é possível por meio de uma ética outra, aquela com a potência decolonial para a resistência e a insurgência.

No caso brasileiro, mesmo com certas particularidades, o encontro entre colonizadorxcolonizado se deu de modo semelhante ao dos demais países da América Latina, ou seja, materializado pelo extermínio e por sucessivas tentativas de supressão do outro. As marcas da colonialidade do ser no Brasil se expressaram na permanente e contínua vontade de “civilizar” os povos indígenas, o que também foi levado a efeito por meio da catequese, da imposição da língua portuguesa, dos hábitos, costumes e valores patriarcais lusitanos (Ribeiro, 1995). Como pontuei antes, a catequese e a instrução foram responsáveis pela colonização linguística, religiosa e subjetiva, pois forçou os nativos a esquecerem suas tradições ancestrais.

Considerando a colonialidade do ser nesta era de globalidade imperial, o DCEPará se constitui em uma muralha de contenção da diferença, sitiando populações racializadas em busca do triunfo da expansão da economia-mundo (Wallerstein, 2004). Ao priorizar a instrução, os conhecimentos ocidentais e ignorar a participação dos povos ancestrais e da sociedade civil organizada, relegará o outro em zonas de não-ser.

Sobre a compartimentação do conhecimento, documento critica o currículo do tipo coleção que compartimentaliza o saber e propõe organizar o conhecimento em eixos estruturantes e campos de experiência; porém, este intento de superar a compartimentação não se materializa, pois o DCEPará não consegue desobedecer a lógica da episteme ocidental hegemônica. Apesar de tentar considerar as culturas global-local, da cidade e do campo, bem como as experiências, privilegia “o que realmente importa”, a instrução, organizando o conhecimento em uma lógica disciplinar, arbórea e canônica. O resultado é que, no fim, garante a aquisição das habilidades padronizadas previstas na BNCC, e para alcança-las sepulta as culturas locais, o outro e seus conhecimentos, promovendo a homogeneização cultural.

Tanto na Educação Infantil quanto no Ensino Fundamental, o documento não consegue se distanciar da lógica disciplinar, mantendo os componentes clássicos. A organização arbórea do conhecimento se reflete organização hierárquica das disciplinas, e o cânone fica expresso além da presença das disciplinas que integram a tradição pedagógica, na indicação de temas e obras consideradas clássicas no ocidente, no detrimento dos conhecimentos das comunidades tradicionais brasileiras (Tiriba e Flores, 2016). O cânone é a expressão do universalismo abstrato e do eurocentrismo do pensamento padrão, e deve ser adotado pela nação que almeja ser representada como civilizada.

Com a estrutura disciplinar, o conhecimento é polarizado entre útil e legítimo e inútil e ilegítimo, dada a manutenção dos canônicos componentes curriculares e o apagamento dos conhecimentos dos povos tradicionais. O conhecimento inútil e ilegítimo, os conhecimentos ancestrais, foram negados na elaboração da política curricular, pela exclusão da sociedade civil organizada e das comunidades tradicionais, cujos conhecimentos advém da experiência corporal, sendo, por conta disso, considerados exóticos, superficiais e pré-científicos. A consequência desta manobra é a imposição do pensamento único, na medida em que ignorar e silenciar as comunidades tradicionais, reforça a racialização de seus territórios, culturas, conhecimentos e sujeitos. A trama política fica perceptível na exclusão dos povos da Amazônia, na tentativa de silenciar a sociedade civil organizada e as comunidades tradicionais durante o processo de elaboração do documento, impedindo sua participação.

Apesar dos muitos os momentos organizados pela Seduc/Pará, bem como de uma consulta pública destinada a ampla participação da comunidade educacional paraense, no documento curricular não há menção ao diálogo com os sujeitos da sociedade civil organizada e comunidades tradicionais. Por isso, houve resistência organizada pelo movimento denominado Frente Estadual em Defesa da educação Pública, formado por um coletivo de entidades da sociedade civil.7 Esta Frente Estadual em defesa da Escola Pública protagonizou um ato político, ao ocupar o plenário do Conselho Estadual de Educação – CEE com cartazes e palavras de ordem, impedindo a realização da sessão de Audiência Pública realizada no dia 10 de agosto de 2018, que aprovaria o documento curricular do Pará. Naquela oportunidade, a Frente lançou o Manifesto em Defesa da Educação Pública, assinado por um coletivo de entidades8, no qual afirma que a proposta curricular do Estado do Pará é ilegítima, antidemocrática e privatista. A ocupação do plenário do CEE/Pará culminou com o cancelamento da audiência pública, porém, o documento foi protocolado novamente no Conselho Estadual de Educação, em 10 de dezembro de 2018, para ser analisado, sendo aprovado em audiência realizada no dia 20 de dezembro de 2018.

Discursos sobre democracia, participação e construção coletiva do conhecimento e da sociedade que se quer, são reafirmados por todo o documento. Porém, a metodologia de elaboração do DCEPará foi marcada por uma trama com marcada por relações de poder, que impediu certos sujeitos de ter lugar e voz, pois os encontros e seminários preparatórios realizados foram meramente consultivos, tendo participado apenas os professores da rede. Desse modo, não a construção coletiva não passou de discurso, pois o que se concretizou foram práticas hierárquicas, burocratizantes e homogeneizadoras.

A homogeneização cultural só pode ser enfrentada com a efetiva participação de pessoas e grupos excluídos socio culturalmente, para ouvi-los, pois têm muito a dizer. A homogeneização cultural é uma estratégia central do sistema-mundo moderno/colonial para garantir coesão social e manter a incessante acumulação (Wallerstein, 2004). Para alcançá-la, o sistema-mundo moderno/colonial não hesita em apagar do mundo as culturas nativas e as diferenças, impondo às nações periféricas e semiperiféricas, políticas culturais uniformizadoras como as reformas curriculares, com conhecimentos padronizados, descontextualizados e descorporizados – como os contidos na BNCC –, na tentativa de unificar a nação por meio de uma cultura comum nacional (Gabriel, 2018). O apagamento das diferenças se concretiza pela defesa da similiaridade humana, como disse Mignolo (2003, 2005, 2008), na medida em que todos são considerados como iguais no mundo.

No DCEPará as comunidades tradicionais e seus conhecimentos foram reduzidos a saberes, o que expressa o binarismo e a hierarquização entre conhecimento e saber, em razão do primeiro ser produzido pelo colonizador europeu, detentor de racionalidade científica, e o segundo, ser produzido pelos povos nativos representados como irracionais e inábeis para a produzir conhecimento (Mignolo, 2008). Ao final, o objetivo de reconhecer as culturas locais e os diferentes povos não se realiza, devido a violência epistêmica reincidente. O desafio de garantir o protagonismo das comunidades tradicionais e sociedade civil organizada não foi superado, em razão da burocratização e dos compromissos políticos dos agentes estatais (Weber, 1999; Wellerstein, 2004) com a BNCC e o sistema-mundo.

Quanto as metáforas, identifiquei algumas que são acionadas para comunicar a visão de mundo, o ideário pedagógico e o compromisso político-cultural do estado. Metáforas como mudança é usada para se referir a atual etapa civilizacional, marcada por intensas transformações promovidas pela globalização econômica e cultural, pela reestruturação produtiva, pelo progresso científico e tecnológico. Ao usar a metáfora mudança, imprime significados positivos ao suposto progresso que resulta das novas tecnologias e dos avanços científicos.

Para entretecer argumentos de que o sujeito precisa olhar e interpretar o mundo de outro modo, mais flexível e aberto a nova dinâmica da contemporaneidade, usa a metáfora quebrar o olhar padrão sobre as coisas, sugerindo implodir ou estilhaçar visões fechadas e unilaterais sobre o tempo presente. É preciso, pois, questionar as teorias tradicionais sobre o mundo. Aqui, imprime significados que sugerem o imperativo de, em tempos de mudanças intensas e velozes, assumir uma postura orientada por novos valores e condutas, para promover a adaptação as demandas impostas e ser capaz de pensar soluções criativas e inventivas.

Duas últimas metáforas, pilar fundador, acionada ao tratar da educação infantil, afirma que esta é o pilar fundador do Ser-Cidadão. Ao acionar esta metáfora para traduzir a função social deste nível da escolarização básica, o documento curricular do Pará afirma que a educação infantil é a base que sustenta a formação cidadã, destacando ainda toda a sua relevância. A metáfora construção é recorrente no discurso social e pedagógico brasileiro. Aqui, é acionada para afirmar que o conhecimento ensinado-aprendido constrói um país plural e as identidades. Com esta metáfora, a intenção é entretecer argumentos que imprimem a ideia de um estado que respeita e valoriza múltiplos saberes, as culturas e seus muitos sujeitos.

O estado neutro e objetivo é uma ilusão, pois sua pesada máquina burocrática com documentos, rituais e interesses exclui as massas de processos participativos (Weber, 1999). Por conta disso, o DCEPará acaba sendo uma prática de sujeição do estado regulador (Abrams, 2015), um cimento unificador que pela homogeneização cultural garante a tranquilidade da divisão do trabalho. A política curricular do estado do Pará apresenta discursos dissonantes, metáforas que substituem certas expressões e intenções, mantendo significados supostamente críticos, e uma trama política articulada pelos agentes estatais para garantir seu apoio a BNCC e atender as demandas subjetivas da política externa. O sistema-mundo moderno/colonial globalizado, flexível e homogeneizador, demanda sujeitos, capazes de produzir mercadorias em grandes quantidades, em tempo reduzido, e com capacidade para consumi-las. Este sujeito é competitivo, individualista, ágil, rentável, consumista e racista. Para constituir este sujeito, o sistema-mundo neoliberal investe nele desde a educação infantil, tempo-espaço no qual crianças e jovens são ensinados a superar suas próprias capacidades, sendo estimuladas a concorrer por meio de um currículo com conteúdos mínimos e testes padronizados.

O conhecimentoe a restituição do sujeito

No mundo, há muito o que aprender com aqueles outrosque a modernidade tornou invisíveis

Maldonado-Torres, 2008b

Como apontei antes, o currículo vem sendo acionado para legitimar a hegemonia do poder colonial desde o início da aventura colonial nas Américas, havendo muitos exemplos de que o “[...] projeto colonial teve uma importante dimensão educacional e pedagógica” (Silva, 1999:128). Considerando isso, é imperativo focar na análise do legado colonial, nas transformações histórico-culturais do país e nas novas formas de imperialismo econômico, para analisar a colonização do currículo e a produção de identidades.

Discutindo o currículo pós-colonial, Silva (1999) argumenta que o processo de colonização precisou garantir sua hegemonia e o fez por meio do extermínio das culturas nativas e da transmissão de conhecimentos das artes, da língua, da religião e das ciências ocidentais, com o propósito de civilizar a cosmovisão “primitiva” dos povos nativos. Ao reivindicar um currículo descolonial, o autor afirma que este é capaz de promover a interconexão entre a cultura, o conhecimento e o poder, permitindo o questionamento do cânone ocidental, das questões étnicas e de subalternização. Este debate foi entretecido no final dos anos 1990, mas ainda é bastante atual, apesar de Silva (1999) não acionar de modo sistemático as contribuições do giro decolonial.

Para a colonialidade do ser, o ser tem sido aprisionado pela episteme ocidental que ignora seu território, sua cultura, seus conhecimentos e sua identidade. Se o ser é aprisionado e coisificado, é imperativo acionar uma nova ética. Esta não limita a apenas considerar uma episteme alternativa à hegemônica, não se limita a apenas dar voz às comunidades subjugadas, não foca em mudar a natureza ou os significados – mesmo que esta seja uma tarefa parte do processo –, e nem se reduz a inclusão de saberes sobre diversidade e inclusão no currículo.

É preciso ir além para se dar conta do histórico silenciamento da episteme nativa, considerando que as cosmologias das comunidades indígenas-negras-mestiças foram diluídas e seus corpos disciplinados. Portanto, a tarefa ética é a decolonialidade, que consiste em considerar as perdas históricas das comunidades tradicionais e problematizar o eurocentrismo que oculta o absolutismo neoliberal por meio da retórica do cidadão. Neste sentido, para Maldonado-Torres, 2008b), é imperativo ser capaz de criar uma realidade pós-genocida e pós-tortura, religando o ser-natureza separado por mais de 500 anos.

Vejo possibilidades, na medida em que mesmo que o DCEPará se constitua em uma barreira de contenção que tenta apagar as culturas minoritárias do estado do Pará, que insista na lógica disciplinar e mantenha certas identidades em zonas de não ser por meio do que estou chamando de currículo branco, é preciso resistir e reivindicar um currículo outro. Esta possibilidade é dada ainda ao se considerar que o processo de constituição identitária é marcado por atravessamentos múltiplos como o pertencimento, a diferença – gênero, sexualidade, etnia, geração, classe, religião, nação –, o desejo e muitos outros. Estes atravessamentos deslocam identitades e estas se expressam aceitando, negociando, traduzindo significados, e resistindo (Hall, 1997; 2000).

Contudo, Maldonado-Torres (2016; 2017) chama a atenção para o fato de que não há soluções fáceis para os problemas da colonialidade – aqui os relativos à educação. O autor ressalta que esta é uma tarefa necessária, pois a colonialidade do ser segue constituindo identidades e subjetividades desejáveis a economia-mundo, por meio de uma pedagogia colonial que sempre esteve a seu serviço. É uma responsabilidade política, científica e ética um pensar-fazer que desobedeça a episteme ocidental, desconstruindo tudo o que, incansavelmente, as colonialidades ensinaram e ensinam.

O debate sobre o conhecimento escolar é levado à efeito por Palermo (2014), que problematiza o pensamento único, imposto pela colonialidade epistêmica à educação, da educação infantil a pós-graduação, desconsiderando conhecimentos outros, produzindo subjetividades enjauladas. Neste panorama, tem sido recorrente o descompasso entre discursos e ações pedagógicas, pois o mais comum é a indolência e a improdutividade do discurso estatal, na medida em que impede efetivas mudanças na concepção de conhecimento e nas práticas educativas.

Explorando a política de curriculum, Palermo (2014) argumenta que na contemporaneidade, o livre mercado impõe o pensamento único, silenciando as comunidades e invisibilizando o outro, por considerar sua cultura e sua linguagem inferiores. Diante deste cenário de surdez hegemônica, é preciso relativizar o currículo oficial e reagir promovendo a decolonialidade do conhecimento, um possível caminho para a necessária afetividade e empatia com a memória sociocultural de pertencimento e com os conhecimentos ancestrais. Para Palermo (2014), é preciso pensar o conhecimento a partir de outro lugar, descartando algumas ferramentas da episteme moderno/colonial, buscando experiências e discursos que reinterpretem as culturas locais. Esta ação é indispensável devido a autora considerar que a pedagogia colonial é incapaz de dar conta das diferenças em razão de suas finalidades homogeneizadoras.

Concordando com Maldonado-Torres (2008b), Palermo (2014) afirma que a escola tem se limitado a disseminar discursos sobre diversidade, mas sem ouvir as comunidades, produzindo e reproduzindo ideias e ações uniformizadoras, o que impõe a necessidade de promover ações pedagógicas capazes de alterar a subjetividade pedagógica eurocêntrica e a representação da cultura local como inferior. Para a autora, o estado precisa atuar na construção de uma sociedade plural em todas as dimensões.

Fanon (2008) também contribui com o debate educacional, afirmando a necessidade de políticas culturais capazes de considerar que a relação colonizador-colonizado é regida por muitos atravessamentos como a religião, a língua, os costumes, a instrução, de modo que seus significados reverberam no currículo, espaço no qual as crianças e jovens mestiços, indígenas e negros são ensinados a desprezar sua própria cultura, sua língua e seus deuses. Estas políticas culturais – discursos, práticas, livros didáticos, currículos, eventos pedagógicos – precisam ser intensamente praticadas, pelo menos até a conclusão dos estudos, no caso brasileiro até a conclusão do Ensino Médio. Nas palavras do autor, é necessário

[...] criar periódicos ilustrados destinados especialmente aos negros, canções para crianças negras, até mesmo livros de história, pelo menos até a conclusão dos estudos. Pois, até prova em contrário, estimamos que, se há traumatismo, ele se situa neste momento da vida (Fanon, 2008:132).

Estas ações permitem a comunicação e criam condições existenciais para um mundo mais sensível em relação ao outro e liberdade para retomar a si mesmo.

Voltando ao compromisso ético capaz de restituir o ser, Maldonado-Torres (2007, 2008b) segue argumentando sobre a necessidade de ações de resistência e de insurgência, destacando que estas têm sido recorrentes em todo o Sul global. Estas ações reivindicam uma educação que considera a política do lugar, a interculturalidade e a transculturalidade como rotas para a intervinculação entre conhecimentos ocidentais e ancestrais.

A política do lugar se refere ao reconhecimento da violência colonial do passado e do presente, permitindo o se dar conta da localidade geo-histórica e da fratura de viver no Sul global; incita o pensar-fazer-sentir desde a história, das memórias e dos conhecimentos ancestrais, em busca de alternativas para o bem viver na região (Mignolo, 2005). A interculturalidade reivindica direitos epistêmicos no contexto dos projetos coloniais e promove um intenso diálogo entre a cosmologia não-ocidental (afros, indígenas, mestiças, asiáticas, árabe-islâmicos, entre outras) e a ocidental, para constituir uma episteme mestiça. A lógica transdisciplinar se refere ao imperativo de refletir sobre a rígida e compartimentada estrutura disciplinar que organizam o conhecimento nas instituições educativas. Castro-Gómez (2005, 2007), considera o mundo complexo, e prática interdisciplinar proposta para supera-lo não logra sucesso, pois esta se limita a trocar informações entre diferentes disciplinas, deixando intactos os fundamentos da episteme moderno-colonial. Assim, propõe experimentações rizomáticas para desfragmentar esta estrutura rígida e interromper a lógica disciplinar, arbórea e canônica; o diálogo entre conhecimentos e entre culturas é a trilha mais promissora.

Acompanhando esta lógica de pensamento, fica evidente a necessidade de interconexão entre as diferenças culturais e diferenças epistêmicas, haja vista expressões como diálogo, intervinculação e comunicação. Neste sentido, uma política curricular que considere as culturas, os conhecimentos e sujeitos outros precisa ir além do discurso do reconhecimento e da inclusão, e praticar a desobediência epistêmica, orientando ações por outra ética e ouvir as comunidades tradicionais.

Desfecho

Ao rastrear a política de identidade do Documento Curricular do Estado do Pará, foi possível mapeá-la e interpretá-la por meio da etnografia multilocal, considerando discursos, tramas e metáforas. Concluo, ainda que provisoriamente, que o discurso do DCPará é dissonante quanto ao contexto, ao conhecimento e as diferenças culturais, pois acaba se alinhando a BNCC privatista e as demandas subjetivas do sistema-mundo moderno/colonial. Assim fazendo, mesmo que almeje formar o Ser-cidadão, a trama leva ao empreendedor de si, competitivo, consumista e racista.

Vale destacar que o documento curricular se coloca contrário a compartimentação disciplinar, porém, acaba reproduzindo e produzindo a lógica disciplinar, arbórea e canônica clássica da episteme ocidental. Esta mesma lógica se repete em relação a diversidade cultural, constantemente afirmada em discursos de valorização e reconhecimento das culturas do campo, dos povos ribeirinhos, dos povos indígenas e das comunidades quilombolas, contudo, a trama política do processo de elaboração do DCEPará, impediu a participação destes sujeitos, o que gerou conflitos, resistência e insurgência. Quanto as metáforas, durante o rastreio do documento, destaquei, apenas aquelas que, em alguma medida, reforçam o ideário pedagógico-cultural e os acordos políticos internos e externos dos agentes estatais.

Neste sentido, a conexão sistema-mundo e experiência fica exposta na medida em que, na atual cartografia pós-11de setembro de 2001, a paranoia dos EUA promove intensa vigilância e controle das nações do Sul global, ao erigir barreiras de contenção para segregar e apagar as culturas minoritárias do mundo, e impor demandas subjetivas para seguir com a acumulação permanente do capital.

Considerando isso, da perspectiva epistêmica, é imperativo se dar conta do lugar, da violência epistêmica e do aprisionamento do sujeito para resistir, desobedecer e desarticular compartimentações, hierarquias e a homogeneização. A resistência reivindica uma educação outra, orientada por uma ética que seja capaz de restituir o sujeito, por meio da intervinculação entre racionalidades diferentes. Na escola, esta ética outra se traduzirá em políticas pedagógico-culturais que considerem os conhecimentos ancestrais, que altere a subjetividade pedagógica, que desconstrua representações inferiorizadas e estereotipadas do outro, que precisam ser desenvolvidas, ao menos, até a conclusão da escolarização básica.

Nesta escritura, produzi informações e procurei traduzi-las de modo a não esgotar possibilidades, até porque o rastreio do discurso, da metáfora e da trama de um documento é sempre móvel e provisório. Outro fator que impede conclusões definitivas é a interpretação orientada pelo giro decolonial, em razão deste se constituir em uma episteme-em-formação, logo, imperfeita, incompleta e aberta a contribuições e ao refinamento. Contudo, ainda que em formação, as ferramentas decoloniais são potentes, produtivas e contribuem com a reflexão dos problemas socioculturais e educativos da América latina e da região Amazônica. Por fim, penso que é possível eleger outros objetos e aportes teóricos-metodológicos para transitar pelo DCEPará, em novas experimentações e alquimias.

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Wordward, K. (2000). “Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual”, in: Silva, Tomaz T. (2000). (Org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes.

Notas

1. . O PIB do Brasil em 2019 foi de R$ 7,3 trilhões, sendo que a contribuição do Pará foi de 155.195. Disponível em: www.ibge.gov; acesso em: junho de 2020.
2. Fonte: www.seplan.pa.gov.br; acesso em: junho de 2020.
3. Fonte: www.agenciapara.com.br; acesso em: junho de 2020.
4. Os psicólogos estadunidenses são os intelectuais da vez, como: Burrhus F. Skinner, Robert M. Gagné, Benjamin S. Bloom e Robert F. Mager (Cf: Libâneo, José Carlos, 1992. Democratização da escola pública. São Paulo, Cortez).
5. No Brasil a noção de cidadania e de cidadão começaram a circular no período republicano sob a influência do ideário da revolução Francesa. Em meados do século XX, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, as bases para a ampla garantia de direitos a “todos os seres humanos” foram colocadas, como o direito à cidadania e a participação integral da criança, da mulher e do homem na sociedade. No final do século XX, mais precisamente nos anos de 1990, crianças e jovens são reconhecidos como cidadãos e sujeitos de direitos, o que culmina com a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente/ECA, cuja finalidade é a proteção plena – garantia de direitos e provimento de vida infantil e juvenil digna –, assegurada pela família, pelo Estado e pela Sociedade. No mapa da cidadania há duas dimensões relevantes: o sujeito de direitos, aquele/a à quem a lei regula atribuindo direitos e obrigações, e a participação social, pautada na diversidade e na atuação política como direito fundamental (Gorczevski; Martin, 2011). Hoje, a participação tem sido renomeada de protagonismo, sendo, em geral, representada pelas lutas dos movimentos sociais e comunidades tradicionais. Neste cenário de direitos e de protagonismo, a cidadania não será realizada em cenários de exclusão social, logo, o protagonismo é fundamental e o primeiro desafio a ser superado.
6. Filósofo porto-riquenho e professor da Universidade de Rutgers/Nova Jersey/EUA; é integrante do Grupo Modernidade/Colonialidade; pesquisador no Departamento de Ciências Políticas da Universidade da África do Sul, membro do conselho internacional da Fundação Frantz Fanon em Paris/França e ativista envolvido em diferentes movimentos sociais.
7. Movimentos populares, sindicatos (Sindicatos de professores da rede pública, sindicato de professores da rede particular, Sindicato dos professores das Instituições Federais da Educação Superior, Intersindical), pelo movimento estudantil (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), pela Associação Nacional de Política e Administração da Educação – ANPAE/seção Pará, pelo Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Educação Básica – PPEB, do Núcleo de Estudos Transdisciplinares em Educação Básica da Universidade Federal do Pará.
8. Assinaram o Manifesto: Associação Brasileira de Ensino de Biologia (SBEnBio), Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), Associação Brasileira de Currículo (ABdC), Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (ABRAPEC), Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES), Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Forumdir – Fórum Nacional de Diretores de Faculdades, Centros de Educação e equivalentes das Universidades Públicas, Associação Nacional de Pesquisadores em Financiamento da Educação (FINEDUCA), Movimento Nacional em Defesa do Ensino Médio, Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM), Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC-PA), Sindicato dos Professores do Ensino Superior Público Federal (SindProifes) (Manifesto em Defesa da Educação Pública, 2018:3).Disponível em: http://www.anped.org.br/ Acesso em: 24/03/2019.

Autor notes

* Doutora em Educação pela Universidade Federal do Pará/UFPA; estágio pós-doutoral na Universidad de Playa Ancha/Valparaíso/Chile. Professora Associado 2, da Faculdade de Educação e Ciências Sociais/Campus Universitário de Abaetetuba/UFPA; Professora do PPGCITI - Programa de Pós-graduação em Cidades, Territórios e identidades, na linha de pesquisa Identidades: linguagens, práticas e representações. É Líder do Gepege – Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero e EducaçãoÁrea de interesse: Currículo e culturas (gênero, sexualidade e artefatos culturais); joyce@ufpa.br
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